Conheci a realizadora Cláudia Varejão em novembro, aquando de uma sua visita à faculdade de direito de Lisboa - nessa visita, falou-nos (a nós, alunos) do seu trabalho, do seu processo criativo, e falou-nos também de Clarice Lispector: da crónica se eu fosse eu.
Nela, Clarice conta que quando perde algo e não sabe onde está se pergunta a si mesma: “se eu fosse eu e tivesse um papel importante para guardar, que lugar escolheria?”, mas que a frase “se eu fosse eu” pressiona-a de tal maneira que a procura se torna secundária e escritora começa antes a pensar, “diria melhor SENTIR”, esse universo alternativo solto das mentiras do eu - que “parece representar o nosso maior perigo de viver, parece a entrada nova no desconhecido”.
Se eu fosse eu não sei se escreveria, acho que se eu fosse eu nem precisaria de escrever porque já não haveria nada em que pensar - seria só ação e sentimento, seria um caos total, provavelmente um bom caos. Se eu fosse eu seria menos eu do que sou agora; tenho-me vindo a aperceber que gosto de ser amestrada pelas palavras que há em mim - eu só sou eu no que escrevo e se eu não escrevesse morreria entupida de mim. Não sei se tenho salvação, estou há quatro meses a pensar nisto e não consigo ver-me fora deste corpo, desta mão, desta vida - talvez o meu problema seja ser demasiado eu. Isto lembra-me Marguerite Duras: “escrever é tentar saber aquilo que escreveríamos se escrevêssemos - só o sabemos depois - antes, é a interrogação mais perigosa que nos podemos fazer. Mas é também a mais corrente.”
Hoje escrevo para vos propor (a vós, leitores) este mesmo exercício: o que seriam vocês se fossem vocês?
Espero as vossas respostas.
-Sobre a Noa Brighenti-
Noa Brighenti começou por colecionar conchas e cromos aos 6 anos. Com 9 recitou o seu primeiro poema, teve o seu primeiro amor e deu o seu primeiro concerto no pátio da escola. Fartou-se dos museus aos 13, jurou que nunca mais pintaria aos 14 e quando fez 17 desfez este juramento. Com 21 anos, coleciona gatos e perguntas. Pelo meio, estuda Direito na Faculdade de Direito de Lisboa, anda, pinta e lê. De vez em quando escreve — escreve sempre de pé.