Há umas semanas vi o documentário de três episódios, da HBO, intitulado ‘’Obama: In Pursuit of a More Perfect Union’’. Este documentário resume o percurso pessoal, profissional e político do 44º Presidente dos Estados Unidos da América e dá-nos a oportunidade de conhecermos melhor a vida de Barack Obama, desde criança até ao seu segundo termo como Presidente dos EUA. Neste documentário, o que mais me fascinou foi a relação de Obama com a comunidade negra norte-americana. Ao longo dos três episódios desta série são entrevistados vários ativistas e políticos negros que dedicaram a sua vida a lutar pela igualdade nos Estados Unidos. Entre estes destacam-se John Lewis, Bobby Rush, Al Sharpton e Cornel West, todos eles ativistas e pensadores reconhecidos pelas lutas que travaram – e continuam a travar – pelo fim da discriminação racial no seu país.
Este documentário reporta com bastante clareza as eleições primárias para eleger o candidato do Partido Democrata às eleições presidenciais de 2008 e, nesta eleição, a talvez mais importante vertente para garantir a nomeação é ser apoiado pela comunidade afro-americana. Um espectador menos atento poderia pensar que Obama teria o voto da comunidade afro-americana ‘’no papo’’. No entanto, não foi este o caso. No documentário, os ativistas que mencionei anteriormente viram-se divididos em quem deviam apoiar. Apesar de reconhecerem Obama como alguém que experienciou ‘’na pele’’ a discriminação racial contra qual eles sempre lutaram, também é relembrado o amor que a comunidade afro-americana nutria pelo marido e ex-presidente Bill Clinton.
Nas entrevistas que dão, dizem que Obama nunca se comprometeu totalmente com a luta contra a discriminação racial, ou pelo menos com a veemência que estes pretendiam, talvez com o receio de ser considerado demasiado ‘’extremista’’ pelos eleitores brancos e alienar o voto destes. Durante muito tempo esta hesitação de pessoas influentes na comunidade negra foi uma pedra no sapato no futuro presidente dos EUA, sendo frequentemente acusado de ‘’não ser negro o suficiente’’. No entanto Obama acabou por ser apoiado pela comunidade afro-americana, venceu a eleição primária contra Hillary Clinton e tornou-se no primeiro presidente negro da história dos EUA. Como se costuma dizer ‘’o resto é história’’.
No entanto (e é aqui que quero chegar após esta longa introdução) o visionamento deste documentário fez-me lembrar algo que chegou a ser tratado quando ainda era aluno da licenciatura em Ciência Política. Devem as minorias ser representadas politicamente por minorias? As minorias conseguem legislar mais efetivamente sobre os seus problemas que outros representantes? A representação das minorias no parlamento levará a que a agenda destas seja avançada? Uma análise mais fria ou até tecnocrata responderia que o político não interessa, apenas as suas propostas, mas na minha opinião as coisas não são bem assim.
Para a formulação deste artigo de opinião decidi ler alguns estudos sobre a matéria, que confirmaram o que já suspeitava. Tanto no caso das mulheres (minoria em termos de representação) como no caso da comunidade afro-americana, ambos sentem-se mais representado quando votam e vêm uma pessoa ‘’igual a si’’ num importante cargo político. Para mim é óbvio que este seria o caso. É natural pensar que uma pessoa que se sentiu menosprezada politicamente durante décadas fique entusiasmada quando surge um/a candidato/a que se parece consigo e que tenha tido as mesmas experiências de vida. Para além disto, seria de esperar que uma mulher estaria mais disponível para endereçar problemas relacionados com a igualdade de género, ou que um político negro canalizaria mais facilmente o combate à discriminação racial na sua legislação.
Por muito que alguém ‘’de fora’’ tente combater a discriminação racial e de género, há experiências que apenas as pessoas que as viveram consegue compreender, pelo que apenas elas saberão a melhor maneira de combater estes problemas. Isto não significa que nós (neste caso homens brancos) nos devemos demitir das responsabilidades de lutar por um mundo mais igualitário, muito pelo contrário. Temos de estar ao lado destas pessoas que são discriminadas, ouvi-las e acompanhá-las nas suas lutas.
No entanto, temos de ter cuidado para não cair no erro de pensar que TODOS os políticos pertencentes a uma minoria pretendem avançar as suas causas. Dou o exemplo de Candace Owens, mulher negra, contra o aborto, apoiante de Trump e crítica do movimento ‘’Black Lives Matter’’ e do feminismo. Não será preciso pensar muito para percebermos que esta pessoa em nada pretende ajudar a combater a discriminação que as mulheres e afro-americanos continuam a sofrer nos dias de hoje. Outra seria Margaret Tatcher, que nada fez pelos direitos das mulheres enquanto foi primeira-ministra do Reino Unido. Fazer parte de uma minoria não é suficiente, é também preciso querer combater a discriminação que estas enfrentam.
-Sobre Rodrigo Andrade-
Rodrigo Andrade tem 23 anos e é natural do Bombarral, uma pequena vila no sul do distrito de Leiria. As ambições académicas levaram-no para Lisboa, onde se licenciou em Ciência Política no Iscte. Seguiu-se o mestrado na mesma área, uns dirão devido ao gosto pelo tema, outros por falta de originalidade, mas desta vez com especialização em Comunicação Política e Opinião Pública. Divide o seu tempo entre a terra de sua naturalidade e a capital portuguesa e dá o seu melhor para se envolver e dinamizar a vila onde reside. Para além da política, é interessado por ambientalismo, associativismo e pelo passado histórico português, mais concretamente pelo período do Estado Novo e como o seu legado se reflete nos dias que correm.