O Clube Safo, a única associação de defesa dos direitos de lésbicas em Portugal, celebra este ano 25 anos de existência. E o mês de Abril é também o mês da visibilidade lésbica.


Fonte: http://portugalpride.org/
Muitas vezes, quando falo da especificidade do Clube Safo e de visibilidade lésbica, perguntam-me:
- Mas queres um espaço só para mulheres, para lésbicas, para pessoas queer e/ou não binárias, feministas, porquê? Para quê? Mas queres uma associação de lésbicas, para lésbicas, para mulheres que têm relações com mulheres? Porquê? Para quê? Já não existem discotecas, bares gay-LGBT? Já não existem associações LGBTI suficientes?
A resposta para todas estas perguntas é sempre NÃO.
A crise de lugares especificamente direcionados para um público lésbico, queer feminino, não-binário, trans, feminista são praticamente inexistentes em Lisboa, no Porto, e principalmente no resto do país. Talvez se lembrem de um, dois e digam, 'na minha cidade (normalmente Lisboa ou Porto) há este sítio ou aquele'. Mas, em comparação com o mundo de cafés, bares, restaurantes e outros locais de convívio para a população em geral, (ou até para homens cis, gays), esse tal sítio de que se lembram é escasso, é pouco num mar de tanta oferta para a maioria ou para a maioria dentro da minoria.


Fonte: https://omirante.pt/
É real também a falta de abordagem dos temas que dizem respeito às nossas vivências, aos nossos mundos e experiências. Que se baseiam em relações de proximidade e empatia e não só em trocas monetárias ou obrigatoriedades laborais. Que ligam as pessoas pelos seus interesses e por ser pessoa humana. Quando numa conversa com Fabíola Cardoso, deputada do Bloco de Esquerda, uma das fundadoras do Clube Safo em 1996, lhe perguntei sobre a longevidade do Clube Safo, 25 anos, meio século de uma associação para lésbicas? São os laços, as amizades, a possibilidade de se ser plenamente com outras pessoas iguais a ti (enquanto me mostra fotografias de atividades do Clube Safo de 1998 e 1999 com mulheres de mamas ao léu nos acampamentos organizados pelo Clube Safo quando ainda não era uma associação).


Fonte: https://www.esquerda.net/
É preciso pensar também que estes espaços têm sempre questões de acessibilidade, que nem todas as pessoas conseguem/podem estar, entrar, participar, pagar. E tantas outras palavras acabadas em ar. Sempre a pergunta: Quem pode respirar?
Temos de criar/apoiar redes que sejam para nós/nossas, começar a sair de casa (mesmo que sair de casa signifique durante uma pandemia viver em frente a um ecrã e proporcionar espaços online ou sem abraços). Com o pouco que temos, o nosso feedbak, a nossa crítica construtiva e disponibilidade para fazer em conjunto podemos construir e ajudar a que locais/espaços/associações que sentimos como segunda casa não desapareçam.
Temos de parar de pedir desculpa por querermos um lugar para nós, quando em 99,9 por cento dos espaços somos alvo de ataque, fetichização, objetificação. Temos de parar de sentir culpa quando queremos/precisamos de locais que permitam e onde possamos reconhecer-nos, encontrar-nos e encontrar outras pessoas iguais a nós, das quais podemos gostar, criar uma qualquer afinidade ou como dizia a Dina (que faleceu no dia 11 de Abril em 2019) encontrar amor de àgua fresca.
A inexistência destes locais de encontro, de partilha, torna mais difícil sabermos quem somos, conhecemos pessoas fora do nosso círculo mais próximo que muitas vezes consiste de pessoas próximas com quem trabalhamos, por exemplo mas que têm pouco que ver connosco, de constituir família de pertença com amigues que são essenciais quando muitas vezes as nossas famílias de origem não nos aceitam na totalidade ou de todo. Torna difícil também o movimento de luta pelos nossos direitos que não será ‘televized’, mas estará nas redes sociais de certeza e que se não formos nós a fazer, não acontecerá.


Porque é que estes sítios são importantes, porque nós somos importantes e merecemos saber onde andamos e ter onde ir, estar e ser.
-Sobre Alexa Santos-
Alexa Santos é formada em Serviço Social pela Universidade Católica de Lisboa, em Portugal, e Mestre em Género, Sexualidade e Teoria Queer pela Universidade de Leeds no Reino Unido. Trabalha em Serviço Social há mais de dez anos e é ativista pelos direitos de pessoas LGBTQIA+ e feminista anti-racista fazendo parte da direção do Instituto da Mulher Negra em Portugal e da associação pelos direitos das lésbicas, Clube Safo. Mais recentemente, integrou o projeto de investigação no Centro de Estudos da Universidade de Coimbra, Diversity and Childhood: transformar atitudes face à diversidade de género na infância no contexto europeu coordenado por Ana Cristina Santos e Mafalda Esteves.