As nuvens esvaziar-se-ão
apenas do seu próprio significado.
E o verão cansar-se-á
da sua própria hesitação.
Não haverá primavera
nem sequer árabe.
Jamais alguém regará a liberdade
nem enxugará o suor das mulheres.
A terra nunca mais transpirará
o bico do pássaro não se molhará e o canto secará.
E eu sobre o nunca voarei
pelos azuis do lugar.
A minha sopa jamais será de chuva
far-se-á sem água nem sequer na boca
porque os lábios endurecerão,
as raízes dos nossos beijos petrificarão
e o mar em nós se tornará um deserto
sem rosas.
E o que nos restará da solidão
sem o orvalho das lágrimas e a chuva?
A minha fala entupir-se-á
e as águas em mim, jamais rebentar-se-ão.
Mas quando só nos resta palavras secas,
no fundo do poço do meu corpo
encontrarás pranto suficiente para chover uma vida.
- Sobre Shahd Wadi -
Shahd Wadi é Palestiniana, entre outras possibilidades, mas a liberdade é sobretudo palestiniana. Tenta exercer a sua liberdade também no que faz, viajando entre investigação, tradução, escrita, curadoria e consultorias artísticas. Procurou as suas resistências ao escrever a sua dissertação de Doutoramento em Estudos Feministas pela Universidade de Coimbra que serviu de base ao livro “Corpos na trouxa: histórias-artísticas-de-vida de mulheres palestinianas no exílio” (2017). Foi então seleccionada para a plataforma Best Young Researchers. Obteve o grau de mestre na mesma área pela mesma universidade com uma tese intitulada “Feminismos de corpos ocupados: as mulheres palestinianas entre duas resistências” (2010). Para os respectivos graus académicos, ambas as teses foram as primeiras no país na área dos Estudos Feministas. Na sua investigação aborda as narrativas artísticas no contexto da ocupação israelita da Palestina e considera as artes um testemunho de vidas. Também da sua.