Há uma nova orquestra em Portugal que vai para além da música clássica. A Real Câmara quer recuperar o legado orquestral do barroco português, tocando-o sob a direção artística do maestro e violinista italiano Enrico Onofri.
No início de agosto, a sala D.Luís do Palácio da Ajuda recebeu um concerto de apresentação da nova orquestra Real Câmara. Constituída por 16 músicos e com direção artística do maestro e violinista italiano Enrico Onofri, a Real Câmara foi buscar o nome à vida musical portuguesa que, no reinado de João V, estava muito centralizada na Corte e, por sua vez, em Lisboa. O projeto surgiu pela vontade de trazer a música do final do séc. XVII e XVIII - cruzando-a com a música italiana-, para as salas de espetáculo portuguesas. Segundo Diana Vinagre, uma das co-fundadoras do projeto, “a vontade de trabalhar com Enrico Onofri”, que soma décadas de interpretação e investigação na área da interpretação histórica informada, e “recuperar o reportório português do reportório barroco”, foi a semente para fazer nascer a Orquestra: “queremos ter uma plataforma de excelência”, acrescenta.
Questionada sobre o que diferencia a Orquestra Real Câmara das outras orquestras , Diana explica que, para além de todos serem especializados em música antiga, “o que normalmente se chama à interpretação historicamente formada”, todo o reportório querer um processo “interpretativo paralelo ao processo mais vulgar a que assistimos na música dita erudita, pressupondo ainda um conhecimento histórico do contexto em que a musica foi escrita, seja através de instrumentos, na forma em que estavam na altura, seja pela pesquisa, através de fontes primárias, de documentos que nos permitam ler melhor a partitura, porque quanto mais para trás vamos, menos detalhada é a partitura. Os músicos tinham uma série de acordes tácitos e muita coisa e não estava na partitura, só conseguimos descobrir essas coisas através de outras fontes”, explica a cofundadora ao Gerador.
“Dal Tevere al Tago” (“Do Tibre ao Tejo”): música ao gosto italiano para a Orquestra da Real Câmara no tempo de D. João V, foi o programa escolhido pela orquestra para se apresentar ao público. O programa foi constituído por peças de compositores italianos e portugueses do reinado de João V, algumas em estreia moderna, como “Ogni fronda chè mossa dal vento”, da serenata “Il vaticinio di Pallade, e di Mercurio”, de Francisco António de Almeida (1703-1754), que foi um dos bolseiros portugueses em Itália, nessa época, e que foi apresentada no Palácio Real da Ribeira, em 1731, culminando "com louvores ao rei magnânimo”. Rinaldo di Capua (1705-1780) “Nacqui agli affani in seno”, ária do 'dramma per musica' “Catone in Utica”, “Tutti nemeci e rei, tutti tremar dovete”, de “Adriano in Siria”, e ainda, de Giovanni Bononcini (1670-1747), “Mio sposo t’ arresta”, ária de “Farnace”, foram outras das estreias modernas apresentadas pela Orquestra da Real Câmara.