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Foco, família e determinação: o segredo do campeão Zicky Té

Zicky Té está indiscutivelmente numa das melhores fases da sua vida. Só em 2022, o universo do futsal elegeu-o o Melhor Jogador Jovem do Mundo e Melhor Jogador da Europa. Nesta entrevista exclusiva para a BANTUMEN – em que o conseguimos tirar, por um momento, das merecidas férias – o atleta do Sporting Clube de Portugal falou-nos sobre a sua trajetória no futebol, as suas origens e confirmou-nos que não se é campeão por acaso, é preciso ter e nutrir uma mentalidade de campeão.

Texto de Redação

Cláudio Ivan Fernandes / BANTUMEN

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Nascido na Guiné-Bissau, Zicky revela que o seu percurso de sucesso deve muito à estrutura sólida que o apoia e que vai além das quatro linhas. É na família que tudo começa e acaba e de onde herdou o foco. O pai é o pilar que precisou sair da Guiné para garantir um futuro melhor para a sua descendência e a mãe é a base que sustenta o propósito de todos. Quanto aos irmãos, sobretudo o mais velho, ainda hoje telefonam para relembrar que o divertimento não pode estar acima da vida profissional. “E é olhar para essas pessoas e ver que o meu pai veio para cá e não tinha nada, não conhecia ninguém. Teve que começar a trabalhar nas obras. também contou com a ajuda de pessoas, claro, porque senão não seria possível. É muito difícil para uma pessoa, que não entende nem a língua, conseguir adaptar-se e mesmo assim não esquecer a família que deixou na Guiné. É um pilar e uma pessoa que vejo como inspiração. Se ele fez isso por nós, quem somos nós para não trabalhar, para retribuir pelo menos? Não que seja uma obrigação, mas acaba por ser, para retribuir tudo que ele fez por nós”, explica-nos o atleta.

Sobre o futebol, Zicky revela que – apesar de já ter pensado em ser advogado, considerando o seu gosto por debater e advogar pelas suas convicções – sempre soube que queria ser jogador. Vem daí o reconhecimento por ser um péssimo jogador de Playstation. Em miúdo, passava o tempo na rua, a jogar à bola. “Gostaria de ter o hobby de jogar play, de jogar jogos de computador e isso com os meus amigos mas passei tanto a minha infância na rua que não sei jogar PlaystationPego num comando e estou sempre a levar 5 [golos] nos [primeiros] 10 minutos. Ainda nem começou bem a primeira parte e já estou a levar 4-0. Quando era miúdo, era mais sair, dez da manhã, ia jogar à bola, voltar só para comer, voltar para jogar à bola e essa era a minha rotina todos os dias”, confirmou com saudades da infância.

Questionado sobre a mecânica entre os seus pares no Sporting e a própria equipa técnica, o jogador não tem meias palavras. A estrutura familiar e as pessoas que trabalham comigo a nível profissional, sem dúvida é um dos segredos e uma das alavancas para estar neste processo, para ser o jogador que sou hoje e o jogador que eu quero me tornar ainda. A minha sorte, por assim dizer, é ter pessoas que me querem muito bem e que trabalham ao máximo para o meu sucesso.

Nesta entrevista, realizada também em vídeo, Zicky falou-nos sobre a sólida irmandade da sua equipa e o apoio que sempre teve da parte técnica, o amor pela música – não, o jogador não se vai revelar, para já, aos microfones – e ainda deu um conselho aos jovens que lhe querem seguir as pisadas.

Cláudio Ivan Fernandes / BANTUMEN

Irmão, ler sobre ti. É fixe para caraças. Estás num momento bom. Já não estás nas escadas, estás no elevador. Como é que está a tua cabeça?

Atualmente, creio que estou a viver uma das melhores fases da minha vida. E muito do que está a ser alcançado e do trajeto que está a ser feito deve-se também à grande estrutura que tenho por trás. Porque muitas vezes, vêem o que acontece dentro de campo e o que aparece nas televisões, mas o que não aparece às vezes pode ser o mais importante. Pode não. Tenho a certeza que é. A estrutura familiar e as pessoas que trabalham comigo a nível profissional, sem dúvida é um dos segredos e uma das alavancas para estar neste processo, para ser o jogador que sou hoje e o jogador que eu quero me tornar ainda. A minha sorte, por assim dizer, é ter pessoas que me querem muito bem e que trabalham ao máximo para o meu sucesso.

Essa estrutura familiar começa desde a base ou a partir do momento em que o pessoal viu que há aqui uma profissão na bola?

