São 82 medidas, divididas em mais de duzentas atividades, a desenvolver ao longo de cinco anos. O Plano Nacional de Combate ao Racismo e à Discriminação 2021-2025 (PNCRD), aprovado em resolução de Conselho de Ministros, prevê uma série de iniciativas, em diferentes áreas de governação, estabelecendo metas e indicadores. Mas, passados dois anos, associações e coletivos queixam-se principalmente da falta de informação.
“Aguardo respostas, certamente, como boa parte das pessoas que está atenta a este plano”, diz Bruno Gonçalves, dirigente da associação cigana Letras Nómadas, que fez parte do grupo de trabalhado criado pelo Governo para a elaboração do PNCR. “Pouca coisa nos foi enviada posteriormente ao grupo de trabalho. Ficou aqui um conjunto de intenções”, acrescenta.
“Sabemos muito pouco”, expõe também Evalina Dias, presidente da DJASS – Associação de Afrodescendentes, uma das entidades auscultadas para a criação do plano e que, desde a apresentação do mesmo, nunca mais foi contactada. “O que é público, e acho que toda a gente sabe, é a criação do Observatório do Racismo e Xenofobia, agora em março.”
Para Anizabela Amaral, do Kilombo – Plataforma de Intervenção Anti-Racismo, há um “fenómeno de falta de transparência”. Na sua opinião, “o governo teria todo o interesse em ter um instrumento de gestão que permitisse, aos coletivos, perceber em que fase de implementação está o plano.” Sobre a dissolução do parlamento e o ato eleitoral que se interpôs à execução do PNCRD – motivos que o executivo tem usado para justificar os atrasos –, a ativista ressalta a necessidade de se fazer uma revisão das metas: “Ficamos sem ter um horizonte temporal com o qual contar.”
As novidades, explica, vão sendo conhecidas sobretudo pela comunicação social. Para Anizabela A., jurista que foi também uma das primeiras dirigentes da SOS Racismo, há “uma falta de visibilidade da parte dos responsáveis na execução do plano” que “só prejudica” os seus promotores e o próprio projeto. “Estamos constantemente a criticar o não se fazer nada, ou fazer-se perto de nada, quando, se calhar, até estão a ser feitas algumas ações”, pondera, mas acrescenta: “não existe uma comunicação. Diria até um marketing institucional. Devia haver uma comunicação célere, direta, com os elementos e as organizações que fizeram parte do grupo de trabalho que deu origem a este plano, para dar uma satisfação”.
Sem nenhuma avaliação dos esforços feita até ao momento, o Gabinete da Secretária de Estado da Igualdade e Migrações disse, ao Gerador, estar previsto que “a avaliação intercalar” do PNCRD “ocorra até ao final do ano”. De acordo com o gabinete de Isabel Almeida Rodrigues, será nesse momento “que serão comunicados os progressos.” Os produtos decorrentes do plano “serão também divulgados pelas entidades envolvidas, junto dos seus stakeholders”, referiu ainda. Estas informações foram avançadas por email, após o respetivo gabinete – contactado a 19 de junho – comunicar, ao Gerador, a impossibilidade de “acomodar a entrevista pretendida” a Isabel Almeida Rodrigues, “até ao final da sessão legislativas [28 de julho], tendo em conta a agenda prevista”. Sob a alçada desta secretaria de Estado, o PNCRD é tutelado pela ministra-adjunta e dos Assuntos Parlamentares, Ana Catarina Mendes, cujo gabinete contactámos na mesma altura, mas sem obtermos qualquer resposta.
Lançado publicamente em março do ano passado, o plano do executivo contra o racismo e discriminação prevê a abertura de 500 vagas no ensino superior para alunos de escolas de zonas desfavorecidas, a alteração ao artigo 240.º do Código Penal, mudanças nos manuais escolares, ou ainda criação de um observatório contra o racismo e xenofobia. Estas são algumas das medidas mais aplaudidas do programa. Mas, apesar das metas estipuladas, apenas a última avançou – e, ainda assim, não ficou isenta a críticas, como se verá mais à frente.
Plano feito, grupo desfeito
Constituído por mais de uma dezena de pessoas, o Grupo de Trabalho para a Prevenção e o Combate ao Racismo – desfeito após a apresentação do plano – foi criado em janeiro de 2021 e foi responsável pela auscultação de 60 entidades dos setores público e privado. Dessas reuniões, resultou uma série de propostas para o PNCRD, que foi submetido ainda a consulta pública entre abril e maio desse ano, e na qual recebeu 139 contributos.
