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Entrevista a Elsa Rebelo: “Quando as pessoas percebem a arte da cerâmica, ficam fascinadas”

Até 15 de setembro, Elsa Rebelo, natural de Caldas da Rainha e ceramista desde pequena,…

Texto de Gabriel Ribeiro

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Até 15 de setembro, Elsa Rebelo, natural de Caldas da Rainha e ceramista desde pequena, expõe as suas peças de cerâmica no Museu de Olaria de Barcelos com o nome de “À Roda”. Considera que “está a dar um gosto especial expor em Barcelos, porque há uma tradição enorme do figurado com raízes muito interessantes”. A arte da cerâmica também conta histórias, e esta é um tributo às mulheres guerreiras.

“A cerâmica vai desde o pratinho de sopa até à escultura”, mas tudo pode ser motivo para escultura. Elsa Rebelo é filha de pais ceramistas e conviveu de perto com diversas artes, desde a cerâmica, olaria e pintura. Hoje, além de expor as suas peças, também trabalha na Fábrica Bordallo Pinheiro, nas Caldas da Rainha. Pelo caminho, aprendeu tudo o que sabe agora. Para a artista, “há uma pesquisa diária, quase de uma vida” para se fazer arte.

Gerador (G.) – Com que idade começou a fazer cerâmica e como surgiu na sua vida?

Elsa Rebelo (E.R.) – Sou filha de pais ceramistas e passei a minha infância na fábrica de cerâmica do meu pai e, por isso, é uma área muito familiar desde sempre. Depois, decidi ir para um centro de formação de cerâmica, onde o meu pai dava aulas de escultura, e aprendi olaria com os velhos mestres oleiros de Caldas da Rainha. Aí fiquei fascinada pelas possibilidades plásticas da olaria, embora tivesse aprendido as formas mais tradicionais. Fiz também vários cursos ligados à pintura cerâmica com vários materiais e acabei por ficar nessa escola a dar aulas durante dez anos. Foi um período muito rico de trabalho com muitos jovens. Mais tarde, em 2000, recebi um convite para ir para Fábrica Bordallo Pinheiro e continuo ligada à fábrica até hoje.

G. – Quais são as principais diferenças entre olaria e cerâmica?

E.R. – Cerâmica é algo mais vasto, é como uma disciplina onde se trabalha as argilas de diferentes naturezas. A olaria, para mim, e penso ser mesmo o termo, é toda a cerâmica feita completamente de forma manual no torno [instrumento que permite o material rodar nas mãos do artista]. É barro que precisa de ser muito bem amassado com muito esforço e, depois, é colocado na roda e, através da rotação, é aberta a peça de cerâmica que queremos.

G. – Como é que decide o objeto de cerâmica que faz?

E.R. – Por vezes, eu penso antes, mas, muitas vezes, é na altura em que estou no torno. É algo que me vem muito rápido e de forma impulsiva. Estou a trabalhar, de repente surge uma forma e, então, desconstruo e transformo noutra coisa. É uma relação muito íntima entre a matéria e o meu pensamento.

G. – Quais as maiores inspirações?

E.R. – Eu costumo dizer que todos nós somos uma mistura muito grande de muita gente que encontramos, que conhecemos e que nos marcaram de alguma forma. Eu conheci muita gente, nomeadamente amigos ceramistas do meu pai, como Ferreira da Silva, com quem privei diretamente, Herculano Elias, Armindo Reis, e tantos outros. E a arte é esta troca de conhecimentos e partilhas estéticas que vêm desde sempre, mas vêm principalmente da minha própria essência.

G. – Já expôs em muitos locais?

E.R. – Como trabalho na Bordallo, o meu tempo é limitado para a minha criatividade, mas mesmo assim tenho exposto em vários museus e tenho projetos futuros. Quero continuar ao meu ritmo porque é algo que me faz bem e tenho um retorno muito agradável das pessoas.

G. – Em que local lhe deu mais gosto expor?

E.R. – Vários. Gostei de expor em Viseu, mas em Barcelos está a dar um gosto especial porque há uma tradição enorme do figurado com raízes muito interessantes. Há também um trabalho incrível que a Câmara de Barcelos faz para promover e divulgar os nomes associados a essa tradição. E eu pensei: “Bem, vais com cerâmica contemporânea para Barcelos, que já é uma cidade de cerâmica? Vamos ver.” Mas, por incrível que pareça, tenho tido um retorno excelente, porque a minha cerâmica é muito diferente. A diferença está a fazer sucesso, e tenho tido muito bons retornos de pessoas que telefonam e se deslocam de propósito.

G. – Que tipo de coleção é que podemos encontrar atualmente no Museu da Olaria de Barcelos?

E.R. – Na exposição, eu tenho vários núcleos de peças. Em primeiro lugar, tenho um grupo que intitulo “As Guerreiras”, que são peças feitas nas rodas de oleiro. No caso de “As Guerreiras”, são bustos de mulheres que têm na cabeça outras peças que eu deformo e parto. No fundo, são guerreiras que conseguem juntar os estilhaços da vida e pô-los na cabeça para seguir em frente. Está exposto também outro núcleo chamado de “As Desatinadas”, que são jarras que têm alma. São esculturas que, por acaso, podem ser flores, mas o objetivo é intrigar o espectador. Depois, tenho “As Potomórficas”: jarras com uma cara que interagem umas com as outras. O último núcleo é composto por peças empilhadas, simples formas de olaria que atraem e juntam para formar uma escultura. De grosso modo, são estes núcleos.

G. – Há muita gente nova a pedir para aprender?

E.R. – Como estou há bastante tempo nesta área, já passei por várias fases. Houve uma fase em que toda a gente queria aprender. Depois houve uma crise enorme em que fecharam imensas fábricas de cerâmica. Acho que agora está a virar novamente, é cíclico. Estamos com orgulho de sermos portugueses e estamos a perceber o que é nosso. Acho que está a voltar o interesse.

G. – Além da cerâmica, também trabalha com olaria e pintura. O mundo da arte fascina-a?

E.R. – Este mundo da arte é a minha vida desde sempre. Na Bordallo, estou muito focada nas peças dos artistas, nas réplicas exatas, nas pinturas… Mas depois faço a ponte com os artistas e ceramistas contemporâneos que por lá passam. No meu ateliê, sou eu e as matérias. E gosto de dar asas à minha criatividade e de mergulhar dentro dos pigmentos. É uma descoberta constante, porque quando estamos a fazer ou pintar não vemos nada do que aquilo vai ser. Com a experiência, vamos ganhando mais certezas. É um diálogo muito íntimo com os materiais.

G. – Considera tratar-se de uma arte desvalorizada em Portugal?

E.R. – Considero que já foi mais desvalorizada, até porque, segundo consta, a cerâmica artística e escultural está a ter grande sucesso noutros países, como nos EUA. Aqui ainda não está nesse patamar. Precisamos de mais pessoas interessadas, nomeadamente a comunicação social, para levar essa informação às pessoas. As pessoas precisam de ser informadas e perceber o que é. Quando as pessoas percebem a arte da cerâmica, ficam fascinadas. Penso que a arte em geral é uma área que não está a ser bem divulgada pelos próprios espaços comerciais.

Entrevista por Gabriel Ribeiro
Fotografia de Elsa Rebelo

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