fbpx
Apoia o Gerador na construção de uma sociedade mais criativa, crítica e participativa. Descobre aqui como.

Não é só o TikTok, estúpido!

Nas Gargantas Soltas de hoje, João Teixeira Lopes nos fala da colonização do TikTok, mas alerta-nos para as causas objetivas que são a raiz do problema: insegurança, medo, competição e precariedade.

Opinião de João Teixeira Lopes

Apoia o Gerador na construção de uma sociedade mais criativa, crítica e participativa. Descobre aqui como.

É claro que as redes sociais colonizam a nossa existência. Modelam-nos cognitivamente, dispersam a nossa atenção, transformam o modo de percecionamos o real (pior: criam o real!), induzem automatismos preguiçosos e são dinamizadas por pessoas-máquinas que destroem a destrinça entre informação, entretenimento e mercado, quer dizer, a possibilidade de distância crítica. Aliás, é o capitalismo que se expande nas nossas mentes, vencendo os poucos redutos que ainda lhe ofereciam resistência: o sono, o desejo e a imaginação. Sonhamos dentro dos moldes da crença na autodeterminação, como se não fossemos influenciados (diria mesmo: produzidos) por um entorno social. Afinal, podemos “ser quem quisermos”, frágil plasticina multiforme: perdemos a temporalidade e o atrito dos fenómenos (exercício crucial para percebermos a sua génese) para nos dissolvermos no presente perpétuo. 

Mas, não nos iludamos: as redes e suas linguagens colonizaram as subjetividades por razões bem objetivas. Desde logo, a incerteza. Abaladas as certezas, desconfiados das hierarquias e dos dogmas, desiludidos face às instituições (Estado, Governos, Igreja, Família), iludidos pela voragem empreendedora, perdemos a oportunidade de desafiar a ordem de antanho por uma nova ética de generosidade e solidariedade. O capitalismo não tolera espaços vazios e a todo o momento recria as condições da sua reprodução, insinuando novas mediações que se confundem com o respirar e se apresentam como a “vida”, em todos os meandros da expressão e da comunicação. 

E aí entra a febre da competição, essa espécie de guerra civil permanente de todos contra todos, em que comparamos o que temos e não temos, o que julgamos ser e aparentar, o corpo e a máscara, num jogo de espelhos onde só sobram os ossos espectrais. Existimos porque comunicamos e comunicamos pela linguagem da autoexpressividade, anulando o caminho que vai de mim ao outro, com o fermento, tão necessário, dos silêncios comunicantes. Não toleramos limites ao que julgamos ser um direito inalienável à autenticidade. 

Nos bastidores, contudo, reina o medo: de nos encontrarmos sós, de perdermos as guerras imaginárias, de vivermos num mundo hostil, perigoso, em devir catastrófico. Sem a noção do passado, pois cada momento se esquece no fogo fátuo da novidade-que-já-não-é, na míngua de futuro, resta o presente histriónico que se oferece em termos simples: eu ou ele; por ou contra; tudo ou nada. Réquiem ao pensamento complexo. 

Uma profunda insegurança nos atemoriza. Nada garante o trabalho, o pão, a saúde, a paz, a habitação. Esboroa-se o calor da hospitalidade e do acolhimento. Só podemos confiar no nosso estado de performance total. 

Venha, pois, o TIKTOK, que nele me instale e viva e morra.

-Sobre João Teixeira Lopes-

Licenciado em Sociologia pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto (1992), é Mestre em ciências sociais pelo Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa (1995) com a Dissertação Tristes Escolas – Um Estudo sobre Práticas Culturais Estudantis no Espaço Escolar Urbano (Porto, Edições Afrontamento,1997). É também doutorado em Sociologia da Cultura e da Educação (1999) com a Dissertação (A Cidade e a Cultura – Um Estudo sobre Práticas Culturais Urbanas (Porto, Edições Afrontamento, 2000). Foi programador de Porto Capital Europeia da Cultura 2001, enquanto responsável pela área do envolvimento da população e membro da equipa inicial que redigiu o projeto de candidatura apresentado ao Conselho da Europa. Tem 23 livros publicados (sozinho ou em co-autoria) nos domínios da sociologia da cultura, cidade, juventude e educação, bem como museologia e estudos territoriais. Foi distinguido, a  29 de maio de 2014, com o galardão “Chevalier des Palmes Académiques” pelo Governo francês. Coordena, desde maio de 2020, o Instituto de Sociologia da Universidade do Porto.

Texto de João Teixeira Lopes
As posições expressas pelas pessoas que escrevem as colunas de opinião são apenas da sua própria responsabilidade.

Publicidade

Se este artigo te interessou vale a pena espreitares estes também

25 Abril 2024

Disco riscado: Todos procuramos um lugar a que possamos chamar casa

25 Abril 2024

Liberdade, com L maduro!

23 Abril 2024

O triângulo da pobreza informativa na União Europeia. Como derrubar este muro que nos separa?

23 Abril 2024

Levamos a vida demasiado a sério

18 Abril 2024

Bitaites da Resistência: A Palestina vai libertar-nos a nós

16 Abril 2024

Gira o disco e toca o mesmo?

16 Abril 2024

A comunidade contra o totalitarismo

11 Abril 2024

Objeção de Consciência

9 Abril 2024

Estado da (des)União

9 Abril 2024

Alucinações sobre flores meio ano depois

Academia: cursos originais com especialistas de referência

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Viver, trabalhar e investir no interior [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Fundos Europeus para as Artes e Cultura I – da Ideia ao Projeto

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Introdução à Produção Musical para Audiovisuais [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Planeamento na Produção de Eventos Culturais [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Jornalismo e Crítica Musical [online ou presencial]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Iniciação ao vídeo – filma, corta e edita [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Práticas de Escrita [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Comunicação Cultural [online e presencial]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

O Parlamento Europeu: funções, composição e desafios [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Soluções Criativas para Gestão de Organizações e Projetos [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Pensamento Crítico [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Planeamento na Comunicação Digital: da estratégia à execução [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Iniciação à Língua Gestual Portuguesa [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Narrativas animadas – iniciação à animação de personagens [online]

Duração: 15h

Formato: Online

Investigações: conhece as nossas principais reportagens, feitas de jornalismo lento

22 ABRIL 2024

A Madrinha: a correspondente que “marchou” na retaguarda da guerra

Ao longo de 15 anos, a troca de cartas integrava uma estratégia muito clara: legitimar a guerra. Mais conhecidas por madrinhas, alimentaram um programa oficioso, que partiu de um conceito apropriado pelo Estado Novo: mulheres a integrar o esforço nacional ao se corresponderem com militares na frente de combate.

1 ABRIL 2024

Abuso de poder no ensino superior em Portugal

As práticas de assédio moral e sexual são uma realidade conhecida dos estudantes, investigadores, docentes e quadros técnicos do ensino superior. Nos próximos meses lançamos a investigação Abuso de Poder no Ensino Superior, um trabalho jornalístico onde procuramos compreender as múltiplas dimensões de um problema estrutural.

A tua lista de compras0
O teu carrinho está vazio.
0