Eu não tenho recordações de algum momento em que a união falhou na minha família. Desde a Guiné-Bissau até aqui, desde os tempos em que nós andávamos com a nossa avó, as tias, os primos… Costumo dizer sempre, a minha família é muito grande. É muito grande. E sinto que antes de sonhar de ser o Zicky, eu era só o Izaquiel a minha família sempre esteve lá, sempre irá estar. Isso nem está em causa, é mesmo um não assunto, porque a família está em primeiro em tudo. Em tudo que eu possa fazer, eu sei que eles nunca vão me deixar cair e vão estar lá sempre comigo, como tiveram no início e como estão agora.

Explica-nos um bocadinho essa estrutura familiar guineense.

Eu saí de lá [Guiné-Bissau] muito, muito novo, mas tenho muitas recordações. Aliás, não me esqueço de nada das coisas que aconteceram lá. O meu pai veio muito cedo para Portugal. O meu pai veio sozinho numa história que, se calhar, era a história de mais um imigrante que saiu da sua terra natal para buscar melhores condições para a sua família. Na altura, primeiro vim eu e a minha mãe e deixámos lá os meus dois irmãos mais velhos. Ele veio sozinho, conseguiu comprar uma casa, depois trouxe-me a mim e à minha mãe, e depois vieram os meus dois irmãos. A prioridade na altura, que os meus irmãos disseram, é ‘nós não vamos sair daqui enquanto ele [o Zicky] não sair. Ele tem que sair primeiro. Ele vai e nós ficamos aqui e aguentamos’.

A minha mãe disse que não ia sair se não saíssem todos. Então, foi uma guerra na altura para o meu pai conseguir que ela saísse de lá e deixasse dois filhos para trás. Mas quando se está em busca de novas oportunidades e melhores condições tem que haver alguns sacrifícios.

E, agradecendo agora ao meu pai, porque eu não tenho muito essa cena de lhe dizer as coisas, mas eu acho que ele sabe o pilar que ele é, que é o boss da família, digamos assim. A pessoa que chegou a Portugal não conhecia ninguém, com uma mulher e três filhos, e construir uma casa, uma família, uma estrutura aqui em Portugal… E [enquanto estávamos] lá na Guiné também nunca faltou nada.
Sempre que chegava o final do mês, lá a minha mãe tinha o dinheiro contado, falava com ele todos os dias…

E é olhar para essas pessoas e ver que o meu pai veio para cá e não tinha nada, não conhecia ninguém. Teve que começar a trabalhar nas obras. também contou com a ajuda de pessoas, claro, porque senão não seria possível. É muito difícil para uma pessoa, que não entende nem a língua, conseguir adaptar-se e mesmo assim não esquecer a família que deixou na Guiné. É um pilar e uma pessoa que vejo como inspiração. Se ele fez isso por nós, quem somos nós para não trabalhar, para retribuir pelo menos, não que seja uma obrigação, mas acaba por ser para retribuir tudo que ele fez por nós.

E aqui, como é que foi a adaptação?

Sinto que sempre fui bem recebido em todos os lugares por onde passei. Chegue cá, estive um ano em casa, acho eu. Não sei se foi bem um ano. O meu avô tinha diabetes e veio para receber tratamentos e também tinha problema de amnésia, então precisava de alguém quase 24 horas a dar apoio e a minha mãe e o meu pai trabalhavam na altura, então, fiquei quase um ano a cuidar dele. Tenho uma convicção, não sei se é verdade, mas parece que as crianças lá são obrigadas a fazer as coisas mais cedo. Tinha que tomar conta dele porque os meus pais passavam o dia todo a trabalhar e por isso entrei também um ano depois na escola. E desde que entrei na escola, desde o primeiro dia que estive cá em Portugal, a adaptação à língua, a adaptação aos colegas… nunca me senti maltratado. Claro que já houve situações, toda a gente já teve problemas, também não foi tudo um mar de rosas mas, no geral, posso dizer que sempre fui bem recebido e adaptei-me muito fácil. Ainda me lembro do primeiro dia quando cheguei a Portugal… só o descer uma escada rolante, aquilo foi tipo um susto porque nunca tinha visto aquilo na vida. Foi bué estranho. E agora, olhando para essas coisas assim… ali estávamos tão fechados, com tanta falta de conhecimento, quando chegamos aqui as coisas são muito estranhas.

