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Os jovens portugueses e a política: uma relação à distância?

Entre os altos níveis de abstenção e uma falta de identificação com os modos de participação política convencional, surgem gerações que expressam sentimentos de frustração para com o sistema político-partidário. A desadequação das estratégias de mobilização e comunicação dos partidos políticos levam os jovens a procurarem novas formas de participar.

Texto de Débora Cruz

Fotografia cortesia de Carlota Duarte

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No passado dia 29 de novembro, dezenas de manifestantes reuniram-se em frente ao Edifício F do Campus da Justiça, em Lisboa. Duas grades de ferro e quatro agentes da Polícia Judiciária impediam o avanço dos ativistas para o átrio do edifício. «Não estão sozinhas» era o mote do protesto e a frase escrita a branco que se lia sobre o pano pintado de vermelho empunhado por quatro dos manifestantes. 

Entre o burburinho que se ouvia, causado pelas conversas paralelas, surgiu uma voz feminina amplificada por um megafone. «Olá a todos», começava, «estamos aqui, na manifestação, em solidariedade com os quatro estudantes detidos da Faculdade de Letras». Cerca de duas semanas antes, os jovens agora presentes em tribunal ocupavam a Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa (FLUL) em protesto pelo clima quando a Polícia de Segurança Pública (PSP), chamada pela direção da faculdade, exigiu que saíssem. Os quatro estudantes recusaram e acabaram por ser detidos. 

A 14 de novembro, os jovens foram ouvidos pelo Ministério Público, mas rejeitaram a suspensão provisória do processo e optaram por ir a julgamento. Foram acusados de «introdução em local vedado ao público» e de «não dispersão de uma reunião pública», como explicou aos jornalistas o advogado dos estudantes, André Ferreira. Numa demonstração de solidariedade, os ativistas da Greve Climática Estudantil de Lisboa agendaram uma manifestação e marcaram presença junto à porta do tribunal. 

Às 14h30, os quatro jovens entraram para o Edifício F do Campus da Justiça e, cá fora, o protesto de apoio às ativistas não cessou. «Prendam o ministro, não as ativistas», «Lutar pelo clima não é crime», «Para que a nossa espécie não fique extinta, fim aos fósseis até 2030» e «Fora Costa e Silva», foram alguns dos cânticos entoados pelos manifestantes. Ao Gerador, João Veloso, ativista da Greve Climática Estudantil do Tejo, faz um balanço positivo do movimento Fim ao Fóssil: Ocupa!.

O jovem de 26 anos considera que «os estudantes mostraram que estamos já num ponto em que não é só preciso manifestar-nos» e que «é necessário dar um passo em frente». O ativista sublinha que a luta pelo clima é «antiga» e os anseios dos jovens não têm recebido respostas satisfatórias por parte dos poderes políticos. «Temos de ocupar os nossos espaços de ensino para que de facto nos ouçam e deem resposta àquilo que são as nossas reivindicações», defende, «já andamos a lutar há muitos anos por elas e continuam, essencialmente, sem ser ouvidas».

Para além da Greve Climática Estudantil do Tejo, João Veloso integra ainda a Brigada Estudantil e o coletivo Minas Não. Para o jovem, a participação política não se esgota em momentos eleitorais ou em militâncias partidárias e as manifestações cívicas pelo clima têm sido um exemplo da participação ativa dos jovens. «[A participação política] tem várias vertentes e é muito abrangente», afere, «ser politicamente ativo vai desde participar numa associação que dinamiza debates ou conversas, a participar numa associação de estudantes ou num coletivo».

A participação política dos jovens tem sido objeto de estudo e tema de múltiplas conversas. Já em 2019, na abertura da Conferência Mundial de Ministros Responsáveis pela Juventude, Marcelo Rebelo de Sousa alertava para a necessidade de refletir sobre o que afasta os jovens do sistema político. Em junho deste ano, o presidente da Assembleia da República, Augusto Santos Silva, questionava, numa conferência intitulada Os Jovens, o Jornalismo e a Política, se a abstenção entre os eleitores jovens seria algo cíclico ou antes um fenómeno geracional que pode enfraquecer a democracia. 

Mas de que política se fala quando se discute a diminuta participação da juventude? E como percecionam os jovens a sua própria participação política?

A abstenção, a participação «arcaica» e a preferência pelo não convencional

Em março de 2022, a Fundação Calouste Gulbenkian (FCG) divulgou as conclusões de um estudo, desenvolvido entre junho de 2020 e março de 2021, acerca da participação política dos jovens portugueses. O estudo, intitulado A Participação Política da Juventude em Portugal, foi promovido pelo Fórum Gulbenkian Futuro, em parceira com o Centro de Estudos e Sondagens de Opinião da Universidade Católica Portuguesa. 

No relatório síntese da investigação desenvolvida, lê-se que «a ideia frequentemente veiculada de que se assiste a um declínio generalizado da participação política da juventude em Portugal não é apoiada pelos dados disponíveis». Através da análise dos dados do European Social Survey, de 2002 a 2019, e através da realização de inquéritos, entrevistas e de grupos focais, os investigadores concluíram que os jovens manifestam uma tendência a participar menos do que os mais velhos em formas de participação descritas como convencionais. Aqui incluem-se as formas de participação orientadas para o sistema partidário: o voto, comícios de partidos e a participação em atividades partidárias. 

