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Saboaria da Sofia: a imprevisibilidade de contribuir, trocar e escolher. A isto se chama sustentabilidade

Psicóloga, formadora, artesã de produtos naturais e ecológicos e mãe de duas crianças. Estas são…

Texto de Patricia Silva

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Psicóloga, formadora, artesã de produtos naturais e ecológicos e mãe de duas crianças. Estas são algumas das tarefas daquela que é a fundadora da Saboaria da Sofia. Localizada numa rua antiga, a que Sofia Aboim frequentava diariamente e onde lhe surgiam ideias sem fins de tanto que sonhava, a porta 19A, inserida numa fachada de 1851, estava pronta a recebê-la. Em junho de 2021, depois de meses a trabalhar as receitas de sabonetes, sais de banho e cosméticos, uma loja online e uma casa onde os armários se ocupavam de produtos, materiais e encomendas nas mais diversas divisões - até nas improváveis - Sofia decidiu alojar-se no seu novo ateliê que continua 'caseiro' e cheio de partilha. A que se dá e a que se recebe.

Com muitas mãos que enchem o seu coração - talvez por isso Sofia diga que romantiza tudo na sua vida - foi a partir da necessidade de "sentir que contribui para alguma coisa" que se tornou uma inspiração para muitxs. Aliando o seu gosto particular, o conhecimento perante a Saúde Mental e a vontade de transmitir o melhor de si, a Saboaria edificou-se na mente, no corpo e no espaço de Sofia e de todxs aquelxs que a partir da sustentabilidade encontram o seu equilíbrio.

A primeira vez que encontramos a psicóloga foi numa feira local, em Cascais. Estávamos num dia de Verão onde a curiosidade desmedida de muitos turistas que por ali passavam se mostrava presente cada vez que se aproximavam da mesa da Saboaria. Dois meses depois conversamos, ainda que longe do ateliê, mas à pequena distância de uma chamada.

Gerador (G.)- Depois de um nome que nos fica no ouvido, cerca de dois anos de uma realidade pandémica e reflexões sobre a importância da saúde e do bem-estar chegou o momento de te questionar: como é que deste este primeiro passo?

Sofia Aboim (S. A.)- Bem, este foi um projeto, no fundo, surgiu de uma forma muito orgânica. Não foi algo planeado. Nunca foi uma coisa que me veio à mente, quando estamos naquela fase da nossa vida, de pensar o que queremos ser ou seguir. Apenas cresceu e surgiu naturalmente.
Para começar esta longa história, a minha formação de base é a Psicologia. Exerço há vários anos. Comecei sempre pela área da Educação, que é onde eu estou nesse momento, mas também tive uma fase em que dei formação a empresas, ou seja, na área organizacional. Decidi continuar a exercer Psicologia em paralelo, porque é uma área da qual eu gosto muito, mas há vários anos que iniciei um hobbie, em que decidi começar a procurar formas de produzir os meus próprios produtos sejam eles de cosmética ou de limpeza, por exemplo. Sempre tive estas preocupações com as questões do meio ambiente e comecei a fazer uma série de trocas e escolhas em casa, sendo que queria ir um bocadinho mais longe. Sendo uma pessoa extremamente curiosa e gostando de me manter constantemente ativa, comecei a pesquisar e a tentar perceber como é que eu poderia fazer as coisas por mim própria. O início deu-se com os sabonetes. Comecei por experimentar algumas receitas de sabonetes porque conseguia controlar as minhas escolhas, os ingredientes e o que estava a usar na minha própria casa e ainda com a vantagem de não existirem ingredientes sintéticos na composição. A questão do plástico também se aliou a estas preocupações, ou seja, a sua redução. A verdade é que quando nós compramos a maior parte dos produtos de limpeza e cosmética, normalmente, vêm em embalagens de plástico e essas mesmas embalagens também têm um impacto ambiental. Por isso, comecei a experimentar. Comecei pelos sabonetes como dizia antes e admito que isto é um 'bichinho que se cria'. Primeiro os sabonetes, depois os champô, os produtos de limpeza, sais de banho... Comecei a criar uma série de produtos à minha volta tendo um maior domínio. Além disso, a aprendizagem pelo meio ambiente começou a ser uma coisa que me dava imenso gozo fazer. Os meus finais-de-dia eram uma atividade, aliás, ainda são, extremamente relaxante e a qual eu adoro fazer. Portanto, eu até tinha pena porque queria fazer mais, mas não podia devido ao ritmo de consumo cá de casa.

