Ao percorrermos as ruelas estreitas de Loulé, no antigo aglomerado de casas, de traça árabe, por trás do Mercado, ele próprio de inspiração mudéjar, encontramos, espalhadas, pequenas lojas que servem de oficinas, onde os artesãos louletanos desenvolvem os seus artefactos, bem à maneira típica da região.
As esconsas e labirínticas ruas oferecem aos visitantes muros cobertos de cal, que, de tão brancos, quase encadeiam os olhos quando está sol e faz calor. As pequenas oficinas dos artesãos passam a ser assim um refúgio fresco, para estas ocasiões, e uma surpresa, a cada viela ou esquina, quando deixam revelar os seus vários tesouros. Nas oficinas, da rede Loulé Criativo, os artesãos guardam segredos sobre técnicas ancestrais, preservam a história e identidade popular de Loulé, por meio do artesanato, e, ao mesmo tempo, abrem portas para a inovação e saber dos designers.
O Loulé Design Lab, um laboratório, coordenado por Henrique Ralheta, de investigação, criação e experimentação, sediado em Loulé, cuja missão é estabelecer o diálogo entre a rede de artesãos locais e a comunidade criativa residente, desafiou, por isso, os artesãos a formarem duplas com os designers e a desenvolverem peças de artesanato com o intuito de serem inovadoras.
O artesanato é um legado precioso de uma comunidade, região ou país. Contribui para a sua identidade e história, mas para se manter vivo, não pode estagnar no tempo.
Após um longo período em que vivemos influenciados por uma cultura material oriunda da produção em série, e em que acreditámos que, só na inovação tecnológica globalizadora poderíamos realizar-nos, corremos o risco, nessa convicção, de perder quase toda a nossa identidade local, além do agravamento das condições ambientais. Não só o artesanato favorece a interação social local, contribuindo para a relação produtiva e emocional positiva, de troca e sustentabilidade entre os habitantes dessa comunidade, tornando-os menos dependentes das grandes estruturas produtivas, como, mais importante, contribuem para a efetiva diminuição do impacto ambiental. Os materiais autóctones são geralmente materiais naturais, amigos do ambiente.
Por outro lado, sendo Loulé um concelho que vive, em boa parte, das receitas que colhe de uma atividade como a do turismo, beneficia muito mais em ter uma oferta de artefactos aos turistas que seja diversificada, rica, original, única, e autóctone, em vez de oferecer objetos, ou outros bens que, com facilidade, podem encontrar em qualquer outra parte do mundo. O que as pessoas procuram quando viajam não é o que podem encontrar em qualquer lado, mas o que é raro, o que só podem encontrar no destino que anseiam.
O Loulé Design Lab tem essa sensibilidade, procura desenvolver projetos que, o mais possível, não perturbem o seio da cultura local da região, nem desvirtuem o que existe de mais tradicional e genuíno na produção dos artesãos. A ideia, ainda, para a Loulé Design, é que os mesmos objetos, resultantes da parceria entre designers e artesãos, fiquem a cargo destes últimos. Por exemplo, os objetos passarem a ser propriedade dos artesãos e poderem ser vendidos nas lojas de artesanato habituais.
As peças resultantes, desta vez, do trabalho entre artesãos e designers, são fruto de uma disponibilidade para aprender, uma abertura para receber o que cada um deles tem para dar. Aliar o saber tradicional e manual do artesão com o conhecimento contemporâneo do designer possibilitou encontrar soluções para o futuro do artesanato louletano, e à escala maior, português.
A Loulé Criativo, projeto da Câmara Municipal de Loulé, responsável pela reconhecimento e formação da rede de artesãos de Loulé, nomeadamente a Casa da Empreita, Oficina de Caldeireiros, Oficina do Barro, e mais recentemente Oficina de Cordofones e Oficina de Relojoeiro, promoveu uma exposição sobre os Artesãos de Loulé, divulgando os mais recentes resultados entre designers e artesãos.
Na casa da empreita, juntaram-se várias gerações, a artesã Maria Odete Rocha, e as designers Sandra Louro e Catarina Guerreiro, que desenvolveram uma mala, de nome “Degradé”, para pôr ao ombro, de formato quadrangular; Maria Valentina Silva, que pratica empreita desde os 11 anos, juntou-se à arquiteta Sofia Correia, e realizou o projeto Requinte Quotidiano, uma caixa para guardanapos ou panos do pó; Maria Cremilde Lourenço, que, além de fazer empreita, faz costura e que, com a designer de produto Verónica Guerreiro, fez bolsas e malas de empreita aproveitando fragmentos de tecidos como a ganga; os vasos de palma que foram desenvolvidos pela designer Ana Hermenegildo e o casal de artesãos Maria Margarida Cortez Ferreira e Jorge dos Santos; o projeto da bolsa Ignátia desenvolvida pela artesã Inácia Coelho e pela designer Sandra Neto; O projeto Remanescente Coca, que consiste num capote em empreita, entrelaçado por Maria Almerinda Miguel, e desenhado pelo artista Paulo Tomé; As Caixas em empreita, de Maria Duartina Mendes, artesã, e de João Carrilho, designer; Oito, enlaçado pela artesã Alzira Maria Neves, e pensado pelo designer Pedro Ramalhete; o projeto em empreita, Uma LEVE viagem, trabalhado pela artesã Lurdes Malveira Costa, e o designer de comunicação Fernando Madeira; Kathaplano Puff, assento em empreita, entretecido por Maria Odete Dias, e desenhado por Eurico Brito, artista; Anaisa, projeto da dupla Ludovina Bota e Silvia Rodrigues; Dona Tacha, Senhor Travesso, projeto de caldeireiros, em que a chapa de cobre foi moldada pelo artesão Analide Carmo, e a sua forma pensada pela designer Ana Rita Contente; ainda no domínio dos candeeiros, o projeto Requinte Quotidiano, realizado pelo artesão Jurgen Cramer e o arquiteto Christopher Whitelaw; O projeto Colares e Pomares, do carpinteiro David Ganhão Cabrita e da designer de comunicação Andreia Pintassilgo; O projeto de Alquimia Orgânica, da ceramista Bernardette Martins e da artista Ortiz Manoli; e por fim, as Tigelas do Algarve, projeto de cerâmica desenvolvido pelo ceramista José Machado Pires e pelo escultor Razvan Crestin.