No entanto, o estudo alerta que esta situação não é exclusiva dos mais novos, nem pode ser considerada um fenómeno português. Ao nível da abstenção, não são apenas os jovens que tendem a não exercer o seu direito de voto. De acordo com os dados da Secretaria-Geral do Ministério da Administração Interna, nas últimas eleições autárquicas, em 2021, a abstenção atingiu os 46,35 %. Nas eleições legislativas deste ano, ainda que se tenha registado uma diminuição face a 2019 (51,4 %), os valores de abstenção atingiram os 48,6 %. Nas últimas eleições presidenciais, 60,8 % dos cidadãos eleitores não foram às urnas. Ainda assim, foi nas eleições para o Parlamento europeu que se registaram os valores mais altos: 69,3 % de abstenção.

Para além da faixa etária, existem outros fatores que influenciam a propensão de exercer o direito de voto. Patrícia Silva, doutorada em Ciências Políticas e investigadora na Universidade de Aveiro, explica que os agregados familiares com rendimentos mais baixos tendem a participar menos, assim como os cidadãos com menores níveis de habilitação. «[Estes fatores] constituem variáveis que são mais difíceis de trabalhar», indica. «Os rendimentos e os níveis habilitacionais estão de alguma forma relacionados, o que gera aqui uma mistura muito complexa em termos da relação que estas pessoas têm com o sistema político e a votação».

As atitudes e perceções que os jovens e a população em geral têm acerca do sistema político-partidário também afetam a participação política. «A ausência de uma ligação às peças centrais das eleições, que são as estruturas partidárias, faz com que [as pessoas] tenham uma perspetiva muito crítica e negativa [sobre eles]», explica Silva, «[faz com] que entendam que estas estruturas nem sempre os representam, que estão mais interessadas em autoproteger-se do que a fazer o seu exercício de representação» e «isso é naturalmente uma variável que tende a afastar os cidadãos do exercício de voto».

Para a investigadora da Universidade de Aveiro, a alternância no Governo, ao longo das últimas décadas, entre o Partido Socialista (PS) e o Partido Social-Democrata (PSD) também pode condicionar a forma através da qual os jovens percecionam o sistema político. «O exercício que os cidadãos e os jovens fazem é: votar num ou noutro é a mesma coisa», explica, «o mecanismo de feedback deixa de funcionar porque aqueles que alternam no executivo são os mesmos». Patrícia Silva destaca que esta rotatividade pode contribuir para que os jovens não se sintam representados e prefiram formas não convencionais de participação política de forma a mobilizar temas que os partidos não lhes permitem.

O estudo publicado pela FCG corrobora, em parte, esta hipótese. O relatório síntese da investigação dá conta de que, apesar da propensão das gerações mais jovens de não participar tanto quanto as mais velhas em atividades convencionais, identificam-se cada vez mais com outras formas de participação emergentes. A participação online, em associações e a participação em debates e manifestações cívicas são algumas das formas através das quais os jovens se mantêm politicamente ativos.

Mariana Gil tem 16 anos e, apesar de não ter militância partidária, tenta marcar presença assídua em debates, reuniões e manifestações. «Em outubro, estive no MICAR — Mostra Internacional de Cinema Anti-Racista e tento estar um pouco envolvida por todo o lado», declara. A estudante, natural do Porto, acredita que os jovens têm encontrado várias formas de estarem envolvidos politicamente que se adaptam a cada um indivíduo e vê a participação cívica como o possível começo de uma vida política ativa. «Acho que é uma forma de antecipação dessa vida política mais adulta: do ato de voto e do envolvimento partidário», defende.

"Sou mulher, sou cigana e sou negra, desde sempre me considero um corpo político", declara Gil. Fotografia cortesia de Mariana Gil

A tendência dos jovens em participar politicamente através de modos não convencionais é justificada por Gil pela forma como os partidos e as juventudes partidárias abordam os mais novos. «A abordagem aos jovens já não se adapta muito à nossa geração», argumenta, «somos uma geração muito versátil que quebra muito com aquela ideia clássica de reunião e de comício muito arcaico, então vamos buscar outras maneiras de participar ativamente, mesmo que não possamos [ainda] votar».

Para Leonor Rosas, deputada na Assembleia Municipal de Lisboa (AML) pelo Bloco de Esquerda, a participação política não convencional pode corresponder a um «primeiro contacto» com uma causa ou um assunto de interesse particular que facilita, mais tarde, a participação convencional ou partidária. «É mais fácil, numa fase inicial, quando uma pessoa se interessa por política ou se começa a aperceber do caráter político do que a rodeia, mobilizar-se por um tema, como as questões climáticas», sustenta, «e, mais tarde, percebe que tudo está ligado e que associado à questão climática vêm questões do sistema capitalista, de orientação e identidade de género, etnia e raça, e talvez se filie ou se aproxime de um partido».

A deputada de 23 anos salienta ainda que o caráter esporádico e o menor grau de compromisso das formas de participação não convencional podem também influenciar as preferências dos jovens. «Às vezes, as pessoas estão mesmo interessadas numa causa antes de se expandirem para uma panóplia de causas, porque quando te interessas num partido, não é por acreditares numa causa, é porque acreditas numa série de respostas que estão todas interligadas a uma série de problemas», declara.

Leonor Rosas na VIII Conferência de Jovens do Bloco de Esquerda. Fotografia cortesia de Leonor Rosas

O afastamento dos canais de participação convencionais e o crescimento da participação não convencional é sustentado por três grandes fatores, no estudo da FCG. A participação não convencional permite «ações de natureza mais concreta em torno de causas específicas» e «mais próximas da vivência quotidiana das/dos jovens e às quais é conferido maior significado», permite «ações de curta duração» que não exigem «um compromisso de continuidade» e possibilita a «perceção de valorização do contributo dos/das mais jovens enquanto elementos catalisadores de mudança».

