fbpx

Apoia o Gerador na construção de uma sociedade mais criativa, crítica e participativa. Descobre aqui como.

Opinião de Tiago Sigorelho

Se eu não gostar de mim, quem gostará?

Nas Gargantas Soltas de hoje, Tiago Sigorelho fala-nos sobre a batalha entre o individual e o colectivo “Na verdade, somos produtos de contextos comunitários. Ninguém consegue procurar a sua felicidade desligado das pessoas e estruturas que o rodeiam.”

Apoia o Gerador na construção de uma sociedade mais criativa, crítica e participativa. Descobre aqui como.

Nos anos 90, não consigo precisar exatamente quando, o Leite Matinal corporizava, num anúncio publicitário, um sentimento generalizado na altura das sociedades ocidentais: primeiro tenho de me focar em mim. A assinatura “Se eu não gostar de mim, quem gostará?” preenchia na perfeição um novo espaço de hedonismo dominante criado na ressaca liberal dos anos 80, com Thatcher e Reagan.

É óbvio que a ideia de celebração do individuo já existe há muito tempo. Basta pensar que a história sempre deu um grande destaque às narrativas personalizadas, desde Jesus, passando por Napoleão até ao Churchill. E também lembrar que a sociedade se entretém a premiar pessoas de várias formas, quer seja na reserva de um lugar num qualquer panteão, quer na avaliação subjetiva do trabalho científico, como os Prémios Nobel.

Mas foi na intersecção dos séculos XX e XXI que a desvalorização do pensamento colectivo e a centralidade atomizada mais se desenvolveu. Algumas organizações passaram a perder influência, como os sindicatos, o associativismo e as entidades de base mutualista. O individuo passou a ser mais relevante, talvez mais no papel de consumidor do que de cidadão.

O colectivo, hoje, é muitas vezes visto como a soma das felicidades individuais. A cada um de nós basta-nos o papel de lutar, de todas as maneiras possíveis, pela nossa própria felicidade. A aritmética básica encarregar-se-á de garantir sociedades felizes.

No entanto, na verdade, somos produtos de contextos comunitários. Ninguém consegue procurar a sua felicidade, a sua notoriedade, a sua influência, desligado das pessoas e estruturas que o rodeiam. 

Há, primeiro, um conjunto de hiper-colectivos dos quais beneficiamos sem notar muito neles. Talvez o mais importante é todo o conhecimento que os humanos já acumularam desde a sua existência e que nos permite ter acesso a tecnologia diferente daquela que os nossos primos da idade média disponham. E há muito outros hiper-colectivos que estão sempre presentes nas nossas vidas, mas que os assumimos como garantia: desde uma ordem política organizada, à gestão das regras de trânsito ou simplesmente a um sistema de esgotos.

Depois existem colectivos que continuam a ser fundamentais na nossa vida, sem os quais seria impossível o individuo, per si, sobreviver e evoluir. Como seria se não tivéssemos escolas, hospitais, teatros, museus? Estamos dependentes dos colectivos para podermos florescer individualmente.

Mas se podemos olhar o final do século passado como o primeiro grande momento desta centralidade egocêntrica, uma segunda revolução surge com a criação das redes sociais. Essa invenção trouxe uma horizontalidade agressiva entre a opinião de um leigo e de um especialista, de uma entidade referência e de um perfil falso.

Hoje estamos assim, portanto. Celebra-se a individualidade, menospreza-se o colectivo. Como poderemos resolver os problemas mundiais se apenas agirmos em nome pessoal? Haverá, algum dia, capacidade de fazer um combate efectivo às alterações climáticas? Seremos capazes, alguma vez, de encontrar uma estratégia para diminuir a força dos partidos de extrema-direita? Encontraremos um sistema para derrotar a desigualdade que persiste?

Se eu só gostar de mim, quem beneficiará?

-Sobre Tiago Sigorelho-

Esteve ligado durante 15 anos ao setor das telecomunicações, onde chegou a Diretor de Estratégia de Marca do Grupo PT, com responsabilidades das marcas nacionais e internacionais e da investigação e estudos de mercado. Em 2014 criou o Gerador e tem sido o presidente da direção desde a sua fundação. Tem continuamente criado novas iniciativas relevantes para aproximar as pessoas à cultura, arte, jornalismo e educação, como a Revista Gerador, o Trampolim Gerador, o Barómetro da Cultura, o Festival Descobre o Teu Interior, a Ignição Gerador ou o Festival Cidades Resilientes. Nos últimos 10 anos tem sido convidado regularmente para ensinar num conjunto de escolas e universidades do país e já publicou mais de 50 textos na sua coluna quinzenal no site Gerador, abordando os principais temas relacionados com o progresso da sociedade.

As posições expressas pelas pessoas que escrevem as colunas de opinião são apenas da sua própria responsabilidade.

Publicidade

Se este artigo te interessou vale a pena espreitares estes também

12 Setembro 2025

Tempos livres. Iniciativas culturais pelo país que vale a pena espreitar

10 Setembro 2025

No gerador ainda acreditamos no poder do coletivo

8 Setembro 2025

PHDA nas mulheres: como o preconceito de género influencia a nossa saúde mental

5 Setembro 2025

Tempos livres. Iniciativas culturais pelo país que vale a pena espreitar

3 Setembro 2025

Viver como se fosse música

1 Setembro 2025

Aborto em Itália: “O governo tem a capacidade de combinar neofascismo e neoliberalismo”

29 Agosto 2025

Tempos livres. Iniciativas culturais pelo país que vale a pena espreitar

27 Agosto 2025

A lição do Dino no Couraíso

25 Agosto 2025

Produzir e consumir sem lucro

22 Agosto 2025

Tempos livres. Iniciativas culturais pelo país que vale a pena espreitar

Academia: cursos originais com especialistas de referência

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Jornalismo Literário: Do poder dos factos à beleza narrativa [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Financiamento de Estruturas e Projetos Culturais [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Desarrumar a escrita: oficina prática [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Fundos Europeus para as Artes e Cultura I – da Ideia ao Projeto [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Jornalismo e Crítica Musical [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Comunicação Cultural [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Criação e Manutenção de Associações Culturais

Duração: 15h

Formato: Online

Investigações: conhece as nossas principais reportagens, feitas de jornalismo lento

02 JUNHO 2025

15 anos de casamento igualitário

Em 2010, em Portugal, o casamento perdeu a conotação heteronormativa. A Assembleia da República votou positivamente a proposta de lei que reconheceu as uniões LGBTQI+ como legítimas. O casamento entre pessoas do mesmo género tornou-se legal. A legitimidade trazida pela união civil contribuiu para desmistificar preconceitos e combater a homofobia. Para muitos casais, ainda é uma afirmação política necessária. A luta não está concluída, dizem, já que a discriminação ainda não desapareceu.

12 MAIO 2025

Ativismo climático sob julgamento: repressão legal desafia protestos na Europa e em Portugal

Nos últimos anos, observa-se na Europa uma tendência crescente de criminalização do ativismo climático, com autoridades a recorrerem a novas leis e processos judiciais para travar protestos ambientais​. Portugal não está imune a este fenómeno: de ações simbólicas nas ruas de Lisboa a bloqueios de infraestruturas, vários ativistas climáticos portugueses enfrentaram detenções e acusações formais – incluindo multas pesadas – por exercerem o direito à manifestação.

Carrinho de compras0
There are no products in the cart!
Continuar na loja
0