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Simão Jarro: “Quando cozinho existe uma outra personalidade que leva o trabalho que faço de forma muito mais séria e rigorosa do que eu levo a minha própria vida”

A Mostra Nacional de Jovens Criadores (MNJC), promovida pelo Instituto Português do Desporto e Juventude, decorreu em Almada, de 1 a 3 de dezembro. Simão Jarro foi o vencedor da categoria de Gastronomia. Ao Gerador, o jovem falou acerca da paixão pela culinária, a valorização da gastronomia portuguesa e a criação que lhe valeu o primeiro prémio.

Texto de Débora Cruz

Simão Jarro, vencedor da categoria de Gastronomia da MNJC. Fotografia de Jennifer Lima Pais

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Simão Jarro tem 25 anos e é licenciado em Psicologia, mas a sua paixão sempre foi a cozinha. Desde criança que observava os seus pais e avô cozinharem e cedo decidiu começar a fazer as suas próprias experiências, aprendendo, sobretudo, de forma autodidata. Durante a licenciatura, o jovem começou a trabalhar como cozinheiro e pasteleiro com o grupo José Avillez, mas abandonou-o para concluir os seus estudos. Porém, após terminar o curso, regressou à cozinha e começou a trabalhar no restaurante Alma, do chef Henrique Sá Pessoa, em Lisboa.

Neste momento, encontra-se em Amesterdão, na Holanda, onde trabalha como chefe de partida no restaurante Bar Itália. “Vim para cá a convite de um amigo de escola que já não via há muito tempo, ele é o chef do restaurante”, conta. Simão Jarro admite ser mais sério na cozinha do que na sua vida pessoal, e o “brio” e “rigor” são as palavras que usa para descrever a forma como leva o seu trabalho. Para o futuro, o jovem espera continuar a aprender e a experienciar “mais cozinhas e mais culturas, mais técnicas e ingredientes”.

Atum na chapa acompanhado de um puré de batata doce, cebolinhas caramelizadas e finalizado com um jus de cebola, prato vencedor da categoria de Gastronomia da MNJC. Fotografia de Jennifer Lima Pais
Gerador (G.) — Acabaste este ano a tua licenciatura. Como é que um estudante de Psicologia “tropeça” na culinária e decide tornar-se um chef de cozinha?

Simão Jarro (S. J.) — O meu interesse por cozinha existia desde relativamente cedo. Desde mais novo que os meus pais me ensinam a cozinhar certas coisas. Sempre fui bastante observador quando via os meus pais e o meu avô a cozinhar, que são as três pessoas que mais presentes tenho na minha vida. Veio a partir daí e durante toda a minha adolescência sempre gostei de cozinha e sempre fui cozinhando umas coisas, mas comecei mesmo a interessar-me no meu último ano de escola e primeiro ano de faculdade. Entre 2015 e 2017, comecei a cozinhar para mim para não estar sempre a comer o que os meus pais faziam e, na altura, também estava a querer mudar a minha alimentação. Comecei a controlar muito mais o que comia e a aprender sobre nutrição e, depois, comecei a querer sair do típico frango com massa. Como sempre tive bons cozinheiros e sempre fui atento a como é que as coisas se faziam, comecei a fazer por mim e a coisa tornou-se uma paixão maior e o interesse foi crescendo até ao que é hoje, que é uma paixão verdadeira.

(G.) — Na tua candidatura à MNJC, mencionaste que não tens estudos na área da Gastronomia. Como foi a experiência de aprender de forma autodidata?

(S. J.) —Uma das coisas que me fez aprender a cozinhar foi querer fazer as coisas de raiz e tentar evitar o processado e o pré-comprado o mais possível. A cozinha é uma coisa que se aprende de forma prática, pode ler-se tudo o que se quiser, mas a verdade é que apenas quando se faz mesmo e se pratica é que se vai ganhar uma experiência e um saber. Posso aprender muito a ler, mas se não praticar não vou saber como me desenrascar em certas situações onde alguma coisa corre mal. Aprender a cozinhar foi uma questão de muita tentativa e erro consoante a receita: repetia três ou quatro vezes a mesma receita até chegar ao ponto de entender já como as coisas funcionavam e já conseguia dar um toque pessoal. Houve esse trabalho autodidata e depois houve um grande trabalho de querer aprender técnicas de corte e de cozinha, também de forma autodidata.

