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Estranha forma de vida? (Parte 3)

Oh!!… Uooh!!! ... Ei!! Ei! Ei!... Vocês!! Vocês aí!! Veem alguma coisa ou continuam sem ver nada?

Este mundo, fechado agora em si mesmo, é inquietante, até perturbador, para os seres humanos nascidos em terra firme e acostumados a abarcar vastos horizontes de terra. As nuvens que toldam o céu potenciam o seu lado misterioso. Os acontecimentos não têm significados. Os acontecimentos são acontecimentos e os significados são pensamentos. Nada tem qualquer significado, salvo o significado que lhe damos. E o significado que damos às coisas não deriva de nenhum evento, circunstância, condição ou situação exterior a nós. Os significados servem só para projetar ansiedades, ilusões e medos que revolucionam os nossos estados internos e inconscientes, abrindo assim um rasgo para nos conhecermos melhor e com isso evoluirmos, não?

Tudo está dentro de nós. A visão, o corpo. A visão do corpo ganha agora em fantasia e perde em realidade. Estes corpos dos seres humanos já não são corpos reais; são corpos metamorfoseados.

Estão a ouvir? Acho que estou a ouvir alguma coisa. Não, não pode ser! Estamos aqui sozinhos!!! Somente temos um tipo de companheiro e esse já o conhecemos, até falamos a mesma língua que ele.

Ai! Ajudem-me!! Que disparate, pedir ajuda agora... Já sabemos que só nos podemos ajudar a nós próprios, porque só nós, cada um de nós é que sabe, verdadeiramente, quem é e o que representa.

Vivemos, no passado, em busca de uma terra perfeita com um clima temperado, em busca de um ideal de vida perfeito, onde se queria que a morte e a doença não chegassem, ou melhor, com tudo o que era preciso para viver bem. Uma terra, enfim, onde os seres humanos existiam em eterna felicidade. Agora, com tudo posto em causa, dizemos que talvez gostaríamos de iniciar tudo de novo, ou de voltar ao antigo paradigma, ou ainda, saber já de antemão qual a nova forma de viver, para obter o tal bem-estar. Mas não é possível. Qualquer processo de mudança, que é sempre para melhor, leva sempre o seu tempo, um tempo para aceitar, um tempo para confiar e um tempo de entrega. Agora a única hipótese que temos é continuar a caminhar em frente, ou subir a montanha para ultrapassar mais esta etapa do nosso percurso.

Ai! Parece-nos que pedimos de mais e agora não queremos viver entre o misterioso e o oculto, o surpreendente e o inexplicável, entre a grandiosidade do fabuloso e a mistura do mito com o quotidiano. É difícil lidar com este outro mundo que ansiávamos. A consciência aterroriza-nos.

Estamos aqui sozinhos, rodeados de terra, água, plantas, animais de todos os tipos, ruas, carros, objetos... e tudo é repelente e inóspito mas, também, apetecível e longe de ser inútil; tudo é imenso, profundo, vazio, aterrador mas, por outro lado… tudo está em profunda mudança, agora já nada é garantido e tudo passou a ter outro valor, outra ordem. Este tempo, onde nos encontramos, devido às suas características e comportamentos insólitos, provoca-nos medo. O aparecer ou o desaparecer atrás de uma espessa neblina assume, assim, diversas morfologias e, de repente, já não sabemos onde estamos e quem somos, se realmente estamos aqui ou noutro lugar.

Ai!! Tenho medo... tenho medo que me façam mal, eles podem aparecer... podem estar do outro lado da neblina, sinto que tenho de fazer qualquer coisa, mas tenho medo. Porque tudo é novo.

Ohh! Ei!! Ei!! Esperem! Ajudem-me.

Não se consegue mudar o facto de as coisas estarem a mudar, mas pode-se mudar o pensamento acerca das coisas que estão a mudar. Talvez, digam-me vocês? Uma das maiores surpresas da vida é saber que a verdade absoluta é coisa que não existe, não?

A verdade é que o medo é coisa que não existe, ou não pode existir.  Espera, agora ouço... Sim, ouço! (sorri) Onde está? Ah! Nada...

Quando não nos amamos a nós próprios, não temos medo de nada, porque não nos importamos com aquilo que nos vai acontecer, ou para onde vamos. Não nos interessa se sobrevivemos. O “instinto de sobrevivência” é a maneira da natureza expressar o amor. Só podemos amar aquilo que é livre... será que somos livres? Será que nos amamos verdadeiramente a nós próprios?

Temos receio de trocar um passado que conhecíamos por um futuro que não conhecemos. Temos medo de perder os nossos amigos, a nossa família, temos medo do que possa acontecer e de como possam ser as coisas. Temos medo de nunca mais voltar a encontrar um local confortável, um local onde, no fundo, não havia grande espaço para o auto questionamento, para a empatia ou para compaixão, no fundo um local de aprisionamento e travamento social e psicológico. E volto a perguntar-nos: Será que somos verdadeiramente livres?

-Sobre Vasco Araújo

Vasco Araújo, nasceu em Lisboa, em 1975, cidade onde vive e trabalha. Em 1999 concluiu a licenciatura em Escultura pela FBAUL., entre 1999 e 2000 frequentou o Curso Avançado de Artes Plásticas da Maumaus em Lisboa.  Desde então, tem participado em diversas exposições individuais e colectivas tanto nacional como internacionalmente, intregando ainda programas de residências, como Récollets (2005), Paris; Core Program (2003/04), Houston. Em 2003 recebeu o Prémio EDP Novos Artistas. O seu trabalho está publicado em vários livros e catálogos e representado em várias colecções, públicas e privadas, como Centre Pompidou, Musée d’Art Modern (França); Museu Colecção Berardo, Arte Moderna e Contamporânea, (Portugal); Fundação Calouste Gulbenkian (Portugal); Fundación Centro Ordóñez-Falcón de Fotografía – COFF (Espanha); Museo Nacional Reina Sofia, Centro de Arte (Espanha);  Fundação de Serralves (Portugal); Museum of Fine Arts Houston (EUA), Pinacoteca do Estado de S. Paulo (Brasil).

Texto de Vasco Araújo
Fotografia da cortesia de Vasco Araújo

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