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Onde está a palavra cultura?

O mês de julho costuma ter, todos os anos, um cheirinho a sexta-feira. É aquele…

Opinião de Tiago Sigorelho

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O mês de julho costuma ter, todos os anos, um cheirinho a sexta-feira. É aquele mês antes das férias, em que parte dos nossos neurónios já se ocupam com as festividades futuras, enquanto outros são resilientes nos esforços profissionais do presente.

Nunca foi um mês dado a grandes reflexões, dedicado a pensamentos complexos. Este é, contudo, um ano diferente de todos os outros que fomos vivendo. E o mês de julho não quis ser distinto dos seus companheiros mensais neste período extraordinário.

Eis senão quando, de repente, este julho espevita-se e manda-nos à cara dois momentos que serão críticos para o futuro do nosso país. Abandona a preguiça pré-agosto e assume a liderança dos meses mais inesquecíveis de 2020.

Logo no arranque do mês, a 5 de julho, para ser preciso, temos conhecimento do documento com o intrigante nome de Visão Estratégica para o Plano de Recuperação Económica e Social 2020-2030. Podes aceder aqui: https://www.docdroid.net/sTLmyl8/plano-de-recuperacao-economica-e-social-de-portugal-2020-2030-5-julho-pdf

Já no dia 21 de julho, depois da famosa batalha dos 5 dias de Bruxelas, surge o documento neutralmente designado por Conclusões da Reunião Especial do Conselho Europeu. Podes ver aqui: https://www.consilium.europa.eu/media/45109/210720-euco-final-conclusions-en.pdf

Estes são, provavelmente, os documentos mais definidores das próximas gerações em Portugal. O apresentado esta semana determina a dimensão do porquinho-mealheiro que iremos quebrar a partir do próximo ano e o do início do mês aponta para onde devemos gastar os tostões que surgiram dos cacos.

Poucas são as vezes em que apenas 15 dias podem ser tão consequentes no futuro de uma população. Por isso, é importante passar a vista por cada um dos documentos. Até 2030, pelo menos, viveremos abrigados pelas palavras destes dois escritos. Permitam-me, na consciência das minhas limitações, abordar levemente cada um deles.

O documento europeu divide-se em duas partes: um plano de recuperação imediata para os próximos 3 anos (Next Generation EU), com os conhecidos 750 mil milhões de euros, segmentados entre 390 mil milhões a fundo perdido e 360 mil milhões em empréstimos com taxas baixas negociadas pela União Europeia como um todo; e um programa mais clássico, semelhante aos habituais fundos europeus, apelidado de Multiannual Financial Framework (MFF), para um período entre 2021 e 2027, com um orçamento de cerca de 1.000 mil milhões (ou um bilião).

Falta detalhar ainda muita informação qualitativa, principalmente para o plano Next Generation EU, mas assume-se que os desígnios identificados para o MFF são similares. Ou seja, uma aposta concentrada na transformação digital, nos recursos naturais e meio ambiente, no controlo de fronteiras e na migração, na defesa e segurança e na coesão territorial.

Já o documento português foca-se mais em detalhar, concretamente, os objectivos e os eixos estratégicos para a recuperação económica e social após a pandemia, para o período até 2030. Existem 9 objectivos claramente definidos e 10 eixos mais abstractos. Essencialmente, grosso modo, há um objectivo central para cada eixo. Excepto para o 10º eixo. O eixo onde a cultura está presente.

Neste documento salienta-se a importância da transição digital, da sustentabilidade, das infraestruturas, do reforço do sector da saúde, do desejo da reindustrialização e das preocupações sociais.

Ora, é desconcertante perceber que a cultura não ocupa lugar na estratégia dos próximos anos. É difícil encontrar uma referência à cultura na declaração europeia e conter o bocejo das parcas ideias relacionadas com a cultura no impresso nacional.

Neste último, para além da cultura ser o único eixo que não tem um objectivo concreto, apenas objectivos com “relação indirecta”, propõe, ainda, um programa que instrumentaliza a cultura em favor dos restantes eixos, com ideias sui generis como estimular a “criação artística com o desenvolvimento de infraestruturas públicas (como eólicas, barragens, transportes)”.

Um país, e um continente, que vive, acima de tudo, das capacidades das suas pessoas deve apostar na educação e na cultura como desígnios fundamentais. Como poderemos ser relevantes na ciência, na inovação, na energia, na saúde, na cidadania, se não damos os estímulos criativos às pessoas?

Sei perfeitamente que não é simples sintetizar estratégias para 10 anos em documentos com pouco mais de 100 páginas. Mas o facto de a cultura ser praticamente excluída, preocupa-me. Fico com a sensação de que quem tem as chaves das decisões ainda não percebeu que uma nação evoluída só se faz com incentivos à educação, à cultura e às artes.

Por isso, mais uma vez, todo o ecossistema cultural vai ter de se manifestar, de lutar pelo lugar que a cultura merece, a bem do futuro. Mas agora estamos mais prontos do que nunca!

Nota: um abraço ao Francisco Cipriano por estar sempre atento e sublinhar a importância destes dois documentos para a cultura.

Texto escrito ao abrigo do antigo Acordo Ortográfico

-Sobre Tiago Sigorelho-

Tiago Sigorelho é um inventor de ideias. Formado em comunicação empresarial, esteve muito ligado à dimensão de gestão de marcas, tanto na Telecel, onde começou a trabalhar aos 22 anos, mais tarde Vodafone, como na PT, onde chegou a Diretor de Estratégia de Marca, com responsabilidades nas marcas nacionais e internacionais e nos estudos de mercado do grupo. Despediu-se em 2013 com vontade de fazer cultura para todos.

É fundador do Gerador e presidente da direção desde a sua criação. Nos últimos anos tem dedicado uma parte importante do seu tempo no estreitamento das ligações entre cultura e educação, bem como no desenvolvimento de sistemas de recolha de informação sistemática sobre cultura que permitam apoiar os artistas, agentes culturais e decisores políticos e empresariais.

Fotografia de David Cachopo

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