Há pessoas que nunca passaram por isso, mas as que passaram de certeza que vão saber do que estou a falar. Essas coisas foram as mais complicadas na adaptação do que propriamente fazer amigos ou dar-me bem na escola. Depois, fui para onde estou agora, para São António dos Cavaleiros (Odivelas).

Cláudio Ivan Fernandes / BANTUMEN

E já estás na tua casa ou com os pais?

Estou com os pais.

Ainda te mandam lavar a loiça?

Quem come lava a sua loiça (risos). Sempre fui habituado assim. Comes, lavas. Cada um lava a sua loiça.

Quando é que percebes que a tua cena podia estar no futebol? E qual foi o apoio dos teus pais em relação a isso?

Acho que sempre percebi, mas não era numa de ‘ah, agora vou investir nisto porque quero ter dinheiro e quero ter coisas’. Não, eu simplesmente gostava de ir jogar com os meus amigos e as coisas corriam-me bem e eu só queria aquilo. Eu não pensava em outra coisa assim para fazer, a não ser quando estava no talvez no quinto ou sexto ano da escola. Tinha a mania de discutir com toda a gente, então passou-me pela cabeça ser advogado. Por isso, quando cresci, dizia ‘vou ser advogado e depois vamos argumentar uns com os outros para ver quem consegue ganhar os casos’. Tinha isso na cabeça também mas a bola mesmo sempre foi a minha cena.

Por norma, qualquer puto quando pensa no futebol, pensa no futebol 11 e em ídolos como o Ronaldinho, o Ronaldo… Como é que foi o teu filtro para ir para o futebol 5 em vez do futebol 11?

O meu irmão mais velho está sempre a falar do Ronaldinho Gaúcho. Ele diz que eu não tenho a noção do jogador que ele foi. O Ronaldinho Gaúcho, o Samuel Eto’o… Mas eu sou daquelas pessoas que não acompanha quase nada. Naquela idade eu só queria jogar à bola e não acompanhava os jogadores. Conhecia, se calhar, os mais importantes, o Messi, o Ronaldo mas não conhecia jogadores de futebol 11 como as pessoas que acompanham.

Uns diziam, eu quero ser como este. Eu queria ser como o meu primo. Ele era a pessoa que era a minha motivação para continuar a jogar à bola. Era a pessoa que me levava a todo o lado e que dizia que eu ia ser jogador. ‘Vais ser como o Ronaldo um dia’.

E como foi o teu início?

Naquela altura também não podia jogar, v não tinha os documentos portugueses. A inscrição era muito difícil e acabei de passar um ano só a treinar, não jogava. E depois, no ano seguinte fui para um clube ao lado de casa, na Póvoa. Aí é que os diretores e os misters andaram de um lado para o outro, quase não sei quantos meses, e conseguiram inscrever-me. Até agora, ainda às vezes, falo com a Sandra, com o David e com a Tânia, que eram os diretores e as minhas treinadoras na altura. No ano seguinte é que vim para o Sporting.

Ok. Esse foi o processo para a residência e o da nacionalidade veio com o tempo?

Sim, veio com o tempo. A prioridade da minha mãe sempre foi ‘trata primeiro o teu, depois eu trato’.
Tanto que a minha mãe só teve a nacionalidade há pouco tempo, há alguns anos.

Cláudio Ivan Fernandes / BANTUMEN

E os teus irmãos, o que fazem?

Eles atualmente estão em Inglaterra, os dois a trabalhar.

Apesar de estarem longe, a união mantém-se?

Continua. É um não assunto a união na nossa família. É a base. É mesmo inquestionável. Uns olham pelos os outros, mais até do que olham para eles próprios. Eu acredito que os meus irmãos – tanto eu como olho para eles – eles pensam primeiro em mim antes de pensarem neles. É inacreditável. Não dá para explicar. Não tenho muitas palavras porque eu também não as encontro para te explicar. Quem nos conhece e quem convive conosco sabe que é inquestionável. Ponho-os acima de qualquer coisa.

Voltando aqui na cena do futebol, os nossos pais africanos focam-se muito no nosso intelecto, na escola e em tudo o que tiver a ver com a nossa educação. O teu processo escolar continuou, parou? Como é que foi a tua cena de profissionalizar o futebol? Como é que foi o apoio da tua família e a intervenção principalmente da tua mãe em relação a essa profissionalização?

No meu caso, a conciliação das duas coisas acaba por não ser muito difícil. Porque, no início, no Sporting, tínhamos a obrigação de apresentar notas e o dever não era o dever, era a preocupação de saber como é que andávamos na escola. E, com os meus pais, se aparecesse com uma negativa em casa, às vezes até queria chegar mais tarde a casa que é para não os encontrar, porque não toleravam negativas. Recado na caderneta, então, era impensável. Se aparecesse um recado na caderneta era melhor ir dormir a casa de um amigo, alguma coisa assim. É escola à frente de tudo.

