fbpx

Apoia o Gerador na construção de uma sociedade mais criativa, crítica e participativa. Descobre aqui como.

Opinião de Leonel Moura

Política cultural

Ninguém lê programas eleitorais. Entende-se. Ao invés de manifestos mobilizadores, são meras listagens de intenções,…

Apoia o Gerador na construção de uma sociedade mais criativa, crítica e participativa. Descobre aqui como.

Ninguém lê programas eleitorais. Entende-se. Ao invés de manifestos mobilizadores, são meras listagens de intenções, de baixa ou nenhuma qualidade literária. Mas eu li, pelo menos na parte onde referem as propostas para a cultura.

O panorama é desolador. Não existe um único partido que apresente uma visão atualizada do que é a cultura nos nossos dias. Pelo contrário, da extrema-esquerda à extrema-direita todos os programas, sem exceção, são conservadores e tradicionalistas, focando-se sobretudo na defesa do património, banalidades sobre a promoção da criação contemporânea e, com exceção dos mais à direita, propondo um aumento do funcionalismo e da burocracia.

O programa do PS, o partido que está em melhores condições para voltar a governar, elenca as mesmas ideias generalistas seguidas pelos sucessivos ministros da cultura dos seus governos, muito politicamente corretas, mas que na realidade não têm representado o sobressalto que a cultura precisa. Configurado, à maneira do discurso serial, em “seis prioridades fundamentais: a promoção do livro e da leitura; o património cultural; a criação artística; a promoção do cinema e do audiovisual; a descentralização; e a internacionalização”, o PS promete sobretudo continuidade. O que é pouco.

O programa do PSD, o segundo partido com possibilidade de aceder ao governo, não é melhor. Embora, numa linha solta, proponha a “digitalização sistemática das obras musealizadas e dos fundos arquivísticos”, no geral, repete a mesma sucessão de verbos, “preservar e valorizar o legado, promover a criação, potenciar a comunicação e democratizar a fruição”, sem que isso represente uma visão alternativa. Diria mesmo, uma qualquer visão.

O CDS quer mais touradas, o Iniciativa Liberal quer mais mecenato, o Chega não quer nada.

À esquerda do PS a cultura é funcionalista e conservadora. Tanto Bloco como PC, tratam sobretudo dos direitos laborais, o que é legítimo, mas não entram no domínio cultural propriamente dito. A cultura é reduzida a mais um Serviço Público, vista como um apêndice da Educação. O Livre quer “incentivar a digitalização da Cultura”, mas através da RTP, o que não se entende e levanta a suspeita de que não sabem do que falam. O PAN trata o assunto ao nível do rodapé.

Enfim, em 2022 seria de esperar mais. A cultura do nosso tempo define-se pela preponderância das tecnologias digitais em todos os domínios, desde a preservação, arquivo e divulgação do património, quanto na produção contemporânea e na forma como se dissemina. Não se entende como ninguém propõe a urgência óbvia, ou seja, um vasto programa de digitalização de tudo. E, quando refiro tudo, é mesmo tudo, registos, objetos, processos, realizações. Vivendo nós num online permanente, a caminho dos metaversos, a cultura do nosso tempo é na verdade uma cultura digital, tanto na criação quanto na difusão. O que não está digitalizado não existe, ou só existe para um número muito limitado de pessoas. Por isso, o grande projeto cultural do momento, na perspetiva das entidades públicas, e, já agora, das privadas também, deveria ser o de empreender um vasto e ambicioso programa de digitalização. Sem isso, para quem tanto se preocupa com o património e a identidade, não existimos. Por outro lado, a criação contemporânea ou é digital ou é rudimentar, artesanal, separada do mundo real, não cumprindo o principal objetivo da criatividade artística, ou seja, o de ser um motor do conhecimento e da evolução civilizacional. Nestas eleições, nenhum programa partidário o anuncia.

-Sobre Leonel Moura-

Leonel Moura é pioneiro na aplicação da Robótica e da Inteligência Artificial à arte. Desde o princípio do século criou vários robôs pintores. As primeiras pinturas realizadas em 2002 com um braço robótico foram capa da revista do MIT dedicada à Vida Artificial. RAP, Robotic Action Painter, foi criado em 2006 para o Museu de História Natural de Nova Iorque onde se encontra na exposição permanente. Outras obras incluem instalações interativas, pinturas e esculturas de “enxame”, a peça RUR de Karel Capek, estreada em São Paulo em 2010, esculturas em impressão 3D e Realidade Aumentada. É autor de vários textos e livros de reflexão, artística e filosófica, sobre a relação Arte e Ciência e as implicações, culturais e sociais, da Inteligência Artificial. Recentemente, esteve presente nas exposições “Artistes & Robots”, Astana, Cazaquistão, 2017, no Grand Palais, Paris, 2018, na exposição “Cérebro” na Gulbenkian, 2019 e no Museu UCCA de Pequim, 2020. Em 2009 foi nomeado Embaixador Europeu da Criatividade e Inovação pela Comissão Europeia.

Texto de Leonel Moura
Fotografia Bebot
A opinião expressa pelos cronistas é apenas da sua própria responsabilidade.

As posições expressas pelas pessoas que escrevem as colunas de opinião são apenas da sua própria responsabilidade.

Se este artigo te interessou vale a pena espreitares estes também

29 Outubro 2025

Catarina e a beleza de criar desconforto

22 Outubro 2025

O que tem a imigração de tão extraordinário?

15 Outubro 2025

Proximidade e política

7 Outubro 2025

Fronteira

24 Setembro 2025

Partir

17 Setembro 2025

Quando a polícia bate à porta

10 Setembro 2025

No Gerador ainda acreditamos no poder do coletivo

3 Setembro 2025

Viver como se fosse música

27 Agosto 2025

A lição do Dino no Couraíso

13 Agosto 2025

As mãos que me levantam

Academia: cursos originais com especialistas de referência

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Jornalismo Literário: Do poder dos factos à beleza narrativa [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Jornalismo e Crítica Musical [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Financiamento de Estruturas e Projetos Culturais [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Criação e Manutenção de Associações Culturais

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Fundos Europeus para as Artes e Cultura I – da Ideia ao Projeto [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Desarrumar a escrita: oficina prática [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Comunicação Cultural [online]

Duração: 15h

Formato: Online

Investigações: conhece as nossas principais reportagens, feitas de jornalismo lento

27 outubro 2025

Inseminação caseira: engravidar fora do sistema

Perante as falhas do serviço público e os preços altos do privado, procuram-se alternativas. Com kits comprados pela Internet, a inseminação caseira é feita de forma improvisada e longe de qualquer vigilância médica. Redes sociais facilitam o encontro de dadores e tentantes, gerando um ambiente complexo, onde o risco convive com a boa vontade. Entidades de saúde alertam para o perigo de transmissão de doenças, lesões e até problemas legais de uma prática sem regulação.

29 SETEMBRO 2025

A Idade da incerteza: ser jovem é cada vez mais lidar com instabilidade futura

Ser jovem hoje é substancialmente diferente do que era há algumas décadas. O conceito de juventude não é estanque e está ligado à própria dinâmica social e cultural envolvente. Aspetos como a demografia, a geografia, a educação e o contexto familiar influenciam a vida atual e futura. Esta última tem vindo a ser cada vez mais condicionada pela crise da habitação e precariedade laboral, agravando as desigualdades, o que preocupa os especialistas.

Carrinho de compras0
There are no products in the cart!
Continuar na loja
0