Era suposto ser simples. Perante a existência de uma emergência climática cientificamente comprovada, inegável, global, o mundo reúne-se para a resolver.
Devia ser como um filme de Hollywood, perante uma emergência como uma invasão de alienígenas, todos se unem para resolver o problema, arriscando a própria vida para o fazer. Depois todos juntos celebram o salvamento do planeta, vem o genérico e voltamos todos para casa, felizes e contentes.
O espantoso é que, na situação presente, a humanidade corre efetivamente o risco de não sobreviver e, ao invés de se unir para resolver de vez o problema, cujas soluções conhece e domina, simplesmente não o faz. Não só não o faz como recorre a constantes adiamentos, agravando o flagelo.
A COP26 - 26.ª Conferência das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas, na qual a ZERO marcará presença, realiza-se de 31 de outubro a 12 de novembro, em Glasgow e irá discutir os próximos passos no âmbito da implementação do Acordo de Paris, alcançado na COP21, em 2015. Os principais objetivos a negociar serão:
1 - Garantir a neutralidade carbónica em 2050, limitando o aquecimento global a 1,5ºC;
2 - Adotar medidas de adaptação para proteger comunidades e habitats naturais;
3 - Concretizar a mobilização financeira;
4 - Unir esforços para obter resultados.
No presente estado das coisas, teríamos mais sorte em mobilizar as pessoas no poder se uns alienígenas decidissem, efetivamente, invadir o planeta Terra.
Além da ausência presencial de líderes de países fundamentais como a China, a Índia e a Rússia, somos ainda confrontados com as intenções de aumento de produção por parte de alguns dos grandes produtores de carvão – de acordo com o Production Gap Report 2021, apresentado esta semana pelo Programa Ambiental da ONU (UNEP).
Há crise energética? De quem é a responsabilidade? Quem é que tem adiado sistematicamente a resolução dos problemas? Porque é que ainda não temos autonomia energética? Porque é que vendemos as redes elétricas à iniciativa privada e esperamos por preços justos? Porque é que dificultamos a produção própria de energia, burocratizando e taxando até o pequeno produtor desistir?
A COP26 poderá resultar se for um ponto de viragem. Caso falhe, caso continue com a ambição controlada de quem empurra os problemas para a frente para ser o seguinte a lidar com eles, o aumento da temperatura não vai ser de 1,5º C. Não se trata apenas de falta de ambição das metas, trata-se de um efetivo retrocesso das políticas ambientais que poderia ser evitado, caso a transição energética tivesse sido uma prioridade estratégica global. E é nesse sentido que, no âmbito da COP26, a ZERO apoia um tratado entre países para a não proliferação de combustíveis fósseis.
10 anos passam num ápice e é por isso mesmo que consideramos que a COP26 é determinante para estabelecer ações concretas que permitam fechar de uma vez por todas este intervalo num horizonte de curto a médio prazo. Esta década é a mais decisiva para conter o aumento de temperatura até ao final do século.
Os líderes mundiais têm uma oportunidade. “Ainda há tempo para conseguir limitar a subida média das temperaturas a 1,5°C, mas a janela de oportunidade está a fechar-se rapidamente”, frisou Inger Andersen, diretora-executiva da UNEP, na apresentação do Production Gap Report 2021. Vamos a isso.
-Sobre Francisco Ferreira-
Francisco Ferreira é Professor Associado no Departamento de Ciências e Engenharia do Ambiente da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa (FCT-NOVA) e investigador do CENSE (Centro de Investigação em Ambiente e Sustentabilidade). É licenciado em Engenharia do Ambiente pela FCT-NOVA, mestre por Virginia Tech nos EUA e doutorado pela Universidade Nova de Lisboa. Tem um significativo conjunto de publicações nas áreas da qualidade do ar, alterações climáticas e desenvolvimento sustentável. Foi Presidente da Quercus de 1996 a 2001 e Vice-Presidente entre 2007 e 2011. Foi membro do Conselho Nacional da Água e do Conselho Nacional de Ambiente e Desenvolvimento Sustentável. Atualmente é o Presidente da “ZERO – Associação Sistema Terrestre Sustentável”, uma organização não-governamental de ambiente com atividade nacional.