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Qual é a diferença entre um imigrante e um expat?

Nas Gargantas Soltas de hoje, Mafalda Fernandes retrata a diferença entre o imigrante e o expat.

Estou ciente da manipulação que está e continuará a ser feita pela extrema direita. É uma manipulação fraca, mas poderosa quando presente na frente do desespero de alguns. É também previsível. E até o horóscopo diria que os grupos minoritários e, por consequência os mais vulneráveis da sociedade, serão sempre os bodes expiatórios dos propagadores do ódio social.

"CHEGA DE IMIGRANTES, eles têm que voltar para a terra deles", apesar de serem eles quem sustenta este país. É a lógica da batata a funcionar na sua plenitude. Antes de sermos engolidos por estas manipulações, gostaria de dizer que está na altura de compreendermos a diferença entre imigrantes e expats.

O imigrante chega, e tem que bater à porta com muito cuidado, e ainda sem olhar o dono da casa nos olhos deve questionar se pode entrar. O expat chega, entra pela casa adentro (até porque a porta está bem escancarada), vai buscar uma cerveja ao frigorífico e senta-se no sofá. Ainda não tivemos tempo de dizer “por favor entrem,  sintam-se em casa…” que eles já são donos da casa.

Quem suporta este país, não são os expats, são os imigrantes. Quem te leva a comida quentinha no inverno é o imigrante. Quem te limpa a casa após uma festa é o imigrante. Quem cuida das crianças quando tens muito trabalho é o imigrante. Quem constrói o novo restaurante da moda é o imigrante e quem serve a comida nesse mesmo restaurante é o imigrante. Volto a repetir: quem sustenta este país é o imigrante.

O expat compra a mansão que daria para alojar muitas famílias sem teto. O expat paga a conta astronómica do restaurante com o salário de origem do seu país e feliz da vida diz que é barato. O expat modifica a arquitetura, as ruas e o comércio da tua cidade. E ainda se integra num grupo de expats porque como não fala o português, não consegue acomodar-se na nossa cultura. O expat diz que como tem dinheiro é seu direito fazer disto a sua casa. E para mim, sinceramente, está tudo bem.

É ok que os ricos continuem a querer suportar os ricos. O que não é nada ok para mim, é a incapacidade dos mais vulneráveis se unirem e se insurgirem contra esta burguesia que infectou o meu Porto, tornando-o num asilo caviar para seres humanos que estão perdidos na vida e decidiram que vir viver para Portugal até seria uma aventura gira e engraçada ou devo dizer "exótica".

Esta é a parte em que vocês pensam: estás a ser xenófoba. Estou, será que estou? Porque que eu saiba a xenofobia encontra-se também presente naquilo que são as estruturas de poder. E a xenofobia que eu vejo está muito bem saliente nesta diferenciação de tratamentos entre imigrantes e expats. Para além de que, o meu problema não é com expats, o meu problema é contra a nossa falta de união e apoio aos imigrantes. Quem diz imigrantes, diz também todos os grupos vulneráveis nesta sociedade.

Não tenho nada contra outros povos, mas tenho tudo contra a desigualdade que se respira neste país. A burguesia sempre desfilou pelas ruas portuguesas, mas esta burguesia tem vindo a aumentar em número, criando mais desigualdade, e determina este processo dizendo que tudo isto é fruto da globalização.

Globalização? Mas qual globalização? A presença de diferentes culturas nos países ocidentais não é globalização, mas sim uma consequência da colonização. O restaurante indiano que tu tanto adoras não está presente em Portugal para satisfazer as tuas curiosidades. A música brasileira e as festas brasileiras para as quais vais abanar a "raba" não foram criadas para que tu te possas sentir sexy. As línguas nativas africanas não são um ornamento que tu usas para diferenciar-te do teu grupo de amigos semelhantes a ti.

Esta lista seria infinita. O mundo não gira ao nosso redor, e há muita coisa boa que podemos retirar desta mistura de culturas, desta Lisboa "criola". Também há muitas reflexões que temos que fazer face a esta "globalização". Porque eu, mulher preta portuguesa, sempre fui para ser preta, mas nem sempre fui para ser portuguesa. E eu não estou aqui para agradar, entreter ou validar um Portugal extremamente desigual. Eu estou aqui para fazer de Portugal um país melhor do que aquilo que alguma vez foi. E este objetivo não será cumprido enquanto,  passivamente, chamarmos a estas novas formas de colonização de globalização.

A maior diferença do ontem para o hoje, é a zona geográfica. Ontem explorávamos os países do sul e as suas pessoas. Hoje exploramos as suas pessoas nos países do norte.

Compreender as estruturas de poder assentes na sociedade em que vivemos é o que nos permite observar a vida social com clareza. E para mim está tudo tão claro que se tornou escuro.

-Sobre Mafalda Fernandes-

Nascida e criada no Porto, filha de pais brancos e irmã de mulheres negras. Formada em Psicologia Social, o estudo e pensamento sobre problemas sociais relacionados ao racismo, são a sua maior paixão. Criou o @quotidianodeumanegra, página de Instagram onde expressa as suas inquietudes. Usa o ecoturismo como forma de criar consciência anti-racista na sociedade. Fã de Legos, livros e amizades, vive pela honestidade e pelo conhecimento. 

Texto de Mafalda Fernandes
As posições expressas pelas pessoas que escrevem as colunas de opinião são apenas da sua própria responsabilidade.

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