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Acesso Cultura: dez anos a ultrapassar barreiras

A associação cultural sem fins lucrativos promove um acesso pleno à participação cultural, tentando ultrapassar e colmatar quaisquer barreiras físicas, sociais e intelectuais que possam pôr em causa esse acesso. Apesar do caminho já trilhado durante estes dez anos na promoção de uma sociedade cada vez mais inclusiva e consciente, a associação não esquece os desafios ainda existentes.

Texto de Débora Cruz

Fotografia cortesia da Acesso Cultura

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Criatividade, Curiosidade, Independência, Influência, Justiça Social, Liberdade e Transparência são os valores que pautam a Acesso Cultura. Desde 2013 que a associação tem realizado consultorias, estudos, sessões de capacitação, seminários e muitas outras iniciativas. Através delas, a Acesso Cultura tem vindo a promover o acesso físico, social e intelectual à participação cultural. O caminho em direção a uma “sociedade curiosa e inclusiva, na qual qualquer pessoa possa sonhar, ter oportunidades para participar e ser o melhor que puder” é a visão delineada para o futuro, lê-se no site.

O direito de acesso à cultura surge consagrado na Constituição da República Portuguesa, no seu artigo 73.º: “O Estado promove a democratização da cultura, incentivando e assegurando o acesso de todos os cidadãos à fruição e criação cultural, em colaboração com os órgãos de comunicação social, as associações e fundações de fins culturais, as coletividades de cultura e recreio, as associações de defesa do património cultural, as organizações de moradores e outros agentes culturais”. O incumprimento deste direito é a razão de existência da Acesso Cultura.

Participação cultural: participação em qualquer atividade que represente uma forma de uma pessoa aumentar a sua capacidade e capital cultural e informacional, o que ajuda a definir a sua identidade e/ou permite a expressão pessoal. Essas atividades podem assumir várias formas, tanto ativas (como trabalhar no setor cultural ou ser voluntário numa organização cultural) como passivas (como assistir a um filme). Podem ocorrer por meio de uma variedade de canais formais ou informais, incluindo a Internet (com base na definição da UNESCO, 2012).

Definição de "Participação Cultural" apresentada no site da Acesso Cultura

Fomentar o diálogo sobre a inclusão e o acesso e contribuir para a preparação técnica dos profissionais da cultura de forma a promover a mudança no terreno são alguns dos principais objetivos da associação. É esse um dos propósitos das múltiplas sessões de capacitação organizadas pela Acesso Cultura: “dotar os profissionais do setor cultural com conhecimentos que lhes permitam promover a acessibilidade física, social e intelectual nas suas instituições ou projetos”, escrevem no site. Em comunicado, a associação cultural destaca a importância de “criar uma massa crítica considerável, que questiona intenções e práticas, cada vez mais consciente da necessidade de conhecer e defender os direitos culturais de qualquer pessoa”. 

Nestes últimos dez anos, a associação introduziu, em Portugal, as Sessões Descontraídas. No site, explicam que estas correspondem a sessões de teatro, dança, cinema ou outro tipo de oferta cultural numa atmosfera mais descontraída e acolhedora e com regras mais tolerantes no que diz respeito ao movimento e ao barulho na plateia/sala. As sessões destinam-se a todos os indivíduos, famílias e grupos em geral que preferem ou beneficiam de um ambiente mais descontraído (pessoas com défice de atenção, pessoas com deficiência intelectual, pessoas com condições do espectro autista, pessoas com deficiências sensoriais ou de comunicação, etc).

A Acesso Cultura criou e faz a gestão, com o apoio da Fundação Millennium BCP, do website Cultura Acessível (2018), plataforma que divulga uma programação cultural acessível. Publicou o manual A participação cultural das pessoas com deficiência ou incapacidade: como criar um plano de acessibilidade (2020), uma encomenda da Câmara Municipal de Lisboa/Polo Cultural Gaivotas|Boavista. Criou a Rede de Teatros com Programação Acessível (2021), com o apoio do BPI/Fundação La Caixa, que apresenta uma oferta regular de espetáculos com audiodescrição e com interpretação em Língua Gestual Portuguesa. Mais recentemente, divulgou o curso de formação de audiodescritores (2022), que contou com o apoio das Direções Regionais de Cultura do Norte, Algarve e Madeira, das Câmaras Municipais do Funchal e do Porto e do El Corte Inglés.