"Tenho a necessidade de sentir que estou a contribuir para alguma coisa", Sofia Aboim, fundadora da Saboaria da Sofia.

Comecei a aprender, a ler muito sobre o assunto e a estudar livros, cursos, etc. Estava constantemente a levantar uma série de questões para tentar perceber melhor e, a certa altura, comecei a partilhar isto com a família e com os amigos. Eles perceberam que estava a fazer algo diferente e começaram a querer experimentar. Foi um momento em que recebi todo um incentivo para que eu avançasse e começasse essa atividade, ainda assim, na altura costumava dizer: 'então, mas eu sou psicóloga, não sei se faz sentido, não tenho tempo. Tinha filhos pequenos'. Ou seja, no fundo, às vezes são todas aquelas nossas resistências à mudança ou ao avançar para qualquer coisa que não é muito certo que nos deixa inseguros. Era isso que ponderava naquele momento.

É certo que fazia isto com alguma regularidade. Sabes quando tens aqueles dias mesmo pesados? Esta era a maneira como eu 'livrava' a minha cabeça e acabava por estar num momento relaxante.

Pensava várias vezes neste projeto, quer dizer, já tinha muitos incentivos e reconhecimento dos produtos e foi então que me lançaram o desafio: 'tu fazes coisas tão bonitas e os produtos são tão bons, porque não te lanças nesse sentido? Cria uma página no Instagram e no Facebook e começas a mostrar o teu trabalho.' Então criei. Inseri alguns produtos, mas nunca mais alimentei aquilo. No fundo, era um projeto que estava na gaveta. Entretanto, surgiu uma altura na minha vida que foi a altura ideal, digamos assim, para avançar com o projeto.

Eu estava num trabalho, o qual eu gostava na área da formação, mas tinha uma série de questões que não me deixavam satisfeita. Em janeiro de 2020 apresentei a minha carta de demissão. Finalizei o meu trabalho em fevereiro de 2020 e decidi tirar uns dias. Regressei na segunda semana de março do mesmo ano, preparadíssima para começar a procura de um novo trabalho com a ideia de uma nova vida. Foi exatamente nessa semana que entramos em confinamento. Necessitei de ficar em casa com os meus filhos, na altura muito pequenos ainda, tinham três e cinco anos, portanto, ainda precisavam de um grande apoio. No caso, o meu marido era considerado trabalhador essencial, ou seja, nem o tinha por perto. Passava literalmente o dia inteiro com eles. Já era trabalho suficiente, mas eu tenho sempre este bichinho de não estar quieta e ter sempre a cabeça a funcionar. A verdade, é que tenho a necessidade de sentir que estou a contribuir para alguma coisa e, por isso, decidi começar a experimentar outras coisas, a evoluir mais nas receitas, a investir nas fórmulas perfeitas e a alimentar as redes sociais. Nesse momento, comecei a ter um feedback de pessoas conhecidas e não só e, a verdade, é que não estava de todo à espera. Na altura pensei, "porque não?". Portanto, eu comecei mais ou menos ali por volta de abril de 2020, assim mais à séria a criar mais conteúdos nas redes sociais. Isso coincidiu com aquele movimento, por parte de muita gente, de quererem apoiar as empresas portuguesas; os artesãos; o fazer encomendas a nível nacional e não tanto nas grandes superfícies; o online teve um crescimento enorme e, por isso, o que acontece a partir daí é que começa a evoluir.

"Eu nunca senti, aliás, continuo sem sentir que isto é um trabalho", acrescenta a psicóloga.

