fbpx

Apoia o Gerador na construção de uma sociedade mais criativa, crítica e participativa. Descobre aqui como.

Opinião de Ariana Furtado

Em voz alta: Medo em tempos de ódio

Na Revista Gerador 43, na crónica Em voz alta, que agora partilhamos contigo, Ariana Furtado fala-nos sobre a importância de combater o racismo estrutural e promover a dignidade humana desde a infância, incentivando a empatia e a gentileza nas nossas ações quotidianas para construir uma sociedade mais justa e acolhedora.

Apoia o Gerador na construção de uma sociedade mais criativa, crítica e participativa. Descobre aqui como.

No recreio da minha escola, vejo o mundo.

Crianças de origem portuguesa, nepalesa, bengali, catalã, angolana, brasileira, alemã, norte-americana, paquistanesa, russa, indiana, cubana, cabo-verdiana, alemã, são-tomense.

No recreio da minha escola, vejo crianças que brincam, correm, se zangam e fazem, logo de seguida, as pazes, contam histórias, fazem teatro, trazem experiências de famílias diversas, conversas únicas, modos de estar, de viver e atuar que devem ser fonte de aprendizagem e de ensino. E é por isso que nestes tempos de medo, e incentivo ao ódio, precisamos de estimular e preservar a dignidade humana e o respeito pelo outro desde a infância.

O racismo não é só uma discriminação estrutural, é um claro obstáculo ao pleno gozo e realização dos Direitos Humanos.

Todos os gestos de gentileza geram gentileza. Transformam a outra pessoa, transformam-nos e ao mundo.

Estaremos nós com os nossos gestos e palavras quotidianos a contribuir para que as diferenças não nos separem?

Na escola onde ensino, tento fazer do acolhimento o melhor momento para expressarmos a nossa capacidade empática e humanidade. Sorrir, olhar nos olhos, ouvir, ajudar, estender a mão, encaminhar, dar respostas, não julgar. Acima de tudo, não julgar. Privilegiar sempre o diálogo e a relação de igual para igual em detrimento da de dominação e superioridade.

O espaço escolar também educa. Deve-se olhar, por exemplo, para as imagens e referências que ocupam as paredes da escola. Há, por vezes, uma linguagem, uma composição de espaço que pode determinar a posição de poder de uns e de outros.

O novo gera medo. O diferente inspira medo. O que não conseguimos controlar desenvolve medo dentro de nós. Tudo isto é normal, mas sejamos capazes de sobrepor ao nosso medo a vontade de aprender com o outro, porque vale a pena. Temos muito mais a ganhar do que a perder. A riquíssima história do nosso mundo é um bom exemplo disso.

Estaremos todos nós a viver um sério problema de humanidade?

O racismo não se perpetua por argumentos racionais, mas por uma perceção deturpada do outro, e o ódio deixou há muito de ser apenas um sentimento. Converteu-se numa muleta política, discursos violentos, ameaçadores e deturpadores da verdade. Motiva e estimula humilhações.

A integração numa nova sociedade é difícil. Os imigrantes, e em particular os refugiados, enfrentam uma série de desafios, desde aprender uma nova língua até lidar com comunidades hostis, sem mencionar a preocupação com o bem-estar dos entes queridos que ficaram para trás.

Ao mudarmos de cultura é como se víssemos o mundo novamente. Encontramos um novo modus operandi social. O que recebemos por parte dos membros da nova sociedade pode afetar positiva ou negativamente o sentimento de competência, valorização e autoestima.

O medo leva à rejeição e exclusão. À construção de muros.

«Sentir com o outro nos leva a reconhecer que pertencemos a uma comunidade de vivos. Perceber e sentir em si que o outro partilha do fundo comum é a possibilidade de ser sensível ao outro. E é se deparando com o outro que é possível se reconhecer e experienciar o poder de ser; ouvir e ser ouvido, tocar e ser tocado, sentir-se sentindo.» (in «Migrantes. Considerações sobre os sentimentos frente ao estrangeiro», por Maria Aparecida da Silveira Brígido e Lia Dauber).

