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Festival Contrapasso: a afirmação das bandas filarmónicas

Na pequena aldeia da Ermegeira, concelho de Torres Vedras, nasceu o Contrapasso, um festival que se quer afirmar como o ponto de equilíbrio entre a tradição e a inovação do universo filarmónico. A primeira edição, que decorreu de 2 a 4 de setembro, foi organizada pela Sociedade Filarmónica Ermegeirense e trouxe ao Parque Natural da Ermegeira espaços infantojuvenis, conversas, ensembles e grandes espetáculos que juntaram bandas filarmónicas às mais diversas formas de expressão artística.

Texto de Redação

©Contrapasso

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O caminho de curvas que nos leva à Ermegeira é pincelado por cartazes coloridos que anunciam que a música está perto. Por todo o recinto é fácil sentir o amor à camisola dos cerca de quarenta voluntários que, durante o último ano, ajudaram a tornar realidade o sonho de Débora Bessa, diretora artística e pedagógica da Sociedade Filarmónica Ermegeirense e Fabion Marques, presidente da mesma.

Divulgação do Festival pela Ermegeira ©Contrapasso

Já havíamos pensado em fazer um festival há algum tempo e no último ano sentimos que tínhamos condições para avançar. Passamos muito tempo a pensar como envolver a comunidade e ao mesmo tempo como fazer algo diferente da festa filarmónica da aldeia. Surgiu assim o Contrapasso”, explica Débora Bessa.

Com apenas 300 habitantes, a Ermegeira foi a casa escolhida para acolher o festival. A diretora artística e pedagógica afirma: “Podíamos ter tido a ideia, propô-la à Câmara Municipal de Torres Vedras e ela acontecer na cidade, mas o facto de ser aqui foi muito desejado por podermos contar com as pessoas, por termos um forte sentido de associativismo. Os nossos voluntários têm idades muito distintas, temos a Maria que vai fazer dez anos e a D. Felismina que já tem os seus oitenta. Era importante para nós fazer isto com estes habitantes porque queríamos trazer as pessoas para a rua, principalmente depois de dois anos de muito isolamento. Queríamos criar um lugar de encontro.”

A música veio encher a aldeia

O parque de estacionamento enche-se de voluntários, músicos e curiosos que depois de passarem pela bilheteira se reúnem junto ao pórtico de entrada. A Sociedade Filarmónica Ermegeirense alinha quatro a quatro e marcha até ao Palco Encontro. Está lançado o mote para os próximos dias: mostrar as várias dimensões da Filarmonia e desafiá-las.

Estrategicamente colocado entre as mesas e bancos da zona de restauração, o Palco Encontro recebe os grupos mais pequenos com o objetivo de estimular a convivência entre músicos e público. O Ensemble de Clarinetes da Universidade de Évora, constituído exclusivamente por mulheres, é responsável pelo primeiro momento musical do dia.

Ensemble Clarinetes da Universidade de Évora ©Contrapasso

Para Martinho Caetano, presidente da direção da Confederação Musical Portuguesa, este é o início de um festival único. “O Contrapasso é diferente de tudo o que já se fez, é um espaço aberto a todos os que pertencem ao mundo filarmónico português mas também a todos os públicos que do primeiro ao último dia do ano, em todo o tipo de eventos, especialmente nas festas e romarias acarinham e recebem as bandas filarmónicas.”

À medida que o Sol se põe e o vento característico do Oeste se faz sentir, a música continua com os 4Tubos, um quarteto de tubas que abre o apetite e prepara as próximas horas. As rulotes servem os primeiros jantares e na Cantina dos Artistas juntam-se todos os que ali estão para fazer música. “Em todos os encontros filarmónicos e mesmo nas nossas atuações, as refeições são feitas desta forma, em modo cantina, porque se torna um momento de convívio e partilha de experiências entre músicos”, conta Débora Bessa.

Tabuleiros arrumados, roupa preta vestida e instrumentos afinados é hora do espetáculo no Anfiteatro. A noite escura e fria não assusta quem vem em busca de um bom momento e pelas cadeiras brancas se distribuem moradores e visitantes, desde os mais novos aos mais velhos. As luzes iluminam o palco e todas as árvores altas ao redor. Inopinatum: um crime no parquejunta músicos da região coordenados pelo maestro Renato Tomás à voz de Norberto Monteiro que ao longo do concerto conta a história de um maestro assassinado. O primeiro dia ficou ainda marcado pelo regresso ao Palco Encontro, desta vez com o quinteto Ciclo das Quintas, um grupo de homenagem à música portuguesa em formato acústico.

Por uma rede de bandas filarmónicas

Durante a tarde do segundo dia, o Parque Natural da Ermegeira foi invadido pelos mais novos. Entre mantas de retalhos e pneus coloridos que deram cor ao espaço infantojuvenil, deu-se início à oficina de criação de marionetas Spongionions, promovida pela associação A Bolha, também responsável pela performance que se seguiu. Perdidos mas Pouco juntou o teatro à música da Sociedade Filarmónica Ermegeirense e contou a história de duas crianças que se separaram do resto da família mas mesmo sozinhas conseguiram enfrentar grandes descobertas na floresta.

