A Conferência Mundial sobre as mudanças climáticas, dita COP26, desagradou a toda a gente. Ambientalistas, governantes, cientistas, todos sem exceção, foram unânimes em considerar que o resultado foi um fracasso. Houve quem chorasse e quem, à falta de melhor, dissesse que para a próxima será melhor. Não será.
A sociedade humana desenvolveu-se e organizou-se num sentido que não lhe permite resolver um problema deste tipo. Dividida em tribos, regiões, países, etnias, cores da pele, línguas, culturas, interesses, egoísmos, ganâncias, não é capaz de se pensar e agir como um todo. A humanidade não se pensa como espécie.
Aquela conhecida frase do "todo superior à soma das partes", definitivamente não se aplica no nosso caso. Não só cada parte está em constante competição com as restantes, como mesmo dentro de si, a separação e o conflito são permanentes. Veja-se o campo da política. Critica-se os governantes por não aceitarem medidas mais restritivas e amigas do ambiente. Mas como o podem fazer sem causar enormes tumultos e, no fim do dia, perderem as eleições? Daí que nestas COPs a componente ambientalista exija o máximo e a política conceda o mínimo.
Caminhamos, assim, para o desastre. Aliás, inevitável quaisquer que sejam as medidas adoptadas. Já vamos tarde. O planeta não é digital, não tem um botão on/off. Os efeitos climáticos são emergentes, vão evoluindo de forma não-linear e dificilmente são reversíveis. Conter o aumento da temperatura do planeta em grau e meio reduzindo o consumo dos combustíveis fósseis é bom para a mobilização, mas é ilusório. Para se regressar aos níveis do passado, não bastaria baixar o aquecimento, seria preciso, caso fosse praticável, refrescar.
Assim, os anos irão passando e a crise climática aumentando. Até ao momento em que realmente se tenha de fazer alguma coisa minimamente eficaz, se é que ainda há alguma coisa a fazer.
A experiência da pandemia dá-nos pistas sobre o que se desenha no futuro. Na realidade, todos os governos do mundo, dos mais democráticos aos ditatoriais, entraram no modo tirânico. Por toda a parte foram instaurados regimes de exceção, obrigando os cidadãos a ficarem fechados em casa, foram encerradas atividades económicas, sociais e culturais, foram impostas imensas proibições. Claro que tudo foi feito tendo em vista o bem comum, mas não deixa de ser uma forma de tirania. Única maneira como hoje parece ser possível conseguir-se alguma coisa. Mesmo assim, assinale-se a quantidade impressionante de pessoas que protestam e aderem a movimentos anti vacinas, por exemplo. Não é muito inteligente, convenhamos, mas estes protestos têm alguma razão.
A sociedade humana não consegue atingir nenhum objetivo comum sem abrir enormes fraturas. A diferença de opinião, a liberdade de expressão, a democracia, são elementos fundamentais da civilização, tal como a conhecemos e, muitos de nós, defendem. Mas dificultam a ação coletiva quando ela é mais precisa.
É, por isso, que antevejo o crescimento das soluções ditatoriais. Quando o ambiente se tornar insuportável, quando o ar ficar irrespirável, quando países inteiros forem inundados dando lugar a migrações nunca vistas, os ditadores vão emergir por toda a parte. Restando saber se conseguirão resolver o problema climático. Duvido.
Para terminar com uma nota positiva. Só a ciência nos pode salvar. Do mesmo modo que o fez com a Covid e outras maleitas, só a ciência poderá resolver o tremendo problema das alterações climáticas. Mais do que injetar dinheiro nos governos e nas empresas, que não servirá para muito, estes COP’s deviam criar um enorme fundo de investimento em ciência. O futuro assim o exige.
-Sobre Leonel Moura-
Leonel Moura é pioneiro na aplicação da Robótica e da Inteligência Artificial à arte. Desde o princípio do século criou vários robôs pintores. As primeiras pinturas realizadas em 2002 com um braço robótico foram capa da revista do MIT dedicada à Vida Artificial. RAP, Robotic Action Painter, foi criado em 2006 para o Museu de História Natural de Nova Iorque onde se encontra na exposição permanente. Outras obras incluem instalações interativas, pinturas e esculturas de “enxame”, a peça RUR de Karel Capek, estreada em São Paulo em 2010, esculturas em impressão 3D e Realidade Aumentada. É autor de vários textos e livros de reflexão, artística e filosófica, sobre a relação Arte e Ciência e as implicações, culturais e sociais, da Inteligência Artificial. Recentemente, esteve presente nas exposições “Artistes & Robots”, Astana, Cazaquistão, 2017, no Grand Palais, Paris, 2018, na exposição “Cérebro” na Gulbenkian, 2019 e no Museu UCCA de Pequim, 2020. Em 2009 foi nomeado Embaixador Europeu da Criatividade e Inovação pela Comissão Europeia.