Embora a Acesso Cultura considere que, ao longo dos seus dez anos, o “acesso e a inclusão passaram a fazer parte natural do discurso dos profissionais do setor cultural”, realça também que a distância compreendida entre a teoria e a prática é ainda muito longa. “Um país que pretende ter uma democracia de qualidade e que entende a importância do saber cuidar, da felicidade e do bem-estar para a construção desta democracia”, escrevem, “não se pode dar ao luxo de excluir”.

Apesar da sua fundação, em 2013, a Acesso Cultura é o resultado do trabalho desenvolvido pelo GAM – Grupo para a Acessibilidade nos Museus. Criado em 2003, o GAM era um grupo informal de trabalho que reunia membros institucionais e individuais, museus e profissionais de museus e que procurava colocar as questões de acessibilidade no centro das preocupações e da reflexão dos museus portugueses. 

Maria Vlachou, atual diretora executiva da Acesso Cultura e um dos membros fundadores do GAM e da associação sem fins lucrativos, explica ao Gerador que “rapidamente se percebeu que a acessibilidade não dizia apenas respeito aos museus e, assim, se criou a Acesso Cultura para trabalhar com todo o setor cultural”. É em junho de 2013 que é feita a transição, e o GAM dá lugar à associação cultural.

Uma visão integrada da acessibilidade

Foi em 2014 que Rita Pires dos Santos, atual presidente da direção da Acesso Cultura, se inscreveu numa das formações organizadas pela associação. “Já tinha conhecimento do GAM, mas muito por alto”, explica, “e, em 2014, fui fazer a formação da Acessibilidade Integrada, que é o cerne da Acesso Cultura: esta noção da acessibilidade física, social e intelectual”. A presidente confessa que a experiência a motivou a querer conhecer mais e lhe permitiu perceber as “diferentes camadas relacionadas com as várias perspetivas de acessibilidade que existem”, indica, “e não apenas aquelas que conhecemos porque fazem parte do nosso dia-a-dia ou trabalho”.

A Acesso Cultura entende a acessibilidade como uma área transversal a toda a atividade das instituições culturais. Desta forma, a associação trabalha no sentido de ultrapassar quaisquer barreiras físicas, intelectuais ou sociais que possam impedir ou dificultar um acesso pleno à participação cultural. “Acreditamos que existe uma necessidade cada vez maior de partilhar com os profissionais da cultura e com as suas tutelas este conceito alargado de acessibilidade”, escrevem no site

Barreiras físicas: Obstáculos naturais ou artificiais (estruturais) que impedem a aproximação, transferência ou circulação no espaço, mobiliário ou equipamento urbano de pessoas com mobilidade condicionada.

Barreiras intelectuais: Barreiras que impeçam ou dificultem a participação cultural de pessoas que: têm baixa literacia; não possuem conhecimento técnico e/ou científico especializado; têm deficiências ou incapacidades sensoriais – por exemplo, pessoas com deficiência visual, pessoas S/surdas, pessoas com deficiência intelectual, pessoas neurodivergentes; pessoas cuja primeira língua não é o português; entre outras.

Barreiras sociais: situações sociais que possam constituir motivo de dificuldade no acesso à participação cultural. Por exemplo: nível de escolaridade, iliteracia, desemprego, proveniência étnico-racial, deficiência, isolamento social, escassez de oferta cultural na zona onde uma pessoa reside, isolamento geográfico, baixos rendimentos, cumprimento de pena judicial; entre outros.

Definições dos diferentes tipos de barreiras combatidas pela Acesso Cultura, apresentadas no site da associação

Para Rita Pires dos Santos, privar alguém de um acesso pleno à cultura é sinónimo de “privar as pessoas de algo que as tornaria, provavelmente, mais completas”. Maria Vlachou acrescenta: “mais completas e mais felizes”. A diretora executiva assevera que “quando não criamos, enquanto sociedade, as condições para que todas as pessoas possam participar na cultura, na política ou na educação, temos de perceber que perdemos todos”.

Norberto Sousa é consultor de acessibilidade web e digital e colabora com a Acesso Cultura desde 2013. “Sempre tive muito interesse pela tecnologia, mas aconteceu mais quando eu perdi a visão, não completamente, mas em parte”, explica, “tinha 18 anos e quando comecei a usar o computador com um leitor de ecrã, comecei a encontrar barreiras para realizar tarefas normalíssimas”. As dificuldades encontradas incentivaram-no a investigar sobre acessibilidade e a sugerir, de forma amadora, melhorias às entidades onde ia encontrando essas barreiras.

