Hoje chegou a vez do Gil se encontrar com o escritor José Luís Peixoto. As perguntas? Essas são curiosas, como sempre ;-)
O que é, para ti, uma ideia?
Uma ideia é uma visão. Para ser partilhada, precisa de ser concretizada em palavras ou em signos de qualquer código, mas as ideias começam a existir antes das palavras e dos signos. Depois, quando há palavras, as ideias habitam-nas. Então, essa visão inicial passa a ser uma espécie de paisagem, mais ou menos nítida. As palavras são janelas abertas sobre ela.
Conta-me uma história em que penses, a que regresses com frequência.
Essas histórias são sérias e muito preciosas. São o centro do que nos interessa, são o que não conseguimos ultrapassar. Há relativamente pouco tempo, descobri que não tenho de responder a todas as perguntas que me fazem. Antes, não sei porquê, achava que tinha a obrigação de o fazer. Esta descoberta singela é uma "história" a que tenho regressado com frequência nos últimos tempos, tenho desfrutado bastante dela.
O que é que gostavas de preservar?
Escrever e publicar palavras em papel é uma forma de tentar parar o tempo, de tentar preservar. Essa, no entanto, é uma ilusão. Não é possível parar o tempo. Tudo muda, tudo passa, tudo morre. Não faço estas afirmações com amargura, creio que tenho retirado o partido possível desta transitoriedade, deste efémero. A esse respeito, não tenho muitos arrependimentos. Periodicamente, por diversos meios, chego à avaliação daquilo que é mais importante para mim, que quero preservar. É nesses períodos que inicio a escrita de um livro. Então, mesmo sabendo que esses assuntos, ideias, palavras e imagens não chegarão ao fim da eternidade, anima-me a ilusão de estar a preservar alguma coisa, de estar a difundi-la, de estar a soprar-lhe um pouco mais de vida. Normalmente, tratam-se de princípios, convicções.
E qual é a tua memória mais antiga?
A primeira memória que julgo recordar é de quando tinha quatro anos. Lembro-me de pensar: "Tenho quatro anos". Sei os detalhes dessa hora e sou capaz de convocar essa sensação com alguma clareza.
Entrevista por Gil Sousa
Foto de Rita Carmo