Para além destes fatores, a investigadora Patrícia Silva, uma das coordenadoras deste estudo, aponta que a utilização de estratégias mais irreverentes por parte dos jovens se prende também com a organização hierárquica horizontal deste tipo de participação. «Dentro das estruturas partidárias, os jovens até podem sinalizar os temas, mas não vão ser eles a mobilizá-los», explica, «a sua capacidade de ação é mais reduzida porque estas estruturas são hierárquicas e os jovens estão mais na base». Por outro lado, nos espaços não convencionais, os jovens conseguem «tirar partido da sua irreverência, visto que sabem que não é relegada para segundo plano e tiram mais proveito destes canais, que são horizontais e tomam decisões em conjunto».

Há cerca de dois anos, Tatiana Pinto e alguns dos seus colegas fundaram o Núcleo Antifascista de Bragança. «Somos uma estrutura horizontal, acreditamos que somos todos iguais e não é preciso ter cargos, de momento», elucida. «A nossa preocupação em criar o núcleo foi a ascensão da extrema-direita em Portugal», explica a jovem. «Tivemos preocupação em ver que houve muitos votos, sobretudo em Bragança e nos meios de interior e mais conservadores, e achámos que era importante informar as pessoas, porque não acreditamos que esses votos partam todos de discriminação ou do ódio, mas sim de uma falta de informação muito grande».

Para a jovem de 24 anos, a preferência pela participação não convencional prende-se, em parte, com a maior liberdade que estas formas de participação permitem. «Associarmo-nos a um só partido [significa que] temos de, quase sempre, apoiá-lo, e no núcleo somos apartidários», defende, «somos uma organização política mas não estamos filiados a nenhum partido e isso dá-nos liberdade: apesar de termos ideologias diferentes, podemos lutar pelo bem comum».

Em outubro, Carlota Duarte, de 17 anos, foi uma das pessoas que organizaram a 5.ª Marcha de Viseu Pelos Direitos LGBTQIA+, promovida pela Plataforma Já Marchavas, que integra desde maio. «Acho que a luta nas ruas é algo que nos dá muita visibilidade porque estamos a mostrar-nos aos outros e àquilo que pensamos», assevera a jovem. «Acho que é a melhor forma que temos de nos expressarmos: sair à rua e mostrar o que pensamos e o que estamos a defender para as pessoas nos verem».

5.ª Marcha de Viseu Pelos Direitos LGBTQIA+, em 2022. Fotografia cortesia de Carlota Duarte

Ainda com 16 anos, a ativista decidiu filiar-se no Bloco de Esquerda e foi através da sua militância partidária que aderiu à associação. Carlota Duarte acredita que deveria existir uma maior articulação entre as associações cívicas e os partidos políticos ou juventudes partidárias, visto que perceciona que ambas as formas de participação «estão relacionadas» e que «certas coisas dependem do partido e outras das associações», pelo que «a articulação seria uma forma de os jovens participarem mais na política».

Porém, João Veloso ressalva que a identificação com o não convencional pode justificar-se também pela descredibilização associada aos partidos políticos. «Os jovens, por um lado, tendem a não se sentir representados pelos partidos e pelo sistema partidário», começa por explicar, «por outro lado, não falando em termos gerais porque não acho que todos [os partidos] sejam assim, mas há alguma falta de diálogo entre o que é o Parlamento, os partidos e os jovens».

A desadequação da comunicação com os jovens e a importância da representatividade

O atual presidente da Direção-Geral da Associação Académica de Coimbra (DG/AAC), João Pedro Caseiro, indica que o «bichinho pelo associativismo estudantil» surgiu no seu primeiro ano de licenciatura, em 2017. Desde então, integrou os corpos gerentes do Núcleo de Estudantes de Psicologia, Ciências da Educação e Serviço Social (NEPCESS), foi membro da Associação Nacional de Estudantes de Ciências da Educação e vice-presidente da DG/AAC. 

O mestrando em Administração Educacional acredita que «existe uma falha na comunicação das ideias dos partidos para os jovens» e crê que o meio em que são mais eficazes a comunicar com os jovens «acaba por ser muito direcionado para a educação e o ensino superior». O estudante de 23 anos defende que existe uma necessidade de reconfigurar as mensagens divulgadas, visto que «o mecanismo mais indicado para chegar aos jovens» já é utilizado pelos partidos políticos: as redes sociais. 

João Pedro Caseiro aponta a forma como a Iniciativa Liberal conseguiu, através da sua estratégia de comunicação, diferenciar-se dos outros partidos políticos e tornar-se mais apelativa para a população jovem. Ainda assim, denota a dificuldade das estruturas partidárias em chegar, por exemplo, a populações residentes em meios rurais. «Cada partido deveria apostar em diferentes estratégias de comunicação, com base nos diferentes públicos que quer alcançar», declara.

