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Simbiose: “A procura da intemporalidade está sempre subliminar, mesmo que não seja consciente”

Maze e Spock juntaram-se para criar um disco intemporal, homenageando os clássicos do rap nacional….

Texto de Patrícia Nogueira

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Maze e Spock juntaram-se para criar um disco intemporal, homenageando os clássicos do rap nacional. Simbiose leva-nos numa viagem pela vida ao longo de vinte faixas, às quais se juntam nomes como NBC, Splinter, Sitah Faya, Buda XL e o DJ Ride.

Foi no dia 13 de abril que o rapper Maze e o produtor Spock mostraram as simbioses que foram criando ao longo de três anos, entre si e com outros artistas. Da busca pela verdade na palavra, os dois artistas fizeram nascer Simbiose, um disco com vinte músicas em que pensamentos e emoções são transmutados em som. Nas palavras do MC dos Dealema, este é um “disco que nasce de um sítio de reencontro com a nossa essência, na viagem ao nosso íntimo que relata as superações da vida quotidiana numa sociedade de controlo que evita a todo o custo a libertação do indivíduo. Serve este manifesto como catalisador para essa luta pela evolução em consciência e é porta-voz duma tribo que acredita numa visão mais positiva da coexistência em harmonia com a natureza do ser.”

As gravações aconteceram nos estúdios da Contentor Records, em Lisboa, ao longo dos últimos três anos, e por lá foram passando os convidados que contribuíram para este trabalho discográfico com as suas vozes: NBC, Splinter, Sitah Faya, Buda XL e Erre K; com os seus instrumentos: Francesco Valente, Buda XL e Sofia Graça; com os seus scratchs: DJ Ride, DJ Sims e DJ Kronic ou na arte da mistura: Ben António e da masterização: Mr. Papz.

Por enquanto, ainda não é conhecida a agenda de concertos, mas, em entrevista ao Gerador, Maze e Spock contaram estar a criar um espetáculo que, assim como toda a sua música, pretende ser “intemporal”. Com o desejo de continuar a elevar o hip hop nacional e ter a palavra como rainha, os dois falaram ainda sobre sobrevivência, caminhos e como este disco é acima de tudo, uma perfeita simbiose.

Gerador (G.) – Maze, desde 1996, que te tens juntado a artistas, participaste em dezenas de discos, fizeste sempre o teu caminho como uma referência para o hip hop nacional. Nestes 26 anos, o hip hop sempre teve o mesmo sabor para ti?

Maze (M.) – Eu acho que sempre esteve presente, sempre com maior ou menos intensidade ao longo destes anos, porque tenho outros interesses, gosto de outros estilos musicais e dedico-me a outras coisas, mas é o fio condutor. É um fio condutor na minha vida e fico muito feliz por ter descoberto essa linguagem muito cedo, a minha linguagem e forma de expressão, de me relacionar com o outro, de chegar ao outro. Isso aconteceu muito cedo, e acho que já era para mim, porque eu lembro-me de que as primeiras vezes que ouvi rap na rádio, ressoou automaticamente, e eu era uma criança. O meu corpo automaticamente reagiu, e isto foi crescendo e cada vez que via algo relacionado com cultura eu identificava-me e acredito que isto sempre tivesse reservado para mim. Talvez na adolescência tenha vivido o hip hop com mais intensidade, as quatro vertentes, pintava bastante, estava a começar a escrever rimas, todo o meu círculo de amigos estava relacionado com alguma vertente do hip hop, então vivi o hip hop muito intensamente durante alguns anos, quase 24 horas. Depois, a vida vai-nos levando por outros caminhos, mas aí já está algo cimentado em ti que não te deixa soltar desse movimento e então aí é vitalício. E se reparares, mesmo a nível internacional, os grandes artistas e pioneiros de todas as vertentes que começaram nos anos 70, ainda hoje com 50 anos estão relacionados com a cultura, mesmo que não tenham um papel ativo, vão estando e ajudando a comunidade, fazendo workshops, tendo uma ligação que os mantém ligados à cultura. E isso é incrível, como é que na sociedade moderna nasce um movimento que tem quatro vertentes de expressão artística, que é tão alargado e chega a tantas pessoas que gostam de criar, de forma diferente – a dançar a pintar, a rimar a produzir, ou o beatbox –, e isto vai-se multiplicando e ramificando e há cada vez mais gente, é uma linguagem universal e está aqui para durar, tanto que de repente é o principal estilo musical consumido no planeta.