Em setembro de 2020 lanço loja online, que apresentou também um grande aumento das encomendas e da procura. E quando dou por mim chegamos à altura do Natal então e nessa altura parecia que a minha casa tinha 'explodido', isto é, tudo era a Saboaria da Sofia. Os armários, as bancadas, a mesa da sala, o chão, as cadeiras. Já não havia quase paço para conseguir gerir também o nível de encomendas e, na altura, até precisei também do apoio da minha família para conseguir dar resposta, o que foi espetacular e completamente imprevisível. E nessa altura percebi que isto se estava a tornar uma coisa séria. Eu já tinha retornado nessa fase ao trabalho nas escolas. Poderia ter deixado este projeto, uma vez que estava a trabalhar novamente, no entanto, não foi essa a minha vontade. Eu estava literalmente a trabalhar numa coisa que nem sequer percebemos que estamos a trabalhar. No fundo, o que eu sentia era que estava a fazer o meu hobbie tantas horas por dia, a fazer algo que eu gosto tanto e ainda me estão a incentivar mais e pagar-me para fazer o que gosto. Eu nunca senti, aliás, continuo sem sentir que isto é um trabalho. Contínuo a sentir que é o meu hobbie e que neste momento ocupa mais tempo do que propriamente o meu outro trabalho. Continuei a deixar que as coisas funcionassem.

Comecei a sentir a necessidade de espaço porque isto em casa já era muito complicado de gerir. Andava à procura de espaço e depois, em fevereiro, surgiu a oportunidade de arrendar o espaço onde estou agora no ateliê, que é um local numa rua onde há muitos anos passava. Tinha uma magia incrível para mim. Eu adorava aquela rua. Olhava para aquele edifício e pensava que um dia estaria ali, mas eu nem sequer sabia o que ia fazer ali. Surgiu a oportunidade e ainda que fosse um bocadinho cedo, uma vez que o negócio ainda nem sequer tinha um ano, mas decidi avançar.

As pessoas começaram a visitar-me mais no ateliê. Sendo Paço de Arcos uma espécie de aldeia e percebi que o apoio da comunidade local também se sentiu de imediato, muitas visitas, muito incentivo e eu também tinha muito esta vontade de começar os workshops, porque sempre gostei da parte da partilha. Trabalho há muitos anos, como psicóloga, com grupos de pessoas, miúdos, pais, professores e, depois, quando fui para a formação com grupos de profissionais. O que eu gosto mesmo é disto: a comunicação dos próprios grupos e desta e das aprendizagens que podem ser feitas em conjunto. Aqui, esse espaço, também me permitiu fazer isso. Além de eu estar a fazer uma coisa que eu adoro, sinto que estou a fazer a minha parte pelas questões da sustentabilidade ambiental e ainda posso partilhar isto e ter outras pessoas que possam aprender e, no fundo, ter o domínio nas suas próprias casas para conseguirem criar os seus próprios produtos sem a necessidade de dependerem de produtos externos. Assim, comecei também os workshops.

G.- É caso para dizer que é uma caminhada fruto do dia-a-dia, cheia de imprevisibilidades...

S. A. - Esta questão do nós deixarmos que as coisas surjam naturalmente na nossa vida é muito bonito. Em vez de fecharmos uma porta e imediatamente dizemos não, isto não pode funcionar ou não faz sentido precisa de ser ultrapassado por uma abertura da nossa mente no sentido ' vou experimentar porque não?' É importante darmos a oportunidade de algumas coisas surgirem na nossa vida e nós fazermos esse esforço por mantê-las por perto, porque se é uma coisa que nos faz bem, porque havemos de dizer que não só porque não faz sentido e às vezes até na cabeça das pessoas estão à nossa volta. Durante muito tempo eu achei que eu tinha um problema porque não me satisfazia só ter uma profissão, portanto, só ter o meu trabalho enquanto psicóloga. Adoro esse trabalho, mas parecia que não estava completa e, por isso, eu gosto muito desta vertente de conseguirmos fazer um bocadinho de cada e que na nossa vida nós não temos que escolher uma profissão e fazer aquilo sempre a cem por cento. Podemos perfeitamente, se tivermos essa oportunidade, ir gerindo várias coisas e sinto-me muito mais completa em conseguir fazer um bocadinho de cada do que estar a fazer uma coisa só. Deixa-me ir, sem planear e ainda bem.

G.- A sustentabilidade e a preocupação perante os produtos de origem nacional e local é uma das missões da Saboaria. Sentiu que estes valores não só permitem um maior equilíbrio entre a natureza e a realidade humana, como se mostram ser, cada vez, mais preocupações de quem procura e compra os seus produtos?

