Liana Marchetti (Itália), Johen Maria Bustorff (Alemanha), Petra Fichtner (Alemanha) e Augusto Costa (Brasil) são os protagonistas de «Eu vim de longe», o podcast narrativo que conta o Processo Revolucionário em Curso na voz e memórias de quatro estrangeiros que estiveram e trabalharam em Portugal durante este período, cooperando na construção da democracia.
Quem são? Por que vieram? O que nos contam hoje passados quase cinquenta anos?
Um podcast da autoria da atriz, encenadora e dramaturga, Isabel Mões, que poderás ouvir a partir de dia 14 de novembro no site e Spotify do Gerador.
Episódio 1: “Já cheguei à Revolução”, de Liana Marchetti (Itália)
Liana Marchetti nasceu em 1943, em Menaggio, no Lago di Como, Itália. Em 1974, tinha 31 anos e foi acompanhando a revolução em Portugal, um país que, nessa altura, lhe era quase desconhecido, com exceção de uma ou outra referência literária e musical. Em 1975, recém divorciada, decide vir de férias para Portugal, sozinha, contrariando o seu pai, naquela que foi, também, a sua própria revolução. Acompanhava as manifestações e rapidamente conheceu pessoas, alguns estrangeiros que estavam por cá e vários portugueses. Aprende português, essa língua estranha cheia de “chs” sobretudo pela leitura do jornal Avante e acompanha o 25 de novembro. Sente o medo e a confusão quando vê alguns dos heróis de Abril serem presos. Acaba depois por se juntar à reforma agrária, trabalhando em algumas Cooperativas, como a 1º de Maio em Avis, onde ajuda na creche e em pequenos trabalhos agrícolas ao lado de outras mulheres portuguesas, e mais tarde no sul de Portugal onde dá aulas de alfabetização. Depois de vários meses abandona a reforma agrária por conta de um episódio que não foi bem visto pelas outras mulheres. Ficou a residir em Portugal, graças à Revolução.
Podes encontrar a transcrição deste episódio, aqui.
Episódio 2: “Luto e Luta”, de Jochen Maria Bustorff (Alemanha)
Jochen Maria Bustorff cresceu numa Hamburgo debaixo de cinzas no pós-guerra. Com pouco interesse em fazer carreira, abandona os estudos de pintura, arranja empregos ocasionais e viaja pelo sul da Europa. Vem pela primeira vez a Portugal em 1971, por ter uma namorada portuguesa e regressa algumas vezes ainda antes do 25 de abril. Recebe a notícia da Revolução de Abril em Hamburgo e através de uma bolsa de estudos para estudar arte popular vem para Portugal em 1975, mais concretamente para o Porto. É no Porto à porta da prisão de Custóias, numa manifestação em solidariedade com os civis e militares presos na sequência do 25 de Novembro, que morre, atingido por disparos da GNR, um manifestante alemão, o seu amigo, Gunter Bruns. Esta morte vai abalá-lo profundamente e quando descobre o diário Bruns, com os apontamentos das semanas que passou na Cooperativa Estrela Vermelha em Santiago do Cacém, resolve visitar a cooperativa e começa a interessar-se pela reforma agrária. Junta-se à Cooperativa A União Faz a Força e mais tarde à Estrela Vermelha, onde permanece dois anos, entre 1976 e 1977, realizando todo o tipo de trabalhos agrícolas e pertencendo inclusivamente, na primeira, à comissão de trabalhadores. Em 1977 é alvo de uma denúncia e procurado pela polícia, numa altura em que já está em marcha o desmembramento da reforma agrária, e deixa as Cooperativas e o Alentejo com um sabor agridoce, pois, como diz “Tinham sido os anos mais felizes da minha vida”.
Podes encontrar a transcrição deste episódio, aqui.
Episódio 3: “Mulheres”, de Petra Fichtner (Alemanha)
Chegou a Portugal pela primeira vez à boleia e de comboio com uma amiga em 1975. Petra Fichtner tinha 22 anos e vinha de Nuremberg, Alemanha. O objetivo principal desta primeira visita era recuperar o seu carro que o namorado, a trabalhar na Cooperativa Che Guevara em Alvalade do Sado, tinha trazido para Portugal. Rapidamente percebeu que o carro era um bem precioso na cooperativa porque existiam pouco meios de transporte para mercadorias. Nessa primeira visita, por duas semanas ajudou em pequenos trabalhos no campo e foi reparando nas desigualdades do trabalho feito pelas mulheres e pelos homens. Dá conta do choque entre os estrangeiros do norte da Europa e dos trabalhadores alentejanos e também das dificuldades dos mesmos pela manutenção das cooperativas e do pleno emprego. Voltou no ano seguinte, em 1976, para a cooperativa e continuou a visitar Portugal e os amigos portugueses que fez nesse tempo. Aprendeu português pela necessidade de se manter a par do que ia acontecendo e ainda hoje, apesar de reformada, continua a sua luta, sobretudo pelos direitos das mulheres.
Disponível no dia 25 de novembro
Episódio 4: “Foi um acaso ou talvez não”, de Augusto Costa (Brasil)
O estudante de teologia, Augusto Costa, vivia no estado da Bahia, no Brasil. Era marxista, mas não estava associado a nenhum partido, participando em grupos de discussão com outros estudantes católicos progressistas. O seu engajamento era sobretudo social, trabalhando em comunidades muito desfavorecidas. Por tentar expor alguns dos crimes da ditadura brasileira acabou por se ver desvinculado da proteção da Igreja e por ter de fugir de barco para a Europa pelo risco de ser preso. Primeiro para Itália, onde trabalhou alguns meses, passando por outros países e chegando a Lisboa em 1976, com o intuito de regressar de novo ao Brasil. Por um acaso, ou talvez não, acaba por conhecer uns jovens que lhe falam no trabalho nas cooperativas do Alentejo e assim parte para a Estrela Vermelha, onde a troco de trabalho tem estadia e comida. Juntou-se aos cerca de 30 estrangeiros, sobretudo alemães e dinamarqueses que ajudavam a Cooperativa naquela altura e presenciou o choque de culturas, por um lado os estrangeiros que tomavam banho nus, dormiam uns com os outros, e os portugueses que ficavam chocados com esta forma de estar. Augusto relata que foi considerado várias vezes subversivo por conversar com as mulheres sobre outras realidades familiares, sobre igualdade, sobre violência doméstica e por dar aulas de alfabetização. Chocava-o um comunismo que permitia uma relação familiar muitas vezes conservadora e abusiva. Por outro lado, sentiu-se em casa, aprendeu a gostar da vida no campo e a admirar a atitude silenciosa e contemplativa dos alentejanos. Mais tarde trabalha na cooperativa Che Guevara, de onde é expulso em 1977.
Disponível no dia 28 de novembro
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Ficha artística
Texto, dramaturgia, selecção musical e narração: Isabel Mões
Protagonistas: Augusto Costa, Jochen Maria Bustorff, Liana Marcheti e Petra Fichtner
Vozes actores: Céu Jesus, João Ferrador e Luís Miguel Nunes
Depoimentos: Ana Ascensão Batista, Francisco dos Santos, Fritzi Heuer, Renata
Nentwig e Virginia Lopes.
Extratos sonoros dos filmes DEUS PÁTRIA AUTORIDADE/BOM POVO PORTUGUÊS de Rui Simões /LEI DA TERRA do Grupo 0 (gentilmente cedidos pela Real Ficção)
Efeitos sonoros e edição: Margarida Pinto e Rui Dâmaso
Gravações em estúdio: Margarida Pinto
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