G. – Numa entrevista, o Maze dizia que, neste país, a música é uma luta de sobrevivência. Vocês estão no mundo da música há algum tempo… ainda é assim?

Spock S. – Eu sinto que sim, especialmente para quem faz música mais independente, underground, é sempre a luta – o underground vs. mainstream –mesmo na questão da sobrevivência porque tudo o que é cartaz maior já tem slots preenchidas por editoras major, então, às vezes, não depende só da qualidade musical, depende de contratos e a parte da sobrevivência é essa. Porque o artista cria independentemente das adversidades que tenha, mas depois a exposição na montra às vezes não depende dele e da sua arte, depende de outros fatores, e é essa a sobrevivência.

M. – Eu aí tenho coisas para dizer, porque sempre tive nessa corda bamba a minha vida toda e fui-me apercebendo de que toda a expressão artística em Portugal é levada para um segundo plano, não é essencial, quase como a arte ser algo menor e que podemos muito bem sobreviver sem ela, é fácil perceber logo isso pela percentagem de orçamento de estado reservado para a cultura, que tem de mudar, e o apoio ao artista tem de ser diferente. O ser humano não vive sem arte, e o exemplo disso é que toda a gente consome música, ou vê filmes, séries, ou vai ao teatro, mas depois ao fim do dia, é uma coisa que está ali. É exatamente o que o Hugo disse, há um segmento de artistas que já estão instituídos, que já estão numa máquina que funciona muito bem, e esses estão (se calhar) confortáveis, e as pessoas habituaram-se a ver o artista como uma pessoa que está bem na vida e que tem dinheiro, que está só a curtir e a fazer a cena dele, mas isso é a ponta do icebergue que está cá fora, porque o resto do icebergue são artistas que estão a lutar, e a trabalhar para financiar a sua arte, e estão nesse loop há anos sem conseguir furar. Há países que abordam isso de forma diferente. Creio que França tem um subsídio para artistas, para que vivam e possam criar, e é assim que devia ser. Agostinho da Silva fala desse subsídio incondicional para viveres e seres tu, que é fundamental porque quando estás num ponto de sobrevivência não tens espaço para pensar em mais nada, e não consegues ser criativo da mesma forma, porque o teu principal objetivo é alimentaras-te, pagar contas e tratar da tua família, e aí não vem a criação como deve ser.

G. – Então, e agarrando no nome do vosso álbum, estas simbioses ajudam a essa sobrevivência, a que a máquina continue a andar?

M. – Sem dúvida, e a Contentor Records é exemplo disso. É um grupo de amigos que de repente une esforços e cria uma máquina a tentar sobreviver, a funcionar independentemente do que está instituído. Então essas simbioses são essenciais para que os artistas percebam que estamos no mesmo barco, todos a lutar pelo mesmo, mesmo a fazer coisas diferentes.

S. – Esta luta e respeito deve-se também aos artistas independentes, porque sabe-se que quando um artista mostra, seja uma canção ou seja uma tela, o esforço que está por trás daquilo que não é visível na arte, é sempre imenso, e quem é artista e sabe o que passa, já olha para o outro artista com respeito. Às vezes estás aqui há 10 ou 15 anos a sobreviver só pelo prazer de criar e mostrar a alguém, porque o artista sabe que a sua arte, muitas vezes, ajuda o próximo e isso é digno, especialmente num país como o nosso que não dá valor a isso, mais valor essa peça tem, seja ela qual for.

M. – Há uns dias, li uma citação de uma entrevista do Rui Chaves em que ele falava sobre o artista estar sempre em constante criação, não tem timings, não diz que via trabalhar só a determinada hora, ou dar um concerto, ou fazer só aquela escultura, é um trabalho constante, não consegues desligar o cheap da criatividade, e durante o dia está sempre nesse processo. Então é um trabalho continuo que tem de ser valorizado. Há muito tempo atrás que é preciso despender até uma obra surgir, mas como está no invisível não é valorizado.

