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Opinião de Ana Pinto Coelho

Fim de ano

Imaginem por um instante que não abraçam o ente mais querido desde Março. Que só…

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Imaginem por um instante que não abraçam o ente mais querido desde Março. Que só comunicam por telefone ou uma qualquer rede social. Alguns, com ainda alguma condição, aprendem a utilizar um telemóvel, um tablet ou um computador para, através dos muitos canais disponíveis, utilizar o vídeo como meio preferencial de interacção pessoal, familiar e, acima de tudo, sem máscara para se poder ver e sentir as expressões de cada um.

Esses são os sortudos, uma fatia social que ainda tem condições para poder ter estes instrumentos. Depois, existem todos os outros que não têm acesso a estes luxos.

E ainda durante o turbilhão a que se chama “segunda vaga”, surge uma quadra muito importante com duas datas que convidam às reuniões familiares e com amigos, que até obrigam à viagem de milhares de km com um sorriso cansado, mas genuíno, porque se sabe que se chegou ao destino. Ou que se tem um destino para se chegar, melhor dizendo.

A família, os amigos, a terra, os animais, a casa, as memórias.

Todas são vividas intensamente durante o Natal e a passagem de ano.

E este ano, passaram a ter uma importância maior, porque, sem aviso, estes reencontros foram difíceis ou impossíveis de concretizar.

Quem está só, ficou só. Quem está sozinho, porque os familiares trabalham longe, conheceu o amargo da maior distância, aquela que traz a solidão mais dura. Por ali e por aqui muito se tentou repensar, refazer, mas a Quadra, essa, ficará guardada como uma má memória que nos faz querer esquecer um ano inteiro, ainda por cima redondo, cujas consequências ainda nos são desconhecidas.

O mundo dividiu-se nos que aceitam momentaneamente a proibição de algumas liberdades e os que não. Os que acatam conselhos e ordens e os que não. Os que acreditam no potencial devastador de um vírus descontrolado e os que acreditam que tudo é um embuste.

Esta é, portanto e também, uma crise que aprofundou barreiras, cimentou fronteiras, destruiu amizades, dividiu opiniões. Uma ferida abrupta que vai levar muito mais tempo a tratar para fechar do que o tempo necessário para concretizar uma tão desejada vacina.

O extremar de opiniões deixou de estar no escritório e no café, bancadas de futebol ou até numa noite de euforia mais descontrolada, para vir para dentro de casa, quer através das redes sociais, quer por meio do agregado familiar.

E sem barreiras nem travões, pois ninguém estava preparado para isto.

Primeiro viver junto com uma família que, muitas vezes, é mais estranha que as amizades mais duradouras.

Segundo, sob o mesmo tecto, tentando alguma privacidade profissional, já que a individual foi-se com palavras e expressões como “confinamento” ou “estado de emergência”.

Terceiro, os aniversários, as conquistas, os eventos que ficaram por se celebrar.

E, por fim, as reuniões verdadeiramente importantes com datas próprias e vividas, mais ou menos intensamente, por miúdos e graúdos.

Parece que, num instante, a festa acabou e que a vida ficou estranhamente pausada como fazemos nos filmes para um pequeno intervalo.

E mesmo com uma vacina à porta, percebemos a sua incógnita. É curioso que, até neste campo, as opiniões dividiram-se tão depressa quanto a mudança de um dia para a sua noite: muitos querem ser vacinados, outros rejeitam a solução.

Esta é mais uma crise que aprofundará barreiras, cimentará fronteiras, destruirá amizades, dividirá opiniões.

Não existe uma varinha mágica que faça desaparecer 2020. Mas seria interessante entender-lhe as mais valias. Sim, porque também as houve. Aprendemos a conhecer-mo-nos melhor. Muitos sentiram necessidade de gritar, outros de fugir, e muitos, pela primeira vez, perceberam que precisam de ajuda para ultrapassar o que está muito diferente.

A saúde mental passou a ser um tema geral, conseguiu destruir algumas barreiras, está menos estigmatizada que em 2019. Muitas pessoas percebem agora o valor do trabalho de um psicólogo, psicanalista, psiquiatra, conselheiro, grupos de apoio e demais soluções.

Parece que se abriu uma janela que não deixou apenas entrar ar, mas sim desempoeirar muito descrédito e/ou desconhecimento. E as pessoas têm medo do que não conhecem ou dominam. E sim, a saúde mental sempre viveu nessa escuridão que, com mais trabalho, divulgação, opinião, conseguirá deixar entrar luz que ajudará muitos dos que já perceberam que precisam dela, e vai com certeza derrubar barreiras que muitos ainda deixaram em pé.

Portanto, que este 2020 nunca seja apagado, mas sim lembrado como, talvez, o princípio e o motor de uma grande mudança que, como todas elas, não vai ser fácil de conquistar.

Mas somos fortes. Vamos conseguir.

*Texto escrito ao abrigo do antigo Acordo Ortográfico

-Sobre Ana Pinto Coelho-

É a directora e curadora do Festival Mental – Cinema, Artes e Informação, também conselheira e terapeuta em dependências químicas e comportamentais com diploma da Universidade de Oxford nessa área. Anteriormente, a sua vida foi dedicada à comunicação, assessoria de imprensa, e criação de vários projectos na área cultural e empresarial. Começou a trabalhar muito cedo enquanto estudava ao mesmo tempo, licenciou-se em Marketing e Publicidade no IADE após deixar o curso de Direito que frequentou durante dois anos. Foi autora e coordenadora de uma série infanto-juvenil para televisão. É editora de livros e pesquisadora.  Aposta em ajudar os seus pacientes e famílias num consultório em Lisboa, local a que chama Safe Place.

Texto de Ana Pinto Coelho

As posições expressas pelas pessoas que escrevem as colunas de opinião são apenas da sua própria responsabilidade.

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