Se fosse preciso faltar a um treino porque tinha que estudar, era faltar a um treino porque tinha que estudar. A escola era a prioridade. Isso nem era questionável.

A tua vida tem mudado. Acredito que com o sucesso vêm mais coisas. A tua família já viveu dessas coisas boas que estão a acontecer na tua vida?

Claramente que sim, o que eu tenho é o que eles têm também. Se eu tiver 10, todos vamos ter 10. Se tivermos x, gastamos os x todos nós e depois logo se vê. Não há isso de ‘vou fazer a minha vida e vocês agora cuidem-se’. Não. Enquanto os meus pais não descansarem, os dois ainda trabalham – a minha mãe agora fez os 50 anos, o meu pai já tem 54, se não estou em erro -, enquanto eles não descansarem
não dá para estar tranquilo. Eles têm de descansar e se for preciso vão para a Guiné, de onde eles vieram. E aí sim vou ter o meu dever cumprido e se calhar vou começar a pensar um bocado mais em mim. Enquanto os meus pais não descansarem, é duro.

Tens visitado a Guiné?

Ainda não visitei desde que vim. Estou para marcar uma visita e creio que vai ser este ano ou o próximo. Não posso ficar muito mais tempo sem ir à Guiné.

Qual é a tua etnia?

Pepel.

A tua família mantém algumas tradições?

As regras em casa é a educação que a minha mãe me deu e a religião que ela carrega. Cada vez que vou para um jogo ela pega na minha cabeça e começa a rezar a Deus, para que tudo corra bem e para que ele nunca me abandone. Já aconteceu a chegar de um jogo e ela, sem saber o que aconteceu, disse-me ‘já sabia que esse jogo ia correr mal. Vocês não iam ter o resultado que queriam mas eu não consegui avisar’. E parou ali à minha frente e começou a rezar de novo.

Digo muitas vezes que parece que estou conectado com ela tanto em campo como nas coisas que faço. E acredito muito que há uma ligação, que ela sinta as coisas que eu estou a passar em campo e que ela está sempre comigo. Sinto isso, não sei porquê, mas sinto muito.

Cláudio Ivan Fernandes / BANTUMEN

És muito religioso?

Sou, mas já fui mais em termos de frequentar mais a igreja. Quando era novo, quando cheguei da Guiné,
íamos sempre todas as sextas-feiras aos cultos bíblicos dos jovens. E aos domingos tínhamos o culto da igreja.

Ainda sobre o futebol, de tudo o que li sobre ti, tu não és só mais um elemento, tu és o elemento. Como é que foi fazer a academia? Como é que é a tua vida dentro do clube?

Dentro do clube a minha vida é muito boa. Tenho uma sorte muito grande. Os meus colegas de agora estão comigo desde que cheguei ao Sporting. Desde os infantis. Alguns já estavam antes de chegar ao Sporting. O Gêmeos, o Tomás e o Bernardo, eu já jogava com eles desde os nove anos. O Neves também, conheci o Neves em Santo Antônio… O Diogo Santos, que jogou comigo também na formação, agora está comigo… É tudo uma família. Somos muito unidos. E mesmo com aqueles já estavam lá, como o Pany, o Érico, o Pauleta, o Baba, e as outras pessoas sempre me receberam super bem.

Já tive muitos colegas que não tiveram a mesma felicidade de seguir até à equipa principal e que ainda hoje jogam. E vamos sempre perdendo pessoas.

Quando chegas à equipa principal, tu dizes que és bom. Mas encontra pessoas melhores que tu. Então se queres te destacar, tens que arranjar uma maneira de ser melhor. Por isso, tinha que responder com muito trabalho e fazer por mim. Com muita ajuda deles, claro. Porque sem a ajuda deles, nada disso ia acontecer. É bem importante teres um bom ambiente, um bom grupo no local de trabalho.

Tens essa cena de ter mentalidade de campeão ou é tudo muito nas calmas?

De onde cresci e aprendi a ser a pessoa que sou hoje, vim com uma mentalidade de tu podes ser até o melhor do mundo mas, para eu te respeitar, tu tens de me respeitar. [No Sporting] Fomos campeões de tudo e mais alguma coisa. Todos os títulos que havia para ganhar nós ganhamos.
E no ano seguinte os mesmos miúdos que tinham subido com 20 anos estavam a ganhar o Mundial. E no ano seguinte, o Europeu.

