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Opinião de Francisco Cipriano

O que é que a “bazuca” europeia nos traz para a cultura?

Devemos reconhecer as habilidades do nosso Primeiro Ministro António Costa no que toca a designações…

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Devemos reconhecer as habilidades do nosso Primeiro Ministro António Costa no que toca a designações curiosas para temas sérios que rapidamente nos ficam no ouvido e circulam amplamente na comunicação social. Primeiro a “geringonça”, agora a “bazuca” dos fundos europeus. As tais designações curiosas ampliam o debate e permitem alargar o conhecimento de todos sobre matérias mais ou menos complexas ou mais ou menos técnicas. Do termo bazuca, vem-nos à memória a arma militar de elevada potência usada sobretudo para disparar granadas. A analogia simples, transporta-nos para algo muito potente, neste caso financeiramente, que permitirá a recuperação económica do nosso país. Mas será que sabemos mesmo o que está por detrás desta nova designação? E no meio desta “chuva” de milhões, o que é que a “bazuca” nos traz para o setor cultural?

Vamos antes imaginar um cenário nos apoios europeus caso o mundo não tivesse sido atingido por uma pandemia. Com um Portugal 2020 a terminar, seria expetável que Portugal viesse a negociar o seu próximo Quadro Financeiro Plurianual 2021-2027 (QFP 2021-2027) da União Europeia com sucesso, cuja negociação até já se tinha iniciado em maio de 2018. Quem sabe com uma dotação mais modesta, o Quadro Financeiro Plurianual 2021-2027 ou Portugal 2030 assumiria a continuidade dos apoios estruturais da política de coesão da União Europeia. O processo de preparação do pós-Portugal 2020 teve início em 2017 e encontrava-se em fase de conclusão no início de 2020, com a identificação das principais linhas de força para o desenvolvimento socioeconómico do país, tendo em conta os seus constrangimentos estruturais.

Em 2020, a situação pandémica e as profundas consequências em matéria de desenvolvimento económico e social, obrigam a ajustamentos estratégicos e operacionais no nosso Quadro Financeiro Plurianual, e ao nível europeu provocou uma verdadeira revolução. O elemento central foi o Mecanismo de Recuperação e Resiliência ou Next Generation EU, um mecanismo extraordinário desenhado para apoiar as reformas e os investimentos realizados pelos países da UE na crise pandémica com o objetivo imediato de atenuar o impacto económico e social da pandemia de coronavírus e tornar as economias e sociedades europeias mais sustentáveis, resilientes e mais bem preparadas para os desafios e as oportunidades das transições ecológica e digital.

A União Europeia apresentou o instrumento Next Generation EU que contribuirá com fundos adicionais e com fundos de vários programas europeus e um impacto imediato nos programas em vigor ainda em 2020 através de uma reprogramação do Portugal 2020, permitindo iniciativas rápidas como o Programa Apoiar ou o Garantir Cultura, e outro de longo prazo que se vem a consubstanciar no tão falado Plano de Recuperação e Resiliência (PRR). Ora é justamente a soma deste novo Plano de Recuperação e Resiliência com as verbas do próximo Quadro Financeiro Plurianual 2021-2027 que origina um montante inigualável de fundos comunitários ao dispor de Portugal, nunca vistos em nenhum momento da nossa história europeia e de onde resulta o termo “bazuca”.

Estrategicamente, o QFP 2021-2027 deverá ser um mecanismo que permita uma transição justa e inclusiva para um futuro ecológico e digital, apoiando a autonomia estratégica da União Europeia a longo prazo, tornando-a resiliente aos choques futuros, onde está prevista uma dotação de €33,6 mil milhões para o período compreendido entre 2021 e 2027.

Já para ao PRR português, estão destinados €16,6 milhões programados em três eixos principais: Resiliência, Transição climática e Transição digital, que permitirão implementar a título extraordinário um conjunto de reformas e de investimentos para que o país possa retomar o crescimento económico sustentado, mas note-se, com duração apenas até 2026.

Mas no PRR e no que toca à Cultura não começámos bem. Na primeira proposta de PRR enviada à Comissão Europeia a cultura foi esquecida. Felizmente em sede de revisão no período pós consulta pública, o Governo confirmou novas componentes, uma delas destinada à cultura. O objetivo geral desta componente passa por valorizar as artes, o património e a cultura enquanto elementos de afirmação da identidade, da coesão social e territorial e do aumento da competitividade económica das regiões e do país através do desenvolvimento de atividades de âmbito cultural e social de elevado valor económico.

