fbpx
Apoia o Gerador na construção de uma sociedade mais criativa, crítica e participativa. Descobre aqui como.

Quantas precisam morrer?

Chamava-se Angelita Correia. Era brasileira, tinha 31 anos e vivia em Portugal desde 2016. Casada…

Opinião de Alexa Santos

Apoia o Gerador na construção de uma sociedade mais criativa, crítica e participativa. Descobre aqui como.

Chamava-se Angelita Correia. Era brasileira, tinha 31 anos e vivia em Portugal desde 2016. Casada com Jorge, português, desde 2018. Foi encontrada morta numa praia em Matosinhos. Esteve desaparecida durante 10 dias sem que o seu desaparecimento fosse capa de jornal ou motivo de notícia para algum canal televisivo.

Os dados do site transrespect.org [Respeito Trans] mostra que, em 2020, foram reportadas 350 mortes de pessoas trans por assassinato. O mesmo site mostra que, desde 2008, são quase 4000 as pessoas assassinadas e que a média de idades é de 31 anos, sendo que 15 é a idade mais baixa.

Este número diminuiu logo no primeiro mês de 2021 já que, no Brasil, a primeira vítima de transfobia do ano foi uma menina trans chamada Keron Ravach de apenas 13 anos.

No Brasil, o mês de janeiro é também o mês da visibilidade trans assinalado principalmente no dia 29 desde 2004, porque, nesse ano, pela primeira vez pessoas trans e travesti estiveram no Congresso Nacional para falar ao parlamento brasileiro sobre as suas vidas e para contar as suas histórias.

Quando olhamos para os dados, estes não contemplam as pessoas cujas mortes não foram denunciadas e por isso não contabilizadas.

Não sabemos os números reais.

Não sabemos quantas pessoas foram mortas por transfobia exatamente, nem quantas pessoas foram vítimas de discriminação, violência por serem percecionadas como trans ou por não cumprirem papéis de género.

Não sabemos os números totais.

Não sabemos quantas pessoas trans tiram a sua vida nem contamos quantas sofrem vidas inteiras sem poder ser quem são por medo.

O que sabemos é que, em Portugal, segundo os dados do Eurobarómetro de 2015,[1] 60% das pessoas inquiridas consideram “normal” a violência e discriminação contra pessoas trans. 35% considera que ser trans deixa uma pessoa em desvantagem quanto a uma oportunidade de trabalho, 60% sentir-se ia desconforatável a trabalhar com uma pessoa trans assim como teria dificuldade em aceitar uma pessoa trans como representante de um partido político, como presidente ou primeiro ministro/a/e. Sabemos também que um candidato presidencial pôde dizer em televisão que uma pessoa que não cumpre expectativas de género não terá lugar em Portugal caso ele governe. Tudo isto que sabemos diz muito sobre quanto falta fazer para podermos ser mais livres. Para podermos ser iguais ao que sentimos ser. Para deixarmos de matar pessoas trans. Mas talvez ainda precisem morrer muitas mais para podermos chegar lá.

Dizer que não se tem a certeza se Angelita foi assassinada ou se tirou a própria vida não é dizer que não foi a transfobia que a matou. Não podemos dizer que não foi o sexismo que a matou. Não podemos dizer também que não foi a xenofobia que a matou. Por isso é preciso, cada vez mais, educarmo-nos para desconstruir preconceitos e desfazer estereótipos. Por isso é preciso sabermos cada vez mais para morrermos cada vez menos.

Até lá, quantas mais vão morrer? 

Para ver a reportagem: Linha da Frente, ep. 2 - O Meu Género.


[1]https://www.ces.uc.pt/intimate/documentos/resources/statistics/eurobarometer2015_Discrimination_PT_437_fact_pt_en.pdf

-Sobre Alexa Santos-

Alexa Santos é formada em Serviço Social pela Universidade Católica de Lisboa, em Portugal, e Mestre em Género, Sexualidade e Teoria Queer pela Universidade de Leeds no Reino Unido. Trabalha em Serviço Social há mais de dez anos e é ativista pelos direitos de pessoas LGBTQIA+ e feminista anti-racista fazendo parte da direção do Instituto da Mulher Negra em Portugal e da associação pelos direitos das lésbicas, Clube Safo. Mais recentemente, integrou o projeto de investigação no Centro de Estudos da Universidade de Coimbra, Diversity and Childhood: transformar atitudes face à diversidade de género na infância no contexto europeu coordenado por Ana Cristina Santos e Mafalda Esteves.

Texto de Alexa Santos
Fotografia de Lisboeta Italiano

Publicidade

Se este artigo te interessou vale a pena espreitares estes também

18 Abril 2024

Bitaites da Resistência: A Palestina vai libertar-nos a nós

16 Abril 2024

Gira o disco e toca o mesmo?

16 Abril 2024

A comunidade contra o totalitarismo

11 Abril 2024

Objeção de Consciência

9 Abril 2024

Estado da (des)União

9 Abril 2024

Alucinações sobre flores meio ano depois

4 Abril 2024

Preliminares: É possível ser-se feliz depois de um abuso?

4 Abril 2024

Eles querem-nos na guerra

2 Abril 2024

Defesa da Europa

2 Abril 2024

O dia em que o relógio parou

Academia: cursos originais com especialistas de referência

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Comunicação Cultural [online e presencial]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Jornalismo e Crítica Musical [online ou presencial]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Viver, trabalhar e investir no interior [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Planeamento na Produção de Eventos Culturais [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Práticas de Escrita [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Iniciação à Língua Gestual Portuguesa [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Iniciação ao vídeo – filma, corta e edita [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Planeamento na Comunicação Digital: da estratégia à execução [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Pensamento Crítico [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Soluções Criativas para Gestão de Organizações e Projetos [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

O Parlamento Europeu: funções, composição e desafios [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Introdução à Produção Musical para Audiovisuais [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Fundos Europeus para as Artes e Cultura I – da Ideia ao Projeto

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Narrativas animadas – iniciação à animação de personagens [online]

Duração: 15h

Formato: Online

Investigações: conhece as nossas principais reportagens, feitas de jornalismo lento

22 ABRIL 2024

A Madrinha: a correspondente que “marchou” na retaguarda da guerra

Ao longo de 15 anos, a troca de cartas integrava uma estratégia muito clara: legitimar a guerra. Mais conhecidas por madrinhas, alimentaram um programa oficioso, que partiu de um conceito apropriado pelo Estado Novo: mulheres a integrar o esforço nacional ao se corresponderem com militares na frente de combate.

Saber mais

1 ABRIL 2024

Abuso de poder no ensino superior em Portugal

As práticas de assédio moral e sexual são uma realidade conhecida dos estudantes, investigadores, docentes e quadros técnicos do ensino superior. Nos próximos meses lançamos a investigação Abuso de Poder no Ensino Superior, um trabalho jornalístico onde procuramos compreender as múltiplas dimensões de um problema estrutural.

A tua lista de compras0
O teu carrinho está vazio.
0