S. – E grande percentagem dos artistas independentes que temos, têm de ter outro trabalho, um para sobrevivência e outro para sobreviveres, que é a parte da criação. A tua cabeça não consegue desligar, está constantemente a criar, só que está limitada por teres de estar noutro trabalho de oito horas, mas a tua cabeça já esta a trabalhar no que vais fazer quando chegares a casa, e muitas vezes chegas a casa cansado, fazes as lidas, e depois dedicas duas horas em extremo cansaço para criar… A quantidade de artistas que trabalha assim e no fim de semana se apresenta num palco para apresentar algo, é de valorizar.

M. – Acho que nunca falei em entrevistas, ou se falei foi muito pouco, mas, quando saiu o Brilhantes Diamantes e estava a passar nos Morangos com Açúcar, e eu nem via os Morangos, por isso não tinha bem a noção da dimensão até onde a música estava a chegar, eu estava a trabalhar todos os dias numa loja de sapatilhas, e então estava exposto. Estava ali num ambiente em que as pessoas me podiam abordar enquanto eu estava a trabalhar, o que era dificílimo, porque eu estava ali só porque precisava daquele dinheiro para sobreviver, mas a minha cabeça não estava ali. Entendo muito bem essa posição, é muito delicada e há muita gente nessa situação em Portugal, artistas que não o dizem abertamente e não falam sobre isso nas entrevistas (e não têm de o fazer), mas estão, e são muitos, e às vezes são aqueles que tu achas que estão mesmo bem.

G. – Mas, por exemplo, o hip hop é mais cru e a palavra é a rainha, e é nisso que muita gente se revê. Não é um pouco antagónico não mostrar também esse lado no hip hop?

M. – Eu acho que quando fazes rap tens de ser genuíno para honrar esse poder da palavra e quando mascaras muitas coisas ou inventas, a palavra não chega da mesma forma à outra pessoa, porque ela espera que sejas tu, genuíno, com a tua verdade, então concordo perfeitamente – há muita coisa que é superficial e que não tem a profundidade que normalmente o rap exige, mas as pessoas também sentem isso. Acho que foi isso que nos ligou a este estilo, tanto eu como o Hugo gostamos dessa sinceridade, tanto na palavra como no instrumental, ambiente e sentimento que a música tem por trás, então para nos só nos faz sentido fazer música dessa forma, que tenha um sentimento presente.

S. – O peso do hip hop é mesmo esse, por isso é que somos um estilo musical onde o ghost writer ou escreveres para alguém não é tão bem visto e faz sentido que assim seja… Sempre foi o MC em frente ao público a debitar a sua vida. Começou como um movimento de festa, mas rapidamente o rap de intervenção ganhou uma dimensão enorme e formou os pilares que esta cultura tem. Então a honestidade, o MC debitar as suas próprias palavras, são valores muito fortes no hip hop e um ouvinte sente quando o MC se está a expor e a ser honesto.

G. – Simbiose é uma associação recíproca de dois ou mais organismos diferentes que lhes permite viver com benefício. Que benefício tiram os dois deste disco? Ou seja, porque surgiu esta vontade de criar algo em conjunto?

M. – Foi surgindo, não saiu de um momento para o outro, foi algo que foi surgindo. Começa tudo pelo Hugo me enviar um instrumental, enviou-me vários, um deles ressoa mesmo comigo e eu respondo-lhe a dizer que tenho coisas a dizer nesse instrumental. Escrevi a música e decidimos encontrarmo-nos finalmente, e passar tempo para nos conhecermos e aí estreitamos uma relação de amizade. A partir daí, essa simbiose começa a acontecer e a ser cada vez mais forte e o disco começa a nascer assim como essa vontade de nos potenciarmos um ao outro. O que eu ganho com esta simbiose é a capacidade de dizer coisas que não iria dizer em instrumentais de outra pessoa, há muita gente a fazer instrumentais, mas nenhum me levaria a fazer este disco, a não ser os dele, e isso extrai algo de mim que é ótimo, e é muito bonito perceber que me estimula desta forma a dizer coisas únicas.

S. – Este disco cresce da forma mais natural de sempre, porque só houve realmente a noção de que tínhamos um disco quando já tínhamos um conjunto de faixas grande, portanto não houve um combinar. Tudo começou com o “O Negro Luto”, em que começamos a trocar ideias, e a coisa começa a ganhar uma dimensão natural que leva ao ponto em que percebemos que temos material suficiente para fazer um disco. A parte da simbiose, a parte bonita disto, é que não há nada que se repita, é impossível que isto se repita, porque a simbiose só existe devido a estas duas energias. Se não fosse o Maze ou se não fosse eu, jamais isto seria igual, é a parte bonita da música. Isto realmente aconteceu por sermos assim e estarmos naquela onde de energia em que conseguimos desenhar aquele ambiente musical, em que ele conseguiu contar estas histórias e expor-se desta maneira, de outra maneira não teria acontecido assim.