Foi um início incrível. É realmente o melhor momento da tua vida. Foi o início incrível.

E manter isso? Já fui o Zicky, que era jovem promessa, que era um miúdo com talento, que íamos ver o que ia dar. E agora vai chegar outro com sede da vida, que é um miúdo lá dos júniores e vai fazer melhor, se calhar. Já bateu um recorde que eu acho que era do mais jovem a marcar na Champions.
Eu nem sei se esse recorde era meu ou se era de outra pessoa mas já chegou outro miúdo e já bateu. Logo, não dá para manter porque está sempre alguém que quer o teu lugar. Não no mau sentido, mas tem que ser. É o ciclo da vida e não podemos manter, se não estagnamos e os outros nos passam.

Como é que as miúdas e os teus amigos, que não estão no ciclo de futebol, olham para ti?

É o que eu estou a dizer, não sei porquê, mas sinto sempre que sou bem tratado em quase todo o sítio onde vou.

Para as miúdas também?

Para as miúdas não, porque agora tenho namorada (risos). Não, mas sinto que sou bem tratado em todo o sítio onde vou. Até porque acho que não deveria ser o contrário. Mas os adeptos do Benfica, as pessoas que são do Benfica, até hoje – no campo é normal mandarem vir connosco – mas até agora, na rua, não tive nenhuma abordagem de alguém que chegasse ao pé de mim com ódio ou com críticas ofensivas. Normalmente é tudo o contrário.

Tornaste-te Sportinguista ou nasceste Sportinguista?

Acho que já nasci sportinguista. [O que é curioso]O meu avô, em casa dele, todos os filhos tinham que ser do Benfica. Todos. Menos o meu pai, que é do Porto.

Se saíres do Sporting, vais para onde?

Eu vou te ser sincero, não penso nisso agora. Sinto-me muito feliz no Sporting. Nós que viemos da formação, olhamos aquilo de forma diferente. Juro que às vezes, dou por mim a olhar para o balneário e estou lá tipo… ‘estou aqui nos séniores’… Olho para o símbolo do Sporting e estou representar o meu clube, estou a representar o Sporting que já tive muitas vezes a apoiar na bancada. O caminho que fiz desde a formação agora está a ser recompensado. Estou a ter a oportunidade de mostrar o que posso fazer em campo. E é uma gratidão muito grande. Para ser sincero, penso só no Sporting agora.

E em festivais. Temos-te visto em todos… (risos)

Comecei a ir de um ano para cá. Antes, também não tinha assim idade, e o meu irmão também não ia me deixar ir a muitos. Ele começa logo a dizer: ‘atenção, não sei o quê, estás a jogar’. E agora que estou de férias, mesmo assim, ainda me liga de vez em quando a dizer para ter atenção ‘estás de férias, mas o ginásio não podes esquecer’. Ainda hoje falamos sobre esse assunto.

Qual é a sensação de estares de férias, com tudo feito, tipo nota 20 em tudo?

Nas férias gosto muito de me divertir com os meus amigos. Principalmente este ano, que foi um ano muito alto e baixo. A época começou, tínhamos vindo de duas épocas, uma ganhamos tudo e a outra tínhamos ganho tudo e perdemos a Champions. Não tínhamos ganho de tudo porque tínhamos perdido a Champions. E esta época tínhamos começado bem, tínhamos ganho a Supertaça.

Depois perdemos, se não me engano, a Taça da Liga, que não chegámos à final, perdemos nos penaltis. Eu, ainda por cima, falhei o penálti e depois eles marcaram e nós perdemos o jogo. Eu não tinha perdido nenhum título. Começo a bater mal da cabeça, só com fome de ganhar.

Como é que é possível? Estava ao nosso alcance. Não perdemos porque somos pior que os outros. Estava ao nosso alcance. E vamos para uma Champions, estava mesmo com um feeling. Eu estava mesmo confiante que ia ganhar a Champions. Olhas para o teu adversário e dizes que vai ser aqui.
Eles não têm por onde fugir. Nós vamos ganhar isto. E depois perdemos nos penaltis. Eu passei por aí uma semana e não conseguia pensar… Até agora. Juro, falo nisso e fico arrepiando, isso deixa-me tipo, super frustrado porque é um assunto que ainda não consigo ultrapassar.

E aquele golo contra o Benfica que correu o mundo? Foi muito treinado ou saiu?