João Pedro Caseiro na Abertura Solene das Aulas da Universidade de Coimbra para o ano letivo de 2022/2023. Fotografia cortesia de João Pedro Caseiro

Por sua vez, Miguel Costa Matos, deputado na Assembleia da República pelo PS e secretário-geral da Juventude Socialista (JS), constata que, muitas das vezes, a comunicação e a organização dos partidos políticos estão feitos de forma unilateral. «Existe uma liderança partidária que decide, transmite e presta conta aos militantes dos partidos, naquilo que é a sua estratégia, a sua visão e as suas propostas», explica, «durante muito tempo isso foi mais dirigido aos reformados, mas o PS tem, felizmente, sabido falar mais de jovens nos últimos tempos e tem feito políticas públicas dirigidas a jovens».

No relatório síntese do estudo da FCG lê-se que «a origem do afastamento dos jovens da política é identificada maioritariamente do lado da oferta e, em particular, ao nível da (falta de) mobilização e motivação dos mais jovens». Os jovens entrevistados pelos investigadores apontaram a desadequação das propostas direcionadas para as gerações mais novas e a desadequação das estratégias de comunicação dos partidos políticos, que defendem dever ser mais ancorada nos meios digitais.

Patrícia Silva explica que os partidos políticos têm os seus nichos de mercado que, regra geral, não são jovens. «Quando olhamos para as ofertas partidárias e para as suas propostas em termos de políticas públicas e de medidas para o país, a larga maioria delas não é pensada para os jovens», esclarece a investigadora, «são um grupo eleitoral que pode fazer a diferença em termos de resultados eleitorais, mas que não participa e que isso faz com que os partidos não olhem para esta faixa etária».

A investigadora explica que os partidos tendem a canalizar a sua oferta de medidas políticas para o grey vote, ou seja, para os cidadãos que "já têm a sua vida estabilizada, que já estão a trabalhar e [que já têm] famílias constituídas». Também dentro das camadas mais jovens tende a existir uma canalização das mensagens e medidas políticas. «Basta que pensemos nos jovens que participam nas juventudes partidárias», elucida Silva, «os jovens que estão mobilizados são de grandes centros urbanos e com níveis de escolaridade elevados».

A tendência dos mais jovens para não irem às urnas e a canalização da atividade partidária para os cidadãos que podem fazer a diferença em momentos eleitorais gera um ciclo difícil de quebrar. «Se os jovens não participam, tal gera pouco incentivo para que os partidos também possam olhar para eles», afirma a investigadora, «se os partidos têm poucos incentivos para olhar para os jovens, eles olham para os partidos e dizem que os partidos não falam para os jovens e, portanto, também não participam». Desta forma, gera-se um efeito cíclico que é «pernicioso para a democracia», mas «muito difícil de se quebrar», defende Silva.

A investigadora acredita que os partidos podem quebrar este ciclo e que «têm feito esse exercício» através de propostas como o alargamento do voto para a partir dos 16 anos. «Esta é uma medida para estimular a participação dos jovens e que, de alguma forma, sugere que os partidos também estão interessados em que participem», declara. No entanto, Patrícia Silva sublinha que os jovens necessitam também de sinalizar essa vontade de participar. 

Apesar da importância que atribui à qualidade da comunicação dos partidos, João Pedro Caseiro acredita que a melhor forma de ouvir e comunicar com os jovens é através da representação. «A melhor forma de aumentarmos a auscultação dos jovens é aumentar a sua representatividade nos órgãos de poder», argumenta. «Creio que, neste momento, isso está em falha, [porque] não há uma representatividade adequada da comunidade mais jovem do nosso país neste tipo de órgãos».

Patrícia Silva argumenta que as estruturas partidárias não demonstram uma grande abertura aos jovens. «No momento mais importante na vida do partido, em que escolhem os candidatos para as eleições, o momento em que os partidos constituem as listas para o Parlamento Europeu, para a Assembleia da República, para o [poder] local, os jovens não são trazidos para a mesa» ou são colocados em lugares não elegíveis, sustenta. A investigadora explica que os partidos têm «um filtro muito ativo e que é muito enviesado para os mais velhos e estabelecidos», fazendo com que sejam «sempre as mesmas pessoas a representar os partidos e os jovens percebem».

No caso do CDS — Partido Popular, destaca-se a escolha de Francisco Rodrigues dos Santos para a liderança do partido, em 2020, quando este tinha apenas 31 anos de idade. Até à sua eleição, o antigo presidente do partido era, desde 2015, o líder da Juventude Popular (JP). Francisco Camacho, atual presidente da JP, salienta que «as questões de representação são importantes, na medida em que haja uma identificação geracional com aqueles que nos representam». 

Para o consultor jurídico, este fenómeno permite uma maior identificação social, visto que «quem sente na pele certos problemas é capaz de sensibilizar de outra forma o debate político para os mesmos». Porém, salienta que, apesar de importante, a questão geracional não é impeditiva. «Uma pessoa que tenha 40 ou 50 anos, se tiver uma consciência social forte sobre certos desafios, pode representar igualmente bem a prossecução de interesses das novas gerações», explica. «As respostas a cada problema não se fazem só em função da idade, fazem-se em função das suas convicções, dos seus princípios, da sua visão doutrinária e ideológica sobre os temas e também da forma como trabalha e analisa cada problema social», acrescenta ainda.

Francisco Camacho aderiu à JP, em 2011, e ao CDS-PP, em 2014. Fotografia cortesia de Francisco Camacho

Sobre a articulação entre os partidos políticos e os jovens, o líder da JP acredita que a qualidade das estratégias de comunicação utilizadas não acompanhou a crescente exigência e sofisticação dos jovens e restantes cidadãos. «Hoje, os eleitores têm uma exigência muito maior, fruto da sua literacia, do que tinham há uns anos e, daqui a 15 anos, se tudo correr bem, vão ter ainda maior exigência», explica. «Há vários setores da nossa sociedade que se conseguiram modernizar, [mas] os partidos não se conseguiram modernizar à mesma velocidade e isso gera esse espírito, esse intervalo, na capacidade de comunicação», continua.

