Quem percebe de azeites em Portugal é o Prof. Doutor José de Gouveia, professor no ISA e alta autoridade para o estudo de toda a matéria relacionada com este produto. Quase quarenta anos de experiência e mais de 30 000 azeites provados fazem dele um profundo conhecedor do assunto e a escolha óbvia para quem deseje acrescentar ao lado gastronómico e mais lúdico desta gordura alimentar a sempre importante vertente científica.
Segundo José Gouveia, “o azeite é profundamente natural, não existe mais nada sem ser aquilo que se extrai das azeitonas espremidas, não há mais nenhum processo extra como o período de fermentação do vinho, por exemplo”.
Esta gordura sublime tem na gastronomia portuguesa um lugar importante. Nos temperos a cru, nos estrugidos e guisados, para espevitar os arrozes, e para acolitar os nossos assados de forno.
Existe alguma discordância à volta da forma mais adequada de untar o assado – entre o azeite e a banha de porco alentejano ou bísaro – e não serei eu que contribua para acabar com essa querela. Devo dizer que prefiro o azeite para o cabrito, a banha para o lombo de porco. E quanto ao borrego dá empate: cordeiros pequenos é com azeite e animais um pouco mais encorpados será com banha.
Todavia, a união mais importante da gastronomia lusitana dá-se quando o azeite um dia encontrou, ao virar de alguma esquina, o bacalhau seco e salgado.
Foi neste contexto que Dom Bacalhau apareceu aos indígenas deste retângulo como a oitava maravilha do Mundo: pelo baixo preço (a pataco, “in illo tempore”...), pelas inúmeras formas de o preparar, pela longa temporada de conservação, pela miscigenação mais que perfeita com o azeite nativo e ...a ânsia de convívio com o vinho tinto do lavrador, para amenizar a salga.
Bacalhau fresco? Serve para dar ao gato (sendo este pouco exigente).
Nas segundas feiras - e seguindo um costume que devia ter sido originado nos tempos em que o peixinho servido em todos os restaurantes era mesmo fresco, do dia anterior, e por isso mesmo à segunda feira não o havia - comia-se Bacalhau nas Tascas, Tasquinhas, Casas de Pasto e Restaurantes das nossas cidades. E igualmente às sextas feiras, mas aqui por preceito antigo de ordem religiosa.
Nas aldeias o consumo do fiel amigo era mais ao corrente dos afazeres da dona de casa e se esta tinha tido (ou não) tempo para ir às compras de outro conduto. Bem de refúgio por natureza – na época sem arcas congeladoras – o bacalhau era sempre um alicerce firme de toda a economia doméstica.
Eram tempos em que ainda havia azeite das oliveiras do proprietário, e por isso fazia-se a lagarada durante a noite, enquanto se esperava pela pressão da azeitona, à porta dos lagares.
Trazia-se bacalhau do alto, vinho do ano, pão acabado de fazer, couves da horta de inverno e batatas.
Lavava-se a batata e assava-se no forno com o sal grosso. Quando estivesse macia, removia-se o sal e apertava-se a batata com a palma da mão. Limpava-se, e cozinhava-se a couve em pedaços grandes. Que escorríamos e reservávamos.
Depois era tratar de assar as postas de bacalhau até dourarem, numa grelha untada com uma colher (sopa) de azeite. Numa panela de barro, despejávamos o azeite restante e o alho picado. Juntava-se o bacalhau, a couve, a batata. E Levávamos ao bico grande do fogão por alguns minutos, mexendo bem.
-Sobre Manuel Luar-
Manuel Luar é o pseudónimo de alguém que nasceu em Lisboa, a 31 de agosto de 1955, tendo concluído a Licenciatura em Organização e Gestão de Empresas, no ISCTE, em 1976. Foi Professor Auxiliar Convidado do ISCTE em Métodos Quantitativos de Gestão, entre 1977 e 2006. Colaborou em Mestrados, Pós-Graduações e Programas de Doutoramento no ISCTE e no IST. É diretor de Edições (livros) e de Emissões (selos) dos CTT, desde 1991, administrador executivo da Fundação Portuguesa das Comunicações em representação do Instituidor CTT e foi Chairman da Associação Mundial para o Desenvolvimento da Filatelia (ONU) desde 2006 e até 2012. A gastronomia e cozinha tradicional portuguesa são um dos seus interesses. Editou centenas de selos postais sobre a Gastronomia de Portugal e ainda 11 livros bilingues escritos pelos maiores especialistas nesses assuntos. São mais de 2000 páginas e de 57 000 volumes vendidos, onde se divulgou por todo o mundo a arte da Gastronomia Portuguesa. Publica crónicas de crítica gastronómica e comentários relativos a estes temas no Gerador. Fez parte do corpo de júri da AHRESP – Associação de Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal – para selecionar os Prémios do Ano e colabora ativamente com a Federação das Confrarias Gastronómicas de Portugal para a organização do Dia Nacional da Gastronomia Portuguesa, desde a sua criação. É Comendador da Ordem de Mérito da República Italiana.