Bruno Gonçalves relembra que o trabalho foi voluntário. “Vínhamos do nosso trabalho e, muitas vezes, estávamos em reuniões horas a fio, para tentar ajudar de alguma forma na construção e elaboração deste plano”, lamenta. “Mas está tudo na mesma.”
Reivindicado por ativistas e associações antirracistas, o programa é uma resposta do Governo português ao primeiro plano de ação da União Europeia contra o racismo 2020-2025, e em que se pedia a cada estado-membro para desenvolver um projeto próprio.
Para Bruno Gonçalves, “se não fosse por essa recomendação, talvez não tivéssemos este plano”. O associativista, uma das vozes mais ativas contra a ciganofibia, sublinha ainda que “muita coisa já foi feita”, mas que ainda há muito por fazer. “Há alguma sensibilidade por parte de algumas pessoas e de alguns governantes. Mas estamos muito aquém nessa área”, comenta.
Lúcia Furtado, uma das fundadoras da FREMAFRO – Associação de Mulheres Negras, Africanas e Afrodescendentes em Portugal, defende que o plano serve “para [os governantes] mostrarem que estão a fazer alguma coisa.” Para a ativista, o plano não está “bem estruturado ou pensado” e tem “bastantes falhas” desde o início. “Tenho um pouco de dificuldade, às vezes, em perceber como querem que o plano seja bem-sucedido”, comenta.
Um plano eficaz?
Estruturado em quatro princípios transversais – desconstrução de estereótipos; coordenação, governança integrada e territorialização; intervenção integrada no combate às desigualdades e interseccionalidade – o PNCRD atua em dez áreas: governação, informação e conhecimento para uma sociedade não discriminatória; educação e cultura; ensino superior; trabalho e emprego; habitação; saúde e ação social; justiça, segurança e direitos; participação e representação; desporto e meios de comunicação e o digital.
“Muito do que está no plano” já foi tentado, diz Lúcia Furtado, “só que não era uma coisa estruturada a nível nacional”. Para que um plano nacional tenha “realmente” efeito, o primeiro ponto é a recolha de dados, defende a ativista da FEMAFRO, criticando a não inclusão da pergunta sobre origem étnico-racial nos últimos censos, realizados em 2021. “Logo partir daí, parece-me já um pouco defeituoso. Queres fazer algo, mas sem conhecer a população por quem o estás a tentar fazer”, alude.
Lúcia Furtado reprova também a criação de uma comissão não remunerada para a elaboração do plano e ainda o facto de o relatório não referir algumas comunidades com uma presença significativa em território português. “Quando o primeiro documento saiu, falava da comunidade africana, da comunidade cigana, pelo meio também tinha lá a questão do holocausto e dos judeus – não vejo bem o enquadramento dentro da sociedade portuguesa... – mas, por exemplo, estamos no século XXI, temos uma larga comunidade asiática, que tem vindo de todos os pontos da Ásia. Está atualmente também a acontecer uma série de problemáticas [com essas comunidades], e não me pareceu que sequer isso estava a ser contemplado ali pelo meio.”
Não sendo, na sua opinião, um plano bem elaborado, a ativista acredita que “daí para a frente, dificilmente poderá ser um plano realmente eficaz”, ou que vá ter algum impacto relevante. “São mais relatórios, mais algumas formações, mais algumas atividades para se apresentar a organismos internacionais para dizer ‘estamos a fazer algo’ sem estar a fazer”, denuncia.
Questionado, por email pelo Gerador, quanto às “metas do PNCRD que já foram cumpridas”, o Gabinete da Secretária de Estado da Igualdade e Migrações optou por destacar quatro “das mais recentes e estruturantes medidas” implementadas, nomeadamente, a realização de inquérito do Instituto Nacional de Estatística sobre origem da população e discriminação, “que vai incluir mais de 35 mil pessoas” – e cujos resultados ainda não são conhecidos; a criação do Observatório do Racismo e Xenofobia; a realização do Estudo Nacional sobre a situação socioeconómica das comunidades ciganas em Portugal, “para melhor sustentar políticas públicas e estratégias de ação”; e ainda "o avanço da autonomização da CICDR [Comissão para a Igualdade e Contra a Discriminação Racial]".
