Chama-se “Terrinhas” e é o primeiro romance assinado pela jornalista Catarina Gomes. A obra venceu, por unanimidade, o Prémio Literário Revelação Agustina Bessa-Luís 2021, que tem um valor pecuniário de 10 mil euros, que garantem a sua publicação. O anúncio foi feito pela Estoril Sol, que, em parceria com a Editorial Gradiva, promove o galardão.
O júri, ao qual presidiu o ex-ministro Guilherme d’Oliveira Martins, considerou tratar-se de “um romance que, a partir do ponto de vista de uma mulher tipicamente citadina, coloca em confronto o mundo rural e o mundo urbano”.
“A memória dos pais, que quase religiosamente vão à terra para trazer batatas, as quais invadem a cozinha e o imaginário da narradora, fornece a visão irónica e, por vezes, mesmo hilariante, com que esta avalia a infância e enfrenta dores e dramas da idade adulta. A alegria e a comovente ternura na avaliação da vida e da morte, associadas a uma escrita fluida e elegante, dão a este romance, um indiscutível alcance literário, que importa valorizar e divulgar”, realçou o júri.
Além de Guilherme d'Oliveira Martins o grupo de decisores incluiu José Manuel Mendes, em representação da Associação Portuguesa de Escritores, Maria Carlos Gil Loureiro, pela Direção-Geral do Livro, Arquivos e Bibliotecas, Manuel Frias Martins, pela Associação Portuguesa dos Críticos Literários, e, ainda, por Maria Alzira Seixo, José Carlos de Vasconcelos e Liberto Cruz, convidados a título individual, além de Dinis de Abreu, em representação da Estoril Sol.
No enredo da obra, Cláudia M. Mendes, a protagonista, ‘designer’ de interiores, vê-se, de um dia para o outro, herdeira de umas nesgas de terra na aldeia da avó, “de onde todos os verões a família voltava com o tejadilho do carro cheio de batatas”. “Forçada a voltar ao sítio onde era obrigada a passar férias, Cláudia vê-se no meio do campo a tentar chegar a terras que não vêm nem em mapas nem em GPS. Seguindo uma estranha trama de linhas desenhadas a calhaus e cruzes, abre-se entre Cláudia e a aldeia de Arrô uma nova e forçada ligação”, lê-se na sinopse.
De acordo com a autora, a ideia para este livro “nasce de uma herança verdadeira”. “Há uns anos, vieram parar-me às mãos um conjunto de terras numa aldeia do norte de Portugal que, para mim, eram apenas nomes estranhos. Nunca as tinha pisado e nem sabia o que fazer para lá ir dar. Eram terras que me chegavam de um tempo em que a terra era tudo, mas que agora pouco valiam, eram terras como as que aparecem nos noticiários de verão sobre incêndios, de quem já ninguém cuida e que acabam por arder sozinhas”, diz Catarina Gomes. “Há uma geração de portugueses com origens rurais que já herdou ou vai herdar terras como as de Cláudia [a protagonista do romance] e para quem elas já não representam quase nada”, acrescenta.
Para a autora premiada, “escrever um romance era um sonho tão antigo que quase não tem idade”. “Parece que me acompanhou toda a minha vida adulta. Sou jornalista há mais de 20 anos e o que tentei fazer nos últimos anos da minha prática profissional foi aproximar-me da ficção. Nos três livros de jornalismo literário que escrevi conto histórias de vida verdadeiras como se escrevesse um romance”, referiu.
Catarina Gomes nasceu em Lisboa, em 1975, e foi jornalista do jornal Público, tendo recebido o Prémio Gazeta (multimédia) e o Prémio Internacional de Jornalismo Rei de Espanha em 2016, pela reportagem "Quem é o filho que António deixou na Guerra", publicada em 2015. É autora de outras obras como “Pai, Tiveste Medo” (2014), sobre a experiência da guerra colonial, a que se seguiu “Furriel não é Nome de Pai” (2018). No ano passado publicou “Coisas de Loucos - O que eles deixaram no Manicómio”, que “teve origem na descoberta acidental de uma caixa de cartão cheia de objetos de antigos doentes no primeiro hospital psiquiátrico português, o Miguel Bombarda”.
O Prémio Literário Revelação Agustina Bessa-Luís foi instituído em 2008 e já premiou oito romances inéditos.