Num mundo onde as fronteiras entre o virtual e o tangível se desvanecem, encontro-me enredado na teia da conectividade perpétua. Como alguém diariamente envolvido no mundo das redes sociais, por questões profissionais e geracionais, a minha existência digital tornou-se inseparável da minha realidade física. É no cenário sempre mutável das redes sociais que me deparo com as complexidades da presença online constante e debato-me com os desafios que ela coloca à minha vida pessoal e profissional.
A natureza da minha profissão exige uma relação íntima com o espaço digital — estar a par da inovação de ferramentas, das tendências e novas personalidades. As redes sociais, que surgiram como meios de conexão e de lazer, transformaram-se numa espada de dois gumes. Por um lado, facilitam a comunicação descomplicada e permitem-me manter contato com amigos espalhados pelo mundo. Por outro lado, atraem-me para uma espiral de disponibilidade constante, esbatendo as fronteiras entre trabalho e vida pessoal. No mesmo aparelho e rede social, mantenho conversas pessoais, informo-me sobre acontecimentos do dia, pesquiso para fins profissionais e faço uma curadoria do que exponho da minha vida.
A conexão constante é tanto uma bênção como uma maldição. Como profissional no domínio digital, a minha presença virtual não apenas é encorajada, mas esperada. A necessidade de estar sempre online afeta todos os aspectos da minha vida, deixando-me ligado a um ecrã que nunca dorme e mal me deixa dormir. Mesmo com as notificações desligadas, exige a minha atenção a todas as horas e sublinha a dificuldade de me desligar do mundo online.
Enquanto as redes sociais funcionam como uma ponte que me liga a amigos, a conectividade constante tem um impacto negativo na minha saúde mental. A pressão para estar sempre disponível e atualizado cria uma sensação de vigilância perpétua sobre o mundo. Sinto-me preso num ciclo de gratificação instantânea através de gestos insignificantes online, muitas vezes à custa de interações significativas offline.
A paradoxal situação de estar cronicamente online torna-se evidente quando as expectativas que defino para mim mesmo colidem com a realidade da disponibilidade dos outros. Num mundo onde todos estão a um clique de distância, a suposição de que os outros partilham o mesmo nível de acessibilidade pode levar à desilusão e frustração. A gestão da dissonância entre a minha disponibilidade e as expectativas à disponibilidade dos outros exige uma constante recalibração.
O que me mantém ligado ao mundo online também me expõe aos perigos da sobrecarga de informação. A incessante corrente de conteúdo, opiniões e atualizações inunda a minha consciência, tornando difícil discernir entre o significativo e o insignificante. A avalanche de informações torna-se uma faca de dois bicos, ampliando os meus horizontes enquanto o polui com ruído digital. Por muito sofisticados que sejam os algoritmos que fazem a curadoria do que surge na minha tela, falta à inteligência artificial a sensibilidade emocional de saber o que colocar, quando e em que ordem. Dou por mim a passar de um vídeo que me faz rir às gargalhadas para outro vídeo explícito do homicídio de uma criança palestina. É um desafio constante às minhas emoções, que temo terminarem na dessensibilização total.
O mundo digital oferece um espaço único para a auto expressão e exploração, onde expomos a nossa identidade, partilhando fragmentos da vida, pensamentos e experiências a uma audiência potencialmente global. No entanto, esta audiência também pode exigir-nos posicionamentos sobre matérias que não estamos devidamente informados. Há uma pressão incessante aos utilizadores, especialmente sobre figuras públicas, para que se pronunciem sobre questões que estão fora do seu domínio. Citando Kanye West, um exemplo duvidoso de comportamento nas redes sociais, “I like some of the [Lady] Gaga songs. What the fuck does she knows about cameras?”. A validação na forma de gostos, comentários e partilhas pode transformar esta ferramenta criativa num campo de batalha pela autoestima, onde a busca por afirmação entra em choque com o valor da expressão pessoal.
Em conclusão, estar cronicamente online é uma jornada complexa de gestão de expectativas e autodescoberta. Ao navegar no digital, há que se ter em conta a necessidade de encontrar um equilíbrio entre as vantagens da conexão constante e os perigos da disponibilidade perpétua. Encontrar conforto em ocasionais períodos de desintoxicação digital, fomentar conexões offline genuínas e redefinir os limites do envolvimento virtual tornam-se essenciais para preservar a minha sanidade.
-Sobre Airton Cesar Monteiro-
Airton Cesar Monteiro é imigrante cabo-verdiano, licenciado em Relações Internacionais (não praticante) e convicto agitador social. Dedicado a escrever sobre mudanças sociais, cultura e o que mais lhe apetecer.