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Direito de resposta

Publicação do direito de resposta enviado pelo Movimento dos Trabalhadorx do Sexo à reportagem “Lenocínio simples: exploração ou autodeterminação?”, publicada no Gerador a 12 de fevereiro de 2024

Texto de Redação

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Ao abrigo do direito de resposta, conforme os artigos 24.º a 27.º da Lei de Imprensa (LI), e sem prejuízo da divulgação pública integral deste Direito de Resposta através dos nossos meios próprios, vem o Movimento dxs Trabalhadorxs do Sexo exercer o seu Direito de Resposta, solicitando a retificação (ou, em alternativa, a publicação integral deste Direito de Resposta) do vosso artigo intitulado “Lenocínio Simples: Exploração ou Autodeterminação”, da autoria de Sofia Craveiro, publicado a 12 de Fevereiro de 2024 na vossa página https://gerador.eu/ , concretamente no enlace https://gerador.eu/lenocinio-simples-exploracao-ou-autodeterminacao/

Assim, nos parágrafos 7º e 9º do referido artigo, lê-se (sublinhado nosso):

No início de maio de 2023, foi noticiado que quatro dos 13 juízes do Tribunal Constitucional, entre eles o novo vice-presidente, puseram em causa a associação entre proxenetismo e violação de liberdade sexual que é feita na lei. (…)

A notícia desencadeou reações antagónicas: o Movimento dos Trabalhadores do Sexo, que defende a legalização da atividade e a despenalização do lenocínio simples aplaudiu. A Plataforma pelos Direitos das Mulheres e O Ninho, que defendem a abolição, repudiaram.”

Enquanto no 15º parágrafo do mesmo artigo, se lê (sublinhados nossos):

O Movimento dos Trabalhadores do Sexo (MTS), fundado em 2018 por pessoas que efetivamente “fazem o trabalho”, afirma, por exemplo, que a definição de regras desse género seria quase um regresso ao tempo da ditadura. Negam a viabilidade dos exames médicos e pedem apenas que a profissão seja reconhecida e equiparada a todas as outras. Defendem a legalização e não a regulamentação do trabalho sexual. Por rejeitarem perentoriamente a narrativa de vitimização veiculada pelos abolicionistas, reclamam, também, a despenalização do lenocínio simples. Apesar das solicitações, o coletivo rejeitou participar nesta reportagem, pois considera que o reconhecimento da profissão não devia sequer ser um debate. Apesar disso, o MTS concedeu uma entrevista ao Gerador, na qual explicita a sua posição.

1 - Como é facilmente verificável logo na terceira linha da introdução à entrevista acima mencionada, concedida ao Gerador pela nossa ativista Melina Antunes e publicada por vós a 12 de junho de 2023 no enlace https://gerador.eu/movimento-dos-trabalhadores-do-sexo-estamos-todos-sob-coacao-do-capitalismo/ , e ao contrário do que é afirmado no artigo que contestamos, o MTS não defende a “legalização” do trabalho sexual, mas sim “a total descriminalização e reconhecimento do trabalho sexual”.

No próprio corpo da entrevista, a ativista do MTS reafirma por duas vezes que o MTS defende um modelo de descriminalização (ou “despenalização”) do trabalho sexual. Assim, em resposta à 10ª pergunta do GERADOR, sobre se o MTS defende um modelo de “regulamentação”, Melina Antunes responde: “Nós defendemos a despenalização. (…)”. Mais abaixo, em resposta à 13ª interpelação do GERADOR (“Então, acham que haver regulamentação também não é solução.”), a ativista insiste: “Não. [A solução é] a despenalização. (…)

Efetivamente, os modelos de enquadramento legal conhecidos como de “legalização” ou de “regulamentação” são modelos repressivos que tentam diferenciar, definir e regulamentar de maneira limitativa formas legalmente legitimadas de exercício do trabalho sexual, em detrimento de outras não enquadradas nesses regimes (que assim são mantidas ilegais), e que apenas reconhecem uma minoria dxs trabalhadorxs do sexo enquadráveis nesses parâmetros (por exemplo, admitem o trabalho sexual exercido no interior de apartamentos enquanto proíbem o que é exercido em contexto de rua; ou reconhecem apenas xs profissionais do sexo nacionais, excluindo as pessoas migrantes não nacionalizadas; ou reconhecem o trabalho sexual por conta própria e não o que é exercido para terceiros). O melhor exemplo da tradução sempre repressiva deste tipo de modelos é o caso alemão, baseado numa política de deportações em massa de trabalhadorxs migrantes e que apenas reconhece como legais determinados contextos de exercício do trabalho sexual.

Tais modelos nada têm que ver com o modelo que defendemos, de descriminalização (ou despenalização), e que consiste na descriminalização total do trabalho sexual, quer seja exercido em regime autónomo ou trabalhando para terceiros e independentemente do contexto de exercício (apartamentos, rua, estabelecimentos, online…), isto é, na eliminação de todas as atuais barreiras ao seu livre exercício (por exemplo, a penalização do lenocínio simples) e a inclusão plena do trabalho sexual no direito laboral vigente, sem imposição de determinadas formas e contextos de exercício por oposição a outras que não são legalmente reconhecidas, e sem exclusão de partes dxs trabalhadorxs do sexo, permitindo que quem exerce trabalho sexual possa escolher livremente os modos e os contextos em que pretende, ou em que pode, trabalhar de forma mais segura.