O consultor acredita que existe ainda um entendimento reduzido sobre a acessibilidade. “As pessoas não têm um contacto tão grande quanto isso com a questão das incapacidades”, reitera, “e é comum associar logo a acessibilidade apenas a uma questão física”. Norberto Sousa é o responsável pela sessão de capacitação Websites e documentos digitais acessíveis, organizada pela Acesso Cultura, e destaca a importância de ter websites que proporcionem a todos uma navegação confortável. “Esta questão da acessibilidade não é só para pessoas com deficiência, a acessibilidade melhora a utilização e a navegação de todas as pessoas”, frisa.

Norberto Sousa relembra que os websites são a principal porta de entrada para as instituições, empresas e projetos, pelo que o papel das entidades nestes processos é de grande importância. “Uma das coisas que as entidades também têm de ter em atenção é o facto de que a acessibilidade já não é uma obrigação por responsabilidade social, nem tem que ser o cumprimento de um decreto-lei”, assevera, “é mais do que isso, é também prestar um serviço a um cliente”.

Os desafios: uma "questão de mentalidade"

No comunicado de imprensa que assinala os dez anos da Acesso Cultura, a associação recorda que os progressos registados não erradicam o trabalho que ainda está por fazer. “Ao mesmo tempo que celebramos os pequenos passos dados para a melhoria das condições de acesso, não perdemos a consciência do muito que há por fazer”, escrevem. 

A diretora executiva da associação destaca que existem cada vez mais pessoas na área da cultura, em Portugal, a discutir estas questões. Ainda assim, reitera que entre a teoria e a prática persiste uma grande distância. “Há cada vez mais pessoas que nos dizem que seria impossível iniciar um projeto e não pensar nestas questões”, conta, “o que não é mainstream é a prática, mas temos muitos colegas no terreno que trabalham para fazer isso mesmo”.

Apesar da existência de vários desafios, para Maria Vlachou e Rita Pires dos Santos, a questão da mentalidade é a que mais dificulta o aproximar entre a teoria e a aplicação prática. "A primeira barreira é a forma como pensamos, a visão que temos das coisas”, defende a diretora. “A prioridade é trabalharmos a nossa mentalidade para olhar para o que fazemos e para o mundo de uma outra forma”, acrescenta.

Maria Vlachou conta que ainda estão muito presentes as atitudes que consideram a acessibilidade como um favor que é feito às pessoas. “Nós vemos isso em vários contactos todos os dias: fazemos o mínimo que podemos e sentimos que já é muito e que as pessoas poderiam estar agradecidas”, atesta, “não olhamos para esta questão como um direito que as pessoas têm e, por isso, uma obrigação nossa”.

A diretora enfatiza também a importância de “não ficarmos muito satisfeitos com melhorias cosméticas que são apenas pontuais”, como o caso da celebração do Dia Internacional da Pessoa com Deficiência. “Acho que um dos desafios é levarmos as coisas mais a sério e perceber o que é que significa mesmo, na prática, construir um mundo mais inclusivo e acessível”, reitera.

Rita Pires dos Santos considera ainda que é necessário reforçar o sentido de unidade entre os profissionais e as instituições do setor cultural. A presidente lamenta a falta de comunicação que, por vezes, impede a partilha de experiências e a interajuda. “Se as instituições tivessem esta capacidade de falar umas com as outras, não teríamos tanto esta sensação de que estamos sempre a começar do zero”, explica, “temos um país tão pequenino, que às vezes podemos ter um colega a poucos quilómetros de distância que já está a fazer algo”.

A assimetria regional é também apontada como um dos grandes desafios. “Pessoas que não vivem nas grandes cidades, realmente não vêm o seu direito à participação cultural respeitado”, explica Maria Vlachou, “não têm grandes oportunidades de ver coisas, de fazer coisas, de participar”. A diretora menciona que a falta de uma boa rede de transportes públicos condiciona de forma significativa a participação cultural e o trabalho desenvolvido por profissionais do setor. “Isto é um desafio, até porque colegas que trabalham na área da cultura e que optam por trabalhar noutras áreas do país e não nas grandes cidades, têm enormes dificuldades em fazer o seu trabalho”, atesta.

Lara Seixo Rodrigues é curadora de arte e a diretora e fundadora da Mistaker Maker, uma plataforma de intervenção artística que fomenta a produção e a promoção de exercícios e projetos de Arte Contemporânea. A curadora é também associada da Acesso Cultura e nutre um interesse particular pela acessibilidade social. “[O interesse adveio] do facto de eu ser da Covilhã e de ter crescido num território onde não havia uma oferta diversificada a nível cultural, nem sequer em número”, explica, “logo aí tu percebes o que é o acesso ou o não acesso e as dificuldades e barreiras que existem”.