Sobre a última medida referida pelo gabinete de Isabel Almeida Rodrigues, o Parlamento aprovou, no passado dia 7 de julho, a proposta de lei do Governo que cria a Comissão para CICDR, que funcionará junto da Assembleia da República. A proposta surgiu na sequência da extinção do Alto Comissariado para as Migrações, do qual a CICDR ainda faz parte, e cujas funções vão ser integradas na nova Agência para a Integração, Migrações e Asilo, que surge para substituir o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras.
Observatório do Racismo e Xenofobia com pouca diversidade
A proposta de criação deste organismo tinha já constado nos Orçamentos de Estado para 2020, 2021 e 2022. Mas só em março deste ano foi finalmente formalizado o Observatório Independente do Discurso de Ódio, Racismo e Xenofobia – quatro anos depois de anunciado e apesar de, no PNCRD, a meta de execução ser 2021.
Com a missão de produzir, recolher, tratar e difundir informação e conhecimento em matéria de racismo, xenofobia e discriminação, este organismo de análise é dirigido pela professora Teresa Pizarro Beleza, atual coordenadora do Centro de Conhecimento Antígona – Clínica de Direito da Igualdade e da Discriminação da Universidade Nova de Lisboa (UNL), e ex-presidente da Faculdade de Direito da mesma instituição de ensino.
Da Comissão de Coordenação do Observatório, fazem ainda parte Manuel Lisboa, sociólogo e professor da Universidade NOVA de Lisboa, e Helena Pereira de Melo, professora da mesma universidade e especialista em Direito da Saúde e da Bioética – uma composição que foi, desde logo, alvo de várias críticas, pela ausência de pessoas racializadas.
Numa carta enviada à ministra dos Assuntos Parlamentares, que tutela o organismo, o coletivo Kilombo criticou a nomeação exclusiva de indivíduos brancos para cargos de liderança no observatório, considerando que a exclusão de indivíduos racializados desses mesmos lugares não só perpetua a desigualdade, mas também compromete a credibilidade e a eficácia do organismo. Para o grupo antirracista, a representatividade é fundamental. “Cria-se um observatório para combate ao racismo, e as pessoas que conhecemos, até agora, são pessoas que não representam de maneira nenhuma as comunidades que esse observatório pretende proteger”, lamenta Anizabela Amaral. “Isto gera-nos as maiores dúvidas sobre eficácia deste observatório, independentemente de considerarmos estas pessoas muito válidas para o seu trabalho”.
A ativista alerta, no entanto, que este não é caso único. “[A diversidade] é algo que está constantemente a ser pedido pelo comité da ONU [Organização das Nações Unidas], que acompanha a implementação da Convenção Internacional para Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial”, explica. “Há um comité que, regularmente, chama Portugal para perguntar como é que [o país] está a implementar a convenção internacional.” Nas conclusões, refere, Portugal é visto como um país que não acautela as questões de representatividade: “Aliás, todo o staff que foi, agora em março, a Genebra, para dar contas aos peritos da ONU, era composto por pessoas, de maioria de pele branca. Isto é revelador da ausência total de representatividade das pessoas que este grupo pretende proteger.”
Sublinhando que isso não quer dizer que aqueles membros não façam um bom trabalho, Anizabela A. concretiza: “O primeiro passo, de dar oportunidade a essas pessoas, não foi dado, nem vai ser dado. E ser dado este passo de uma forma simbólica, figurativa, também não faz muito sentido.”
Racismo estrutural: um tema tabu
Coordenado pela Universidade Nova de Lisboa, o Observatório do Racismo e Xenofobia incluirá parceiros de outras universidades e politécnicos, e ficará sob a alçada do ministério de Ana Catarina Mendes, que, na cerimónia de assinatura do protocolo para a criação do organismo, não se comprometeu com a ideia de que existe racismo estrutural em Portugal – um momento fortemente criticado por ativistas e associações.
Em causa, estão as palavras expressas pela governante, após a coordenadora do observatório defender a existência do fenómeno no país. “A professora Teresa Beleza disse há instantes, e bem, que não podemos falar só de racismo e xenofobia, temos de falar de racismos e xenofobia. Teremos a oportunidade de ter a discussão sobre ser ou não estrutural, e eu tenho gosto em participar nisso”, disse a ministra-adjunta e dos Assuntos Parlamentares, segundo avançado pela LUSA.
