Não só sou emigrante como a minha área profissional é a integração de pessoas migrantes, que estão em situação irregular. Estar longe da nossa rede de apoio, não falar o idioma do país ou adaptar a uma nova cultura foram alguns dos desafios que passei. Também enfrentei algumas situações discriminatórias como estar no autocarro a falar português e mandarem-me calar com raiva ou ouvir piadas xenófobas contra os portugueses. Estes são só alguns exemplos, pois a lista continua.
Ser emigrante tem sido, e continua a ser, desafiante, não importa quanto tempo passe. Tanto em 2014, na primeira vez que emigrei, como hoje enfrento obstáculos. Porém, sei que sou uma privilegiada: sou migrante económica em situação regular e branca. Não fujo de uma guerra, sem poder voltar atrás. O meu país está em paz e posso regressar de férias. Posso apanhar um avião em segurança e não percorrer uma rota perigosa por mar. A nacionalidade no meu cartão de cidadão europeu não me torna uma ameaça.
Num mundo cada vez mais globalizado e com cada vez mais liberdade de movimento, as políticas de integração de migrantes, sejam eles económicos, requerentes de asilo e/ou refugiados são débeis. Esta é uma área ainda pouco desenvolvida e, no geral, não se ouve falar do tema. Na verdade, nem nos importamos, desde que eles estejam quietos no seu canto e não nos chateiem. Não fazemos um esforço para os ajudar e, como são eles a vir “para aqui”, achamos que são os imigrantes que têm de fazer todo o trabalho para a sua própria integração.
Até que algo acontece, como vimos no passado dia 28 de Março e o tema da integração de imigrantes volta à ordem do dia, mesmo que efêmero. Só nos preocupamos realmente quando algo assim acontece ou quando necessitamos deles para colher fruta em condições inumanas, porque preferimos pagar por fruta barata ou para trabalhar em empregos precários que não queremos.
Quantas vezes já ouvimos dizer “Eles não se querem integrar”? Mas será que nós, como comunidade de acolhimento, lhes damos oportunidades de trabalho ou os convidamos a participar em atividades da nossa sociedade.
Quantas vezes ouvimos “Se fechassem as fronteiras isso não acontecia”? E todos os outros crimes praticados por portugueses? Também deviam fechar a fronteira do município de de um agressor de nacionalidade portuguesa? Em 2020, menos de 16% da população reclusa em Portugal tinha nacionalidade estrangeira.
Quantas vezes ouvimos dizer “São parasitas, só custam dinheiro ao estado”? No entanto, em 2021 tivemos o número mais alto de sempre de contribuições de imigrantes para a Segurança Social: mais de 1200 milhões de euros.
Os governos estão a falhar. Desde o momento em que uma pessoa que chega num barco a um país é considerada criminosa. Quando um bote de borracha está a afundar em alto mar e não aceitam a responsabilidade de salvamento. Quando criam acordos com países aos quais pagam milhões para enviar os requerentes de asilo. Quando não existe um plano de apoio de saúde mental adequado. Quando não existem aulas suficientes do idioma do país. Quando existe um sistema burocrático longo e difícil que muitos não sabem navegar. E até quando não é oferecida a possibilidade apoio de tradutores no acesso a cuidados de saúde.
Não quero simplificar um problema tão complexo, nem retirar responsabilidade ao Estado que deve fazer mais e melhor, não dependendo apenas de organizações não governamentais para resolver estas necessidades sociais. Porém acredito que só vamos alcançar uma integração completa e verdadeira, quando nós, sociedade, quebrarmos os estereótipos negativos, tivermos mentes mais abertas e um papel mais ativo no processo de integração de quem vem para o nosso país. A comunidade de acolhimento tem um papel fundamental na integração de migrantes e vários estudos mostram que um dos fatores mais importantes é a coesão social. O que podemos fazer? Para começar, deixar de lado estereótipos xenófobos e racistas; oferecer uma proposta de trabalho sem olhar a nacionalidade; promover atividades culturais; entre muitas outras.
No outro dia um amigo foi passar uma tarde no centro para imigrantes em situação irregular onde trabalho. No final da atividade diz-me “Se todos os que são contra a emigração, fossem passar o dia com os emigrantes, mudariam de opinião. Somos pessoas com os mesmos objetivos, uma vida melhor, porque criamos segregação?”. A solução está em nós, mas não a queremos ver.
-Sobre Teresa Valente-
Descreve-se como cidadã do mundo apesar de ter Abrantes sempre no coração. Licenciou-se em psicologia, com a certeza que seria psicóloga clínica, mas a vida trocou-lhe as voltas! Acabou a fazer um mestrado em Conflito, Governação e Desenvolvimento Internacional na Universidade de East Anglia.
Devido à sua forte presença na esfera associativa já teve a oportunidade de beneficiar de múltiplas programas internacionais. Co-fundou a Associação Youth Cluster em 2020 com o objetivo de promover oportunidades inclusivas e acessíveis a todas as pessoas jovens. Através do seu trabalho na Youth Cluster e, em cooperação com outras organizações, tem reivindicado por igualdade de oportunidades e melhores políticas para a juventude.