A curadora conta que o panorama tem vindo a melhorar, mas a oferta cultural diversificada continua a ser um problema. “Pleno acesso é poderes escolher o que quiseres, não é só uma questão de teres acesso às quatro [atividades] que te programam mensalmente”, defende, “em muitos territórios no nosso país tu não tens direito de escolha”. “Podes ter acesso, mas tens de te limitar àquilo que te estão a apresentar, que não é assim tão variado”, reitera, “portanto, não podemos dizer que existe um acesso pleno”.

Debate organizado pela Acesso Cultura, em Castelo Branco. Fotografia cortesia da Acesso Cultura

“A primeira barreira é a interna”: o papel dos decisores

A presença de pessoas que trabalham no setor cultural em debates, conferências e sessões de capacitação promovidas pela Acesso Cultura é cada vez mais assídua. Ainda assim, muitos dos profissionais que procuram envolver-se e obter informações, encontram barreiras quando regressam aos seus locais de trabalho. “Nas conferências e nos debates, raramente temos pessoas com poder de decisão e, por isso, repetidamente, quem participa diz: 'Era o meu chefe que deveria estar aqui hoje’”, declara Maria Vlachou, “muitas vezes, as pessoas regressam aos seus locais de trabalho e a primeira barreira [à promoção de mudança] é a barreira interna”.

A diretora executiva revela que, em dez anos, só em 2022 a Acesso Cultura contou com a presença de um diretor de um grande museu numa das suas formações. “Faz muita falta esta reflexão e formação”, argumenta, “parece que as pessoas que depois regressam ao seu local de trabalho são as únicas responsáveis [por promover mudanças] e, mesmo assim, sem ter poder de decisão”.

Maria Vlachou alerta, contudo, para a responsabilidade de todos nestes processos, sugerindo que é frequente as entidades culturais convocarem a presença de decisores políticos já numa fase final da implementação de medidas ou da preparação de atividades. “Muitas vezes, quando convidamos o ministro, convidamos para inaugurar ou fechar e ficamos contentes com isso”, critica, “ambos os lados têm responsabilidade de dizer: 'isto não é suficiente’”.

Referindo-se aos decisores políticos e criticando a desadequação da Estratégia Nacional de Promoção da Acessibilidade e Inclusão dos Museus, Monumentos e Palácios 2021-2025 à realidade, Rita Pires dos Santos salienta que a falta de comunicação e de consideração por diferentes perspetivas e experiências dificultam a adequação dos planos à realidade. “[É preciso] pensar as estratégias desde o início com as pessoas que estão no terreno, com as pessoas a quem se dirige”, defende, “senão também estamos sempre a cair naquele erro de decidirmos apenas o que nós achamos que é bom e vamos levar às pessoas somente a nossa forma de pensar sobre o que é cultura e o que é a participação cultural”.

Maria Vlachou identifica o plano australiano, Revive: a place for every story, a story for every place, e o inglês, Let’s Create, como boas estratégias culturais. “Ambas se basearam na auscultação dos cidadãos comuns, porque todos temos algo a dizer sobre a cultura e a participação cultural”, declara, “não são apenas algumas mentes brilhantes, conhecedoras, que decidem e que criam estratégias”.

Para além das falhas na auscultação do público e dos profissionais que trabalham no terreno, a distância entre as medidas e estratégias publicadas e a sua respetiva implementação também se afiguram um problema. Maria Vlachou fala na pouca preocupação que é tida com a aplicação das medidas que são adotadas e que, mesmo assim, tendem a revelar um entendimento do que é a cultura e a participação cultural “muito reduzido”.

O impacto da Acesso Cultura

Ao longo destes dez anos, várias pessoas que acompanham o trabalho e que participam nas atividades organizadas pela Acesso Cultura têm partilhado, através das fichas de avaliação das diferentes iniciativas, o impacto destas experiências nas suas vidas. A maior parte dos testemunhos são anónimos: “O mais interessante foi constatar o quão distante estava das diferentes realidades e o quanto tudo mexeu comigo”; “Sinto que aprendi e que vim com a bagagem bem mais cheia”; “[Fez-me] perceber que às vezes é nas pequenas coisas que quebramos as maiores barreiras”.

