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Opinião de Manuel Luar

Gastronomia e Literatura

Recordando as ligações da gastronomia à literatura. E porque estamos tão próximos do 25 de…

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Recordando as ligações da gastronomia à literatura.

E porque estamos tão próximos do 25 de Abril estas duas recordações bibliófilas têm um cheirinho a cravos.

“Um Amor Feliz" passa-se na sociedade do pós 25 de Abril, e situa-se em Lisboa e arredores. Conta a história de um escultor português com quase sessenta anos e de uma estrangeira duas décadas mais nova que ele. Além da diferença de idades, ambos estão casados — ele com uma pediatra, ela com um homem de negócios que lhe parece quase um estranho. Os dois conhecem-se num jantar de boas-vindas a um outro casal do mesmo meio social e começam a encontrar-se às escondidas, no atelier dele. São estes os elementos que servem de base à história deste romance de David Mourão-Ferreira, escrito em 1986.

Cito um parágrafo ainda hoje muito atual desse romance admirável:

"De regresso ao meu cadeirão, mal-humorado, e olhando de novo aqueles oligarcazinhos de meia tigela, que bebiam e comiam de tudo com tão boa boca, avidamente metidos até ao gasganete em negociatas de batatas ou de batotas, em tráficos de terrenos ou de terrores, acudiu-me a conclusão de não ser por acaso que "poder" e"podre", em português, se escrevem fatalmente com as mesmas letras."

Em contraponto, o clássico dos clássicos da literatura romanceada sobre o conflito de classes: “Angústia para o Jantar” de Luis Sttau Monteiro, a obra-prima de 1961, também ela passada em redor da nossa capital, com reminiscências do então aristocrático “English Bar”, hoje o restaurante “Cima’s, (restaurante de culto onde nunca se levavam as amantes) e de outros locais bem conhecidos da época.

É a história de dois antigos colegas de liceu, que passados trinta anos continuavam a jantar todos os dias 15 de cada mês. O Gonçalo, que é empresário rico e filho de boas famílias. Casado e com dois filhos, um dos quais era motivo de grande preocupação devido às suas ideias revolucionárias. E o António, empregado de escritório e pobre, filho de um oficial da marinha e solteiro.

Apesar de toda a intimidade demonstrada na conversa, o leitor fica com a ideia de que aquela era uma relação tóxica que faria mais mal que bem aos intervenientes. Gonçalo gozava com António devido à falta de dinheiro e à condição social, e António invejava Gonçalo porque ele tinha de tudo melhor que ele. No caminho para casa cada um ficava a pensar por que raio se continuavam a encontrar todos os dias 15…

Nestas duas leituras que ainda hoje faço com gosto reencontro a memória do David Mourão-Ferreira, sentado na sua mesa favorita do restaurante Beira Mar em Cascais (na sala da direita encostado à parede), sempre bem acompanhado, acariciando o inevitável cachimbo do final da refeição, elogiando muito os filetes de pescada e  tagarelando com a Dona Lurdes sobre as novidades daquela Rua das Flores, quem tinha aparecido e se tinham existido episódios engraçados. Tudo lhe servia para fonte de futuros artigos ou romances.

Reencontro ainda a figura patriarcal do Sr. José Manuel Cimas Sobral (dos Sobral Portela da Galicia) que recebia no seu English-Bar tanto os Reis de Espanha como o proletário assistente universitário, novinho e em busca de conhecimentos gastronómicos e de materiais que lhe enchessem mais tarde os sonhos.

Ambas as casas ainda existem, ambas se recomendam. Os dois autores é que infelizmente não…, mas não deixa de ser muito recomendável a obra que cada um nos deixou.

-Sobre Manuel Luar-

Manuel Luar é o pseudónimo de alguém que nasceu em Lisboa, a 31 de agosto de 1955, tendo concluído a Licenciatura em Organização e Gestão de Empresas, no ISCTE, em 1976. Foi Professor Auxiliar Convidado do ISCTE em Métodos Quantitativos de Gestão, entre 1977 e 2006. Colaborou em Mestrados, Pós-Graduações e Programas de Doutoramento no ISCTE e no IST. É diretor de Edições (livros) e de Emissões (selos) dos CTT, desde 1991, administrador executivo da Fundação Portuguesa das Comunicações em representação do Instituidor CTT e foi Chairman da Associação Mundial para o Desenvolvimento da Filatelia (ONU) desde 2006 e até 2012. A gastronomia e cozinha tradicional portuguesa são um dos seus interesses.  Editou centenas de selos postais sobre a Gastronomia de Portugal e ainda 11 livros bilingues escritos pelos maiores especialistas nesses assuntos. São mais de 2000 páginas e de 57 000 volumes vendidos, onde se divulgou por todo o mundo a arte da Gastronomia Portuguesa. Publica crónicas de crítica gastronómica e comentários relativos a estes temas no Gerador. Fez parte do corpo de júri da AHRESP – Associação de Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal – para selecionar os Prémios do Ano e colabora ativamente com a Federação das Confrarias Gastronómicas de Portugal para a organização do Dia Nacional da Gastronomia Portuguesa, desde a sua criação. É Comendador da Ordem de Mérito da República Italiana.

Texto de Manuel Luar
Ilustração de André Carrilho

As posições expressas pelas pessoas que escrevem as colunas de opinião são apenas da sua própria responsabilidade.

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