“Se não existe racismo estrutural, para que é que foi feito o plano?”, questiona Evalina Dias. “Para nós, o PNCRD foi implementado, porque o Governo reconheceu que existia um problema de racismo, xenofobia e discriminação na sociedade portuguesa”, declara a presidente da DJASS, dizendo não entender como “temos uma ministra que vai tutelar um observatório, que decorre desse plano, e que diz que não existe racismo estrutural”.
Nas palavras de Bruno Gonçalves, uma das vozes mais ativas contra a ciganofibia, “é um contrassenso”. “[O PNCRD] nasce porque todos temos noção de que a nossa sociedade tem este problema. E, se tem este problema, tivemos de elaborar um plano. Ou só o fizermos para dizer que sim?”, interroga. Para o dirigente das Letras Nómadas, “há uma inércia de alguns políticos”, que deriva do facto de o racismo, as estratégias para os imigrantes ou para os ciganos serem “temas impopulares” na sociedade portuguesa. O ativista considera por isso “que os “partidos ditos convencionais vão pela questão do eleitorado” e acrescenta: “Ainda não temos esses políticos com coragem. Temos muito boas pessoas no meio da política, que têm muita vontade e que, às vezes estão ‘asfixiadas’ de alguma forma, por outros que não querem perder os privilégios.”
Ao longo das últimas três semanas, o Gerador contactou por email os Ministérios dos Assuntos Parlamentares, Saúde, Justiça, Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Administração Interna, Educação e Cultura, com a solicitação de uma entrevista, em que se pretendia apurar o avanço das medidas previstas nas diferentes áreas governativas. Apenas o gabinete dos Ministérios da Cultura e Trabalho, Solidariedade e Segurança Social responderam, referindo não ter a tutela do plano.
Quinhentas vagas no ensino superior para alunos de escolas de zonas desfavorecidas
Para Evalina Dias, da DJASS – Associação de Afrodescendentes, este é um dos pontos mais importantes do PNCRD. O plano previa que, no ano letivo de 2022-2023, fossem criados 500 lugares extras no ensino superior e em cursos técnicos superiores profissionais, para alunos que venham de escolas do programa Territórios Educativos de Intervenção Prioritária (TEIP), que operam em contextos sociais desfavorecidos. O objetivo era que, este ano, entrassem por esta via o dobro, e que em 2025 chegassem aos dois mil.
A iniciativa – cuja implementação ainda não tem garantia de início no próximo ano letivo – não é, no entanto, consensual. “Não consideramos, de todo, que possa ser considerada uma medida de combate ao racismo”, explica Anizabela Amaral, do Kilombo. “Insurgimo-nos, desde o primeiro momento, contra esta medida. Esta medida vem realmente prever a criação de um contingente especial para os candidatos do programa TEIP no concurso nacional de acesso. Porém, em momento algum nesta medida se refere que estas vagas são para jovens pertencentes às comunidades que são vítimas de racismo e discriminação racial”, explica a jurista. Integrantes do coletivo Kilombo, acrescenta, fizeram chegar esta crítica ainda na fase da consulta pública do PNCRD. “Dizermos que estas vagas são para os alunos dos territórios TEIP não é a mesma coisa que dizermos que estas vagas são para alunos das comunidades racializadas e afrodescendentes, uma vez que os alunos dos territórios TEIP que vão aproveitar estas vagas podem ser todos homens brancos”, clarifica.
De acordo com informação disponibilizada no site oficial da Direção-Geral da Educação, o programa TEIP abrange atualmente 146 agrupamentos de escolas e escolas não agrupadas que estão localizadas em territórios económica e socialmente desfavorecidos, “marcados pela pobreza e exclusão social, onde a violência, a indisciplina, o abandono e o insucesso escolar se manifestam”.
Em declarações dadas, em julho de 2021, ao jornal Público, Rosa Monteiro, na altura secretária de Estado para a Cidadania e a Igualdade, explicou a opção do executivo de manter o contingente de alunos oriundos de escolas TEIP e não desenvolver uma política de ação afirmativa através da origem étnico-racial. A ex-governante esclareceu que se considerou melhor experimentar em Portugal “a metodologia implementada noutros países e integrada na lógica do reforço do que são as escolas TEIP”.
