Tenho terror do Inverno. Desde que me lembro, a chegada do frio para mim nunca esteve associada ao quentinho de uma lareira ou ao conforto de uma bebida quente. Estas eram apenas estratégias desesperadas para sobreviver a um desconforto constante em casa, na escola ou no café. No meu primeiro Inverno fora de Portugal, percebi que a origem da minha aversão não era o Inverno em si, mas o fato das nossas casas e edifícios não serem capazes de armazenar calor suficiente para termos um espaço onde nos podemos recolher confortavelmente, numa estação em que a Natureza nos convida a isso mesmo.
O problema é, como tantos outros, sistémico: o parque edificado português é obsoleto, sendo que aproximadamente 70% dos edifícios foram construídos antes de 1990, ou seja, quando os regulamentos de desempenho energético para edifícios residenciais ainda não tinham sido implementados no país. Na verdade, segundo a ADENE, 69,5% das habitações avaliadas em Portugal tiveram uma classificação energética entre C e F – as classes menos eficientes, conforme o Sistema de Certificação Energética de Edifícios. Neste cenário, não há sistema de aquecimento que seja na verdadeiramente eficaz e a fatura da utilização de equipamentos de climatização de baixa eficiência, como lareiras ou aquecedores elétricos, é, no final das contas, elevadíssima.
Sim, faço parte daquela categoria de pessoas comumente designadas de “friorentas”, mas não sou a única prejudicada, na verdade, somos todos. A fraca eficiência energética prejudica o ambiente, uma vez que o setor energético é responsável pela emissão de uma grande quantidade de gases com efeito de estufa. Em Portugal, o setor dos edifícios é responsável pelo consumo de aproximadamente cerca de 30% da energia final, sendo que mais de 50% deste consumo pode ser reduzido através de medidas de eficiência energética.
A solução é, como muitas outras, financeira: para evitar as faturas elevadíssimas mensais, o ideal seria investir a priori no isolamento térmico com materiais reciclados, em coberturas e pavimentos interiores ou exteriores, em paredes exteriores ou interiores; aplicar melhores janelas nas habitações, que reduzem significativamente as perdas de calor para o exterior; e investir em equipamentos como ar condicionado/bomba de calor que, embora apresentem um custo elevado e impliquem algum ruído, têm uma eficiência na produção de calor quatro a cinco vezes superior à de um irradiador a óleo.
Infelizmente, estas medidas não são acessíveis a todos. Nesse caso, podemos talvez recorrer à calafetagem de portas e janelas, ao uso cuidadoso dos aquecedores a óleo e termoventiladores (desligando-os durante a noite e regulando adequadamente a temperatura de funcionamento, evitando colocá-los no máximo), ou à biomassa através da queima de lenha (evitando lareiras abertas). E claro, não esquecendo as roupas quentes e confortáveis. Não devemos esquecer ainda que o governo português lançou o programa vale eficiência para prestar apoio financeiro às famílias para melhorar a eficiência energética das suas casas, por isso, se se aplicar, usufrua.
Pessoalmente, no meio do processo doloroso de adquirir uma casa, espanta-me como muitos anúncios nem sequer falam da eficiência energética do edifício, quando a perspetiva de uma casa gelada me continua a aterrorizar. Assim como me espanta quando a minha mãe me conta, em tom de brincadeira e heroísmo, que a janela do seu quarto de infância tinha gelo quando acordava. Ter frio em casa não “enrijece”. Pelo contrário, em Portugal, o frio nas casas estará na origem de quase 25 por cento das mortes no Inverno, sendo os idosos os mais afetados. Precisamos de casas mais quentes no Inverno, pelo bem da nossa saúde e do ambiente.
-Sobre Laura Bastos-
Laura Bastos é licenciada em Jornalismo e doutorada em Relações Internacionais pela Universidade de Coimbra. Colabora como voluntária com a ZERO – Associação Sistema Terrestre Sustentável desde Setembro de 2022.