Acresce que, formalmente, a prostituição (infelizmente os legisladores ainda não apreenderam o conceito mais amplo de trabalho sexual e legislaram apenas esta atividade particular) é legal em Portugal, pelo que - mesmo sabendo que a criminalização do lenocínio simples e a sua definição extremamente vaga no Código Penal acabam por criminalizar todas as suas formas e contextos de exercício – menos sentido faz ainda falar de “legalização” no contexto português. Finalmente, qualquer consulta às páginas de Facebook e de Instagram do MTS, aos documentos que emitimos publicamente, ou ainda às múltiplas entrevistas e reportagens ou debates (que se encontram online) em que vimos participando desde 2018, revela que o MTS vem constantemente diferenciando o modelo de “legalização”, que consideramos errado, do modelo de descriminalização que defendemos.

2 – É inteiramente falso que, como afirmado no artigo, o MTS tenha recusado a sua participação na reportagem por considerar “que o reconhecimento da profissão não deveria ser sequer um debate”. Embora, naturalmente, essa seja uma posição do movimento, uma vez que se trata da nossa realidade laboral, esta não pode ser apresentada como sendo a nossa justificação para a recusa de participação na reportagem – seria, aliás, bastante estranho que o fosse uma vez que o MTS se vem pronunciando publicamente sobre o tema, aceitando assim participar nesse debate público. O verdadeiro motivo da nossa recusa é bastante claro na troca de mensagens de email entre a autora do artigo, Sofia Craveiro, e a equipa do MTS, que passamos a citar:

“De: Sofia <sofia.craveiro@gerador.eu>11/05/2023, 18:52
para MOVIMENTOTS

Olá Maria,  No seguimento da nossa conversa telefónica, venho acrescentar algumas informações sobre o meu trabalho. (…) Conforme tinha referido, pretendo fazer-vos algumas questões sobre a regulamentação - assim é que é - da prostituição em Portugal e a despenalização do lenocínio. Vou ouvir testemunhos contra e a favor, sendo as vossas declarações integradas depois numa reportagem abrangente. (…)”

-----  
De: Movimento dxs trabalhadores do sexo MTS <movimentots@gmail.com>
12/05/2023, 15:43
para Sofia

Olá Sofia, Obrigada pelo contacto com a nossa associação. De momento a posição do MTS é a de não entrar em debates, palestras, entrevistas que apresentem também a visão abolicionista. Infelizmente as nossas palavras são sempre distorcidas e descontextualizadas. Quando em debates somos constantemente interrompidos e desrespeitados.  Se no futuro quiserem falar connosco sem ter de ser um 'prós e contras' com pessoas que nunca fizeram o nosso trabalho, estaremos disponíveis. A equipa do MTS.”  
   

Fica, assim, claro que a recusa do MTS foi justificada com a intenção do Gerador de dar voz, na mesma reportagem, a organizações de caráter abolicionista, compostas e dirigidas por pessoas que não são, nem nunca foram, trabalhadorxs do sexo e que não sofrem na pele as consequências dos regimes legais sobre trabalho sexual, organizações que insistem em silenciar e substituir-se às vozes próprias dxs trabalhadorxs do sexo, assim como insistem na amálgama abusiva entre o trabalho sexual e crimes como o tráfico de seres humanos ou a exploração sexual.

Não questionamos o dever jornalístico de ouvir diferentes partes em qualquer temática, no entanto reservamo-nos o direito de questionar quem é que é considerado “parte” na temática do trabalho sexual: se as pessoas que o fazem, se organizações que ativamente contribuem para o reforço do estigma e da perseguição contra xs trabalhadorxs do sexo e que consideram saber melhor do que nós o que é melhor e mais adequado para as nossas próprias vidas. Na verdade, só uma falha na compreensão da noção de lugar de fala e numa verdadeira apreensão do tema do reconhecimento do trabalho sexual como uma questão de direitos humanos permite compreender que organizações abolicionistas sejam consideradas como um parte neste debate. Não o são, da mesma forma que para falar de racismo não se contrapõem as vozes das comunidades racializadas com vozes brancas ou com vozes de organizações racistas, ou que não se contrapõem as vozes de mulheres a vozes de homens ou às de organizações misóginas para abordar as questões da violência de género. Tal equivaleria – e equivale – a estabelecer uma falsa equivalência de legitimidade entre quem sofre e quem perpetua estas realidades, e entre as vozes das próprias pessoas afetadas e outras que abusivamente entendem saber melhor do que as próprias e ter direito a pronunciar-se silenciando as vozes das próprias. Entristece-nos sinceramente que esta opção editorial venha ensombrar uma reportagem, no geral, bastante abrangente, informativa e de grande qualidade.  

Nota editorial

A jornalista e autora da reportagem lamenta as imprecisões no texto em relação à posição dos Movimento dos Trabalhadorx do Sexo e garante a imediata retificação dos mesmos. A par disto, Sofia Craveiro esclarece que a inclusão de opiniões de movimentos e pessoas que defendem a abolição do trabalho sexual era necessária para enquadrar as diferentes visões da questão, garantindo assim o contraditório a que obriga a ética jornalística.

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