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Sexo sem folhas de Excel

Chamaremos à relação sexual o que quisermos. Hoje podemos foder, amanhã poderemos fazer amor, e se nos der na telha, na quinta será triqui-triqui. Se mesmo assim não nos contentarmos, poderemos criar um neologismo, se estiveres interessado num Writing and Chill. 

Se tu quiseres parar, ou eu quiser parar, paramos. Quer seja mesmo no princípio, a meio, ou quase no fim. Não vale insistir. Ouvi dizer que saiu uma nova série engraçada e encontrei uma receita muito boa de panquecas. Vestes tu o avental?

Fazes o que quiseres ao teu pêlo, e eu faço o que eu quiser ao meu pêlo. Hei-de prezar o teu gosto pela sua presença ou ausência no teu corpo, como mais te aprazar fazer. Se picar, desenhamos umas bolas de Natal e já temos árvore. E se fizéssemos um concurso de desenhos de corte? Se calhar é só totó. 

Quando quisermos fazer sexo, fazê-lo-emos em sítios que consideramos confortáveis para ambos. Poderá dar-se o caso de só um de nós estar disposto a enfiar um pé na sanita para nos podermos encaixar numa casa de banho pública. Aviso já, não sou eu. 

Falaremos como gostas de dormir em conchinha ou como eu gosto de fazer de ti colchão. Abraçar-te e afagar-te é bom para ti como é para mim, ou sufoca-te? Ouvir o teu coração no meu ouvido será giro ou irritante? Queres atribuir classificação de 1 a 10 quanto à tolerância de braço dormente?

Discutiremos métodos contraceptivos que respeitarão as opções de ambos. Escolheremos e experimentaremos (conjugação longa) preservativos diferentes, se nos apetecer, para variar e explorar. Será que o de banana sabe a rebuçado? Se usares o que brilha no escuro e eu me afastar, parecerá um daqueles pauzinhos fosforescentes que as pessoas levam para concertos dos Coldplay ou assim?

Explicaremos um ou outro a nossa relação com meias. Meias durante, sim ou não? Poderemos investir em padrões de meia sugestivos, temáticos, sazonais, ou preferes as de tom monótono tradicional para não distrair? É impreterível que uses meias?

Respeitaremos a nossa privacidade sexual, não partilhando detalhes íntimos com outras pessoas sem a autorização um do outro. Se me envias fotos, ou eu te envio fotos, tudo com consentimento, não as partilharemos (nem as mostraremos) a mais ninguém. Posso-te mostrar o meu ângulo favorito?

Falar durante pode ser mais do que válido. Haverá um grupo restrito de temas capaz de funcionar? Será possível falar de meteorologia de forma sexy? Não há regras, há conversas descontraídas, sussurrares ao ouvido e sons sem vergonha. Afinal, sou só eu e tu, qual é o drama? 

Dir-te-ei o que sei que gosto. Dir-me-ás o que sabes que gostas. E, com licença, experimentaremos coisas novas. Com risos e ups e ais sim e ais não. Queres fazer uma folha de Excel com reviews? Não, isto não é uma competição, nem há uma lista para cumprir. Seremos orgânicos, com lub à base de água, e até acessórios, se tal for preciso, se tal quisermos experimentar. Vou-te enviar um artigo que fala sobre umas novas formas de manobrar a coisa. Quantos níveis já desbloqueaste para lá do missionário? Lavaste as mãos? Se calhar dizer “com licença” antes de entrar é esquisito? Acho que sim. Já alguma vez te disseram “obrigada” no fim? 

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Não há cotações, nem reviews. Não há cá folhas de Excel com operações automáticas e programadas. Não há regra fixa que funcione para toda a gente, há sim uma comunicação a ser feita. Sexo é tudo o que acontece num envolvimento sexual. Sexo é o que nos interliga — independentemente do género ou do historial sexual—, não uma definição restritiva e limitadora ou uma mera penetração. Sexo é o que nos dá prazer, o que nos estimula; é que nos une, no nosso espaço, no nosso momento, com liberdade, consentimento e comunicação. 

Pode ser só hoje, pode ser por muitos amanhãs. Pode ser com muito carinho, pode ser muito selvagem, pode ser um acto supremo de paixão, podem ser os três.

Sexo pode ser tudo, se, e quando, tu e eu quisermos.

E, por favor, que seja sem folhas de Excel. Obrigada.

*Texto escrito ao abrigo do antigo Acordo Ortográfico

-Sobre Clara Não-

Clara Não é ilustradora e vive no Porto. Licenciada em Design de Comunicação, pela Faculdade de Belas Artes do Porto, e fez Erasmus na Willem de Kooning Academie, em Roterdão, onde focou os seus estudos em Ilustração e Escrita Criativa. Mais tarde, tornou-se mestre em Desenho e Técnicas de Impressão, onde estudou a relação fabular entre Desenho e Escrita. Destaca-se pela irreverência e ironia nas ilustrações, onde reivindica a igualdade, trata tabus da sociedade e explora experiências pessoais.  Em 2019, lançou o seu primeiro livro, editado pela Ideias de Ler, intitulado Miga, esquece lá isso! — Como transformar problemas em risadas de amor-próprio.  Nas horas vagas, canta Britney.

Texto de Clara Não
Fotografia de Another Angelo

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