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Onde fica o nosso futuro?

Nas segundas Gargantas Soltas de hoje, Manuel Falcão fala-nos da necessidade de construir um arquivo audiovisual para garantir a sobrevivência do património cultural e artístico portugueses.
“Um país sem memória audiovisual da produção e dos agentes culturais e sociais será um país sem existência futura. Mais: um idioma que não exista no audiovisual será um idioma condenado ao desaparecimento futuro.”

Opinião de Manuel Falcão

©Paulo Alexandrino

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A produção audiovisual de um país é, nos dias de hoje, aquilo que vai permitir, no futuro, avaliar a importância da sua cultura. Não direi que será mais relevante que a literatura ou as artes plásticas, mas não tenho grande dificuldade em dizer que é no domínio do audiovisual e da sua distribuição digital que se vai poder preservar a memória, perpetuar o processo de trabalho de criadores das mais diversas áreas, registar a sua produção e divulgar tudo isto. Se não existir registado no audiovisual, certamente não terá existência num futuro já próximo.

Quando passo por uma série de canais europeus - e pela PBS norte-americana - constato que existe uma linha clara de produção que engloba biografias, registo de concertos de orquestras, companhias de dança e teatrais, gravações de festivais e espectáculos, mas também documentários sobre temas que têm que ver com as transformações da sociedade e a evolução do conhecimento. Estes são documentos preciosos, tão importantes como a defesa e a boa utilização da própria língua. Mas em Portugal, por via de regra, esta actividade é a excepção e não a regra. Há alguns documentários sobre artistas e escritores, mas faltam gravações de espectáculos, faltam biografias de figuras relevantes - da cultura, mas também da política, do desporto, da arquitectura, das empresas, da ciência, da história e das ideias. Na melhor das hipóteses temos algumas imagens de arquivo, pequenas entrevistas, registos ocasionais. O grande Alfred Hitchcock dizia que os documentários são narrativas visuais que retratam o mundo real. Enquanto os filmes se baseiam em desencadear emoções, os documentários são uma forma de transmitir e alargar conhecimento ou de fazer um apelo à acção. Parminder Vir, uma produtora e realizadora de documentários da BBC, condecorada com a Ordem do Império Britânico, defende que os documentários contam histórias importantes, muitas vezes desconhecidas, e conseguem captar a atenção de audiências significativas. Sublinha que alguns deles são a melhor fonte de informação, inspiração e entretenimento. E, prossegue, têm também sido elementos fundamentais capazes de chamar a atenção para temas sociais e culturais relevantes. Falando da tecnologia que já é vulgar hoje em dia sublinha que  “a facilidade de aceder a documentários através de serviços de streaming ajuda a criar movimentos por uma maior justiça e mudanças na sociedade”.

Em Portugal falta um trabalho reflectido que permita enquadrar as pessoas e as obras no seu tempo, ouvir opiniões contemporâneas sobre elas. Daqui a uns anos, quando muitas das pessoas com lugar na nossa História contemporânea tiverem já desaparecido, constataremos que o material audiovisual que existe sobre a maioria é escasso, insuficiente, às vezes tecnicamente defeituoso. Este é um enorme problema da nossa política audiovisual, mas também da nossa política cultural. Era desejável e lógico que o Ministério da Cultura e vários dos seus organismos desenvolvessem um programa coerente nesta área, que garantisse o incentivo à produção e difusão deste tipo de produção. Não chega fazer filmes e produzir ficção, é fundamental fazer documentários audiovisuais. A desculpa das audiências é a mais usada para não avançar com este tipo de produção, a que por comodidade se chamou de stock, em contraponto à produção de fluxo. O stock pode ser exibido, reexibido, constitui o registo do nosso tempo fora da actualidade e da espuma dos dias. O fluxo é aquilo que passa, parece importante hoje mas amanhã dificilmente o será. Seria desejável o envolvimento do Governo, dos produtores de audiovisual, dos operadores de televisão para um pacto sobre o aumento da produção audiovisual de stock e sobretudo de documentários. Cada dia que se perde no arranque de uma iniciativa assim deixa de se filmar, registar, preservar, algo de importante que de um momento para o outro pode desaparecer. Além disso, este tipo de produção, que tem custos menores que outras, pode proporcionar maior actividade ao sector e, inclusivamente, beneficiar realizadores e técnicos em início de carreira. Um país sem memória audiovisual da produção e dos agentes culturais e sociais será um país sem existência futura. Mais: um idioma que não exista no audiovisual será um idioma condenado ao desaparecimento futuro.

*Texto escrito ao abrigo do antigo Acordo Ortográfico

-Sobre Manuel Falcão-

Manuel Falcão iniciou-se no jornalismo pela fotografia e, ao longo de duas décadas, desenvolveu a sua carreira como repórter e redactor. Foi fundador do Blitz e de O Independente, trabalhou nas Agências Notícias de Portugal e Lusa, no Expresso, no Se7e e na Visão, entre outros. Realizou vários programas de rádio. Dirigiu as áreas de produção de TV e de novas edições da Valentim de Carvalho e foi diretor do canal 2 da RTP. Foi também Presidente do Instituto Português de Cinema, Diretor do Centro de Espectáculos do CCB e administrador da EGEAC. Durante 15 anos, foi Director-Geral da agência de meios Nova Expressão. Em 2013 fundou a editora Amieira Livros, dedicada à fotografia e, em 2020, criou a SF Media onde desenvolve os seus projetos pessoais.

Texto de Manuel Falcão
A opinião expressa pelos cronistas é apenas da sua própria responsabilidade.

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