S. A. - Sim. Eu também acredito que o facto de ter estado e continuar a crescer não tem só que ver com o apoio que as pessoas dão e com o apoio do que é português, do artesanal e do que é também o comércio online, mas creio que isto é também o repensar na nossa vida, isto é, que escolhas é que temos? O que é que isto causa? Já havia este movimento em relação ao meio ambiente e tem sido uma coisa crescente nos últimos anos, mas acho que muita gente parou para pensar durante o confinamento sobre as escolhas que estava a fazer e deixou de andar no automático. Era o que dava jeito, o que dava tempo e começámos a fazer aqui uma reflexão própria. E eu recebo muitas pessoas que se aperceberam isso e quiseram fazer essas mudanças e querem, por vezes, falar com alguém para perceber como é que podem fazer essas mudanças, porque não basta dizer vou trocar o gel de banho por um sabonete. Ou vão trocar um champô líquido para o sólido. Ou uma vela por outra. As pessoas são genuinamente interessadas e querem também perceber o porquê, como é que funciona, de onde é que vem, ou seja, é literalmente uma escolha consciente não é apenas uma moda. As pessoas querem mesmo saber os efeitos, como podem fazer estas estas trocas da melhor maneira e com o aconselhamento.

Pode ser uma imagem de comida e interiores
"É literalmente uma escolha consciente não é apenas uma moda." - Sofia.

Portanto, o facto de poderem dirigir-se a mim, ou a qualquer outra pessoa dentro do ramo, e poderem fazer questões e perceberem como é que funcionam é espetacular. Esta componente de se perguntar, apoiar e aconselhar tem também um impacto grande. Por isso, eu diria que sim, que as pessoas procuram muito porque estão verdadeiramente preocupadas com as mudanças pelo meio ambiente e eu acho muito interessante o facto de ser uma área que está a crescer tanto para mim como para outras colegas. Há espaço para toda a gente. E se houver mais oferta também existe mais procura, porque às vezes é difícil encontrar este tipo de produtos e se as pessoas se habituarem a terem vários locais onde podem recorrer é uma coisa boa, porque já não é preciso ir ou encomendar coisas de locais distantes e portes de envio. Se em cada cidade ou vila existir uma loja que permita que as pessoas façam estas trocas, melhor ainda.

G.- Este contacto e conhecimento acaba por ser muito importante, mesmo através dos teus workshops, para que as pessoas consigam entender aquilo que compram e de que forma se podem tornar ainda mais sustentáveis...

S. A. - Sim. E até temos outra questão, que eu falo muito disso nos workshops e acho que toda a gente se revê nisto: ao contrário da alimentação em nós chegamos ao supermercado olhamos para o rótulo com base nos ingredientes, com a cosmética é muito mais difícil. Na maior parte dos cosméticos, nós olhamos para a etiqueta e para os ingredientes e não percebemos rigorosamente nada do que está lá escrito, porque aquilo é uma nomenclatura internacional, supostamente para ser reconhecida em qualquer parte do mundo, mas é só para quem sabe. Não é para o consumidor. Às vezes as pessoas não percebem o que está por detrás e porque é que estão a fazer essa troca. Eu acho que há todo um conjunto de pessoas que tem um genuíno interesse não só por fazer este troca, mas o perceber os porquês por detrás disso. É mesmo um conjunto de pessoas interessadas. Não é uma troca pela moda. Depois há uma coisa aqui associada que eu acho que acontece muito ali na Saboaria. As pessoas acabam por comprar um produto por vários motivos em conjunto: é mais amigo do ambiente; por questões de saúde, onde procuram produtos naturais; compram porque é português e artesanal, muito mais ligado ao feito à mão, com cuidado em pequenos lotes e não tanto às questões de fábrica, também relacionado com as questões da poluição da própria produção e as pessoas realmente se interessam por quem está por detrás do projeto. Portanto, eu tenho muita gente que não está a comprar o produto à Saboaria da Sofia, mas sim à Sofia. Acabam por querer saber um bocadinho mais sobre mim, sobre o meu percurso e, assim, há uma relação emocional também com o produto. As pessoas estão verdadeiramente a contribuir para isso, um conjunto de causas que são uma mão cheia delas, ao mesmo tempo (risos).