A “nova” componente C4, cultura, visa abordar desafios em duas áreas específicas: Promoção da transição digital das redes culturais através da sua modernização tecnológica e da digitalização de artes, literatura e património e valorização; salvaguarda e dinamização do património cultural, no sentido amplo de património cultural material, imaterial e natural. Os investimentos que permitirão responder a estes desafios ascendem a €243 M.

No que toca às Redes Culturais e Transição Digital (€93 M), pretende-se aumentar a sofisticação tecnológica e a qualidade da obra digital, o que permitirá alcançar novos públicos, aumentar o consumo geral de cultura, alcançar novos modelos de negócio e promover o desenvolvimento empresarial nas áreas culturais de forte componente tecnológica. Nesta área já foram identificados investimentos prioritários; na modernização da infraestrutura tecnológica da rede de equipamentos culturais (equipamentos informáticos, bibliotecas itinerantes online, sistemas de informação e catálogos integrados para 239 bibliotecas públicas); na digitalização de artes e património (digitalização e virtualização do espólio de bibliotecas públicas e arquivos nacionais, digitalização de acervos de museus públicos, visitas virtuais em 65 museus, digitalização de 1 000 filmes portugueses da Cinemateca); e por fim na internacionalização, modernização e transição digital do livro e dos autores, prevendo-se a tradução de obras literárias e edição de audiobooks e ebooks, a modernização e transição digital das livrarias e a criação da plataforma de empréstimo de livros eletrónicos.

A segunda área, o Património Cultural (€150 M), tem como objetivos a preservação e reabilitação do património, combatendo a obsolescência, melhorando o desempenho energético e mitigar consequências de fenómenos extremos. Onde igualmente já foram identificados investimentos prioritários: a requalificação e conservação dos museus, monumentos e palácios nacionais (intervenções em 46 museus, palácios e monumentos), requalificação dos Teatros Nacionais (intervenções no Teatro Nacional S. Carlos, no Teatro Nacional D. Maria II e no Teatro Camões) e a implementação do programa “Saber Fazer”, uma iniciativa para programas de ensino das artes e ofícios tradicionais e iniciativas de dinamização do nosso património imaterial. Facto é que o surto pandémico da COVID-19 que afetou profundamente a vida de toda a população e que representou um forte choque para toda a estrutura cultural foi também o vetor que expôs um conjunto de vulnerabilidades que agora carecem de atenção. Uma atenção mais ou menos urgente, mas que pode ser decisiva e encontrar um caminho sólido para a afirmação e reconhecimento do setor cultural e criativo nacional.

-Sobre Francisco Cipriano-

Nasceu a 20 de maio de 1969, possui grau de mestre em Geografia e Planeamento Regional e Local. A sua vida profissional está ligada à gestão dos fundos comunitários em Portugal e de projetos de cooperação internacional, na Administração Pública Portuguesa, na Comissão Europeia e atualmente na Fundação Calouste Gulbenkian. É ainda o impulsionador do projeto Laboratório de Candidaturas, Fundos Europeus para a Arte, Cultura e Criatividade, um espaço de confluência de ideias e pessoas em torno  das principais iniciativas de financiamento europeu para o setor cultural. Para além disso é homem para muitas atividades: publicidade, escrita, fotografia, viagens. Apaixonado pelo surf vê̂ nas ondas uma forma de libertação e um momento único de harmonia entre o homem e a natureza. É co-autor do primeiro guia nacional de surf, Portugal Surf Guide e host no documentário Movement, a journey into Creative Lives. O Francisco Cipriano é responsável pelo curso Fundos Europeus para as Artes e Cultura – Da ideia ao projeto que pretende proporcionar motivação, conhecimento e capacidade de detetar oportunidades de financiamento para projetos artísticos e culturais facilitando o acesso à informação e o conhecimento sobre os potenciais instrumentos de financiamento.

Texto de Francisco Cipriano
Fotografia da cortesia de Francisco Cipriano

As posições expressas pelas pessoas que escrevem as colunas de opinião são apenas da sua própria responsabilidade.

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