Quando fizemos o convite ao Matheus para ir ao jantar “Portugal meets Brazil”, uma experiência culinária na casa do chef José Esteves, ele confidenciou-nos que se tinha sentido o “último biscoito do pacote”, e foi rápido a dizer que sim. Mas afinal a feijoada é brasileira ou portuguesa? E sabiam que os dois países reclamam o caldo verde como seu prato típico? Pelo que nos parece, foi mesmo uma experiência de lamber o prato!
Ao chegar à morada do número 96 na Rua Luciano Cordeiro, um pouco antes do horário marcado, inúmeras coisas passavam na minha cabeça: “será que cheguei em cima da hora?”, “será que só vai ter bacalhau?” e “será que a Madonna é uma das convidadas?”. Bom, a resposta seria não para todas essas perguntas, mas nada era certo até que, às 20:30, apertei a campainha e a porta abriu. Era hora de conhecer o que me esperava.
Ao chegar, um rosto conhecido: o da Priscila Ballarin – minha conterrânea brasileira que também participou no parto desta revista – e a primeira surpresa da noite: descobrir que a Pri era namorada do Zé Esteves, o Chef, e que aquela era a casa deles. Uma sensação de: “Tudo faz sentido agora!” ecoou na minha mente. Tentei disfarçar minha descoberta à la Sherlock Holmes e saudei o Zé. Vestindo uma dolmã (aquela roupa branca que os cozinheiros usam) e avental, ele estava começando a servir os petiscos.
O Zé me contou que sempre cozinhou para os amigos em casa. Essa é uma das semelhanças que partilho com ele, ambos temos muito prazer em reunir os amigos à mesa, seja almoço, jantar ou mesa de bar. Mas a empatia ficou maior ainda quando descobri que ele morou por algum tempo em São Paulo e no Piauí (Estado no Nordeste brasileiro), o que explica a experiência nos pratos luso-brasileiros. Quem prova carne de sol com manteiga de garrafa, requeijão cremoso e uma boa cachaça artesanal (não estou falando da 51, meus amigos) e sabe adicionar esses ingredientes a pratos típicos da culinária portuguesa, harmonizando com um bom vinho do Douro ou Alentejo, é garantia de sucesso.
“Mas e os demais convidados?”, vocês devem estar se perguntando. Não foi desta vez que conheci uma celebridade internacional, mas um pessoal muito boa onda estava presente. Portugueses e brasileiros misturados, e até um chinês, que ficou hospedado naquela casa há uns meses e virou amigo do casal. Desconhecidos e conhecidos unidos à mesa. É assim que funciona a dinâmica do projeto Chez Esteves, que proporciona, além da experiência Portugal Meets Brasil, aulas de culinária e tours gastronômicos por Lisboa.
E assim que a irmã e o cunhado do Zé chegaram, nos sentamos e o Chef revelou que o menu seria composto de uma entrada, dois pratos e sobremesa, acompanhado de vinho tinto e branco. Para picar, pedaços de queijo da ilha e goiabada. No Brasil, essa dupla é conhecida como Romeu e Julieta. Um acerto para os amantes do “salgadoce” – a mistura de salgado com doce –, como eu.
“Mas e os demais convidados?”, vocês devem estar se perguntando. Não foi desta vez que conheci uma celebridade internacional, mas um pessoal muito boa onda estava presente. Portugueses e brasileiros misturados, e até um chinês, que ficou hospedado naquela casa há uns meses e virou amigo do casal. Desconhecidos e conhecidos unidos à mesa. É assim que funciona a dinâmica do projeto Chez Esteves, que proporciona, além da experiência Portugal Meets Brasil, aulas de culinária e tours gastronômicos por Lisboa.
E assim que a irmã e o cunhado do Zé chegaram, nos sentamos e o Chef revelou que o menu seria composto de uma entrada, dois pratos e sobremesa, acompanhado de vinho tinto e branco. Para picar, pedaços de queijo da ilha e goiabada. No Brasil, essa dupla é conhecida como Romeu e Julieta. Um acerto para os amantes do “salgadoce” – a mistura de salgado com doce –, como eu.
Na sequência, o caldo verde. Esse item é, de acordo com o Zé, o menos consensual de todos, porque Portugal afirma que é um prato típico e o Brasil também. Deve ter sido mais uma dessas receitas que viajou o Atlântico e encantou o gosto popular, assim como a Feijoada. Mas o caldo servido explica porque ambos os países o adoram tanto: era suave, com couve e chouriço de porco preto crocantes. Simplesmente divino.
Enquanto aguardávamos o próximo prato, o Chef atende a uma ligação inesperada: três italianos que ficaram sabendo do jantar pelo Facebook e apareceram mesmo sem reserva. Zé pensou bem e disse: “Vocês acham que eu vou deixar alguém com fome?” e desceu para resolver a situação. Mas não foi desta vez que os italianos se juntaram à mesa, preferiram deixar para uma próxima oportunidade. Então o jantar seguiu com as onze pessoas já presentes, um número considerado por Chez Esteves ideal para todos poderem comer e conversar tranquilamente.
“Não pode beber ainda, só cheirar”, disse o Chef ao retornar com copinhos de shot e um jarro, com uma bebida misteriosa. Ao sentir o aroma, logo disse: “Caipirinha”. Errei, mas não completamente. Era uma batida de limão, bebida famosa para acompanhar pratos pesados, como os buffets de feijoada e, neste jantar, feita para harmonizar com o próximo prato: “dadinhos” fritos de tapioca acompanhados de molho agridoce picante, uma inspiração do famoso prato do Restaurante Mocotó, em São Paulo. Os dados foram lançados e resultaram em mais uma combinação certeira: o crocante da tapioca com o doce levemente apimentado.
Pensei que como sou de Brasília, cidade que teve muita influência da cultura de pessoas que migraram, principalmente, do Nordeste e Sudeste brasileiro, iria reconhecer facilmente aqueles sabores. Mas até o prato seguinte, que aparentava ser mais comum, o feijão tropeiro, que já provei diversas vezes, foi uma surpresa. Farofa de ovos, feijão, cebola caramelizada, couve e enchidos no ponto certo foram o último sabor salgado antes da sobremesa.
No último ato, Zé disse “agora é a hora que eu vou caçar a sobremesa” e saiu de capacete e lanterna, no maior estilo MacGayver, à área externa da casa. Foi buscar flores comestíveis, que davam o toque final à sua última invenção: morangos fritos, uma mistura de sabores, texturas e camadas de morangos fritos em manteiga, iogurte natural, biscoito triturado, menta e flor amor-perfeito recém-colhida.
Toda a experiência foi tão descontraída que eu e Beatriz, nossa fotógrafa, esquecíamos por vezes o motivo pelo qual estávamos lá. Parecia que éramos apenas amigos do Zé à mesa em mais uma noite na sua casa. No Portugal meets Brasil, os dois países se encontram e conversam com o restante do mundo numa viagem gastronômica que percorre diversos quilômetros sem ao menos sair da mesa de jantar.
Texto por Matheus Miranda, futuro jurado do MasterChef
Fotografias por Beatriz Sequeira