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Recomeços

Eu não sou uma pessoa homofóbica: Desde que não seja à minha frente.Desde que não…

Opinião de Alexa Santos

©Lisboeta Italiano

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Eu não sou uma pessoa homofóbica:

Desde que não seja à minha frente.
Desde que não seja na rua.
Desde que não seja à frente de crianças.
Desde que não sejam dois homens.
Desde que não apareça na televisão.
Desde que não andem de mãos dadas.
Desde que não dêem beijos na boca.
Desde que não se casem.
Desde que não tenham filhos.
Desde que não adotem.
Desde que não seja nas escolas
Desde que não…
Desde que...
Desde que… não existam!

O preconceito é uma daquelas coisas que nunca estamos prontas para encontrar. Ele vem sorrateiro, em comentários leves, em violência mascarada de elogio:

... Mas tu não pareces lésbica.

... Mas tu não és preta, és mais mulatinha. (o diminutivo, forma mais comum de diminuir também a tua identidade de forma despercebida para ver se passa).

... Mas tu não, qualquer coisa que de certeza vai ser uma micro violência.

Quando, num programa de TV, um apresentador ou comentador faz uma generalização preconceituosa sobre pessoas homossexuais, bissexuais ou transgénero, o seu comentário é visto por muitas pessoas e legitima na sociedade a homofobia, bifobia, transfobia.

Quando Quintino Aires diz em televisão nacional:

"... De facto, os homossexuais eram muito mais promíscuos. Aliás, continuam a querer mostrar a sua promiscuidade, quando têm aquela vergonhosa marcha da vergonha... E, repare, que quando se faz a marcha em que vão literalmente meios nus a lamberem-se todos...", o que não percebemos ou, a generalidade da sociedade pode não perceber, é que este comentário é proferido por alguém que nunca foi a uma marcha, que é um lugar de aceitação e celebração de todas as pessoas gay ou não, trans ou não, e também de pessoas homossexuais, trans, não binárias, e até pessoas hetero porque, quando se é livre para ser quem é, também as pessoas cis e hetero ficam mais livres. O que Quintino Aires tem como factual é, na realidade, um preconceito que reitera de todas as vezes, que apenas algumas pessoas têm o direito à existência plena.

Eu gostava de um dia poder recomeçar, e que os meus textos não denunciassem uma e outra vez este tipo de situações e comentários, mas quando começo a escrever deparo-me, todos os meses, com mais um e outro ataque a mim, à comunidade LGBTQIAP+, que faz com que não consiga recomeçar, mas que volte sempre ao mesmo ponto.

Persiste, na sociedade em geral, a ideia de que existem bons e maus homossexuais, que as pessoas que merecem respeito têm de ser de uma determinada forma.

Persiste, na sociedade, a ideia de que existem as pessoas que merecem ter direitos e as que não merecem, as que são seres humanos e as que podem ser tratadas com violência, desrespeito e desprezo.

Persiste, na sociedade, a ideia de que tudo o que é diferente de um determinado normal patriarcal, machista, sexista, hetero é mau. Homens gays não podem ter filhos porque "o que será das criancinhas?" Pessoas trans não podem parecer trans porque "o que é que isso diz de quem se identifica com o género que lhes foi dado à nascença?" Ai de quem questione, que pergunte sobre porque é que é assim! Ai de quem queira mudar, transformar, desconstruir.

Esta ideia é homofóbica, é bifóbica, é transfóbica e não só, é contra a liberdade.

NÃO EXISTE UMA ÚNICA FORMA DE SER! Seja homossexual ou não. AS PESSOAS TÊM DIREITO DE SER QUEM SÃO E VER OS SEUS DIREITOS RESPEITADOS.

As nossas vidas não têm de continuar confinadas à penumbra, ao secretismo, às quatro paredes por conveniência e por preguiça das pessoas que se sentem atacadas por quem vive em plenitude a sua verdade.

Nós, pessoas LGBTQIAP+, TEMOS DIREITO À EXISTÊNCIA, À VIDA PLENA E COMPLETA independentemente da nossa orientação sexual, identidade e/ou expressão de género.

Temos muito que fazer para desconstruir ideias homofóbicas e binárias de género em que apenas o hetero, cis, branco é celebrado e respeitado. Que a televisão nacional continue a compactuar com estes discursos é criminoso. Que pessoas que têm influência continuem a poder dizer estas coisas é criminoso. Mata!

Eu quero poder recomeçar. Eu quero poder estar, ser, amar, uns dias de cabelo despenteado a ver NETFLIX sentada na cama (porque nem para ir para o sofá a energia chega), a comer batatas fritas e a catar migalhas para não desperdiçar nada e para não as catar depois quando estiver a rebolar na cama a tentar dormir; outros de bikini com os pêlos debaixo do braço e as pernas por depilar sem ser questionada ou ouvir comentários como: “ai que falta de higiene as pessoas que não se depilarem”; outros ainda, de fato e gravata, sem ter medo de ser abordada nos meios de transporte por alguém que precisa mesmo de saber qual é o meu género.

Eu quero recomeçar num mundo em que as pessoas percebem que os seus comentários homofóbicos, transfóbicos, racistas, xenofóbicos põe em perigo a minha vida. Põe em causa a minha segurança sempre que saio à rua. Deixam-me mais vulnerável quando vou adquirir um serviço ou produto ou quando preciso de alugar uma casa e/ou abrir uma conta no banco.

Eu quero recomeçar! É preciso recomeçar!

-Sobre Alexa Santos-

Alexa Santos é formada em Serviço Social pela Universidade Católica de Lisboa, em Portugal, e Mestre em Género, Sexualidade e Teoria Queer pela Universidade de Leeds no Reino Unido. Trabalha em Serviço Social há mais de dez anos e é ativista pelos direitos de pessoas LGBTQIA+ e feminista anti-racista fazendo parte da direção do Instituto da Mulher Negra em Portugal e da associação pelos direitos das lésbicas, Clube Safo. Mais recentemente, integrou o projeto de investigação no Centro de Estudos da Universidade de Coimbra, Diversity and Childhood: transformar atitudes face à diversidade de género na infância no contexto europeu coordenado por Ana Cristina Santos e Mafalda Esteves.

Texto de Alexa Santos
Fotografia de Lisboeta Italiano
A opinião expressa pelos cronistas é apenas da sua própria responsabilidade.

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