(G.) — Na tua candidatura mencionavas também que tiveste a oportunidade de trabalhar junto do grupo Avillez e no restaurante Alma, do chef Henrique Sá Pessoa. Como foi trabalhar junto de dois dos grandes nomes da culinária portuguesa?

(S. J.) — Na altura, o grupo José Avillez estava em expansão e tinham cerca de 14 ou 15 restaurantes. O meu primeiro trabalho foi num restaurante mexicano, no El Corte Inglés, que é o Cascabel, e aí trabalhei com o chef Avillez. Quando foi para fazer a abertura do segundo sítio onde trabalhei, um restaurante libanês chamado Za’atar que, neste momento, está fechado também trabalhei com o chef Avillez. Nessa altura, eu estava na cozinha e ele estava do outro lado, porque vinha todas as noites para acertar a ementa e dar a opinião. Trabalhei também com um chef libanês, Joe Barza, para além de outras pessoas que não são celebridades, mas que, no mundo da cozinha, são de valor e conhecidas. Foi um choque grande, sabendo que tinha pouco mais de quatro mesitos de experiência profissional, sem ter feito escola antes. Foi quase uma experiência... quase “out of body experience”, porque não era de todo o que estava habituado.

Este ano, depois de ter acabado o curso, queria muito voltar para o mundo da restauração e trabalhar outra vez em cozinha. Queria, pelo menos, voltar ao mesmo nível de quando estava no grupo do José Avillez ou tentar fazer melhor. Acabei, por uma certa loucura, por entrar no Alma e fui lá deixar o meu currículo. Fui lá falar com o chef Daniel, um chef estrelado, e acabei por trabalhar com ele todos os dias. E foi, mais uma vez, uma “out of body experience”. A cozinha é dos poucos trabalhos em que o valor de cada um é mostrado pelo trabalho prático que se faz, não é pelo que se diz ou o que se quer ou pelas ideias que se tem. Realmente foi uma experiência ótima e fantástica, mas não é por ter trabalhado com eles que eu próprio sou uma celebridade na cozinha. Há que aprender com eles, eles têm muito para nos ensinar. Fico mais contente por ter tido isso tão cedo, no início da minha carreira culinária. Dá-me alguns sinais positivos para o futuro.

(G.) — E identificas-te com algum ou alguma chef, no panorama nacional ou internacional, que te sirva de inspiração ou que influencie o teu trabalho?

(S. J.) — Não me identifico propriamente com nenhum chef em específico. Gosto das cozinhas de certos chefs, gosto de estilos culinários e de certos pratos, ideias e conceitos. Aprecio chefs que foram inovadores ou mexeram com conceitos novos ou modernos. No entanto, não diria que tenho um chef que sigo. O que posso dizer é que tenho aprendido com todos os chefs e tenho tentado trazer isso para o meu trabalho e o que tenho vindo a aprender é que todos os grandes chefs com que trabalhei começam por ter, antes de mais, rigor e profissionalismo no seu trabalho. É verdade que se queremos aprender em cozinha tem que se ter muito rigor, profissionalismo e levar o trabalho a sério, porque não se deixa de se estar a servir um cliente, uma pessoa que está a pagar, acima de tudo, por uma experiência. No Alma, há muita gente que tem reservas feitas há dois ou três meses, a pessoa paga um montante considerável pela sua refeição, é uma experiência que planearam e, se calhar, até viajaram para ir ao restaurante. Um bom cozinheiro quer oferecer a melhor experiência possível a esse cliente que está à espera de concretizar uma idealização da experiência que vai ter. É algo que não vai esquecer, é o que queremos dar: uma experiência que não vai esquecer, era o que eu quereria, que a minha experiência fosse memorável. Não quer dizer que não existam erros, mas para haver uma experiência memorável significa que do outro lado tem que haver rigor, consistência e seriedade, mas também fazê-lo com gosto, porque gostamos de servir as pessoas. Por isso, não tenho tanto um chef que siga, mas tenho sim o rigor que todos os chefs com quem já trabalhei e levo isso como uma lição moral para a minha carreira profissional no futuro.

Fotografia de Jennifer Lima Pais
(G.) — Como te descreverias enquanto chef?

