fbpx
Apoia o Gerador na construção de uma sociedade mais criativa, crítica e participativa. Descobre aqui como.

Se as nossas mães tivessem abortado

Os Estados Unidos da América deram recentemente um gigante passo atrás, daqueles que pisam em…

Opinião de Catarina Maia

Fotografia de Pedro Lopes

Apoia o Gerador na construção de uma sociedade mais criativa, crítica e participativa. Descobre aqui como.

Os Estados Unidos da América deram recentemente um gigante passo atrás, daqueles que pisam em falso num fosso e preparam um tombo monumental. Reverter Roe v. Wade foi uma afronta aos direitos da mulher e um precedente para um sem números de recuos em matérias de direitos humanos. Este assunto é muito preocupante e potenciou naturalmente um debate aceso à volta do tema por estes lados, onde estamos, para já, seguras – mas sabe-se lá por quanto tempo.

Numa discussão gerada por uma afamada publicação de LinkedIn que aplaudia este recente retrocesso, uma senhora comentava que as mulheres ganhavam agora o “direito à responsabilidade de não engravidarem”. Acrescentava até que “em pleno século XXI, só com falta de responsabilidade é que se engravida”.

Parece-me existir na cabeça daqueles que se intitulam “pró-vida” um arquétipo da mulher que aborta: ela é promíscua, ela gosta de abortar e, aliás, usa o aborto como um método contraceptivo. Abundam pela Internet comentários como o desta senhora, cujo perfil daquela rede social indica ser enfermeira (eu sei, não faz sentido nenhum), cheios de juízos de valor e até de um certo nojo de mulheres que têm sexo. Têm-se dito coisas absurdas e cruéis, como: “Abriu as pernas? Pois bem feita! Agora que crie este filho”, ou até “Ficou infértil depois de abortar? É para aprender.” Mas onde é que andam essas mulheres que adoram abortar? Onde é que estas pessoas vão buscar as suas referências? Uma mulher não gosta de abortar. Querer acreditar nisso é perverso e completamente desfasado da realidade.

O que achei mais curioso foi o que a tal senhora do LinkedIn escreveu, de seguida: “alguns dos que são tão fervorosos no SIM ao aborto, pena as vossas mães não terem tido essa oportunidade na altura”. É irónico que tenha tentado tecer um insulto a quem defende a prática legal e segura da interrupção voluntária da gravidez (IVG). Se o desejamos para nós, porque é que não haveríamos de o desejar para as nossas mães? Carregamos muitas histórias que nos pesam: a da tia que não chegámos a conhecer, que morreu e que deixou o filho órfão; da avó e das suas amigas, que iam abortar no intervalo do trabalho na fábrica; da prima da mãe que era adolescente e ficou estéril para sempre. Uma foi vítima de violação; outra não tinha como sustentar os filhos que tinha; outra, ainda, quis apenas encerrar um ciclo de violência. Estas são histórias de ontem, mas que existem ainda hoje, com a diferença de que hoje uma IVG não é uma ameaça de morte. De resto, são inúmeras as circunstâncias em que uma mulher decide que o melhor para si é não avançar com a gravidez, e não o faz levianamente.

Por isso, é exactamente isso: quem nos dera que as gerações anteriores pudessem ter tido a oportunidade de fazer uma IVG com segurança, condições e apoio. Teria sido tudo diferente, e certamente para melhor. Se isso significa que não estaríamos aqui hoje, pois bem. Seria apenas justo.

-Sobre Catarina Maia-

Catarina Maia estudou Comunicação. Em 2017, descobriu que as dores menstruais que sempre tinha sentido se deviam a uma doença crónica chamada endometriose, que afecta 1 em cada 10 pessoas que nascem com vulva. Criou O Meu Útero e desenvolve desde então um trabalho de activismo e feminismo nas redes sociais para prestar apoio a quem, como ela, sofre de sintomas da doença. “Dores menstruais não são normais” é o seu mote e continua a consciencializar a população portuguesa para este problema de saúde pública.

Texto de Catarina Maia
A opinião expressa pelos cronistas é apenas da sua própria responsabilidade.

Publicidade

Se este artigo te interessou vale a pena espreitares estes também

25 Abril 2024

Disco riscado: Todos procuramos um lugar a que possamos chamar casa

25 Abril 2024

Liberdade, com L maduro!

23 Abril 2024

O triângulo da pobreza informativa na União Europeia. Como derrubar este muro que nos separa?

23 Abril 2024

Levamos a vida demasiado a sério

18 Abril 2024

Bitaites da Resistência: A Palestina vai libertar-nos a nós

16 Abril 2024

Gira o disco e toca o mesmo?

16 Abril 2024

A comunidade contra o totalitarismo

11 Abril 2024

Objeção de Consciência

9 Abril 2024

Estado da (des)União

9 Abril 2024

Alucinações sobre flores meio ano depois

Academia: cursos originais com especialistas de referência

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Iniciação ao vídeo – filma, corta e edita [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Narrativas animadas – iniciação à animação de personagens [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Jornalismo e Crítica Musical [online ou presencial]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Soluções Criativas para Gestão de Organizações e Projetos [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Introdução à Produção Musical para Audiovisuais [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Práticas de Escrita [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Viver, trabalhar e investir no interior [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Fundos Europeus para as Artes e Cultura I – da Ideia ao Projeto

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Comunicação Cultural [online e presencial]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Planeamento na Produção de Eventos Culturais [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

O Parlamento Europeu: funções, composição e desafios [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Iniciação à Língua Gestual Portuguesa [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Pensamento Crítico [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Planeamento na Comunicação Digital: da estratégia à execução [online]

Duração: 15h

Formato: Online

Investigações: conhece as nossas principais reportagens, feitas de jornalismo lento

22 ABRIL 2024

A Madrinha: a correspondente que “marchou” na retaguarda da guerra

Ao longo de 15 anos, a troca de cartas integrava uma estratégia muito clara: legitimar a guerra. Mais conhecidas por madrinhas, alimentaram um programa oficioso, que partiu de um conceito apropriado pelo Estado Novo: mulheres a integrar o esforço nacional ao se corresponderem com militares na frente de combate.

1 ABRIL 2024

Abuso de poder no ensino superior em Portugal

As práticas de assédio moral e sexual são uma realidade conhecida dos estudantes, investigadores, docentes e quadros técnicos do ensino superior. Nos próximos meses lançamos a investigação Abuso de Poder no Ensino Superior, um trabalho jornalístico onde procuramos compreender as múltiplas dimensões de um problema estrutural.

A tua lista de compras0
O teu carrinho está vazio.
0