G. – Cada álbum é uma história. Que história nos querem contar ao longo destas 20 músicas?

M. – O disco começa quase a apresentar a viagem que se segue. “Túnel” é centrada nesse túnel que é uma viagem e depois termina na ultima faixa “Um ponto de Luz”, com a luz ao fim do túnel, e com essa saída para o que aí vem, e que está por vir, fazer e desenhar, e só nos cabe a nós fazê-lo. Durante esse percurso, há todos uns meandros que vão acontecendo e que são muito autobiográficos, porque é assim que eu costumo criar, tem de partir desse sítio, tem de sair de mim dessa forma. Então tem muito a ver com vivências, sentimentos e pensamentos que vou tento ao longo dos tempos e que os instrumentais vão induzindo a expô-los. É uma viagem que não foge muito ao que eu me proponho fazer, que é guiar o outro através da minha palavra e do meu exemplo, sempre esperando que a minha história inspire quem está a ouvir, inspire a pensar, a sentir, que se reveja, que aquilo fique a ressoar nele e que ele sinta vontade de transformar, acho que é isso que sempre me propus e continuo a tentar fazer da melhor forma.

G. – Foram buscar outros artistas para contar com vocês esta história…

M. – Os convites foram todos muito naturais. As peças foram-se juntando e, se virmos bem, a lista de convidados são pessoas com as quais nos relacionamos e que gravitam à nossa volta de alguma forma, e que nós reconhecemos talento e gostamos do trabalho deles, e por isso achámos que iam agregar valor a este disco. Não só agregar valor, como são fundamentais para contar esta história porque dão as suas visões muito importantes, ou seja, não é só a minha narrativa, tem a energia deles. Não só os que participam com a voz, mas também os instrumentistas que estão no disco todo, e que vão pontuando, como as flautas do Francesco ou os baixos do Buda XL que são fundamentais, e que depois das músicas estarem construídas, de repente ainda ganham uma dimensão maior só com a participação deles. E nas vozes aconteceu o mesmo, a minha voz está lá, mas o convidado chega e às vezes brilha mais do que eu, e está tudo bem, não tenho problema nenhum com isso. Há aquela cena no rap de “eu sou o artista principal deste tema” ou “eu tenho de ser o melhor da minha rima”, mas, às vezes, o convidado chega e tem um momento em que brilha muito mais do que eu naquela fase. E eu estou tranquilo com isso, porque é esse valor que tem que ser agregado a essa faixa e é assim que a faixa vai crescer.

A questão dos DJ é fundamental também. O rap que fazemos é clássico e a nossa pretensão é fazer discos clássicos de rap que se aguentem no tempo, e há algo que se foi perdendo ao longo do tempo - essa presença do DJ na música, Então fizemos questão de convidá-los e criar esses momentos na música em que há ali uma parte para representar essa vertente da cultura.

G. – Quem são os poetas que vos inspiram?

M. – Há muitos poetas que me inspiram, a mim que estou colado à palavra desde sempre, sou um apaixonado pela palavra e isso passa a ser o meu ofício, sou inspirado por muitos rappers americanos, nacionais, sou inspirado por poetas portugueses clássicos, por poetas mais contemporâneos, alguns mesmo underground que estão a lançar livros agora e estão nesse circuito da palavra dita. Vou estando atento e lendo, sempre com uma certa distância porque não quero ser contaminado. Sempre ouvi pouco rap português, ouço o disco, mas não o consumo durante meses, para não haver essa contaminação subconsciente e ficar com estilos de outras pessoas gravados em mim e que saem na minha escrita, porque quero ter essa unicidade do meu estilo. Então vou absorvendo, lendo, captando, mas transformando para que seja meu, não quero estar aqui a atirar nomes, porque é um pouco injusto, mas consumo regularmente poesia seja ela escrita, dita ou rimada em música.

