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Auto Rádio: Futurologia eleitoral nos 50 anos de Abril

Na Revista Gerador 43, na crónica Auto Rádio, que agora partilhamos contigo, Benjamim fala-nos sobre o cenário político atual, alertando para os perigos do populismo, da fragilidade da democracia e da necessidade de diálogo entre diferentes ideologias para garantir a estabilidade e os valores fundamentais da sociedade.

Texto de Redação

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Nesta edição, vou lançar as cartas e fazer alguma futurologia. Escrevo este texto num fim de tarde anormalmente quente para Janeiro, antes das eleições, e ele é publicado quando vocês já estão no futuro e sabem o resultado das mesmas. Assim, caso tenha razão, não preciso de vos lembrar que já sabia que «isto» iria acontecer. Caso contrário, podem regozijar-se com a minha queda em tempo real (ou em câmara lenta, se forem sádicos).

Vamos a isto. Um, dois, três. O PS ganha as eleições outra vez, graças a um resistente (apesar de cada vez mais desanimado) eleitorado de centro-esquerda, assustado com a ideia de Montenegro estar a fazer bluff e aceitar fazer uma grande coligação de direita, com o apoio do Chega. Como o PS vai ganhar sem maioria, André Ventura irá efectivamente chegar a acordo com Montenegro, que fez realmente bluff, e irá formar o governo com o apoio de toda a direita.

Posso ser surpreendido, mas duvido sinceramente que, caso a direita tenha maioria, Montenegro vá perder esta oportunidade para exercer o poder.

Mas também será o princípio do fim do Chega, que agora terá o seu momento da verdade. Um partido que assenta única e exclusivamente na figura de um líder de estilo extremamente duvidoso, apesar de indiscutivelmente carismático e politicamente astuto, terá sempre os dias contados, pelo simples facto de todo o partido depender de uma só pessoa (por muito que tentem disfarçar) e tudo à volta dele é um deserto ainda mais árido. A montanha de promessas do partido vai parir uma mão cheia de nada, uma vez que não tem quadros para fazer absolutamente nada e nenhuma ideia que defende aos berros tende a sobreviver por mais de um ano, surfando a política ao sabor da maré das caixas de comentários do Instagram. Olhando para os deputados que desviou do PSD, são o fim da linha do partido. Dos que já lá estavam nem se fala, por isso é que teve de ir buscar alguém com algum tipo de experiência política a outros partidos, por muito pobre que a experiência fosse. O partido anti-sistema é composto pelas figuras de pior qualidade do sistema e financiado pelo pior do sistema – super-ricos que têm todo o interesse em ter um partido bom para o negócio, tal como André Ventura era bom para muitos deles aprimorarem o seu desempenho fiscal. O facto de algumas das famílias que mandam no país desde a monarquia quererem fazer colapsar o sistema fala por si. O facto de muito do apoio que o partido tem vir de camadas mais desfavorecidas seria incompreensível, não fosse a descrença que as pessoas têm actualmente na política.

Para que fique claro, o sistema que os anti-sistema tanto criticam é a nossa democracia. É o sistema que foi implementado na sequência do 25 de Abril e, sim, também do 25 de Novembro. A democracia é este processo tenso, construído entre a Primavera e o Outono, em que conseguimos conviver, contendo a abolição das nossas divergências através do diálogo e processos tão básicos como eleições e referendos. Ao contrário da ditadura, na democracia passou a existir a possibilidade de todas as sensibilidades políticas conviverem sem se prenderem uns aos outros por delito de opinião, seja de esquerda ou direita. Neste aspecto, quando os desmemoriados tentam fazer equivaler a esquerda à extrema-direita, é bom lembrar as perseguições das quais foram alvo os movimentos e partidos de esquerda, que, depois de proibidos pelo regime de extrema-direita, resistiram e participam hoje na vida política de forma democrática. Não foi ao contrário.

Na democracia, a corrupção é quando alguém se aproveita de recursos que pertencem a todos para aproveitamento pessoal, um enorme problema, inegável, que a direita populista conseguiu aproveitar muito bem (apesar de partidos como o Bloco e o PCP o tentarem pôr na agenda política há anos, com alguns momentos memoráveis, como as comissões de inquérito em que Mariana Mortágua interrogou Ricardo Salgado ou Zeinal Bava).

Na ditadura, a corrupção suprema é que o poder absoluto é concentrado nas mãos de um só cidadão, cuja conta bancária, ao contrário do que fascistas adoram proclamar, era a própria conta do país, da qual ele podia dispor como lhe apetecesse, mesmo que a usasse para poupar dinheiro à custa de um país atrasado, analfabeto e com fome.

De Ventura ouvimos slogans do Estado Novo, quando fala em Deus, Pátria, Família (que, na sua melhor versão, é um excelente disco de B Fachada) e na Nossa Senhora que o escolheu.

Nós já ouvimos Ventura a dizer tudo e o seu contrário. Eliminar o Ministério da Educação mas agora já não, castração química mas agora já não, nunca coligar-se com ninguém porque os partidos são todos maus mas agora já só se quer coligar e apresentar medidas completamente desprovidas de ligação à realidade orçamental deste país.

Outro aspecto que é inegável é o carácter racista do partido, apesar de domesticado para tentar relativizar, é absolutamente indesmentível que o Chega conseguiu meter a agenda da palavra «raça» ou «nacionalidade» no discurso político.

No Reino-Unido, quando a direita conservadora democrática aceitou patrocinar o discurso da extrema-direita, o país saiu da União Europeia, de uma forma que ainda hoje, enquanto ex-migrante em Londres, custa a acreditar. É difícil de acreditar num futuro que não passe por uma união sólida do velho continente – a alternativa parece bem mais sombria. A paz, a democracia, a estabilidade, a livre circulação, a liberdade de pensamento, de movimentos, económica, religiosa (islamofobia), o respeito pelas opções sexuais de cada um, pelos migrantes (e não apenas pelos nómadas digitais) são valores em sério risco.

Eu sou de esquerda, mas sei que o único regime em que as pessoas têm a mesma opinião é nas ditaduras. As democracias não são de esquerda ou de direita, não tem mal pensarmos de maneira diferente. Não existe ninguém que se consiga afirmar como alternativa aos olhos do eleitorado de direita sem ter de engolir este sapo, no ano em que a nossa democracia faz 50 anos?

*Texto escrito ao abrigo do antigo Acordo Ortográfico

- Sobre Benjamim -

É um escritor de canções, músico e produtor que gosta de dançar. Em 2020, lançou o seu terceiro álbum, Vias de Extinção, um disco que começou na pista e acabou a ecoar no vazio que a pandemia criou. Como produtor, já trabalhou com nomes como Joana Espadinha, Cassete Pirata, Lena D’Água, B Fachada.

Texto de Benjamim
As posições expressas pelas pessoas que escrevem as colunas de opinião são apenas da sua própria responsabilidade.

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