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Mudar é difícil

Os humanos são criaturas de hábitos. Não é fácil mudar e mesmo que a mudança seja a única maneira de garantir a sobrevivência, a inércia parece insuperável.

Essa dificuldade refletiu-se no mais importante pacote legislativo sobre alterações climáticas levado a cabo no contexto do Pacto Ecológico Europeu: o Pacote da Comissão Europeia “Preparados para os 55”, que, no entanto, ficou claramente aquém do necessário.

Muitas das propostas políticas que constam do pacote legislativo da Comissão são pouco ambiciosas e não preparam o caminho para que a UE consiga antecipar a neutralidade climática para 2040.

A ciência tem falado alto e bom som: é preciso uma ação climática sem precedentes até 2030, a fim de limitar o aumento da temperatura média a 1,5°C até ao final deste século. Não obstante os inúmeros sinais de alarme lançados por milhares de cientistas, e de milhões de cidadãos em marcha pela mudança, o objetivo climático está longe de cumprir o compromisso do Acordo de Paris de limitar o aumento da temperatura. Se esse 1,5º C parece pouco, já as implicações são brutais.

As recentes inundações no coração da Europa - Alemanha, França, Bélgica, Holanda - comprovaram a fragilidade do nosso modo de vida perante as consequências das alterações climáticas - geradas por essa mesma maneira de viver. A nossa inação climática terá inevitavelmente impactos funestos, em particular para os grupos mais vulneráveis e para os países de rendimentos mais baixos.

Apesar das evidências, estamos a deixar o mundo caminhar para um aumento global da temperatura de 2,5°C, pelo menos, até ao final deste século. A nossa incapacidade de unir esforços, de ver para além do nosso umbigo e de quebrar os nossos hábitos de consumo em sentido lato (alimentação, trabalho, mobilidade, lazer, etc.) vai afetar profundamente as nossas vidas, os recursos disponíveis e a economia, os meios de subsistência e os direitos fundamentais. 

A velocidade e a dimensão dos desafios climáticos e ambientais que enfrentamos a nível mundial é de tal ordem, que se torna impensável perder mais tempo.

O montante sem precedentes de fundos disponibilizados pelo Quadro Financeiro Plurianual para 2021-2027 e o Plano de Recuperação da UE (Next Generation EU Recovery Plan) não é, por si só, suficiente para garantir a revisão da nossa postura como consumidores e a das empresas como produtoras e grandes emissoras. Por um lado, as medidas previstas não garantem que se alcance o objetivo da redução de emissões em 55%, pelo menos até 2030. Por outro lado, a alteração dos modos de pensar o mundo e de nele viver não se consegue através da mera injeção de verbas astronómicas nas sociedades. A dimensão ética do combate por um clima favorável à vida humana na Terra não encontrou ainda forma de se expressar condignamente. Não agir de forma concertada e urgente terá consequências irreversíveis, tanto na UE como nos países em desenvolvimento. A lógica de mercado que tem de ser equacionada como a última das prioridades, porque está profundamente desadequada da realidade atual. Entre outras razões, continua a transferir o custo da poluição para o consumidor final, dispensando as empresas poluidoras desse esforço. 

É, apesar deste quadro ameaçador sobejamente divulgado, onde cada dia nos evidencia a sua insustentabilidade, no mundo das empresas, dos políticos, dos opinion-makers, há ainda quem se mantenha teimosamente fiel ao paradigma liberal de um crescimento económico sem fim. O planeta precisa de uma visão diferente e desafiadora, suportada já por muitos especialistas, onde é possível e desejável um menor uso de recursos associado a uma profunda descarbonização, conduzindo ao mesmo tempo a uma melhoria do nosso bem-estar e da nossa qualidade de vida.

1 Designação do conjunto de propostas legislativas apresentadas pela CE aos estados-membros em julho de 2021, visando a redução das emissões de gases com efeito de estufa em 55% até 2030 relativamente a 1990.

-Sobre Francisco Ferreira-

Francisco Ferreira é Professor Associado no Departamento de Ciências e Engenharia do Ambiente da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa (FCT-NOVA) e investigador do CENSE (Centro de Investigação em Ambiente e Sustentabilidade). É licenciado em Engenharia do Ambiente pela FCT-NOVA, mestre por Virginia Tech nos EUA e doutorado pela Universidade Nova de Lisboa. Tem um significativo conjunto de publicações nas áreas da qualidade do ar, alterações climáticas e desenvolvimento sustentável. Foi Presidente da Quercus de 1996 a 2001 e Vice-Presidente entre 2007 e 2011. Foi membro do Conselho Nacional da Água e do Conselho Nacional de Ambiente e Desenvolvimento Sustentável. Atualmente é o Presidente da “ZERO – Associação Sistema Terrestre Sustentável”, uma organização não-governamental de ambiente com atividade nacional.

O Francisco Ferreira, Presidente da ZERO, é formador do curso de 9h “Alterações Climáticas: causas, consequências e ações”, que decorre nos dias 25, 26 e 31 de agosto na Academia de Verão do Gerador. Se te interessas por este tema clica aqui para saberes como podes assistir. 

Texto de Francisco Ferreira | Zero – Associação Sistema Terrestre Sustentável
Fotografia da cortesia de Francisco Ferreira

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