A cidade de Liepaja, na Letónia, já está escolhida como uma das duas que terá o título de Capital Europeia da Cultura em 2027, mas falta ainda saber que cidade portuguesa terá também essa distinção. Na corrida, há quatro candidatas: Évora, com a sua vontade de levar mais longe o “vagar” alentejano; Ponta Delgada, que destaca a “natureza humana”; Braga, que apela a um “tempo de contemplação”; e Aveiro, que acredita na mudança que pode vir aí. Qual delas conquistará o título? A decisão deverá ser conhecida esta quarta-feira, dia 7 de dezembro.
No caso de Braga, a candidatura, contam os responsáveis, surgiu como “percurso natural” no seguimento da atribuição do título de Cidade Criativa da UNESCO, no domínio das Media Arts. O mote escolhido foi “tempo de contemplação”. “O nosso objetivo é promover uma reflexão, a nível coletivo, sobre os desafios da cidade e da Europa”, sublinham.
E detalham: “Quando dedicamos tempo a parar e a contemplar o que nos rodeia, tornamo-nos conscientes, conectamo-nos. Agimos de acordo com o nosso eu interior, com respeito pela comunidade, pela natureza, juntamente com os valores europeus”.
Segundo os responsáveis pela candidatura, a aspiração do programa cultural de Braga é, assim, “desencadear um processo transformador para que os cidadãos participem na vida cultural da cidade, não apenas como espectadores, mas como atores principais”.
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Curiosamente, também na candidatura de Évora a reflexão ocupa um papel central, desta feita espelhado no conceito de vagar, tão tipicamente alentejano. “O vagar enquanto modo de ser e estar alentejano”, salientam os responsáveis, que garantem que não é só Évora que está na corrida à distinção em causa, mas também todo o território envolvente.
“Toda a proposta da candidatura e o seu programa cultural e artístico baseiam-se nesta ideia: o vagar enquanto consciência plena de que estamos sempre em relação com tudo o que nos rodeia. E esta consciência implica, na nossa visão, coexistência, coevolução, contenção, criação e construção, espaço e tempo, memória e coletivo, resiliência e tensão. Acreditamos que a Europa, e o mundo, precisam deste vagar para enfrentar os desafios que se apresentam, e, por isso, propomos o vagar como ‘uma outra arte de existência’”, explica Paula Mota Garcia, coordenadora da equipa por detrás da candidatura.
Já no meio do Atlântico, Ponta Delgada escolheu a “natureza humana” como guia para a sua candidatura ao título de Capital Europeia da Cultura: “é uma ressignificação de uma expressão que está associada ao comportamento humano”, dizem os responsáveis.
De que modo? “Na nossa proposta, a natureza quer dizer lugar, e o humano designa a sua cultura. Assim, este conceito explora a relação entre cultura e o lugar de onde ela surge. Fala da relação intrínseca de pertença que temos com a paisagem e com a natureza, e de como as características desta geografia atlântica estiveram na origem de tantas manifestações culturais e de uma identidade cultural absolutamente singular e diversa”, explicam.
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Para a candidatura açoriana, este conceito de natureza humana passa, pois, por tomar a cultura como uma força de “verdadeira transformação”, capaz de nos fazer reconectar “uns com os outros e com o ambiente”. “Essa utopia não é só nossa. A Europa precisa dela para avançar com esperança e imaginação”, realçam os responsáveis.
Por sua vez, Aveiro elegeu a mudança como mote da sua candidatura e avisa que o título em questão não constitui um “fim em si próprio”. Antes, integra uma visão a longo prazo para a cidade, que passa nomeadamente por promover a salvaguardar a diversidade das culturas, alargar o acesso e a participação nesse âmbito e reforçar a capacidade desse setor e as suas ligações com as demais atividades, “igualmente importantes”.
Que ambiente cultural se vive hoje nestas cidades?
Um papel reforçado enquanto “fator decisivo da transformação do território”. É isso que Braga tem atribuído à cultura, nos últimos anos, o que é comprovado pelo crescente orçamento dedicado ao setor, “que praticamente duplicou desde o início do processo de candidatura e que se espera que continue a crescer ao longo dos próximos anos, sendo objetivo que a cultura venha a representar 10% do orçamento municipal”, avançam os responsáveis.
Ainda assim, persistem desafios, como a “reduzida massa crítica de criação artística de caráter contemporâneo, uma cultura independente e underground intermitente, o perfil predominantemente conservador (de pessoas e instituições), a escassez de espaços de trabalho para artistas e profissionais da cultura, a falta de experiência em colaborar com artistas, instituições e projetos internacionais, e um centro da cidade altamente ‘magnético’ que neutraliza dinâmicas culturais descentralizadas”.
Neste cenário, a candidatura bracarense incluiu projetos que pretendem dar respostas a essas questões, garantem os responsáveis, mas também a outras matérias muito caras não só a Braga, mas à Europa, como um todo: a saúde mental, a fraca participação cívica, o ritmo acelerado em que as sociedades vivem e o individualismo crescente.
Mais a sul no território português, Évora garante que hoje é marcada por uma “dinâmica cultural muito diversa e forte, impulsionada por criadores e artistas que escolheram este território para viver e criar”. “Vive-se uma consciência de que este setor unido e em diálogo projetará esta região a nível nacional e europeu. Enquanto lugar de confluência de várias culturas, creio que haverá sempre espaço em Évora para novas vozes”, enfatiza Paula Mota Garcia, que assegura que esta cidade é mesmo sinónimo de cultura.
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Já Ponta Delgada destaca a sua abertura à diversidade cultural: “Aqui não há uma ideia singular de cultura, há culturas”. Esta cidade quer, portanto, afirmar-se como uma verdadeira democracia cultural. E garante que esta atitude já lhe valeu novos habitantes, que "têm encontrado o seu espaço de diversas formas, o que, muitas vezes, passa pelas práticas artísticas e culturais”.
Os responsáveis exemplificam: “Biólogos, geólogos, cozinheiros ou carpinteiros, vindos de vários cantos do mundo, são, frequentemente, parte de projetos de festivais, como o festival de artes Walk & Talk ou o festival de música Tremor. Há já 20 anos que a grande comunidade cabo-verdiana a viver na região encontra espaço na música. Brasileiros, franceses, espanhóis, holandeses, argentinos são hoje promotores de festivais de cinema, donos de galerias , encenadores, atores e responsáveis pela recuperação de património cultural da região, material e imaterial.” Ponta Delgada é, assim, dizem, um sítio de “vibração cultural” aberto ao mundo, à curiosidade e à inovação.
Ganhar o título que será oficialmente atribuído esta quarta-feira significará para todas estas cidades, garantem, uma oportunidade de projeção única e preciosa na Europa e no mundo.