É algo natural, consoante a ocasião. Se calhar, se eu recebesse a bola e ficasse com ela assim, não ia sair nenhum lance mas como a bola fugiu um bocado, tive que improvisar e depois… Tentei procurar alguém para passar, não encontrei, tive que improvisar de novo e as coisas saíram ao natural.
Não dá para dizer, a bola vem, agora vou fazer isto.

Estás a pensar no golo do ano ou não pensas nisso?

Estou só a desfrutar o meu momento.

Cláudio Ivan Fernandes / BANTUMEN

Quais são os teus hobbies? Jogas Playstation? O que fazes fora do campo?

Gostaria eu de ter o hobby de jogar play, de jogar jogos de computador e isso com os meus amigos mas passei tanto a minha infância na rua que não sei jogar Playstation. Pego num comando e estou sempre a levar 5 [golos] nos [primeiros] 10 minutos. Ainda nem começou bem a primeira parte e já estou a levar 4-0. Quando era miúdo, era mais sair, dez da manhã, ia jogar à bola, voltar só para comer, voltar para jogar à bola e essa era a minha rotina todos os dias.

O que é que estás a ouvir de música?

Eu ouço muito rap crioulo.

Quem é o teu rapper favorito?

Quando era mais novo era o Goya. Agora, digamos assim, que tenho muitas músicas de que gosto, principalmente de amigos meus. Também curto os cantores da minha zona, que tem muito talento na música, desde os PMB, o Estevão, o Suculo, o Misi, que fez uma música com o meu nome e que é uma das músicas que ouço bué vezes antes dos jogos e em que ele diz que ‘vai brilhar como o diamante Zicky. É uma música que para mim tem muito sentido, porque é um dos meus a falar sobre mim. Mas gosto também de T-Rex, Wet Bed Gang, Plutónio…

Sobre negócios, olhas para negócios para investir ou ainda estás só a poupar para pensar no futuro?

O poupar é lixado porque quando poupas dinheiro ele desvaloriza. Se metes o dinheiro aqui, amanhã já não vale o mesmo. Logo, claramente, penso em investimentos que posso fazer, que é para multiplicar o dinheiro.

No que é que tens investido?

Ainda estou a ver, disseram que a imobiliária era um bom negócio, mas também tem que se ter conhecimentos para isso. E estou também a pensar se vou para a faculdade.

Vais ser advogado agora?

Agora ainda não, mas vou para Gestão. Dá tempo se formos organizados, se soubermos controlar, agilizar bem as coisas.

E sobre a reforma, vais ser mais um jogador tipo o Pepe, que vai aposentar-se depois dos 41 ou mais um Ronaldinho ou um Neymar, que já deve estar quase a largar o futebol?

(Risos) Eu ainda só estou no início da minha carreira. Não vale a pena iludir-me com o que já conquistei. Porque se amanhã acontecer que eu não ganho nada do que tenho a ganhar e que o caminho começa a ser assim, no mundo do desporto as pessoas têm muita curta memória. E podemos estar a 8 como podemos estar a 80. Muito facilmente as pessoas podem lembrar-se do que é que o Zicky está a fazer, como amanhã já não presta ou já deixei de ser o que quero.
E depois há vários fatores que começam logo a ser associados. Desde as saídas, desde aconteceu isto, aconteceu aquilo e desleixou-se. E não, simplesmente há vezes que não estás numa fase fixe.

E olho tanto exemplo… Tenho Pany na equipa, tenho Matos na equipa, tenho Marley na equipa, tenho Cavinato na equipa, que é um exemplo para todos nós naquele balneário. São pessoas que têm trinta e tal anos e que ainda estão num alto nível. Como é que eu com 21 vou pensar que um dia vou ser… tenho que trabalhar ainda muito mais. Se eu já conquistei tudo, eles já conquistaram muito mais. Já está a ser muito bom, não digo o contrário, também não ia estar a ser hipócrita. Está a ser muito bom, estou a conseguir coisas muito grandes, mas ainda estou no início.

Qual é o recado que deixas para os mais novos?

O recado que deixo é para nunca desistirem das coisas que querem conquistar e para responderem com trabalho em qualquer situação da vida. Por isso é pensar mais no que podemos fazer, no que podemos controlar e não no que as pessoas [os outros] podem fazer ou controlar. Porque nós é que podemos mudar. Se não acreditarmos que podemos fazer a mudança, ninguém vai fazê-lo por nós.

*Esta entrevista foi publicada no âmbito da parceria com a Bantumen.

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