Em dez anos, foram múltiplas as atividades e iniciativas que marcaram a ação da Acesso Cultura. Destaca-se, entre outros, a atribuição, desde 2014, dos Prémios Acesso Cultura, que pretendem “dar maior visibilidade a profissionais e entidades que se diferenciam pelo desenvolvimento de políticas exemplares e de boas práticas na promoção da melhoria das condições de acesso” à participação cultural, em Portugal, que tem contribuído para a valorização e promoção deste tipo de iniciativas.

A associação escreve que, em dez anos, apesar do trabalho que ainda está por concretizar e da lentidão que caracteriza a mudança, existe uma “família”, que envolve colegas, organizações culturais, parceiros públicos e privados, que “está a crescer todos os dias”. O trabalho que realizam é movido pela hipótese de “poder ver que qualquer pessoa neste país, independentemente de onde vem e onde vive, possa ser o melhor que puder”, escrevem no comunicado.

Lara Seixo Rodrigues acredita que uma das aprendizagens mais significativas que adquiriu através da Acesso Cultura foi a necessidade de questionar de forma constante o trabalho que desenvolve enquanto profissional do setor cultural. “[A Acesso Cultura] ensina-nos um novo modo de olhar para coisas que, muitas vezes, nós já tínhamos assumido que sabíamos”, refere a curadora, “na verdade, não sabemos, e [a Acesso Cultura] obriga-nos a questionar cada vez mais o que fazemos e mostra-nos que há sempre coisas a mudar”.

André Murraças é encenador e dramaturgo e no seu trabalho utiliza referências da história queer e LGBT portuguesas. A sua colaboração com a Acesso Cultura começou em meados de 2018, com um seminário inserido nos Seminários “Diversidade e Inclusão”, e que pretende realçar a importância da história não contada e o impacto de objetos artísticos como portas de entrada e saída do universo queer português.

O encenador avalia de forma positiva as reações e o impacto dos seminários nos participantes. “Há sempre pessoas que ficam a pensar no que foi mostrado”, conta. “É um bom ponto de encontro para trocarmos informação uns com os outros e para quem está a receber este seminário, ficar com mais ferramentas e mais informações para usar depois na sua vida e trabalho”, acrescenta o dramaturgo.

Conferência sobre Património LGBT. Fotografia cortesia da Acesso Cultura

Norberto Sousa destaca a importância que o Prémio Acesso Cultura, atribuído desde 2014, tem tido para promover a vontade dos profissionais do setor de tornar os espaços e os projetos culturais mais acessíveis e reconhece o papel da associação no crescente interesse que se tem verificado pelas questões da acessibilidade. “Acho que tem havido esta vontade das pessoas, por um lado, se tornarem associados, porque veem que o trabalho tem sido efetivo”, conta, “e noto que tem havido uma maior oferta de serviços derivada da intervenção da associação”.

Ao pensar sobre possíveis momentos que reflitam o resultado indireto da ação da Acesso Cultura, surgem a Maria Vlachou, rapidamente, vários episódios. O mais recente ocorreu quando assistiu ao espetáculo Uma Ideia de Justiça, com o texto de Isabel Minhós Martins e a direção de Joana Providência. Era um espetáculo interpretado em português e em língua gestual portuguesa e, no dia em que assistiu, a peça tinha audiodescrição e inseria-se numa sessão descontraída. “No final, quando houve uma conversa breve com o público, a senhora imediatamente atrás de mim disse: 'Uma ideia de justiça é eu que sou cega, poder vir assistir a este espetáculo com a minha filha que vê’”, conta.

Maria Vlachou explica que é esse o objetivo: “sentir que estamos todos juntos, que temos os nossos direitos respeitados e que podemos participar no que quisermos, para fazer o que quisermos, para sermos o que quisermos”. Também Rita Pires dos Santos se recorda de um episódio específico: o debate Representatividade no cinema: personagens e artistas com deficiência e surdos no cinema português, co-organizado pela mostra de cinema AMPLA, em fevereiro, e que lançou pistas sobre o futuro da Acesso Cultura.

“Foi um debate em que as pessoas que estavam a debater e a moderar, assim como os convidados, eram as pessoas certas para estar naquele sítio”, explica a presidente. “Nós, Acesso Cultura, estávamos no sítio onde tínhamos de estar: na plateia, eram eles que tinham o palco”, continua, “acho que é para lá que deveríamos caminhar”.

Debate Representatividade no cinema: personagens e artistas com deficiência e surdos no cinema português. Fotografia cortesia da Acesso Cultura

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