Um metro ao lado, no Espaço Fonte, discutiu-se a importância da criação de uma rede de bandas filarmónicas que contou com Martinho Caetano, Presidente da Confederação Musical Portuguesa, Carlos Lopes e Luís Bernardino, membros da direção da Associação de Filarmónicas do Concelho de Leiria e José Rodrigues, maestro da Orquestra de Sopros do Alto Alentejo e membro da Federação de Bandas Filarmónicas do distrito de Portalegre.

“Existem cerca de 750 bandas filarmónicas no país, algumas delas centenárias, outras com mais de dois séculos de existência, são um dos principais pilares da cultura portuguesa, que funcionam como autênticos ‘conservatórios do povo’ ao serviço do ensino, da execução e da divulgação da música. Por isso é importante e necessária a criação de uma rede de bandas filarmónicas para que este património se possa consolidar”, realça Martinho Caetano.

Bestiarium pela Filarmónica União Taveirense ©Contrapasso

Já o final da tarde ofereceu oficinas de limpeza de instrumentos e a reabertura do Palco Encontro trouxe o quarteto de saxofones Lady’Sax. No Anfiteatro, o Contrapasso recebeu a Banda Sinfónica da Filarmónica União Taveirense que apresentou o espetáculo Bestiarium, uma passagem pelo som de animais extintos e outros em vias de extinção, complementado por ilustrações ao vivo a cargo do artista Gabriel Lagarto.

A música continuou noite dentro com o grupo Camisas Negras, uma fanfarra de animação de rua que navegou por vários estilos musicais e acabou o segundo dia do Contrapasso em grande.

A tradição de mãos dadas com a inovação

A tarde de domingo voltou a ser marcada pelo Filarmónicas à Conversa, que teve lugar no Espaço Fonte, desta vez sobre o espaço da inovação nos contextos tradicionais, com a presença de Carla Raposeira, diretora do Departamento Cultural da Fundação Inatel, e da criação artística nos seios das comunidades, que contou com Ana Bragança e Ricardo Batista do projeto Onda Amarela, Gonçalo Oliveira do projeto Somos Comunidade e Natália Vieira da área de teatro da Escola Superior de Educação de Lisboa.

Escola de Música da Sociedade Filarmónica Ermegeirense ©Contrapasso

Também a Escola de Música da Sociedade Filarmónica Ermegeirense se apresentou ao público que seguiu depois caminho para o último concerto de fim de tarde no Palco Encontro: o Ensemble Inopinatum, composto por cinco músicos do concelho de Torres Vedras.

Nem por ser noite de domingo o público se afastou do Anfiteatro que recebeu a Banda da Covilhã, juntamente com seis malabaristas da companhia espanhola PistaCatro Produtora, num espetáculo que reunia música e circo no mesmo palco, com um repertório que agradou até aos maiores fãs de rock.

Banda da Covilhã com Orquestra de Malabares ©Contrapasso

Sob a bandeira da sustentabilidade

Durante três dias de música e animação, ninguém se esqueceu do lugar que pisava. Um festival que decorre no meio da natureza quer também apelar à sustentabilidade e esse foi um valor que a organização não esqueceu.

Débora Bessa explica: “Todo o espaço foi transformado apenas no sentido de manutenção. Todas as estruturas aqui existentes foram aproveitadas, desde o Anfiteatro onde colocamos o palco principal, à Fonte onde acontecem as conversas e aos lavadouros que são pano de fundo do espaço infantojuvenil. O parque já era um espaço incrível e tinha tudo o que era necessário, por isso não quisemos acrescer a pegada ecológica com um festival que não tem essa necessidade. As estruturas já cá estão, é possível alimentar toda a gente, é possível ter o bar com materiais reutilizáveis ou de fácil reciclagem. É possível tudo isto acontecer com a mínima intervenção.”

E aconteceu. O Contrapasso fechou assim em festa três dias em que a cultura, a arte, a música, a tradição, mas também a inovação andaram de mãos dadas. Para Débora Bessa, “os festivais servem para mostrar algo que faz com que se avance e mais do que mostrar às pessoas o que fazemos, queremos também mostrar que isto é um caminho a seguir”.

“Numa aldeia pequena, a Filarmónica é o coração. Estar aqui é importante para estas pessoas porque lhes lembra a festa anual que deixou de haver há muitos anos. Estar aqui é importante porque lhes traz os grandes espetáculos, a um preço mais acessível e sem terem de se deslocar aos grandes centros. Não queremos um festival elitista, a acessibilidade é algo muito importante para nós. Queremos dignificar esta população. Não é só Lisboa e Torres Vedras que merecem a cultura, estas pessoas também e nós estamos cá para a trazer”, acrescenta.

Texto de Patrícia Caneira

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