Há cerca de um mês, decorreu na cidade da Amadora a 5.ª edição do Conversas na Rua, projecto promovido pela Câmara Municipal que fomenta a actividade artística no espaço público, envolvendo as comunidades locais.
Quando em 1981 filmou Mur Murs, já a realizadora Agnés Varda ilustrava de que forma é que a arte mural podia ajuda a criar novas dinâmicas artísticas na cidade de Los Angeles, nos Estados Unidos da América. Facto é que desde essa época, a arte urbana, em especial através do mural, tem-se tornado numa forma artística privilegiada para ajudar a promover uma maior harmonização das populações com o espaço público.
Em Portugal, essa técnica ganha evidência na década de 70, nomeadamente depois da revolução portuguesa, com um número significativo de murais a serem produzidos coletivamente por motivos políticos e partidários. Esse legado não é indiferente a muitas cidades portuguesas, como é o caso da Amadora.
Face a um “acervo significativo” dessa época, surge, em 2015, o projeto Conversas na Rua para dar “continuidade a esse legado em manifestações mais contemporâneas, com diferentes técnicas e com artistas que vem de diferentes áreas”. Em entrevista ao Gerador, Catarina Valente, gestora cultural e coordenador do Conversas na Rua, realça que mais do que uma iniciativa “que promove a arte pública” pretende-se também “estabelecer um diálogo com a comunidade local”.
Depois de uma fase de seleção do artista e do local onde se realiza a intervenção, a comunidade é chamada a dar o seu feedback sobre as obras em curso. “Até agora o retorno tem sido positivo e existe muita interatividade com espaços que antes não eram vivenciados, que se tornaram lugares onde as pessoas convivem. Há uma apropriação do espaço público e isso é ótimo, porque pretendíamos que as pessoas vivessem mais a cidade e entendemos que isso se faz através desta democratização da arte”, acrescenta a coordenadora.
Neste sentido, Catarina Valente considera que o projeto acaba por ter um duplo sentido na sua ação: “um mais social, no sentido de envolver a comunidade e sensibilizá-la para a importância da expressão artística; por outro lado, pela forma como este tipo de expressão ajuda a harmonizar a paisagem urbana e a reduzir o estigma negativo associado à cidade, criando-se um maior envolvimento com as artes e a cultura”, sustenta.
No que diz respeito às intervenções murais, a edição deste ano contou murais dos artistas Odeith, Tamara Alves, Samina, The Caver e Third, todos eles a convite da autarquia. Odeith, artista local, é aliás, um dos “porta estandartes” do Conversas na Rua, de acordo com Catarina Valente. “Já tínhamos um acervo significativo, com muitas obras deste artista que vive na cidade, por isso achamos que fazia todo o sentido convocá-lo para fazer coisas maiores e ser embaixador artístico do projeto”, conta.
Como forma de celebrar os 5 anos do Conversas na Rua, que decorreu entre 30 de agosto e 10 de setembro, o Recreios da Amadora – um dos espaços que têm sofrido diversas intervenções artísticas – acolheu uma oficina de serigrafia, pelo projecto Bicicleta Manifesta, uma exposição com fotografias de Andreia Mayer e a leitura encenada Murais Poéticos, com interpretação das atrizes Carla Chambel e Joana Brandão, baseada nos processos de trabalho dos artistas Sara Morais, Gonçalo Mar e Regg Salgado que, em 2016, realizaram intervenções no Logradouro dos Recreios da Amadora com obras de arte.
Além disso, decorreu ainda uma conversa em torno da importância da Arte Urbana para a revitalização do espaço urbano, com os artistas Ana Dias, Elsa Poderosa, Tamara Alves e Gonçalo Mar e um concerto do músico Janeiro que, perante uma plateia bem composta, apresentou o seu LP de estreia Fragmentos.
Desafiado pela organização, o Gerador foi responsável pela programação deste dia assim como de um Instameet, que juntou 5 Instagrammers portugueses, que ao longo do dia 3 de agosto andaram pela Amadora a descobrir as paredes e os espaços icónicos da cidade.
No âmbito do Conversas na Rua já foram realizadas na Amadora 22 intervenções murais, resultado da participação de vários artistas portugueses provenientes de diferentes disciplinas artísticas, desde a pintura e a ilustração, ao graffiti. Estas obras estão entre os mais de 100 trabalhos de arte urbana espalhados pelas paredes da Amadora e que integram o Mapa da Arte Urbana da Amadora, disponível online.
No futuro, o objetivo da autarquia passa por levar “mais intervenções artísticas às seis freguesias do concelho da Amadora” e “ajudar a cria um roteiro mais que dê a conhecer outros locais da cidade culturalmente ativos. Dessa forma podemos criar uma dinâmica em que convocamos o exterior e em que disseminamos a cidade de um ponto de vista artístico, no sentido de a promover”, conclui Catarina Valente.