Escrevo estas palavras cheia de esperança de que consigamos ultrapassar o medo e sejamos capazes de gerir as nossas emoções, as nossas vidas, respeitando o direito a existir e o direito à dignidade humana de quem vive ao nosso lado.

Nas escolas, nas ruas, nos serviços públicos, nos supermercados, nos serviços de saúde, na restauração, nos trabalhos dignos com salários dignos. Recomeçar. Por mais humanidade.

- Sobre Ariana Furtado -

Ariana é Cabo-verdiana, cresceu em Portugal, e é professora do 1.º Ciclo e coordenadora da Escola Básica do Castelo, em Lisboa.
Co-autora de projetos como "Com a mala na mão contra a discriminação" ou "Ge(ne)rando polémica... ou antes pelo contrário". É também tradutora de vários livros infantis.

As posições expressas pelas pessoas que escrevem as colunas de opinião são apenas da sua própria responsabilidade.

As posições expressas pelas pessoas que escrevem as colunas de opinião são apenas da sua própria responsabilidade.

Publicidade

Se este artigo te interessou vale a pena espreitares estes também

13 Outubro 2025

Jornalista afegã pede ajuda a Portugal para escapar ao terror talibã

10 Outubro 2025

Tempos livres. Iniciativas culturais pelo país que vale a pena espreitar

9 Outubro 2025

Estará o centro histórico de Sintra condenado a ser um parque temático?

7 Outubro 2025

Fronteira

6 Outubro 2025

Carlos Eugénio (Visapress): “Já encontrámos jornais [em grupos de partilha] com páginas alteradas”

3 Outubro 2025

Tempos livres. Iniciativas culturais pelo país que vale a pena espreitar

29 Setembro 2025

A Idade da incerteza: ser jovem é cada vez mais lidar com instabilidade futura

26 Setembro 2025

Tempos livres. Iniciativas culturais pelo país que vale a pena espreitar

24 Setembro 2025

Partir

22 Setembro 2025

Pensar a sociedade para lá do crescimento ilimitado: propostas do norte e do sul global

Academia: cursos originais com especialistas de referência

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Criação e Manutenção de Associações Culturais

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Fundos Europeus para as Artes e Cultura I – da Ideia ao Projeto [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Financiamento de Estruturas e Projetos Culturais [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Jornalismo Literário: Do poder dos factos à beleza narrativa [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Desarrumar a escrita: oficina prática [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Comunicação Cultural [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Jornalismo e Crítica Musical [online]

Duração: 15h

Formato: Online

Investigações: conhece as nossas principais reportagens, feitas de jornalismo lento

29 DE SETEMBRO

A Idade da incerteza: ser jovem é cada vez mais lidar com instabilidade futura

Ser jovem hoje é substancialmente diferente do que era há algumas décadas. O conceito de juventude não é estanque e está ligado à própria dinâmica social e cultural envolvente. Aspetos como a demografia, a geografia, a educação e o contexto familiar influenciam a vida atual e futura. Esta última tem vindo a ser cada vez mais condicionada pela crise da habitação e precariedade laboral, agravando as desigualdades, o que preocupa os especialistas.

02 JUNHO 2025

15 anos de casamento igualitário

Em 2010, em Portugal, o casamento perdeu a conotação heteronormativa. A Assembleia da República votou positivamente a proposta de lei que reconheceu as uniões LGBTQI+ como legítimas. O casamento entre pessoas do mesmo género tornou-se legal. A legitimidade trazida pela união civil contribuiu para desmistificar preconceitos e combater a homofobia. Para muitos casais, ainda é uma afirmação política necessária. A luta não está concluída, dizem, já que a discriminação ainda não desapareceu.

Carrinho de compras0
There are no products in the cart!
Continuar na loja
0