Do outro lado do espectro partidário, Miguel Costa Matos afirma que os partidos deveriam «adotar uma comunicação mais arrojada, mais fresca e mais irreverente». O vice-presidente do grupo parlamentar do PS acredita que os jovens sentem que "a política não fala para eles, não fala com eles e não está nos sítios onde eles estão», defende, «e, por isso, o nosso trabalho tem de ser ir ao encontro dos jovens e falar sobre os temas dos jovens». 

A presença e comunicação são também apontadas pelo secretário-geral da JS. «A premissa das redes sociais depreende uma partilha mútua de conteúdos e informações», destaca, «e é neste sentido que me parece que não só a escola [ensino sobre e que estimule a participação política] deve mudar, mas a própria política tem de mudar no sentido de criar atividades e de criar métodos de comunicação que potenciem um bocadinho [a participação]».

Miguel Costa Matos entrou na JS com 14 anos e é secretário-geral desde 2020. Fotografia retirada do Facebook de Miguel Costa Matos

O deputado da AR menciona também a importância de fazer com que os jovens sintam que as suas ideias são consequentes. De acordo com o estudo da FCB, os jovens correspondem às faixas etárias onde se registam os maiores níveis de «autoeficácia política», ou seja, um sentimento de que a sua participação tem consequências e pode influenciar tomadas de decisão. Para Miguel Costa Matos, é necessário transcender a comunicação e materializar as ideias e propostas dos jovens para continuar a atingir este sentimento.

O desencanto com o sistema político-partidário e o sentimento de estagnação

A desadequação das estratégias de comunicação dos partidos políticos, a falta de identificação com as formas de participação convencional, a perceção de que as suas condições de vida não têm vindo a melhorar e a falta de esperança que reconhecem para o futuro são alguns dos sentimentos apontados pelos jovens que contribuem para uma desmoralização. Parece surgir, entre as gerações mais novas, uma ideia de estagnação e de falha do sistema que as desmoraliza de participar ativamente.

Francisco Camacho sublinha que, apesar de os jovens terem interesse em participar e terem, por norma, um maior acesso a informação, as «novas gerações têm estado um pouco defraudadas com o que têm sido algumas respostas de uma parte do que compõe a política, nomeadamente algumas vias mais convencionais: os próprios partidos não têm dado respostas que interconectem a juventude com o poder político». A falta de respostas para as novas gerações tem «desencantado um pouco» a juventude, defende.

O presidente da JP reitera que «os jovens não dizem que não à política», mas antes que «dizem não a uma certa forma de fazer política». Camacho explica que os jovens não se reveem numa «forma de fazer política redonda, que não tem em atenção os verdadeiros desafios das novas gerações e as suas verdadeiras carências» que, no ponto de vista material, «se relaciona com uma ausência do discurso político que vá ao encontro do que são as expectativas dos jovens».

Francisco Camacho a discursar na Escola de Quadros 2021. Fotografia cortesia de Francisco Camacho

O relatório síntese do estudo da FCG dá conta de que «mesmo admitindo que existe uma parte da juventude passiva e desinteressada, este fenómeno é atribuído à desilusão com os atores políticos (a descredibilização da classe política é mencionada reiteradamente) e à sua incapacidade de motivar e mobilizar as gerações mais novas». No entanto, a possível «alienação» sentida pelos jovens ocorre em relação à «maquinaria democrática», ou seja, em relação aos partidos políticos, e não face aos princípios democráticos, «contrariando o argumento da despolitização ou da apatia da juventude», lê-se no relatório. 

Tatiana Pinto constata que o sentimento de alienação está relacionado com uma perceção de estagnação. «Tem muito que ver com o facto de parecer que estamos sempre estagnados no mesmo sítio, não temos perspetivas para o nosso futuro, para o acesso à habitação, o emprego é também muito escasso e muito precário», explica. «No geral, não temos muitas perspetivas para o futuro e continuamos a acreditar que não está nada a mudar». A ativista de 24 anos acredita que só através de manifestações cívicas se tem conseguido influenciar os processos políticos.

A investigadora da Universidade de Aveiro, Patrícia Silva, explica que a visão negativa que os jovens detêm da classe política é sustentada por diversos fatores. «Por um lado, os jovens percebem que, em debates e campanhas eleitorais, são pouquíssimas as medidas que são direcionadas especificamente para os jovens», esclarece, «se pensarmos nas últimas eleições, há temas transversais que não foram trazidos para debate, como a qualidade da educação, o primeiro emprego e as saídas profissionais, a constituição de família e a habitação». Além disto, a investigadora sustenta que a «ideia da corrupção generalizada» da classe política também descredibiliza os partidos e afeta a participação.

Entre os jovens existe também quem questione a razão pela qual as novas gerações «já não vêm nos partidos políticos uma razão para ter esperança, para se envolverem ou então para irem votar», equaciona Leonor Rosas. «Acho que isto tem que ver com uma ideia de esperança e de futuro que foi roubada», argumenta, «a nossa geração e as pessoas um bocadinho mais velhas viveram já duas crises, passámos por uma pandemia quando estávamos a entrar na adolescência, vimos as condições de vida dos nossos familiares a piorarem drasticamente com a crise e com a intervenção da troika».