S. – Eu faço parte de uma geração que já cresceu com hip hop e ganhei o gosto pela poesia através do hip hop com todos os nomes que nos inspiraram desde Sam a Dealema. Tenho a vantagem de poder trabalhar com poetas incríveis, que são os poetas dos dias de hoje que são MC, que se o instrumental parar eles conseguem debitar a poesia deles, e isso é incrível… como o hip hop conseguiu dar esse valor ao poeta, e acrescentar tantos poetas de qualidade que se inspiraram através da música. A cultura deve isso ao hip hop. Por isso, sim, grande parte dos meus poetas são MC e, felizmente, posso trabalhar com muitos deles, o que é ótimo.

G. – Vocês dizem que este é o início do caminho, “para esta irmandade que promete continuar a criar clássicos do rap nacional, ocupando o seu próprio espaço na esfera da spoken word”. O que ainda falta fazer pelo hip hop?

M. – É uma pergunta difícil. Falta sempre tudo, o que nós quisermos. Não temos propriamente de fazer algo pelo hip hop, temos de criar o que temos de criar, e isso passa a fazer automaticamente parte da cultura, a cultura abraça e agrega e vai crescendo com todas as partes que os seus elementos vão trazendo. Então acho que temos de fazer mais música com esse objetivo de fazer mais música que sejam clássicos, músicas intemporais, que prevaleçam ao longo do tempo e tenham qualidade, a que achamos que devem ter.

S. –– Há sempre coisas que ficam por dizer, apesar do disco ter chegado a um número de faixas, havia sempre faixas que podiam ter entrado, então é sempre uma porta aberta para outro trabalho. Porque quando tens uma posição na cultura que vives, tu queres defende-la, falar sobre ela, transmitir esses valores, então sentes que nunca terminaste, que tens sempre algo para acrescentar. Agora lançamos o disco, e para o ano ou daqui a dois anos a geração que vai estar à frente do hip hop já será completamente diferente, então sentimos que temos coisas para dizer a quem nos segue. A parte bonita do ser artista é que nunca acaba.

G. – Há sempre essa procura pela intemporalidade?

M. – Sim, quando me proponho a criar o que eu mais gosto é que a peça prevaleça ao longo do tempo e tem-me acontecido, há músicas que escrevi há 20 anos estão mais válidas do que há 20 anos, e acho que este disco conta com isso. A maior parte deste disco está escrito há três anos e de repente passamos por uma pandemia e há músicas que fazem muito mais sentido agora depois de termos vivido estes tempos. Então a procura da intemporalidade está sempre subliminar, mesmo que não seja consciente. E tenho a certeza que nós e mais artistas que pensam desta forma, acabam por marcar a diferença numa sociedade e numa indústria que é tão efémera e que está sempre à procura da nova moda. As coisas têm um prazo de validade muito curto e um espaço de atenção também muito curto em relação a tudo. As coisas são consumidas, devoradas, deitadas ao lixo e venha a próxima. Então, quando saímos deste molde da competição e da comparação com o outro e da tentativa de estar nas mesmas montras, marcamos diferença e chegamos às pessoas que realmente temos que chegar e que nos querem ouvir.

S. – Há várias formas de te posicionares enquanto artista. Ou te posicionas para entrares na corrida do que é atual, do que é o momento, porque hoje em dia o momento são meros segundos, ou então crias para fazer algo que seja transversal a tudo isso, que tanto pode ser ouvido hoje como daqui a dois anos, que se mantém valido. E sinto que esse é mais o nosso caminho, do que o da corrida. É mesmo uma maneira de encarar a arte. E o que torna isto vantajoso é que mesmo depois de quinze anos, quando quiser dar valor à mensagem, quando precisar disso, vou poder encontrar este disco, talvez já com o pó no Spotify, mas ele vai ser válido.

M. – E como já temos esse background, temos um papel aqui também de ensinar e de mostrar o que é que já foi feito, para que quem está a fazer coisas novas e vanguardistas perceba que as coisas estão todas interligadas. Só existe o que eles estão a ouvir porque outras coisas foram feitas noutros tempos que levaram a essa posição, porque a música está em constante mutação. Acaba por acontecer com os mais novos: de repente entram com um comboio que já partiu há muito tempo e já só conhecem aquela estação. Se calhar, fazer o caminho inverso, ir umas carruagens atrás e perceber o que é que já foi feito, é importante.

Texto de Patrícia Nogueira
Fotografia da cortesia dos artistas

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