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Opinião de Paula Cardoso

Fundadora da comunidade digital “Afrolink”, que visibiliza profissionais africanos e afrodescendentes residentes em Portugal ou com ligações ao país, é também autora da série de livros infantis “Força Africana”, projetos desenvolvidos para promover uma maior representatividade negra na sociedade portuguesa. Com o mesmo propósito, faz parte da equipa do talk-show online “O Lado Negro da Força”, e apresentou a segunda temporada do “Black Excellence Talk Series”, formato transmitido na RTP África. No mesmo canal, assume, desde Outubro de 2023, a apresentação do magazine cultural Rumos. Integra ainda o Fórum dos Cidadãos, que visa contribuir para revigorar a democracia portuguesa, bem como os programas HeforShe Lisboa e Bora Mulheres, de mentoria e empreendedorismo feminino. É natural de Moçambique, licenciou-se em Relações Internacionais e trabalhou como jornalista durante 17 anos, percurso iniciado na revista Visão. Assina a crónica “Mutuacção” no Setenta e Quatro, projeto digital de jornalismo de investigação, é uma das cronistas do Gerador, e pertence à equipa de produção de conteúdos do programa de televisão Jantar Indiscreto. Em Março de 2023 foi apontada pela revista de negócios “Success Pitchers” como uma das “10 Mulheres Líderes Mais Inspiradoras do Empreendedorismo Social”, distinção que sucedeu à indicação, em 2022, pela Euclid NetWork, como uma das “Top 100 Women In Social Enterprise” da Europa de 2022.

Chimamanda p’ra branco ver…mas não ler! 

Nas Gargantas Soltas de hoje, Paula Cardoso fala-nos sobre o “branqueamento” da vinda da escritora Chimamanda Ngozi Adichie a Portugal, prevista para a próxima semana.

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Como assim? A Chimamanda vem a Portugal? Quando? Fazer o quê?

Num entra e sai de mensagens de WhatsApp, apercebo-me, tardiamente, da vinda de Chimamanda Ngozi Adichie a Lisboa.

“Vai estar na FLAD no dia 14 de Maio, às 18h30, para uma conversa com os leitores e a jornalista do Público Isabel Lucas”.

Confirmo a notícia a partir dessa mensagem, publicada nas redes sociais da Fundação Luso-Americana - Para o Desenvolvimento – ou simplesmente FLAD –, mas continuo incrédula.

Como assim? A Chimamanda vem a Portugal, e, tendo em conta a sua identidade, obra e pensamento, ninguém achou importante envolver, na programação, mulheres negras e/ou colectivos negros?

“Um dos grandes objectivos desta iniciativa é permitir o contacto e a conversa entre o público e os autores, pelo que no final de cada sessão todas as intervenções/perguntas são bem-vindas”, contorciona a FLAD, revelando uma confrangedora incapacidade de compreender a crítica de embranquecimento do programa que lhe foi dirigida.

“As instituições continuam a repetir as mesmas falhas”, lamenta Melissa Rodrigues, programadora de Discurso no TBA – Teatro do Bairro Alto em Lisboa, secundando um comentário publicado pela artista e poeta Gisela Casimiro, que passo a reproduzir: “Fico muito contente com a vinda de Adichie, mas gostaria que também estivesse à conversa com pessoas negras que não apenas as do público”.

Tanto Melissa como Gisela, mulheres, negras, feministas, e tanto mais, poderiam ser as anfitriãs da conversa com Chimamanda, possibilidade que a FLAD não revela, contudo, qualquer abertura para acolher. 

Pelo contrário, a Fundação explica que a autora do best-seller “Americanah” viajará a seu convite, no âmbito da iniciativa “Meet the Author”, formato iniciado em 2022, e que  conta, desde o primeiro momento, com Isabel Lucas na condução.

Os anfitriões do costume

Bem lidas as coisas, é caso para escrever que a FLAD parou no tempo. 

Felizmente não foi na época do tráfico transatlântico de seres humanos, “engenho” português que condenou pessoas negras à desumanização, explorando-as como se fossem mercadorias.

Infelizmente, também não foi em 2022 que a FLAD parou: embora tenha sido esse o ano de estreia do “Meet the Author”, as lutas pela igualdade racial são muito anteriores a essa data. 

Aliás, bastaria conhecer um pouco do pensamento e da obra de Chimamanda para perceber que a sua assinatura é indissociável desse combate.

Na realidade, talvez esteja aí o problema: apesar dos estrondosos alertas da escritora nigeriana sobre “O perigo da História única”, a FLAD não consegue sair do ‘guião do humano universal’. Que é como quem diz, aquele em que se diz que todas as histórias importam, mas no qual só se reconhece a algumas pessoas – por norma, brancas – o direito de as contar e escrever.

Não nos iludamos: Chimamanda está no palco porque se tornou um fenómeno incontornável, Isabel Lucas porque tem acessos que, em 2025 – e com todos os méritos que lhe possam ser atribuídos –, continuam reservados aos anfitriões de sempre.

É também sobre isso que nos fala a escritora nigeriana, nos livros, palestras, e incontáveis presenças online. Numa entrevista de 2022, por exemplo, durante uma viagem ao Brasil, Chimamanda partilhou o seu choque racial: “Lembro-me de ter ficado impressionada com a ausência de pessoas negras. Então perguntei ao meu redor: ‘Onde estão os negros?’”.

Talvez a pergunta se volte a impor em breve, com a vinda a Portugal, e devolva a mesma certeza evidenciada no Brasil. “Acho que isso é algo que deveria mudar, porque se vivemos numa democracia, a ideia de democracia é que todos devem ser representados”.  Sempre, e em todos os lugares.

As posições expressas pelas pessoas que escrevem as colunas de opinião são apenas da sua própria responsabilidade.

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