A deputada na AML perceciona que existe ainda uma «ideia de um triunfo de um pensamento neoliberal que diz que há um presentismo infinito em que o futuro é uma reprodução infinita do presente», explica. «Nascemos numa altura, no final da década de 1990, [em que existia a perceção] de que a História tinha acabado, de que já não havia mais uma possibilidade de um futuro diferente, que íamos infinitamente viver num capitalismo financeiro e nesta suposta democracia liberal». Rosas acredita que a esquerda deve trabalhar no sentido de devolver aos jovens a «ideia da possibilidade da transformação social e de uma possibilidade de futuro». 

Miguel Costa Matos acredita também que, nos últimos muitos anos, «a política, sobretudo na área do socialismo democrático, entre os anos 1990 e 2000, tinha como pressuposto aceitar, de forma quase acrítica, o mercado como ele existia e pôr apenas paliativos sociais». O deputado da AR afirma que o período de austeridade vivido contribuiu para que o sentimento de que os «partidos são todos iguais» se enraizasse na população portuguesa. Porém, sublinha que este paradigma sofreu uma grande mudança a partir de 2015.

O secretário-geral da JS sustenta que medidas como a creche gratuita, os manuais escolares gratuitos, a redução da propina e o aumento das bolsas permitiram que os jovens pudessem entender que «a política fez a diferença nas suas vidas», apesar de poderem não percecionar a política como fator decisivo para as mudanças registadas. Miguel Costa Matos acredita que a classe política tem a tarefa pedagógica de demonstrar que «através de um Estado Social, através de instituições públicas, consegue promover-se a igualdade de oportunidades» e que «não precisamos de deixar às mãos invisíveis do mercado a construção dessa liberdade para as pessoas poderem realizar seus projetos de vida».

O deputado de 28 anos reconhece que os jovens possam estar desiludidos com a política, mas reivindica que é necessário valorizar o papel que desempenha na vida dos cidadãos. "Precisamos de dizer às pessoas que a política está a fazer tudo isto [as mudanças] nas suas vidas, inclusive quando achamos que não está a apoiar o suficiente, que devia ter ainda mais apoio, isso é uma opção política, não dar esse apoio», explica. «Temos de convidar as pessoas a perceberem que o seu dia a dia é um somatório de várias decisões políticas em que elas podem participar» e «não podemos ter este discurso de autoesvaziar a política», remata.

Miguel Costa Matos a discursar na Escola Secundária Avelar Brotero, em Coimbra. Fotografia retirada do Facebook de Miguel Costa Matos

«Vai para a creche»: a desvalorização das vozes dos jovens

Para além da desadequação das estratégias de comunicação e mobilização, os jovens apontam que, em função das suas idades, as ideias e opiniões que expressam nem sempre são valorizadas. No estudo da FCG lia-se que, na perspetiva dos ativistas entrevistados, a participação de jovens é desvalorizada por serem vistos como «imaturos e pouco autónomos», pela sociedade e pelos partidos políticos.

Foi com 21 anos que Leonor Rosas foi eleita deputada na AML e conta ter ouvido, no âmbito de debates realizados na Assembleia Municipal, que deveria «ir para a creche» ou «ir estudar». A militante do Bloco de Esquerda defende que ao invés de se rebater uma opinião expressada por um jovem, o argumento que é muitas das vezes mobilizado é de autoridade. «É surreal, todos enchem facilmente o peito e clamam por mais jovens na política, [e afirmam que] é preciso que eles se interessem, mas depois não toleram que existam jovens que, por acaso, têm uma opinião que diverge da sua», conta, «[existe] esta ideia de que somos necessariamente pouco formados».

Leonor Rosas filiou-se no Bloco de Esquerda quando tinha 18 anos. Fotografia cortesia de Leonor Rosas

Também Mariana Gil reconhece este tipo de desvalorização e uso de argumentos de autoridade contra os mais novos. «Os jovens são muito descredibilizados e nunca se sentem ouvidos pelas instituições, porque desde pequenos há sempre aquela ideia de 'OK, o professor é uma autoridade’ e isso começa na escola e vai para outros meios, nomeadamente para os partidos e para a política», argumenta.

Patrícia Silva indica que mesmo nas juventudes partidárias existe a ideia de que os jovens não têm ainda formação suficiente, nem são «maduros o suficiente para estar no clube dos grandes dos partidos». A investigadora foi uma das responsáveis pela redação do terceiro relatório publicado pela FCB, intitulado As juventudes partidárias e os movimentos associativos, e conta que alguns dos jovens entrevistados admitiam que «o ideal seria que as juventudes desaparecessem, porque têm o efeito de cristalizar esta ideia de que precisamos de formar jovens dentro de estruturas partidárias e que enquanto estiverem na estrutura jovem, tal sinaliza que ainda não estão preparados para participar dentro das estruturas dos partidos». 

O papel das juventudes partidárias

Os partidos políticos não são as únicas estruturas pelas quais os jovens sentem algum afastamento ou das quais detêm perceções negativas. No relatório síntese do estudo da FCG, lê-se que as juventudes partidárias são «consideradas relevantes» pelos jovens, mas reconhece-se «a difícil relação interna com as direções dos partidos» e a existência de preocupações em relação à margem de autonomia destas estruturas jovens.