Pode ser uma imagem de flor
Vela feita em taça de cerâmica portuguesa em tamanho grande, em parceria e com as lindas flores da MUNUKIÁ. De aroma fresco e cítrico a erva-príncipe e limão, elaborada com óleos essenciais e ingredientes 100% naturais, vegan e biodegradáveis.

G.- A proteção da natureza e da saúde física e mental é também uma prioridade. Acho que seria também importante perceber se os diferentes recursos que utiliza no produção dos sabonetes e das velas aromatizadas, por exemplo, refletem esta consciência.

S. A. - Há aqui várias vertentes em relação à saúde mental. Se formos pensar no próprio produto em si, ou seja, nos ingredientes do natural versus sintético, o que acontece muitas vezes e que a maior parte de nós não sabe é que nos próprios produtos industriais, cosmética industrial e velas por exemplo, todos estes produtos sintéticos têm um efeito nocivo diretos na nossa saúde. Portanto, tudo o que nós colocamos na pele e inalámos tem um efeito nas nossas hormonas e na nossa regulação emocional. Normalmente, nós não relacionamos isto diretamente, mas achamos sempre que são outras coisas. É muito mais fácil para nós relacionarmos que a nossa boa alimentação está ligada ao bem-estar, e isto ouve-se falar muito, mas não se ouve falar muito sobre o bem-estar associado à cosmética e à decoração, e aqui estamos a falar nas questões dos ambientadores e das velas. Associado a isso, temos também uma série de benefícios associados a óleos essenciais, ou seja, ao invés de fragrâncias, nós usamos óleos essenciais, que estão associados a uma série de factores positivos na aromaterapia. Por exemplo, nós sabemos perfeitamente que o óleo essencial de lavanda está associado às questões de tranquilodade e calma. E tem mesmo efeitos a nível neurológicos, cerebrais e do humor. Existem uma série de óleos essenciais que ao serem inalados ajudam também a manter uma boa saúde mental.

Além disso, eu acredito mesmo que a nossa saúde mental também está muito relacionada com as escolhas que nós fazemos. O facto de nós sentimos que estamos verdadeiramente a fazer escolhas boas, saudáveis e positivas na nossa vida isto também tem muita impacto. Se eu sei que as coisas que eu faço no meu dia-a-dia e que escolho têm um impacto profundo em mim, na minha família, na sociedade e no ambiente, então eu sinto que sou uma pessoa melhor ou que estou a fazer escolhas melhores. Quando nós sentimos que estamos a fazer escolhas melhores também nos sentimos melhor connosco próprios e, isto, é um efeito bola neve.

Outra coisa muito interessante é que nos próprios workshops têm surgido imensas pessoas que têm um trabalho extremamente monótono ou solitário. O teletrabalho trouxe-nos muito isto de estarmos em casa, isolados e, a verdade, é que recebo muitas pessoas que estão à procura deste momento de partilha. De fazerem uns com os outros. Do terem alguma coisa para fazer na sua própria casa que conseguem controlar, isto porque, há muita gente que não têm controlo sobre o próprio trabalho. Às vezes têm essa necessidade de ir à procura de outra coisa que as preencha. Ainda ontem tive um grupo muito engraçado num dos workshops e acabámos por falar um bocadinho, desta questão de necessidade, de contacto de partilha, por um bem comum a todos e o quanto isto faz bem à nossa saúde mental.

Nenhuma descrição de foto disponível.
Associado a isso, temos também uma série de benefícios associados a óleos essenciais, ou seja, ao invés de fragrâncias, nós usamos óleos essenciais, que estão associados a uma série de factores positivos na aromaterapia.

G.- Os workshops são também pensados de forma a chegarem a todos os grupos sociais, destes adultos a crianças. O objetivo aqui é também contribuir para a tal consciencialização que falávamos há pouco, em repensar práticas sociais de alguma forma ligadas à sustentabilidade?