(S. J.) — Por acaso, fizeram-me esta pergunta ainda ontem. É curioso, porque o mundo da cozinha é um mundo duro, de stress, pode ser um mundo de correria e é um mundo muito hierarquizado também, mas há uma razão para tal. Exige-se responsabilidade na cozinha e nós, enquanto cozinheiros, ou mesmo até o chef, a não ser que seja ele o dono do restaurante, tem sempre um patrão acima dele a quem ele próprio tem de prestar contas, digamos assim. Eu, enquanto chef, sou uma pessoa aberta e acessível, pelo menos, tento ser. Por acaso, fora do meu trabalho dificilmente me chateio ou me irrito com pessoas, no entanto, venho a perceber que no meu trabalho existe uma outra personalidade que leva o trabalho que faço de forma muito mais séria e rigorosa do que eu levo a minha própria vida. Posso ter a minha cama desarrumada, mas não tenho a minha bancada desarrumada. No fundo, percebo agora, depois de ter estado na última experiência e no grupo Avillez, que se queremos rigor e as coisas bem feitas, há que ser a figura que às vezes as pessoas não querem enfrentar, é ser o gajo chato que está ali para supervisionar e estar em cima de ti para te dizer que não está bem e para se chatear contigo. Eu quero ver isso no meu trabalho, porque acho que é a melhor maneira de ter brio e rigor. Quanto mais postura e rigor tiver, que é algo que se ganha com a experiência, mais naturalmente vou manter o meu trabalho organizado, limpo e bem feito e as coisas dão prazer quando são feitas assim. Não dá prazer fazer um trabalho que não é eficiente, quando se está arrastar e está desorganizado ou quando a cozinha está suja. Não sou chef, nem fui, sou chefe de partida, por isso tenho a responsabilidade sobre a minha bancada e dos cozinheiros que me ajudam. Todos nós fazemos uma cozinha organizada e é aí que está a beleza da cozinha: é a organização, que acaba por se tornar numa dança quando todos trabalham em equipa.

(G.) — Esse brio e rigor era algo que tinhas já antes da tua experiência profissional ou foi algo que foste ganhando com o tempo?

(S. J.) — Na minha vida não sou uma pessoa organizada, verdade seja dita. No entanto, quando se tratou de trabalhar e da minha vida profissional, fui uma pessoa que sempre levei o trabalho a sério. E é preciso ser humilde, sobretudo em cozinha, porque há muita coisa a aprender. O rigor veio a formar-se com os chefs e sítios que exigem esse rigor, veio muito com a experiência.

(G.) — Sobre a tua participação na MNJC. Como ficaste a conhecer o concurso e o que te motivou a submeteres a candidatura?

(S.J.) — Vim a saber do concurso através de outra pessoa. No que toca à categoria de Gastronomia foi até o primeiro ano em que aconteceu. Talvez se fosse um concurso de cozinha que existisse há mais tempo tivesse ouvido falar porque é uma área que me interessa mais do que outras que fazem parte da MNJC há mais tempo. Foi através de outra pessoa que conheci e decidi concorrer com um prato meu. O que me motivou foi o desafio de ter a oportunidade de criar um prato totalmente original que ia ser julgado por pessoas competentes, que têm experiência e sabem o que estão a fazer. Quis ver o que saía daqui, sempre fui de desafios.

Simão Jarro na Mostra de Gastronomia da MNJC, no dia 3 de dezembro. Fotografia de Jennifer Lima Pais
(G.) — O teu prato intitulava-se “Atum na chapa acompanhado de um puré de batata doce, cebolinhas caramelizadas e finalizado com um jus de cebola”. Qual foi o processo criativo que levou a esta criação?

(S. J.) — A ideia inicial surgiu de querer fazer uma versão pescetariana de um bife Wellington, um prato inglês clássico que leva um lombo de carne enrolado numa pasta de cogumelos, que depois é enrolado em crepes e numa massa folhada. O básico é este, mas há outras versões, e, muitas das vezes, é acompanhado por um puré de batata e um jus ou um demi glace. Na altura, ia fazer esse prato, mas tinha uma amiga que, para além de tentar seguir uma dieta sem carnes, não consumia leite. Então eu não podia fazer nem o lombo de carne, nem o puré de batata, que leva manteiga, e nem podia fazer o molho, que é feito à base de ossos. No entanto, disse-lhe que ia fazer uma coisa diferente. Tinha trazido do restaurante um lombo de atum muito grande e eu sabia que se faziam Wellington de salmão. Assim, ia fazer com atum em vez do rolo de carne, puré de batata doce em vez de puré de batata normal, porque este tem uma consistência naturalmente muito boa sem ter que se usar qualquer gordura. Depois, pensei numa ideia para um molho e fiz uma redução de um caldo de cebola até chegar a um jus e engrossar. 