Patrícia Silva salvaguarda que, durante a realização do estudo, os investigadores denotaram que os militantes de juventudes partidárias sentem que, por vezes, os partidos instrumentalizam os jovens pertencentes a estas estruturas. «Ficámos com a perceção muito clara de que os partidos utilizam as juventudes partidárias como uma ponte, mas como se só tivesse um sentido: o sentido do partido, estrutura-mãe, para os jovens», explica, «mas não utilizam o potencial que as juventudes têm de garantir o sentido inverso: estes jovens podem utilizar as juventudes para sinalizar aos partidos, preocupações muito específicas [da juventude]». A investigadora salienta que «as juventudes não querem ser a voz dos partidos para os jovens, querem ser a voz dos jovens para os partidos».

O presidente da DG/AAC, João Pedro Caseiro, não nega a hipótese de ter uma militância partidária no futuro, mas admite que, neste momento, o seu foco é a AAC. «Tenho a minha função na AAC, tento afastar-me desse meio para não haver qualquer tipo de indiscrição entre os dois mundos e mantenho a minha idoneidade», reitera. O estudante frisa que o foco exclusivo das juventudes na transmissão de uma ideologia para os jovens seria errado, mas acredita que estas estruturas têm conseguido desempenhar ambas as missões. «A par desta transmissão [de ideologia], devem ser uma voz para os jovens e servir de ponte entre estes e os partidos», assevera, «deve ser [este] o principal foco, de modo a estimular a participação dos jovens na política».

Manifestação dos estudantes da Universidade de Coimbra pelo reforço da ação social. Fotografia cortesia de João Pedro Caseiro

Atualmente, Mariana Gil também não tem qualquer militância partidária, mas não descarta a possibilidade de integrar uma juventude ou um partido no futuro. Apesar de considerar que tem de existir um equilíbrio entre o envolvimento cívico e a participação partidária, a jovem teme que as estruturas jovens adiram a uma causa «por conveniência», utilizando-a como um «peão de propaganda». Para a ativista, as juventudes acabam por ter a sua margem de autonomia condicionada pelos partidos e não permitem tanto uma discussão aberta e pouco burocrática.

Sobre a independência da JP face ao CDS-PP, Francisco Camacho garante que a estrutura jovem tem «quadros capazes de dar respostas, de construir programas, de produzir pensamento e de ter ação política». Para o deputado municipal da AML, a melhor forma de combater a possível instrumentalização das juventudes é através da «autenticidade que os jovens têm na participação política, ao fazer valer as nossas ideias, e as nossas convicções» e garantir, desta forma, a capacidade de influência das juventudes sobre os partidos políticos.

Também Miguel Costa Matos assegura que a JS consegue manter a sua margem de autonomia face ao PS. «Temos a nossa autonomia política e não abdicamos de defender nada porque o partido acha que não devemos ou acha que não é a altura», assevera. «Cabe-nos não sermos instrumentalizados, ter as nossas ideias e não desistirmos delas, não somos apenas caixas de ressonância do partido em que nos inserimos e, nos programas do PS, as nossas propostas, nos orçamentos e nos projetos, são tidas em conta».

João Veloso nunca integrou nenhuma juventude partidária, mas já se associou a dois partidos no passado, acabando por se desvincular devido a divergências. Neste momento, afirma que decidiu priorizar o ativismo e a intervenção social, mas não põe de parte o regresso à participação partidária. Ainda assim, manifesta uma preocupação com a possível articulação entre ativistas e estruturas partidárias. «Acho que essa é a principal preocupação, a de haver instrumentalização, por isso é que tende a existir uma tentativa de distanciamento face aos partidos», considera. «Julgo que a forma mais importante de não haver esse aproveitamento é os partidos estarem dispostos a ajudar sem necessariamente terem [o] protagonismo».

João Veloso numa manifestação cívica, em 2020. Fotografia cortesia de João Veloso

Para o presidente da JP, é compreensível que as associações e movimentos cívicos prefiram manter uma certa distância das estruturas partidárias. «Há matérias na sociedade portuguesa e internacional que são tão relevantes que me parece que devem extravasar o que é o âmbito dos partidos», clarifica, «sendo que também tenho presente que essas organizações devem ter como meta a capacidade de influenciar os partidos e a sua agenda, sob pena de, depois, não conseguirem concretizar as suas ambições».

Leonor Rosas é um dos membros da Coordenadora dos Jovens do Bloco há cerca de quatro anos e reconhece o potencial da articulação entre jovens ativistas e estruturas partidárias. «Os partidos políticos, na sua relação com o movimento social, podem fazer chegar a nível institucional e legislativo as reivindicações dos movimentos que não chegariam lá de outra forma e dar apoio a nível logístico», afirma. Por outro lado, a deputada municipal acredita ainda que «é muito importante que os ativistas sociais também ensinem o BE».

O combate à «alienação»: algumas propostas

Para combater a possível alienação sentida pelos jovens portugueses em relação ao sistema político-partidário, os entrevistados desta reportagem apontaram algumas medidas que poderiam estimular a participação política das novas gerações. A educação política, o direito ao voto a partir dos 16 anos e a implementação de diferentes estratégias de proximidade e comunicação por parte dos partidos políticos foram algumas das hipóteses discutidas.

O estímulo para a participação política através da educação foi a primeira medida apontada por Tatiana Pinto. «Acho que a educação desempenha um papel muito importante para os jovens perceberem porque é que a política e a democracia existem e porque temos de tentar sempre lutar pelo que acreditamos», argumenta. É a uma antiga professora de História que atribui o espoletar do seu ativismo e do seu interesse pela política, pelo que reconhece o potencial da educação para estimular o entusiasmo dos jovens.