S. A. - Sim, é verdade. Eu consigo apanhar aqui uma panóplia de idades e de faixas etárias. Desde de crianças que já consegue trabalhar estas questões de sermos curiosos pelo que usamos, pela maneira como fazemos. Levantar reflexões ambientais, das preocupações do impacto do que estamos a criar em nós, na nossa família, no mundo. Desde cedo, gosto de criar essa consciência para as escolhas que estamos a fazer. Eles acham muita piada ao facto de estarem a fazer um sabonete que é amigo do ambiente e serem eles a fazer. O sentirem que estão a fazer algo que nunca pensaram que podiam fazer. Quando sai da mãos deles é muito interessante, porque além desse orgulho de ser amigo do ambiente é o orgulho do eu fiz isto, eu sou capaz de. Portanto, cria-se aqui uma auto-estima muito interessante por parte dos miúdos.

Depois temos claramente uma geração que eu diria que é a geração que está mais sensível às questões ambientais e das escolhas que fazemos, as gerações dos 20 dos 30 e dos 40. É uma faixa extremamente interessada e que normalmente é aquela faixa que reconhece aquilo que estou a dizer a explicar e fazem perguntas importantes porque já vêm com conhecimento prévio. São pessoas que já leram sobre o assunto, já sabem o que faz sentido a nível de sustentabilidade. Eu não preciso de as convencer de nada porque estas trocas mais sustentáveis estão a ser feitas.

Tenho ainda uma geração mais antiga que usava sabonetes ou outros produtos e vêm com alguma curiosidade e pela recuperação do artesanal, por querem aprender e voltar às origens digamos assim, mas que acabam por ouvir falar pelas questões mais sustentáveis e trazem consigo o interesse. É engraçado como a gente faço workshops com pessoas com as mais diversas idades e encontram ali um lugar com interesses comuns. É incrível estas pessoas poderem fazer estas partilhas entre si.

G.- A Sofia é psicóloga, formadora, artesã de produtos naturais e ecológicos e, principalmente, mãe de duas crianças. Como é gerir todas estas funções e projetos que lhe dizem tanto?

S. A. - É a pergunta mais difícil de todas que me poderias ter feito até então (risos). É a mais difícil porque é, de facto, o meu maior desafio. É o haver tanta coisa gira para fazer na vida e não haver tempo para tudo. Neste momento, vai-se gerindo, ou seja, vão-se encaixando essas várias atividades. Nem sempre é fácil, porque quando eu digo que não há tempo, estou a falar muito a sério. E a sorte disto tudo é que eu sou tão apaixonada por aquilo que faço que isto acaba por ter impacto na minha vida pessoal. O meu trabalho não acaba às cinco ou seis da tarde. Normalmente, eu continuo por aí fora. Isto é algo transversal a todos nós quando partilhamos isso que é, o entusiasmo é tão grande que estamos sempre a pensar nisso. Acaba por ser uma coisa constante. Agora, realmente não é muito fácil, no dia-a-dia gerir a questão da psicologia e a Saboaria. É mais fácil de gerir, por exemplo, a parte da Psicologia porque tenho um horário fixo. A Saboaria é um desafio maior porque não sou eu que dito o ritmo de trabalho. O que cada por acontecer é que tudo é gerido muito no momento. Claro que é bom e mau, obviamente. É mau porque de vez em quando foge do controlo e tenho alturas que estou extremamente casada, mas também é muito bom porque nos ajuda a viver no presente e não estarmos sempre a pensar no que vem aí e no que falta dizer. Como dizia, este é o meu maior desafio, conseguir conciliar isto tudo. A verdade é que estou feliz!

G.- Pensar no futuro em parte incerta é uma meta inalcançável, no entanto, no meio da imprevisibilidade arrisco-me a perguntar quais são os próximos passos.

S. A. - É tudo muito vivido no momento, no presente. Tenho sempre ideias de novos projetos e produtos, no entanto, é tudo pensado a curto prazo. Não pensei nisto para ser um negócio, a realidade, é que se transformou (risos). Aqui, as coisas vão organicamente acontecendo, portanto, eu vou tendo ideias e há tanta coisa coisa que vai surgindo por parte de quem me visita e questiona que acaba por ser, mais uma vez, algo feito através de partilhas. Há um ano atrás, não fazia ideia que estaria aqui, aliás, se me dessem esta perspetiva acreditaria que seria algo muito ousado. Neste momento, não sei onde vou estar daqui a um ano, o que não me assusta, muito pelo contrário. É uma descoberta. E eu gosto que assim seja.

Texto por Patrícia Silva
Fotografia retirada do facebook da Saboaria da Sofia

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