(G.) — Que tipo de texturas e contraste de sabores procuraste ter neste prato?

(S. J.) — O puré de batata doce é bastante doce por si só e pode ser enjoativo. O atum é um peixe mais carnudo e precisava de um elo que ligasse o puré que é muito doce com o atum que é carnudo. A cebola, quando cozinhada, fica nesse elemento entre o amargo e o doce dos açúcares que são trabalhados. A ideia original veio daí. A partir daí, acabei por chegar ao prato que submeti: mantive o atum apenas na chapa, porque queria que ficasse bastante cru no meio, o puré manteve-se o mesmo e o molho de cebola também. A ideia da pele de salmão veio por duas razões: porque o prato tem influências japonesas, com o atum e o próprio molho tem uma pasta de miso; e porque a pele do atum não se pode utilizar porque é muito grossa e decidi, para dar mais cor e um elemento crocante ao prato, fritar essa pele. De certa forma, estamos a por uma nova pele no atum e a criar várias tonalidades com ela. As sementes de sésamo que coloquei também são algo japonês que dá um certo toque crocante e um padrão diferente. 

Já as cebolas, que são caramelizadas, são um retrabalhar do caldo, são uma representação do caldo sob forma física. É mais uma textura, porque sem a cebola temos apenas um puré e uma carne e um elemento crocante no peixe, mas falta aqui quase uma quarta textura de leguminosa. Tentei jogar com todos os elementos e fazer um prato que jogue com todos eles no nosso palato. Depois, existe ainda um jogo de cores. Quando fiz a primeira vez, fiz uma versão mais feia ou menos perfecionista deste prato. As cebolas também foram uma tentativa de introduzir mais cor.

Fotografia de Jennifer Lima Pais
(G.) — O empratamento do teu prato era também muito meticuloso. Podes explicar a disposição dos elementos e de que modo pensaste a forma como o empratamento iria influenciar a prova do prato?

(S. J.) — Isso é bem visto, porque o posicionamento dos elementos e/ou a maneira como os elementos são cortados tem uma influência grande no nosso palato. No meu caso, é engraçado porque eu, agora, olho para o prato e fazia 30 vezes melhor [risos]. Há imensas coisas que não gosto naquele empratamento, acho que podia estar melhor e mais bonito. Mas respondendo à tua pergunta, a ideia era combinar todos os elementos de uma só vez e ter toda a experiência do prato quando se tem uma garfada do atum com a pele, com o puré e o molho e talvez um pouco da cebola. A cebola até pode ser comida à parte, por isso é que está posta um pouco mais de lado. A cebola é um ingrediente que é muito pouco utilizado como leguminosa. Em Portugal, não usamos muito a cebola como acompanhamento, usamos para completar o nosso prato, para fazer o refugado, para as sopas, para tudo menos como acompanhamento. No entanto, é um legume como todos os outros que, quando é cozinhado, é perfeitamente comestível e foi o que quis fazer com o meu prato. Queria fazer uma junção de todos os elementos no palato de quem está a comer e combinar todos os sabores entre o que é o amargo, o doce, um pouco do carnudo e o crocante. Queria também criar um prato bonito que também se comesse com a vista, porque acho que se começa por comer com os olhos. Não é tudo, porque um prato pode ter ótimo aspeto e não valer nada, quantas vezes não nos aconteceu isso, mas a ideia era criar algo que fosse bonito e que se pudesse apreciar antes de comer.

(G.) — Mencionaste na tua candidatura que procuraste trabalhar com a alta qualidade de produtos nacionais. Soubeste, desde logo, que querias utilizar, sobretudo, produtos portugueses?

(S. J.) — A 100 %, não houve dúvidas na minha cabeça. Aliás, para mim fazia sentido porque se trata da Mostra Nacional de Jovens Criadores. A ideia desta iniciativa é, no fundo, mostrar o que Portugal tem de melhor e se queremos mostrar isso temos também de o representar no prato e escolhi usar apenas produtos nacionais. Fiz um grande trabalho para o vídeo da candidatura e para tudo o que fiz na MNJC, exceto a pasta de miso, que é japonês, e o atum, estes são os únicos dois elementos que não são de origem portuguesa. Todas as coisas foram compradas no mercado a uma senhora que os vende e os colhe da sua terra, todos esses elementos são portugueses. Queria apostar nos produtos nacionais desde o início, mas deu-me um pouco de trabalho porque há coisas que não são de fácil acesso cá em Portugal, como o alho e o aipo que são, normalmente, produzidos em massa em Espanha ou até noutros países. Mas era tudo português, era esse um dos objetivos. O prato tem influências japonesas, mas Portugal também é um país multicultural que é influenciado por diferentes culturas e o Japão acaba por ser um deles, por isso sabia que não ia ser estranho.