No caso de Carlota Duarte, foi a sua antiga professora de Filosofia que a inspirou a dar início ao seu envolvimento cívico e partidário, pelo que a educação é também a primeira hipótese que equaciona. «[Poderíamos] começar por ter uma disciplina que nos educasse para esse futuro que vamos ter enquanto cidadãos e seria logo meio caminho andado para as pessoas estarem mais interessadas», declara, «teríamos aquela informação obrigatoriamente e escolheríamos o que fazer com ela, seria um bom começo».

O presidente da DG/AAC, João Pedro Caseiro, é licenciado em Ciências da Educação e mestrando em Administração Educacional, pelo que o investimento na educação lhe surge como uma resposta natural. O estudante acredita que uma sociedade é quanto mais desenvolvida quanto mais participação existir e que através da educação é possível consciencializar os cidadãos para a importância de intervir. «[É necessário] procurar educar os cidadãos a participar politicamente através de espaços formais, como a escola ou o ensino superior, e também através de meios mais informais, com ações direcionadas à população», reitera.

Patrícia Silva reconhece também o papel importante que a escola pode desempenhar na promoção de debates e no confronto de ideias, sobretudo «num contexto em que se está a caminhar para uma crescente polarização, em que as pessoas não querem ouvir as visões uns dos outros». Além disso, Silva considera que a promoção de uma revisão constitucional de forma a introduzir-se o direito de voto aos 16 anos é uma medida positiva.

A investigadora argumenta que, aos 16 anos, «o jovem está em contexto escolar e isso permite que sejam trabalhadas, nas escolas, todas as competências de que necessita para compreender o sistema político e eleitoral». Para além disso, Silva afirma que os 18 anos correspondem, por norma, à idade com que os jovens se candidatam ao ensino superior e a possível deslocação do meio onde residem pode implicar uma barreira geográfica que dificulta o exercício do voto. 

Silva reconhece a existência do voto antecipado, mas sustenta que este não cria os mesmos efeitos. «Existe o voto antecipado, mas não é a mesma coisa, porque não cria este sentimento positivo de ‘fui, votei e convivi com quem votou e exerci fisicamente o meu espaço de votação’», defende. «Os estudos sugerem que quando a primeira votação é significativa e produz sentimentos positivos, isso tem um efeito que perdura», reitera a investigadora, «e se [os jovens] não sentirem isso, a probabilidade de votarem em eleições futuras cai».

Já Francisco Camacho não acredita que a possibilidade de voto aos 16 anos contribua, a longo prazo, para estimular a participação política dos jovens. «Percebemos que há uma desilusão das novas gerações com o sistema político, mas não é por não poderem votar mais cedo», argumenta, «é porque o sistema político não tem dado respostas aos seus grandes anseios». O presidente da JP acredita que, através de projetos políticos que fossem ao encontro das aspirações dos jovens, seria possível suscitar um maior envolvimento. «Se tivéssemos uma classe política que fosse capaz de melhorar de forma significativa a qualidade de vida em Portugal, não tenho dúvidas nenhumas de que as taxas de participação iriam aumentar», assevera.

Por sua vez, a comunicação estabelecida entre os partidos políticos e os jovens é também considerada de maior importância. Mariana Gil acredita que a comunicação deve ser estabelecida de jovens para jovens, caso contrário não vai ser atrativa. «Se estamos a falar de um projeto para jovens, não pode ser apresentado por uma pessoa de 70 anos porque não vai ser tão apelativo», explica. 

Para João Veloso, é necessária uma maior abertura por parte dos partidos políticos. «[É preciso] mostrarem que não estão aqui para se sobreporem a nós, como se não soubéssemos nada, mas sim dizerem que estão aqui para construirmos [projetos] em conjunto e para nos ouvirem», declara. «Essa é a forma mais democrática e pode ser a melhor forma de aproximar as pessoas, se não existir o nós versus eles».

O desenvolvimento de um trabalho de proximidade é também defendido por Leonor Rosas. «É [preciso] estar onde os jovens estão, disputar espaços nas universidades, escolas secundárias, locais de trabalho e levar para lá as nossas ideias, o que defendemos e porque é que as nossas propostas são importantes para melhorar a vida dos mais jovens», explica a deputada da AML. «Quem quer que as suas ideias cheguem às pessoas tem de fazer o mesmo», defende.

O secretário-geral da JS afirma também que é necessário «conseguir ouvir mais do que falamos e conseguir ser consequentes com as ideias que ouvimos». Miguel Costa Matos acredita que os partidos necessitam de falar mais vezes sobre os jovens e precisam de procurar, através das suas organizações de juventude, estarem mais próximos das novas gerações. Do ponto de vista mais estrutural, propõe combater a falta de interesse na política através de respostas como a criação de um Dia do Eleitor. Tendo como referência o Dia da Defesa Nacional, esta proposta permitiria «informar e consciencializar os jovens sobre o que são as instituições democráticas e sobre como podem participar», explica.

Miguel Costa Matos acredita que é necessário recuperar uma política de massas ao procurar ouvir as ideias dos cidadãos para construir a atividade política no dia a dia. «[A democracia] é demasiado importante e demasiado real para ser deixada apenas nas mãos de membros do Governo, de deputados, membros de gabinetes e autarcas», defende, «a maior recomendação que faço é que deem uma oportunidade à vossa participação política».

*Esta reportagem foi inicialmente publicada a 22 de dezembro de 2022.

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