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Opinião de Leonor Rosas

É doutoranda em Antropologia no ICS onde estuda colonialismo, memória e cidade. É licenciada em Ciência Política e Relações Internacionais na NOVA-FCSH. Fez um mestrado em Antropologia na mesma faculdade. É deputada na AM de Lisboa pelo Bloco de Esquerda. Marxista e feminista.

Não é complicado

Nas Gargantas Soltas de hoje, Leonor Rosas debate a ideia de que o genocídio na Palestina é um tema demasiado complexo para ser compreendido, debatido e denunciado, e critica a ideia de que podemos ser tranquilamente indiferentes à violência e aos massacres que nos chegam todos os dias.

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É "complexo", "complicado", "um tema para especialistas"," um problema com muitas nuances". Estas e outras frases são repetidas ad nauseam por familiares, colegas, amigos, guras públicas, comentadores ou até pessoas em cargos políticos de modo a justicarem a ausência de posicionamento sobre conitos militares, genocídios, alterações climáticas, declarações xenófobas sobre migrantes e um vasto cardápio de outros temas denidores do nosso tempo. Ao longo do último ano, com o intensicar do genocídio na Palestina, os terríveis números de vítimas são diariamente dissolvidos numa ideia acrítica de um “conito” demasiado complexo, contextualizados de forma xenófoba sob a ideia de uma região do globo que estaria sempre em guerra ou até ignorados como se tratassem de um tópico de uma tese apenas passível de ser analisada por especialistas.

Não é complexo, não é complicado, não é um tema para especialistas e muito menos um problema com muitas nuances. Comecemos com factos muito simples fornecidos pela Aljazeera. Desde 7 de outubro de 2023, cerca de 42 mil palestinianos foram assassinados, 16 mil destas mortes são de crianças e 10 mil pessoas encontram-se desaparecidas. Mais ainda: mais de metade das casas, 80% dos estabelecimentos comerciais, 87% das escolas, 68% das estradas e 68% das terras agrícolas foram total ou parcialmente destruídas pelas forças israelitas. A cada hora que bate nos nossos relógios, quinze pessoas em Gaza são assassinadas e seis delas são crianças. Israel ataca implacavelmente hospitais, campos de refugiados e zonas onde sabe que se concentram civis. À medida que a violência se expande e intensica, a justicação dos reféns parece cada vez mais distante e incompreensível face ao genocídio que se desenrola ao vivo nas nossas televisões, redes sociais e jornais. Nada disto me parece complexo: o genocídio de um povo não é complicado, o assassinato de crianças não é um tema para especialistas e a destruição total ou parcial de 31 dos 36 hospitais de um território não tem nuances. Por muito que alguns se contorçam em discursos tenebrosos na televisão para justicar o assassinato de crianças, não há nada mais representativo da podridão absoluta de um regime que esse mesmo argumentário.

Por todo o mundo, mesmo face à conivência grotesca dos governos ocidentais, milhões de pessoas têm mostrado que não há nada de complexo neste assunto. Pelo contrário, que o ato de procurar compreender o que se passa em Gaza não é apenas uma opção informativa, mas um imperativo moral de toda a gente em todo o mundo. Não há distância territorial, diferença cultural ou alteridade linguística que justiquem a incompreensão ou banalização do que se vem passando na Palestina. Repetir que é complexo, complicado ou cheio de nuances é uma forma de conivência, de abdicação do sentido ético e moral coletivo e de renúncia ao sentimento de solidariedade. Os movimentos de estudantes que têm ocupado universidades contra o genocídio e insistido rmemente com as suas direções para que tomem posição são exemplo da força do envolvimento, da solidariedade e do imperativo moral que ultrapassa fronteiras.

Há dias debrucei-me sobre as ideias de “solidariedade mnemónica”. Vários autores debatem como diferentes histórias de opressão se podem articular e criar plataformas progressistas e capazes de construir um sentido de futuro. Daqui partem ideias de que as vítimas do Holocausto e do colonialismo europeu - apesar das diferentes histórias e geograas - podem encontrar plataformas políticas comuns de solidariedade e raízes semelhantes na sua opressão. Desta lógica podemos transpôr para os resistentes ao Estado Novo e à ditadura de Pinochet no Chile, para as vítimas do genocídio na Palestina e dos massacres na Bósnia, para os vietnamitas que tiveram o seu país invadido e para os ucranianos que hoje combatem também uma invasão. É esse o gesto de compreensão do outro, da sua incorporação nas histórias globais de discriminação e violência e da solidariedade que ultrapassa a diferença e que destabiliza ideias de falsa complexidade. Penso nesta ideia poderosa de que nenhuma injustiça ou violência é incompreensível ou reservada ao estudo dos especialistas. Que estamos todos envolvidos na luta ideológica contra o sionismo, o fascismo e o genocídio. Só seremos todas livres quando a Palestina também for.

As posições expressas pelas pessoas que escrevem as colunas de opinião são apenas da sua própria responsabilidade.

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