Fotografia de Jennifer Lima Pais
(G.) — Referiste há pouco que foi a primeira vez que a categoria de Gastronomia foi incluída na MNJC. Achas que pode ser sinal de um reconhecimento da culinária como algo artístico?

(S. J.) — Acho que a cozinha consegue ser uma arte, mas não é necessariamente vista como tal ainda. Acho que consegue ser uma arte, porque a arte implica um artista, um artista é um criador e a cozinha tem certamente que se criar. A cozinha é uma arte, mas não quer dizer que seja feita por todos, acho que nem toda a gente quer levar a cozinha como uma arte e não a leva a esse nível de preocupação com a experiência da outra pessoa quanto à obra que nós fizemos. Quando criamos algo, tem de ter um impacto nas outras pessoas ou em nós e acho que nem todas as pessoas se preocupam tanto com o impacto que o prato vai ter. Na cozinha tradicional, por exemplo, não procuramos que o prato seja particularmente bonito, no entanto, é extremamente saboroso. Acho que com a cozinha moderna e de fusão, com a influência de outros países como a França e com o fine dining, começou a haver essa preocupação com a experiência que é dada ao cliente, a influência que essa experiência tem na comida que estamos a comer. Pessoalmente, acho que é na cozinha de fine dining que começa a entrar o lado artístico do que é a culinária. Ainda é muito tomado como um pouco elitista e certamente não é de acesso a todos, sobretudo em Portugal, com o nível de vida que temos. Talvez a própria gastronomia portuguesa não procure tanto o fine dining, talvez seja uma cultura gastronómica que não veja a cozinha de forma tão artística, mas é algo que se está a tornar nisso. E a MNJC ter incluído a categoria é uma prova de que a gastronomia portuguesa tem imenso valor. É uma cozinha muito versátil que utiliza muitos ingredientes diferentes, que teve influências de muitos sítios e é uma gastronomia que não tem medo de usar coisas um pouco diferentes.

(G.) — Quando recebeste o prémio disseste que «somos apenas dois, mas vamos apostar nisto [para o futuro], a gastronomia portuguesa é mundial e a culinária de Portugal é muito grande». Não sentes que existe essa valorização da culinária portuguesa entre os mais jovens, em particular? 

(S. J.) —Fiquei muito surpreendido de só haverem dois candidatos. Acho que só aconteceu porque a MNJC nunca tinha tido uma categoria de gastronomia antes. No entanto, fiquei muito surpreendido de terem existido apenas dois candidatos porque, pela experiência que tive, sei que há muitos jovens com imenso talento em Portugal. Existem pessoas com muitas capacidades e tenho a certeza de que são pessoas com muita criatividade e ideias. Em Portugal, o trabalho até pode não ser valorizado, mas a experiência é de valor. Temos sítios ótimos, de imensa qualidade, sítios de respeito a nível mundial, só não temos os apoios suficientes. Por isso fiquei surpreendido, quase que não acho justo porque, garanto-te, no próximo ano vão haver oito candidatos selecionados. Acho que, cada vez mais, existe um maior interesse pela gastronomia. A gastronomia em Portugal está a crescer e há zero chances de no próximo ano existirem apenas dois selecionados.

(G.) — Quais são os teus planos para o futuro? Qual é o caminho a partir daqui?

(S. J.) — Posso dar uma resposta mais específica ou uma mais filosófica. Vou dar uma resposta mais filosófica e dizer que o futuro que vem aí é um de continuar a aprender, continuar a ganhar experiência. Acho que ainda não aprendi quase nada do que há para aprender, e a cozinha só se faz e só acontece através de experiências. Por isso, quero experienciar mais cozinhas e mais culturas, mais técnicas e ingredientes. Se há coisa que goste é de aprender mais em cozinha e é o que quero continuar a fazer e trazer mais ideias, criatividade e rigor para o meu trabalho. É isso que procuro no futuro: continuar a evoluir na minha carreira profissional e evoluir no que é o meu interesse pela minha paixão, que é a cozinha e ninguém me vai tirá-la, de certeza.

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