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A cultura como consciência coletiva para a sustentabilidade

Olhando para o ecrã vazio para iniciar esta crónica perguntei-me, que vou escrever? Da grande ligação entre a cultura e o ambiente? De pequenas e melhores práticas ambientais no dia a dia da cultura ou no papel da cultura como mudança de mentalidades? Boas práticas na cultura ou a cultura como consciência coletiva?

Numa crónica mensal cabem todos os temas e, pouco a pouco, por lá iremos passar. Mas, para começar, devemos abordar o básico, discernir definições e de que forma a cultura e o ambiente podem trabalhar juntos para uma sociedade em que o desenvolvimento sustentável seja a norma.

Para falar de cultura e desenvolvimento sustentável devemos estar todos de acordo com o significado destes conceitos. Mas será que existe acordo? Definir o conceito de cultura e desenvolvimento sustentável é mais complicado do que parece à primeira vista, mesmo para cientistas e políticos dessas áreas. São conceitos complexos e abrangentes. São ambíguos e vagos. Aqui terei de me socorrer de outros.

Raymond Williams definiu cultura como três ideias gerais e diferentes entre si: cultura como processo de desenvolvimento geral intelectual, espiritual ou estético; cultura como modo de vida particular, seja de pessoas, de um período ou de um grupo; ou cultura como conjunto dos trabalhos e da atividade intelectual artística. Estas ideias permitem-nos ver a cultura num sentido mais alargado ou mais restrito, mas podemos, sem dúvida, afirmar que a cultura abrange todos os domínios da vida humana. E, olhando para a cultura desta forma, então a maioria, senão todos, os problemas ambientais, sociais e económicos têm como base atividades e decisões culturais, uma vez que têm por base pessoas e ações humanas.

E a definição de desenvolvimento sustentável? Aqui temos de nos socorrer da famosa definição do relatório Brundtland, apresentado em 1987 - “Desenvolvimento sustentável é aquele que satisfaz as necessidades presentes, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de suprir suas próprias necessidades”. Uma definição extremamente abrangente e, se calhar, idealista, que juntou, originalmente, as vertentes ambiental, social e económica. Rapidamente foi integrado nesta definição o pilar da cultura, das ideias humanas. Claramente, a cultura constrói a sociedade e a sociedade também muda a cultura. 

É assim que a cultura pode associar-se ao desenvolvimento sustentável, como mais um eixo de suporte numa sociedade que não quer hipotecar o futuro. Mas falar da cultura como mais um círculo que complementa os outros domínios não deve esconder a relação da cultura com a natureza, nem minimizar a sua relação com os problemas maiores da sociedade, embora seja fácil ter uma visão mais estreita da cultura como o domínio limitado das artes e do setor cultural e criativo, ou como contributo sócio-económico de uma nação.

Podemos pensar mais além, e discutir a cultura para o desenvolvimento sustentável. Se o ser humano apresenta uma panóplia de culturas e uma grande diversidade de valores, então a cultura representa a componente base das sociedades e das comunidades humanas. Neste papel, a cultura é o ponto de contacto entre os três pilares do desenvolvimento sustentável. Este papel pouco explorado da cultura como mediador entre a sociedade real e o ambiente é muito exigente, mas pode claramente ser decisivo. Infelizmente, nunca foi um papel que tenha sido explorado a fundo.

E se formos mais ambiciosos? Pensar na cultura como o desenvolvimento sustentável, em que existimos como uma civilização de base cultural ecológica que tenta perceber o lugar dos seres humanos no planeta e que reconhece os humanos como uma parte inseparável, mas não “dona” do mundo natural. Quando encararmos a cultura deste modo vemos um sistema cultural guiado por um desígnio, explicações de motivos, regras de conduta e por questões morais, que pensa no desenvolvimento sustentável como um processo, sempre em aperfeiçoamento e permanente transformação.

Quando olhamos para estes três papéis da cultura no desenvolvimento sustentável e pensamos nas gerações vindouras, então somos todos, verdadeiramente, cultura. Os intervenientes  mais envolvidos, os que lêem esta e outras crónicas, podem ser as personagens principais na mudança de paradigma, pela sua relação com a sociedade e podem imprimir dinamismo, abordar a controvérsia, fazer o contraditório, promover o debate para ajudar a criar uma narrativa estruturada e devidamente fundamentada que nos permita alterar a maneira como pensamos e atuamos com, e no mundo em que vivemos e que queremos salvaguardar.

É precisamente neste ponto que a ZERO e todos os atores da cultura se tocam. É aqui que surge o tema do ativismo individual e coletivo, na defesa do mundo natural, na alteração do comportamento da sociedade como um todo e da perceção do indivíduo como ser único, perante a realidade inevitável das ameaças ao ambiente em que vivemos. Porque aquilo que todos queremos é que o futuro das gerações vindouras não comece hipotecado à nascença. Queremos um desenvolvimento sustentável!

-Sobre Francisco Ferreira-

Francisco Ferreira é Professor Associado no Departamento de Ciências e Engenharia do Ambiente da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa (FCT-NOVA) e investigador do CENSE (Centro de Investigação em Ambiente e Sustentabilidade). É licenciado em Engenharia do Ambiente pela FCT-NOVA, mestre por Virginia Tech nos EUA e doutorado pela Universidade Nova de Lisboa. Tem um significativo conjunto de publicações nas áreas da qualidade do ar, alterações climáticas e desenvolvimento sustentável. Foi Presidente da Quercus de 1996 a 2001 e Vice-Presidente entre 2007 e 2011. Foi membro do Conselho Nacional da Água e do Conselho Nacional de Ambiente e Desenvolvimento Sustentável. Atualmente é o Presidente da “ZERO – Associação Sistema Terrestre Sustentável”, uma organização não-governamental de ambiente com atividade nacional.

Texto de Francisco Ferreira | Zero – Associação Sistema Terrestre Sustentável
Fotografia da cortesia de Francisco Ferreira

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