Sabemos que a sociedade tem códigos, condutas, fórmulas. Também sabemos que as pessoas, se juntam às que têm interesses comuns e que existem muitos tipos de famílias com quem crescemos e por quem somos adoptados.
Há sempre alguém ou algo a apontar um caminho ou uma solução. Geralmente com metas iguais, mas apresentados com figurinos que só divergem na cor ou no formato. E, não nos iludamos, quase tudo é igual sem tirar nem pôr.
Por muito que o grosso da sociedade se dê bem no meio desta ordem organizada, muitos ficam de fora ou por fora. O problema é que, aos olhos dos primeiros, são apontados e considerados diferentes, estranhos, esquisitos. Estão, portanto, fora do baralho. Ou do conjunto de cartas e cores que se entendeu aceitar como certas e coerentes.
O ser diferente pode ser assumido de várias formas e ao longo da vida. Não se trata, mas também, de códigos visuais, de interesses que fogem à corrente dominante, de preferir nichos por opção ou por outra qualquer razão.
Muitas vezes nasce-se diferente, outras cresce-se de forma diferente. Seja de uma ou outra forma, continua a não ser fácil viver no meio de um grupo que não entende essa diferença e, pior em muitos casos, não a aceita.
O sentir diferente pode despoletar grandes alterações comportamentais, físicas e psicológicas. Uma das soluções mais abrangentes é tentar esconder essa nossa verdade, anulando-nos, fazendo tudo para pertencer ao grupo, não dar demasiado nas vistas.
Ao longo do tempo, esta solução torna-se demasiado pesada e as ramificações são, geralmente, dolorosas para quem as forçou chegando, algumas vezes, a ser insuportáveis.
Outra opção é apresentar de forma veemente essa diferença, gritando-a, impondo-a, mas pouco resolve pois quem o faz, fá-lo obrigado e sobre enorme pressão. Deseja apenas ser rapidamente aceite ou, muitas vezes, que simplesmente o deixem em paz.
E é essa paz que quem é diferente raramente vive, pois a sociedade, por muito “evoluída” que se apresente, continua a juntar-se para atacar quem não lhes é igual. Muitas vezes por desconhecimento, muitas outras por medo.
Felizmente que, muitos de nós, são indiferentes à diferença. Nem a percebem porque não lhes interessa ou não é relevante para uma relação ou convívio. Ou seja, é natural ser-se indiferente ao que nos é fora do comum. Aliás, são as diferenças que nos ensinam a ser tolerantes, aprendizes, professores, em suma, humanos.
Alguns chavões, como o famoso “todos diferentes, todos iguais” podem ser úteis numa certa altura, geralmente de apelo ao apoio, nascidos para dar as mãos em busca de um objectivo comum. O problema, é que quando o conseguimos atingir, ou não, esse sentimento esvai-se tão depressa como foi criado.
Mas o que é afinal ser diferente?
Para uns, nada. Para outros, muito. Para alguns, tudo.
Enquanto que uns são indiferentes, outros amedrontam-se e os demais abraçam. Vamos fazer um teste muito básico?
Imaginem que surge alguém que se veste de forma diferente de todos os outros. Que pinta o cabelo com cores inusitadas, que se apresenta como escritor, músico, pasteleiro, cozinheiro, arquitecto, cientista, piloto de corridas, desportista, etc.
Como a profissão tem algo de irreverente ou artístico, é natural que seja aceite de forma mais fácil. Ah, mas tem de conseguir ser melhor que os demais.
Mas quando vemos alguém com a mesma roupa, cor do cabelo mas que se apresenta como advogado, bancário, gestor ou polícia, a resposta quase imediata dos que anteriormente aceitaram o primeiro grupo, pode ser negativa.
E como se explica esta simples análise?
Digam-me vocês, pois não percebo onde está a diferença.
*Texto escrito ao abrigo do antigo Acordo Ortográfico
-Sobre Ana Pinto Coelho-
É a directora e curadora do Festival Mental – Cinema, Artes e Informação, também conselheira e terapeuta em dependências químicas e comportamentais com diploma da Universidade de Oxford nessa área. Anteriormente, a sua vida foi dedicada à comunicação, assessoria de imprensa, e criação de vários projectos na área cultural e empresarial. Começou a trabalhar muito cedo enquanto estudava ao mesmo tempo, licenciou-se em Marketing e Publicidade no IADE após deixar o curso de Direito que frequentou durante dois anos. Foi autora e coordenadora de uma série infanto-juvenil para televisão. É editora de livros e pesquisadora. Aposta em ajudar os seus pacientes e famílias num consultório em Lisboa, local a que chama Safe Place.