Em agosto do ano passado – após a falha na criação das vagas previstas no PNCRD – o Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior referiu, ao Jornal de Notícias, que, durante o ano letivo seguinte (2022/2023), seria "promovida uma reflexão sobre o regime geral de acesso ao Ensino Superior", ocasião em que essa matéria seria "ponderada”.
A abertura das vagas, no âmbito do plano de combate ao racismo e discriminação, manteve-se em suspenso, tendo, este ano, o Governo decidido criar um contingente prioritário de estudantes carenciados economicamente, com 2038 vagas, em todas as instituições de ensino superior públicas – a medida, para candidatos beneficiários de escalão A de ação social escolar, entrou em vigor, no concurso nacional de acesso que está a decorrer desde a última segunda-feira, 24 de julho.
Alterações à lei 240.º do Código Penal
Outra das medidas que ficou em suspenso foi a alteração ao artigo 240.º do Código Penal, que implica que quem exerça cargos e funções públicas, seja docente ou jornalista, possa vir a ser impedido de exercer a sua profissão se for condenado pelo crime de ódio – uma sanção acessória prevista num anteprojeto de diploma do Governo.
Com o PNCRD, “ficamos convencidos de que vai acontecer alguma coisa”, diz Anizabela Amaral. Para o coletivo Kilombo, que critica a falta de informações sobre o estado de implementação da proposta, esta é uma das bandeiras mais importantes em termos de justiça.
O programa de ação referia – todavia, sem se especificar como – a intenção de fazer a revisão “à luz dos instrumentos internacionais que vinculam o Estado português, alargando o tipo incriminador para acomodar todas as discriminações proibidas”. O artigo 240.º do Código Penal já prevê prisão para atos de violência, difamação, ameaças, fundação de organizações de propaganda que incitem ao ódio ou discriminação, mas a sua aplicação prática tem sido reduzida.
O grupo Kilombo tem sublinhado a necessidade de submeter essa proposta de revisão a consulta pública. “Era muito importante haver uma consulta aos coletivos, à sociedade civil, às organizações não governamentais que andam há muitos anos a pedir alterações neste artigo 240º e não só”, refere Anizabela A., alertando que há outras medidas legislativas previstas no plano de forma “muito pouco clara”.
A jurista clarifica: “Quando se diz, por exemplo, o robustecimento do sistema sancionatório, contraordenacional, revendo as molduras das coimas e condutas sancionadas, isto é muito geral, mas está aqui nos indicadores que o que se vai considerar como cumprido será proposta de lei aprovada.” Ora, até haver uma proposta de lei aprovada, esclarece, “há todo um trabalho legislativo que tem de ser feito antes, para o qual achamos que seria importante serem consultados os coletivos”. A integrante do Kilombo procurou saber mais informação, no âmbito de uma apresentação para o 1.º Encontro de Intervenção Anti-Racista, que decorreu em julho deste ano. Mas, sem ter consigo perceber “se existe algum grupo de trabalho”, conclui: “Já estão dados alguns passos, mas nada disto é transparente.”
Para o coletivo, as medidas relacionadas com a área da segurança, justiça e direito assumem especial importância no plano. Das ações já realizadas, Anizabela Amaral sublinha a assinatura do Protocolo de Cooperação no Quadro do Plano de Combate ao Racismo e Discriminação com a Ordem dos Advogados. No entanto, ressalva, “o protocolo também é bastante superficial naquilo que são as suas medidas, a sua execução, o seu âmbito”. O “lançamento de um projeto piloto de apoio jurídico”, considera, “é a medida mais concreta que aqui está.” E mais uma vez, a falta de informação: “Há pessoas do coletivo Kilombo que, inclusive, instaram a Ordem dos Advogados diretamente através do email, para saber em que fase de implementação é que está este protocolo de cooperação, sem terem obtido resposta”.
Ainda no âmbito do que está previsto no plano, dá conta a ativista, entraram em funções, em abril deste ano, os oficiais de direitos humanos da Polícia de Segurança Pública, Guarda Nacional Republicana e Serviço de Estrangeiros e Fronteiras. Estes oficiais têm como missão trabalhar com a Inspeção-Geral da Administração Interna, na monitorização do plano de prevenção de discriminação nas polícias.