Um projeto montado a oito vozes – enérgicas e femininas –, que parte de um elo comum de ligação ao mundo da arte. Chama-se Coletivo Tarimba, nasceu no final de 2018, e pretende dar voz e visibilidade a novos artistas.
Na noite de passagem de ano, o grupo composto por oito mulheres – Carolina Pinto Basto, Clara Motta, Francisca Gigante, Gabriela Moura, Hérika Lorena, Letícia Castro Vilela, Marina Patto Caresia e Sâmia Siqueira – organizou uma primeira exposição em Lisboa, que funcionou como pontapé de saída desta nova plataforma.
Neste primeiro evento mais restrito em termos de público, Carolina Serrano, Madalena Corrêa Mendes, Mariana Martins De Oliveira e Sara Coelho foram as artistas escolhidas para uma mostra a que chamaram De fio a pavio, de uma ponta à outra.
Já este mês, no dia 24 de fevereiro, organizam a primeira edição de um ciclo de conversas – tarimba sessions #01 –, em que vão estar presentes as artistas incluídas na primeira mostra, e que irá decorrer no espaço Graal Portugal, em Lisboa. De acordo com Hérika Lorena, este evento tem a “finalidade de abordar o processo criativo das artistas e dar a conhecer quais as linhas de raciocínio que desenvolveram, num ciclo que pretende ser de partilha e de debate sobre a criação no panorama das artes”.
Pela democratização e descentralização do meio artístico
O Coletivo Tarimba assenta base em duas ideias fundamentais e que habitam como manifesto do conjunto: “somos pela democratização e descentralização da arte”. Em entrevista ao Gerador, as responsáveis explicam que, nessa linha de pensamento, pretendem, por agora, seguir um modelo de residências artísticas onde querem expor artistas, dos mais variados âmbitos, mas com pouca visibilidade no meio.
Sobre este modelo a que chamam itinerante, Francisca Gigante conta que a estrutura teve como inspiração um projeto de residências artísticas do qual fez parte em Veneza, aquando da Bienal de Arte de 2017. “Foi a primeira vez que um responsável nos cedeu um espaço para fazer uma exposição e onde acabei por fazer a minha primeira curadoria. Tínhamos liberdade total, e isso esteve na base da ideia por detrás desta plataforma”, afirma.
O grupo conheceu-se, maioritariamente, quando trabalhavam no Museu de Arte, Arquitetura e Tecnologia (MAAT), em Lisboa e, mesmo com percursos diferentes – das Belas-Artes à Comunicação, passando pelas Relações Internacionais – convergem na pulsão artística que reivindica a emergência de novos artistas como modo de atuação.
Marina Patto Caresia relata que foi em contexto de conversa que a ideia deste coletivo ganhou força: “ao conversarmos percebemos que muitos artistas, com grande potencial, não tinham possibilidades de exibir o seu trabalho porque não estavam formalmente inseridos num contexto artístico e institucional. Aí surgiu a ideia de criar uma plataforma, um lugar onde essas pessoas pudessem exibir o seu trabalho, sem a formalidade de uma galeria ou um museu. O nosso maior intuito é, por isso, o de criar uma rede que permita esse diálogo, entre público e artistas”.
Quanto ao nome escolhido, o grupo explica que a palavra “tarimba” se refere ao processo de aprendizagem pela prática, algo que rapidamente associaram à “vontade de fazer acontecer”, e de ter “estaleca” para dinamizar espaços capazes de levar arte às pessoas.
Atualmente, trabalham a partir de Lisboa, mas querem tentar explorar outros territórios, espalhados um pouco por todo o país. Mesmo não tendo encontrado ainda um espaço mais fixo de trabalho, o coletivo vai continuar a expandir-se através de um modelo itinerante, e, naturalmente, aberto aos convites que possam surgir.
Uma open call para artistas emergentes
Ao mesmo tempo, o grupo lançou também um repto público. Num formato de open call, o Coletivo Tarimba pretende receber, até ao dia 28 de fevereiro, portefólios de artistas que estejam interessados em expor numa das suas residências. “Servirá como uma base de dados para as primeiras exposições que queremos fazer”, realça Clara Motta, antevendo uma nova exposição, que deverá acontecer já no mês de março.
Sobre este processo, Hérika Lorena refere que até agora o coletivo já recebeu “mais de trinta candidaturas, onde se incluem portefólios de artistas cotados no programa Rumos do Itaú Cultural e que tem muita fama no Brasil”.
Além deste planeamento, o grupo tem também conversado com curadores e festivais para estudar a possibilidade de se criarem futuras parcerias. Francisca Gigante sublinha que a ideia, para os próximos tempos, “é dialogar com pessoas que não conhecemos mas que nos conquistam pelo seu trabalho, sejam artistas, curadores ou outro tipo de pessoas interessadas no universo das artes”.
Criar mais acessos ao mundo da arte
No documento em que explicam as motivações que levaram à criação do Coletivo Tarimba, pode ler-se que o grupo pretende preencher uma lacuna que existe no “acesso à arte contemporânea” e na dinamização de espaços que promovam “o encontro entre jovens artistas, curadores, entusiastas e colecionadores”.
Para Hérika Lorena, museóloga de formação, este conjunto de ideias explica o porquê da arte ter o dever de funcionar como um meio que aproxime as pessoas. "Sendo brasileira, imigrante em Portugal, a minha experiência de museu leva-me a pensar em espaços que tenham essa intrínseca característica de dar a conhecer mundos”.
A ideia é corroborada por Marina Patto Caresia, observando o atual panorama mundial. “No momento em que vivemos, conturbado político e economicamente, falta muitas vezes a experiência de podermos ter a vivência do outro”. E nesse sentido “é necessário criar espaços para a reflexão, sobre arte e sobre viver em comunidade”, acrescenta ainda Clara Motta.
No fim de contas, o percurso a trilhar estará de longe de ser o mais fácil, mas é nesse mesmo desafio que o grupo encontra a grande virtude do seu projeto. Para já, este coletivo continuará a expor publicamente o trabalho dos artistas que vão conhecendo. O mote, esse, mantém-se igual desde o princípio: “aprender fazendo”.